Palavras da Arte escrita por Taichan


Capítulo 4
Manet é reconhecido — para Renoir, os seios; para Edgar, uma posse.


Notas iniciais do capítulo

Quando reli esse capítulo, percebi como deixei de contar coisas. Por exemplo, há um quadro que poderia ser bem comentado de Manet chamado Bar at the Folies-Bergère, e há alguns pontos que podem ser destacados nele. Há também Execution of Maximilian, que é um tanto "histórico".
Boa leitura!



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Numa fotografia antiga em uma placa, em frente a um salão, estava um homem barbudo e de bigode longo; o rosto era austero, mas suas sobrancelhas estavam franzidas e o olhar dubitável. Embaixo, o nome Édouard Manet.

— Seu nome é Manet? — questionou-se Vicky. — Ele tem um sobrenome idêntico ao de Monet.

— E isso causou confusões, sim, e deixou Manet muito irritado quando foram confundidos. Mas no fim, Claude foi o principal sorriso de Edouard Manet. Você sabe? Manet foi considerado o que começou tudo. — Antes que Vicky apontar o que seu tio disse anteriormente sobre Monet, o fato dele ter dado vida ao Impressionismo, ele disparou: — Claude deu origem ao termo, e possivelmente os fizeram conhecidos. Na realidade, Claude sobreviveu desde o primeiro ao último impressionista. Isso deve ter doído muito para ele.

O desejo que imortalidade de Vicky nunca foi tão difamada.

— E todos eles morreram querendo ter mais tempo. Vicky, você já... Não, você ainda é jovem. Mas você irá querer ter mais tempo: alguns poetas não se importam muito; a morte para eles é apenas algo que vai finalizar o fio da sua vida, calar sua alma que já foi tão expressada. Eles já terão deixado o legado deles.

Caminharam lentamente pela sala. Suas passadas não eram apressadas, mas Vicky estava ficando cansada, mas por outro lado, ela não queria voltar para casa. Para aquele mofo, ou encarar seus pais novamente.

— O Salão foi o grande desafio de Manet: não direi que um ou outro teve mais sorte nesse quesito, mas o que realmente deixou Manet irritado foi que sua arte não ser compreendida. A França queria glória. Mitos. Política. Anjos. E mesmo quando Manet trouxe isso a eles, foi de sua maneira. Uma maneira muito avançada para as mentes perpetuas do Salão. Uma vez sua pintura foi agredida por um homem com guarda-chuva por estar retratando uma mulher nua!

— Parece que os Impressionistas não eram muito sortudos — comentou Vicky.

Anthony riu, bufando.

— A única coisa que artistas podem fazer em tempos de crise é pintar.

— Penso que o forte de nenhum escritor ou pintor foi um dia uma arma. — comentou Vicky.

— Tudo o que Manet fez foi enterrar sua cara de baixo de uma almofada, para se esconder dos insultos: mesmo fazendo isso por puro prazer, artistas também querem ser reconhecidos, e a única chance de verem seus trabalhos e venderem, era n’o Salão: algo proposto pelo Estado para expor obras e a avaliarem. Manet não aceitava distorcer suas obras a ponto de não serem compatíveis a ele. Tinha que haver sua sinceridade ali, sua expressão, sua forma... — Anthony apontou para um quadro. Ele era retratado num ambiente livre, natural, talvez um bosque. Haviam árvores ao redor de três pessoas sentadas num pequeno piquenique, uma dessas sendo uma mulher de costas, observando seus telespectadores sobre os ombros, completamente despida. Suas roupas encontravam-se jogadas no chão. Dois eram homens de terno, algo antagônico a mulher. Aos olhos de Vicky, parecia ser uma crítica: os homens sequer davam atenção a ela, como se ela fosse algo balela, como se sua nudez não advertisse sua presença. Como se ela fosse o cardápio.

Ao fundo, uma mulher estava agachada numa lagoa. Vicky esforçava-se para interpretar essa obra, pois era intrigante vê-la; talvez Manet quisesse mostrar a verdadeira forma que a mulher tem, talvez o seu lado interno de ser, e como os homens a viam - ou não a viam. 

— Essa arte foi considerada incivilizada, uma monstruosidade. — disse Anthony. — Mas ela força os limites da moralidade pública, como seus quadros eram famosos por fazer; e por estar assimilado aos dias atuais, jogando na cara dos juris sua verdadeira face, enfatizando todos esses detalhes e realismo, o Salão considerou algo absurdo, então recusando-o.

— Não entendo. — disse Vicky. — Como conseguiram ignorar tudo isso? Esses traços...

— Não tente entendê-los. Os críticos diziam ser especialistas em arte, mas não pareciam compreender e assimilar — Seu tio fazia gestos engraçados com a mão, como se girasse uma manivela — que elas representavam. — Anthony virou até outro quadro de Manet. Havia uma mulher que os fitava, quase os desafiando a absolvê-la. Estava deitada com o cotovelo apoiado numa almofada, suas mãos sustentando sua cabeça. Era retratada totalmente nua, com um ou outro objeto como pulseiras e uma sandália. E um colar que puxou a atenção de Vicky, algo que a fazia focar sem perceber a negritude do ambiente. Sendo assim, demorou para ser percebido um gato negro nas sombras. Talvez tivesse uma relação com a mão esquerda da mulher, que escondia sua intimidade. Havia também uma criada negra carregando um buquê de flores, como uma devoção. O quadro transmitia algo fantástico para Vicky, como se algo a puxasse para continuar observando, tentando desvendar seus segredos. — Essa era uma deusa, assim como o Salão pedia. Mas ela claramente tem traços humanos, uma mulher comum, uma mulher moderna. O quadro denomina-se Olympia, e foi além de criticada, insultada por deveres. Diziam estar suja, algo como se Manet tivesse que renovar suas pinturas. Foi quando Manet foi conhecido pelos Impressionistas e idolatrado, mesmo sendo reservado. E sabe qual o lado interessante disso na vida de Manet?

Vicky levantou as sobrancelhas.

 — Os pais deles permitiram ele aprender a pintar, mas não queriam que ele virasse pintor.


Anthony lhe apresentou apenas mais dois quadros de Manet: Bar at the Folies-Bergère e Execution of Maximilian, mas não ficaram para conhecer os demais. Quando caminhavam para conhecer outro salão, Anthony resolveu comentar sobre a morte de Edouard.

— Enquanto Manet morria, Claude disse que viu em seus olhos a vontade do amigo de voltar às suas pinturas inacabadas. Tantas coisas para dizer. Desejando ter mais tempo. Edgar justamente comentou em seu caixão "ele é ainda maior do que imaginávamos". Parece sempre assim, não é? No leito de morte, as pessoas não reconhecidas como um filho amado, um parente amado, um marido maravilhoso. Mas para um artista, isso é verdadeiro. Sua grandiosidade sempre é vista em vida, mas nunca notada. Talvez morramos sem saber o quão grande fomos.

 
Não ficaram muito tempo para observar os feitios de Manet. Sabiam que o dia, e assim seu tempo ali, estavam acabando. Partiram para outra sala.

— Você gosta de balé, Vicky? — perguntou Anthony célere.

— Acho algo bonito, mas nunca parei para pensar sobre. Por quê?

— Edgar Degas ficou famoso por retratar os movimentos das bailarinas. Era sua grande paixão — não a bailarina em si, mas o movimento que elas faziam. Tanta graça. Eu diria que uma bailarina é a dor e o cansaço, um refinamento da ópera. Mas havia algo escondido atrás de toda essa beleza: — Anthony curvou-se. — eles escolhiam garotinhas, entende? E Degas retratou isso diversas vezes.

Vicky assombrou-se com o olhar que Anthony a mandou. E em parte por um comentário à parte, em outro para fugir dessa afrontação, ela lembrou-se de algo e passou a procurar pelo local um quadro. Retratava apenas uma bailarina, de braços abertos e uma perna a pousar no ar, absolvida pelo seu movimento. Parecia estar em um palco, e as pinceladas que Edgar deu ao seu redor aparentavam ser para esconder algo absorto pelas trevas bem atrás: por baixo do marrom, um tronco masculino que a observava. A bela garota parecia estar presa em outro local, ou distraída de seu ambiente.

— Qual o nome desse quadro? — perguntou Vicky.

— A Primeira Bailarina. — Anthony parecia querer explicar e contar a história daquela tela, mas Vicky continuou dizendo:

— Eu sempre vi A Primeira Bailarina como uma pintura de terror. Havia tanta escuridão ao redor dela, como se estivesse presa numa gruta ou numa caverna, eu imaginava. E uma pessoa observando escondida por trás disso tudo, como um monstro, eu diria.

— Você conhece Renoir? Foi um grande, talvez o maior, amigo de Monet — comentava Anthony. — Chamavam Renoir de pintor das mulheres, isso porque ele as pintava como elas eram: tanto nuas quanto revestidas. Dizia que o seio feminino era um grande motivo para pintar, senão, não o faria. Por outro lado, Degas pintava as mulheres sem roupas, pois era um momento honesto. Nudez, para Edgar, era só uma posse.

Anthony mostrou alguns quadros de Renoir. Eles eram delicados, sempre coloridos, com pinceladas excepcionais.

— Ele pintava o mundo livre da pobreza, da ansiedade, do medo ou qualquer coisa semelhante. Não porque via o mundo assim, mas era como deveria ser. Quando Renoir morreu, em 1919, ele levou uma parte de Monet junto. Cinco anos depois, Claude foi-se também. O pai do Impressionismo, sobrevivendo a todos os Impressionistas. 

— Anthony — chamou Vicky, desviando o olhar do chão, com a testa franzida. Depois de saber a história de tantos artistas, ela gostaria de saber: — Porque dentre todos esses, Monet é seu favorito?

Não demorou para que eles responde-se:

— Ele era louco, ousado. Parou uma estação de trem inteira para pintar. O tempo para Monet era eterno: nós temos suas pinturas, seus jardins, seus momentos fugazes. Uma impressão. Ah, me lembro bem! Me lembro da pintura que Monet fez de Camille quando ela estava morrendo. O nome do quadro, fantástico: Camille Monet on her deathbed.


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Notas finais do capítulo

*Eu realmente imaginava assim e sequer sabia desse “outro lado” que havia.
Conheçam também outros artistas impressionistas como Cézanne, e assistiram o filme "Os Impressionistas", publicado pela TV Brasil. Próximo capítulo é o epílogo!



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