Ela abusara de sua beleza, me seduzira e agora partia.

            Droga.

            E o que mais me incomodava era saber que eu não havia sido o primeiro – certamente não – e nem seria o último.

            No fim das contas Dulce se mostrava mesmo pior do que as irmãs, ela usava e jogava fora. Ela sabia a todo instante o que fazia.

            Droga.

            Meu sangue fervia de ódio e eu não duvidaria se alguém dissesse que eu estava espumando. Raiva. Ódio.

            E o pior era que, mesmo tendo feito tudo isso, eu não conseguia esquecê-la, e cada rascunho que eu esboçava me fazia lembrar as cenas de nós dois juntos, e seguiria sendo assim.

            Só que ninguém havia me dito que poderia doer tanto.

— Demônio — eu murmurava e era como se pudesse ver seu sorriso brilhando na minha frente. Isso me fazia querer gritar.

            Jogado no chão de meu apartamento eu sentia meus músculos doídos e contraídos pela tensão, eu esperara por dias a fio que ela voltasse – sentado na janela que ela sempre ficava fumando, eu escrevia palavra atrás de palavra, consumindo xícaras atrás de xícaras de um café ralo e amargo – e não importava quão ruim o tempo estivesse, eu fiquei ali, mas ela não apareceu.

            Eu fiquei ali até a última palavra da minha história – demônios – e então estava acabado de vez.

            Agora folheando tudo que foi rascunhado nesses dias, há toda nossa história aqui – com um pouco mais de amor, talvez – e suspirei, pensei que passando toda essa história para o papel doeria menos – ledo engano.

            Ela se foi. Ela não vai voltar.

            Convença-se disso Christopher.

            De olhos fechados eu só queria voltar ao início de tudo, a antes da morte de Claudia – eu a avisaria, cuidaria dela se preciso, eu faria de tudo para que ela largasse a vida fútil que levava. Eu poderia até devolver o brilho aos seus olhos... Eu cuidaria de Blanca também.

            Ah eu faria tantas coisas só para não ter que sentir esse buraco que se formou em meu peito. Eu faria tantas coisas para não ter que enfrentar aquele demônio – para esquecer que um dia tive de fazê-lo.

            Mas do que adianta, eu posso dizer e repetir quantas vezes for necessário, eu posso inclusive voltar no tempo, mas – por ela – eu sei que faria tudo de novo.

            Droga.

            Porque Dulce era um demônio que me tentava, e o único modo de me livrar da tentação seria entregando-me a ela... Exceto uma coisa seria diferente, eu já saberia o final da história – porque ela partiria mais cedo ou mais tarde, talvez a vida a dois, ou nessa cidade, ficasse maçante, de qualquer modo Dulce não foi feita para servir de Amélia – eu teria me entregado desde o início.

            Eu teria me transformado num demônio por ela também.

            Só por ela.