Apenas Um Olhar escrita por Mi Freire


Capítulo 16
Grandes suspeitas, terríveis marcas.




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Os bebês cresceram muito rápido. Quando eu pisquei eles já estavam engatinhando pelo chão e se apoiando nos móveis para alcançar objetos no alto. Eu era uma muito zelosa e agora tinha muitos mais motivos para me preocupar. Porque com qualquer descuido eles poderiam cair ou derrubar algo e se machucarem feio. E eu não queria que nada de ruim acontecesse a eles.

Eu estava me sentindo muito mais cansada que o normal mesmo com a ajuda da Célia, porque tinha que estar atenta o tempo todo. Cuidando da educação dos gêmeos e cuidados dos afazeres da casa. Além de cuidar das contas de casa.

O Carlos parecia não dar a mínima para isso. Desde que ele chegasse em casa e tivesse tudo em feita ordem: casa limpa e comida no prato. Pelo menos ele ainda se importava com os filhos. Ele comia, tomava um banho e passava um tempo com eles, enquanto eu saia pela casa recolhendo os brinquedos espalhados.

Nossa comunicação estava péssima. Eu nem me lembrava de qual foi a última vez que saímos só nos dois para jantar fora. Ou quando fizemos amor. Não que eu estivesse reclamando. Mas não é porque agora eu era mãe e tinha trabalho em dobro dentro de casa, que não merecia a atenção e o carinho do meu marido.

Eu tinha acabado de dar comida e banho nos gêmeos, quando dispensei a Célia mais cedo, na esperança que eu e o Carlos tivéssemos um tempo sozinhos. Nem que fosse para ficar de bobeira, conversando sobre nossos problemas. Mas bastava eu me aproximar dele para ele fugir de mim. Como se tivesse repugnância. Ele sempre inventava que tinha algo muito importante para fazer ou que estava cansado e só queria dormir.

Por muitas vezes eu me perguntava qual era o problema. Será que ele não me amava mais? Não sentia mais atração ou tesão por mim porque eu estava mais gordinha depois do nascimento dos gêmeos? De fato, eu tinha engordado muito. Antes eu pesava cinquenta e cinco quilos. Agora já estava com dez quilos a mais - ou será que eram quinze? - e isso fazia uma diferença grande nas minhas roupas e na minha disposição.

Os gêmeos estavam assistindo um desenho na sala de estar dentro do cercadinho aquela tarde, quando eu resolvi pegar o balde de roupa suja no banheiro e colocar tudo na máquina para lavar.

Foi quando eu notei que tinha alguma coisa estranha nos ternos do meu marido. Um cheiro estranho. Um perfume doce e feminino que não era dele. Não deu em outra. As paranoias na minha cabeça começaram a falar mais alto.

Será que o Carlos estava me traindo?

Só de pensar na ideia eu comecei a me desesperar. Por pouco eu não chorei. Eu teria chorado se eu não tivesse acabado de ouvir o Carlos chegar em casa mais cedo. Um fenômeno raro. Agora ele estava na sala, fazendo os gêmeos rir.

Bobagem, pensei. Eu precisava tirar aquilo da minha casa. Eu estava paranoica. Carlos jamais algo assim comigo. Mas quem disse que eu consegui esquecer aquilo? Então, comecei a observa-lo com mais atenção. E realmente, ele estava mais estranho que o normal. Muito mais distante e frio. Passava muito tempo no celular sorrindo feito um canalha e sempre dava uma desculpa esfarrapada para sair de casa mesmo quando eu precisava da ajuda dele com os bebês.

Comecei a ter pesadelos muito assustadores depois de todas essas minhas suspeitas. Eu realmente tinha enlouquecido de vez. Estava tão distraída pensando em meios de descobrir se o Carlos estava ou não me traindo que nem vi quando o Gustavo subiu na cadeira e escorregou, batendo a cabeça no chão.

Eu só percebi que ele tinha aprontado quando ele começou a abrir o berreiro. Eu corri para socorre-lo. Ele não se machucou muito, mas criou um pequeno calo na testinha dele.

Carlos veio correndo ver o que tinha acontecido.

— O que está acontecendo com você? – rudemente ele pegou o bebê dos meus braços, como se eu tivesse jogando-o no chão de propósito. — Você deveria estar cuidado do nosso filho!

— Me desculpe! Eu só estava distraída. Não fiz de propósito. Eu não o machuquei. Foi um acidente! Não vai mais acontecer.

Peguei o bebê de volta e tentei acalma-lo, ele ainda chorava muito.

Minutos depois levei os dois lá para cima, para o quarto. Eu contei uma historinha e eles dormiram rapidamente. Isso sempre funcionava. Quando voltei lá para baixo para terminar de arrumar as coisas, o Carlos estava esperando por mim.

Parecia furioso.

— O que foi que eu fiz de errado agora?

— Não se atreva a falar assim comigo.

Ele praticamente me fuzilava com os olhos amendoados.

— Carlos, eu já disse: foi um acidente. Essas coisas acontecem. Ele já está bem. Está dormindo tranquilamente lá em cima.

— Mas isso não deveria acontecer! – ele deu um passo na minha direção, ficando a poucos centímetros de mim. — Poderia ter acontecido algo pior. Você deveria ficar mais atenta!

— Eu só estou cansada, tá legal? – por incrível que pareça eu não estava com medo dele. — Tudo sempre sobra para mim nessa casa! Eu cuido dos bebês. Eu cuido de tudo. E você não parece dar a mínima. Quase não tem tempo para sua própria família.

Cuspi aquelas palavras com gosto.

Elas já estavam acumuladas dentro de mim a tempos.

— Essa é mais que sua obrigação, Melissa. – ele segurou meus punhos com força. —Você é minha mulher e mãe dos meus filhos. Eu não te peço quase nada. Você só precisa cuidar dessa casa e dos nossos filhos. Será que nem isso você consegue fazer direito?

Ele me chacoalhou com brutalidade e me empurrou com força no chão. Eu bati minha cabeça na mesinha de centro.

E mais uma vez Carlos agiu como um animal selvagem e totalmente perigoso. Agora sim eu estava com medo. Por um momento pensei que ele fosse fazer pior. Mas só me olhou com desprezo e saiu de casa, sem nem se desculpar.

Aquela noite ele não voltou.

E eu chorei como um animal ferido.

— Eles estão ficando cada vez mais lindos! – Heloísa observou na tarde seguinte. Ela e Milena sempre que podiam vinham me fazer uma visita. Nossos filhos se davam muito bem. Brincavam o tempo todo! — Ei, o que foi, Mel? Que carinha é essa? Você tá tão estranha...

— Helô, eu preciso da sua ajuda. – pensei muito sobre aquilo. Eu precisava desabafar com alguém ou enlouqueceria ainda mais. — Eu acho que o Carlos está me traindo. Todos os sinais indicam que sim. Eu queria muito que isso fosse mentira ou uma apenas paranoia minha. Mas meu coração me diz o contrário.

Ela assentiu, compreensiva.

— Me ajuda, amiga. Me ajude a descobrir se isso é verdade ou não. Se você tiver alguma suspeita ou se notar algo de diferente no comportamento dele, por favor, me diga. Não esconda nada!

— Claro, Melissa. Não precisa nem pedir. É claro que eu vou te ajudar. Mas sinceramente? Eu não acho que isso seja possível. Ele gosta tanto de você! Porque ele faria algo assim?

— Eu não sei! – lágrimas se formaram em meus olhos. — Talvez ele só esteja cansado de mim.

Naquela noite ele chegou mais cedo. Muito mais cedo que o esperado. Ele não me cumprimentou nem nada. Apenas subiu e foi tomar um banho, depois passou no quarto dos filhos para vê-los.

— Se arrume. Depressa! Hoje nós vamos jantar fora com alguns amigos meus.

— Mas e os bebês?

— Não se preocupe. Heloísa e Fred vão ficar com eles essa noite.

Fiz o melhor que podia. Me arrumei para ficar deslumbrante, na esperança que ele pelo menos me elogiasse como nos velhos tempos ou reparasse o meu sacrifico por ele. Mas nem isso.

Era um jantar de negócios. Muito chato. Fingi estar interessada no que eles conversavam e sorria sempre que possível. Queria muito voltar para casa logo e ficar com os meus filhos. Mas o jantar pareceu durar uma eternidade.

Outras mulheres estavam por lá também, acompanhando seus maridos. Mas nenhuma delas foi muito legal comigo. Pareciam todas muito artificiais e forçadas. Nem ousei a puxar conversa, mas fiquei de olho nelas. Imaginando que talvez pudesse ser uma delas, a amante do meu marido.

Mas não vi nada de suspeito.

Carlos dirigiu em silencio. Pensei em confronta-lo naquele momento, mas tive medo que ele novamente me tratasse com violência. Então, preferi ficar calada. Não queria apanhar de novo.

— Nós não vamos para casa? – perguntei, curiosa. Aquele com certeza não era o caminho de casa.

— Não agora. – foi tudo que ele disse, mantendo o mistério. Toda minha tensão evaporou, quando entramos em um Motel.

Aquela noite foi intensa. Eu não estava esperando por aquilo. Carlos e eu nunca tínhamos feito amor daquele jeito. Foi selvagem e rápido. Com uma brutalidade até que sexy.

Depois daquela noite até fiz questão de esquecer algumas das minhas suspeitas e por um momento até tive esperança que as coisas em nós melhorassem. E melhorou. Mas não do jeito que esperava. Carlos ainda estavam distante, mas pelo menos me procurava algumas vezes por noite para me tocar e se saciar.

No começo foi bom. Eu voltei a me sentir desejada e querida. Depois comecei a me sentir usada e descartável, como um objeto. Porque algumas vezes eu não queria. Estava muito cansada ou sem vontade. Mas ele insistia muito e sempre acabava vencendo.

Em uma noite eu reuni forças e disse a ele o que eu pensava. Tudo que estava entalado. Mas foi um grande erro. Porque ele se irritou ainda mais comigo e me bateu. Ele me machucava cada vez mais e eu não podia fazer barulho e nem gritar, porque os bebês estavam dormindo no quarto ao lado.

Com o tempo eu só me sentia cada vez pior. E apesar de estar cansada daquela situação, não havia muito o que eu pudesse fazer. Não queria correr o risco de ser chutada para fora de casa, porque eu não tinha nada. Eu estava nas mãos dele. E agora eu tinha meus filhos, eu também corria o risco de perde-los.

Pensei em me abrir com alguém. Mas o medo sempre vencia. Eu já sabia o que as pessoas diriam ou pensariam de mim. Que eu era uma covarde. E realmente, eu era. Porque o amor que eu sentia por esse homem me tornava uma refém de suas garras.

Parece loucura, mas sim, eu ainda o amo. E vivo na esperança que isso seja só um pesadelo ou uma fase ruim. Fico esperando que um dia ele caia na real e perceba que não precisa usar esse tipo de arma para me fazer perceber que eu lhe pertenço.

Pensei também em procurar as autoridades e fazer uma denúncia. Mas eu me sentiria muito culpada, pelo resto da vida, em colocar o pai dos meus filhos atrás das grades.

Aguentei isso por muitos anos. E ao contrário do que eu pensava, com o tempo percebi que eu não era fraca ou covarde. Mas sim muito corajosa e forte por aguentar a tudo isso calada, mantendo os votos que um dia eu fiz a esse homem.

Ama-lo e respeita-lo até que a morte nos separe.

Eu parei de ir visitar a minha família em Niterói e parei de convidar as pessoas para virem na minha casa. Não queria que elas vissem as marcas roxas espalhadas por meu corpo. Mas nem sempre eu conseguia esconder isso dos meus próprios filhos.

— Mamãe, o que é isso? – perguntou o Vinicius, muito inocentemente. Apontado para uma marca no meu braço.

— Não é nada, querido. Não se preocupe. – segurei seu rostinho angelical e dei um beijinho doce em sua testa. — A mamãe caiu e se machucou um pouquinho. Mas nem dói, olha.

Peguei o dedinho dele e pressionei sobre a marca. Mordi os lábios para não gemer de dor. Porque ainda doía muito. Mas eu queria provar para ele o contrário.

Fazia um lindo dia de sol lá fora, mesmo assim tive que usar blusa de mangas longa e calça para dar um passeio com meus filhos na praia. Fiquei sentada na areia, observando-os correr de um lado para o outro, felizes da vida.

Carlos podia até ser mal comigo, mas ele continuava sendo um bom pai para os meninos. Poucas vezes, quando sabia que tinha pegado pesado comigo, ele até pedia desculpas e prometia que aquilo não iria se repetir. Eu sempre acreditava em suas promessas, mas elas sempre eram quebradas. E como que para me compensar de alguma forma, ele me dava presentes caros que para mim não significavam nada e não levaria embora a dor que eu sentia.

Nas férias de Julho nós viajamos para o exterior. Levamos os gêmeos pela primeira vez a Disney. Eles só tinham quatro aninhos. Eles ainda eram muito pequenos, mas gostava de aproveitar as coisas. Foi uma viajem maravilhosa, onde por alguns dias eu pude esquecer todos os problemas e dificuldades.

No aniversário de seis anos dos gêmeos nós fizemos uma grande festa em um salão. Todos foram convidados. Eu estava radiante e muito feliz. Pude até usar um lindo vestido de alças, porque meu corpo estava sem marcas nenhuma. Fazia um bom tempo que o Carlos não me agredia. Não fisicamente.

Na semana seguinte eles iriam entrar na primeira série do ensino fundamental. Eu estava tão animada! O Vinicius estava empolgado, mas o Gustavo não. O Vinicius é mais parecido comigo. Ele é mais sensível. Já o Gustavo é mais parecido com o pai em muitos sentidos. Eu só tenho muito medo que ele também seja violento. Farei o possível para que isso não aconteça.

Carlos nos acompanhou para o primeiro dia de aula dos filhos. Ele estava sorridente e isso me deixou muito aliviada e feliz. Vinicius se despediu de nós com um abraço, depois pegou a mão da professora e sumiu com ela. Já o Gustavo deu trabalho. Ele ficou bravo e chorou. Não queria entrar de jeito nenhum. Carlos o puxou de lado e eles tiveram uma conversa muito séria.

Por fim, depois de muita relutância, ele entrou.

Carlos me abraçou pela cintura, sorridente. Enquanto observávamos nossos filhos sumir de vista. Naquele momento eu pensei que as coisas entre nós poderiam melhorar. As esperanças voltaram com tudo. Mas eu estava completamente enganada.


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Notas finais do capítulo

Nada bom, não é mesmo? Como algumas já suspeitavam, o Carlos não parece um bom homem. Afinal, nenhum homem tem o direito de fazer isso com nenhuma mulher. Vamos esperar pra ver qual será o destino desse casal. O que Melissa deveria fazer?