Minha Gotinha de Amor escrita por Miss Vanderwaal


Capítulo 1
A dor exige ser sentida


Notas iniciais do capítulo

Como eu disse no disclaimer, Sparia é território novo pra mim e, honestamente, não tenho quase nada planejado e escrevendo esse primeiro capítulo eu senti como se estivesse dando um tiro no escuro. Sendo que, por favor, me deem direções, sim?



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Aria remexeu-se em sua cama. Estava com calor e queria muito se livrar das cobertas que sua mãe havia estendido sobre ela mais cedo, mas também estava com preguiça. Seu quarto pequeno era naturalmente mal iluminado e tudo o que ela conseguia ouvir atrás de si era o barulho calmante da chuva. O ambiente estava em perfeita harmonia e aquele seria mais um domingo chuvoso que Aria passaria feliz da vida em casa se não estivesse atualmente se sentindo tão... vazia.

Ela havia terminado com Ezra na sexta-feira, e fazia quase quarenta e oito horas que ela não chorava, o que era um bom sinal. Ela só andava pensando muito sobre certas coisas. Sobre as coisas boas que os dois haviam vivido juntos e sobre como se sentia aliviada por aquele rompimento ter acontecido de uma forma tão pacífica.

Na verdade, fora um “término mútuo”. Os dois apresentaram motivos pelos quais não deveriam mais continuar com aquilo e concordaram um com o outro. Ezra havia se comportado como o cavalheiro que sempre fora durante aquela última conversa. Segurara as duas mãos de Aria e dissera as palavras de uma forma muito suave, que fizeram Aria sentir como se estivesse sendo acariciada por elas, como se elas fossem elogios e nada mais do que isso.

Ele dissera que ela era uma menina tremendamente especial e que nunca, jamais conheceria alguém que se igualasse a ela. Dissera que nunca deixaria de amá-la mas que a culpa por prendê-la em um relacionamento ilegal aos olhos da sociedade o estava massacrando. Aria entendia, afinal ela tinha dezessete anos e ele, vinte e seis. Nove anos de diferença era bastante coisa para chocar as pessoas.

Ela ainda lembrava do olhar cortante que a mãe dele lhe lançara durante o “jantar de apresentações”. Aquele olhar doera muito, assim como doeriam as piadas que ela sabia que alguns alunos de sua escola fariam a respeito dele se soubessem da verdade, como “Você não dá conta de alguém do seu tamanho?”. Isso porque, além de ser praticamente uma década mais velho, Ezra havia sido professor de Aria – não mais nos últimos meses, felizmente.

Quando Aria saía com Ezra por cinco minutos para tomar um mísero café, por exemplo, ela sentia olhares pesados sobre si, que a deixavam desconfortável, e aquele desconforto ia ultimamente se sobrepondo a qualquer sentimento de tranquilidade que pudesse vir a dominá-la estando com ele. E foi aí que ela percebeu que não era justo entregar-se a Ezra apenas pela metade devido ao medo.

Fugir da cidade? Ela já havia considerado, mas era menor de idade, não havia como. E burlar as leis e viver escondida numa casa afastada apenas esperando-o chegar do trabalho para que pudessem ficar juntos simplesmente não valia à pena. Por tais motivos o término do namoro havia sido premeditado e não doera tanto. Quer dizer, Aria chorara na hora, mas não devido à incompreensão, devido ao contrário disso. Ela compreendia que era a coisa certa a fazer.

Agora Ezra provavelmente já estava em algum trem rumando ao estado vizinho, Ohio. Dissera a Aria que conseguira um emprego no Instituto de Artes de Cleveland. Ele não dissera que estava se mudando para evitar cruzar com ela nas ruas da pequena Rosewood, mas isso com certeza ficava subentendido. E mesmo que tudo estivesse parecendo se ajeitar, algo ainda deprimia Aria o suficiente para ela pensar em faltar aula na segunda-feira e ficar na cama o dia inteiro ouvindo músicas tristes em seu iPod.

Levantou-se. Andou devagar até sua escrivaninha e tocou com a ponta dos dedos as teclas da máquina de escrever cor-de-rosa que seu pai lhe dera em seu último aniversário. A cadeira de madeira artificialmente envelhecida e encosto alto pareceu-lhe bastante convidativa. Respirou fundo. Esse era um daqueles momentos em que ela sentia muita vontade de escrever. Poderia escrever sobre aquilo. Talvez fosse vir a ser lucrativo algum dia. Pessoas adoram ler sobre amores proibidos. Balançou a cabeça, censurando-se. Não era justo escrever sobre aquilo ou qualquer outra coisa pensando em dinheiro.

Aria amava datilografar. Escrever usando papel e lápis cansava e com certeza usar uma máquina de escrever era mais divertido do que escrever no computador. Desde pequena ela sempre gostou de ouvir o som das teclas da Royal preta que Byron mantinha em seu escritório, apenas com a função de enfeitar sua mesa.

Sentou-se à frente de sua escrivaninha e endireitou a coluna. Fechou os olhos por um segundo e em seguida encarou a vista de sua janela. Mesmo com o vidro abaixado, ela conseguia quase sentir o vento que fazia as copas das árvores dançarem do lado de fora. Era um dia para escritor nenhum botar defeito.

As gotinhas d’água escorregando pelo vidro davam um ar poético a tudo aquilo. Pensou em buscar uma caneca de café na cozinha para completar o “visual” mas decidiu deixar algo no papel primeiro. Sentiu certa empolgação emanar de seu peito para o resto do corpo e sorriu minimamente.

“Eu gosto de sentir – ela começou –, não importa se é algo bom ou ruim. Eu apenas gosto de ser vulnerável a uma lágrima ou a um sorriso.”

Ela realmente se identificava com aquele pensamento. Era bom saber que não era de ferro. Não sabia se havia tirado-o de um livro, de um filme ou se era apenas sua inspiração soprando-lhe aquilo. De qualquer jeito, aquela frase descrevia precisamente sua dor a respeito de Ezra. No fundo, era uma dor boa. E ela precisava sentir aquilo no momento. Como ela lera em A Culpa é das Estrelas: “A dor exige ser sentida”.

Relaxou as costas no encosto alto da cadeira e ouviu três batidinhas na porta.

– Ei, que bom, você já está de pé! – disse Spencer, sorridente, por um segundo com apenas a cabeça para dentro do quarto.

– Não exatamente de pé – rebateu Aria, virando-se ainda na cadeira para a amiga que fechava a porta atrás de si.

– Ainda assim fico feliz por saber que você não pretende passar a vida hibernando.

– Spencer, é o primeiro fim de semana e eu já aceito comer alimentos sólidos – Aria defendeu-se enquanto Spencer sentava na ponta de sua cama desarrumada – Em comparação a outras garotas e seus términos, estou bem adiantada.

Spencer riu e enfiou uma mão no bolso de seu sobretudo verde.

– Eu li sua mente, então – disse, mostrando a Aria um saquinho plástico transparente com alguns cookies de chocolate – Estão fresquinhos.

Aria torceu sutilmente o nariz.

– Não estou com muita fome agora – alegou num tom docemente educado.

– Como assim não está com fome? – Spencer fingiu indignação – Eu que fiz. Coma.

Aria riu também, em descrença.

– Você os fez? – levantou-se para sentar ao lado direito da amiga na cama – E desde quando a futura advogada Spencer Hastings realiza trabalhos manuais na cozinha?

Spencer levantou um indicador.

– Em primeiro lugar, você sabe que nunca deve pronunciar Spencer Hastings e advogada num mesmo fôlego. E em segundo lugar – ela amaciou a voz – Qual é! Eu abri essa exceção pensando em você e no que a sua mãe disse a Hanna quando ela veio aqui tentar falar com você ontem. Se eu não me engano, as palavras da Sra. Montgomery foram “no momento ela está pálida e possivelmente com febre emocional”.

Aria encolheu os ombros, sorrindo levemente e sentindo-se culpada por ter preocupado sua mãe.

– Não sei se estive com febre – disse ela baixinho, deitando a cabeça no colo de Spencer –, mas posso ter estado pálida.

– E você ainda está pálida – disse Spencer acariciando os cabelos de Aria de modo a fazê-la olhar para cima, em seus olhos – Na verdade, está horrível. Devia tirar esse pijama e marcar hora num salão de beleza.

Aria gargalhou. Spencer não costumava usar muito de sua voz sarcástica, então quando o fazia, tal era inconfundível.

– Eu só não te corro daqui porque você está me fazendo bem.

Spencer emitiu um “own” e lançou-a um sorriso derretido, parecendo realmente lisonjear-se.

– Obrigada. Mas e aí? Vai provar meus biscoitos ou não?

– Coisa chata – Aria grunhiu, fingindo estar brava – Me dê aqui.

Spencer entregou-a o pacotinho com os biscoitos que ainda estavam mornos.

– Se estiver ruim tenha em mente que eu lembrei que os com gotas de chocolate são os seus preferidos, então é pelo menos um ponto a meu favor.

Aria revirou os olhos e riu antes de dar a primeira mordida em um dos biscoitos. Estava sendo a sua vez de sentir-se lisonjeada. Ela gostava de saber que Spencer andava estando tão preocupada com ela.

– Uau! – disse, sentindo o chocolate derreter em sua boca e o açúcar adormecer sua língua por um momento – Está... divino. Mas, Spencer, acredite, eu odeio dizer isso: você não sabe cozinhar.

– Tá bom, tá bom – rebateu Spencer, cerrando os olhos – Eu admito. Emily fez quase todo o trabalho mas fui eu quem ligou para a sua mãe pedindo a receita.

Aria gargalhou outra vez. Spencer, quando queria, conseguia ser incrivelmente fofa e deixar a pessoa metódica que quase sempre era de lado. Ela parecia realmente orgulhosa da pequena façanha que realizara.

– Bem, eu estou profundamente tocada – garantiu Aria, afastando-se momentaneamente da amiga para voltar a deitar a cabeça em seus travesseiros.

Spencer, por sua vez, desceu da cama e agachou-se ao pé dela, ficando ao nível dos olhos castanhos de Aria.

– Acho que eu só queria ter uma desculpa para poder vir aqui ver você.

O coração de Aria amoleceu por um segundo. A garota falava tão suavemente, olhando tão fundo em seus olhos, parecendo extremamente verdadeira, num contato que talvez as duas nunca tivessem tido uma com a outra.

– Você não precisa de uma desculpa para vir me ver, Spence – Aria sorriu ternamente, enrolando um cachinho fino dos cabelos dela em seu indicador –, sabe disso.

Spencer lançou-a o mesmo sorriso terno e segurou levemente os dedos que antes brincavam com alguns fios de seus cabelos.

– Eu sei que posso ser mandona às vezes, ou quase sempre. Sei que ajo constantemente como se fosse a mais inteligente ou soubesse o que é melhor para todo mundo. Mas queria que soubesse que hoje eu abaixei minha guarda. Não estou aqui para tentar te dizer o que fazer.

– Eu nunca pensei em você dessa forma – Aria assegurou, negando com a cabeça – Pra mim você é uma ouvinte tão boa quanto o resto das meninas. Quer dizer, você é tão boa quanto Emily, porque Hanna iria fazer pouco caso da minha “fossa” e com certeza algumas piadas viriam de brinde. E Alison, bem, ela provavelmente me arrastaria para um bar e me diria para “parar de fazer drama”.

Spencer riu.

– Eu amo a Emily, e não sei dizer por que estou feliz que você tenha sido a primeira a vir falar comigo, mas estou – Aria concluiu.

– Talvez pelos meus maravilhosos biscoitos de chocolate – ela fingiu beijar o ombro do casaco e Aria acompanhou-a em mais uma risada – Falando sério agora, eu é que estou feliz por você não ter ficado brava comigo vindo aqui, porque você é mesmo muito pequenininha e parece ainda menor deprimida e... eu te amo – Spencer concluiu, fazendo biquinho.

– Santo Deus, quanta carência! – Aria sentou-se e envolveu os ombros de Spencer com os braços – Parece que foi você que perdeu um namorado e não eu.

– Argh, eu sei, é patético! – Spencer desprendeu-se da garota e voltou a agachar-se ao pé da cama dela.

– Não se preocupe – Aria cochichou, como se contasse um segredo à amiga – Os membros assexuados do seu clube de debates não estão aqui para testemunhar isso.

Spencer pegou uma almofada decorada que estava junto aos travesseiros de Aria e jogou-a carinhosamente contra seu nariz.

– Idiota – as duas já riam novamente – Eles não são assexuados. Só... não são os maiores fãs de contato físico.

– Mesma coisa – Aria deu de ombros e pegou novamente o saquinho com os biscoitos.

Spencer não rebateu e o silêncio que se fez em seguida só era quebrado pelo som das mastigações de Aria, que pousou os olhos na garota perto de si e passou a observá-la distraidamente. Spencer agora estava sentada no chão encerado com as pernas flexionadas junto ao corpo e parecia querer ficar ali para cuidar de Aria caso ela caísse no sono. Tinha minúsculas argolinhas prateadas nas orelhas e não usava maquiagem, o que deixava os pequenos sinais de nascença que ela tinha em algumas partes do rosto à mostra. Aria não sabia por que, mas queria dizer a Spencer que ela estava bonita. Ao invés disso, largou o saquinho com agora apenas dois biscoitos em seu criado-mudo e relaxou a cabeça em um travesseiro, suspirando de uma forma talvez dramática demais.

– Tudo bem aí? – perguntou Spencer com um meio sorriso e uma sobrancelha arqueada.

Aria assentiu sem dizer nada.

– Quer conversar? – a garota insistiu.

– Quero – ela soltou, percebendo que não se importaria de falar com Spencer sobre qualquer coisa.

– Certo, então – Spencer recostou-se de lado ao colchão de Aria – Vou ser sua psicóloga de cabeceira. Conte-me o que está te incomodando, ursinha.

Aria prendeu outra risada. Spencer estava usando a voz sarcástica outra vez.

– Me chamou de quê?

– Ora, se seus pais têm direito de te chamar assim, eu também tenho.

– Hã, certo, a última vez que me lembro de ser chamada assim por eles eu tinha sete anos.

– E daí? Você continua quase do mesmo tamanho.

Spencer usou os braços para proteger-se de uma possível travesseirada mas Aria limitou-se a reclamar, fazendo o uso de uma falsa birra.

– Se não for me levar a sério, coloque-se daqui para fora – ela apontou para a frente, mas a risada no final da frase a entregou.

– Não, não – Spencer segurou o pulso da amiga – Eu vou me comportar, prometo.

– É bom mesmo. Senão nunca mais te elogio dizendo que você é uma melhor ouvinte que a Hanna e a Alison.

– Certo, é justo – Spencer cedeu, voltando a fitar Aria com uma doce seriedade – O que você está sentindo?

Aria suspirou outra vez, passando o braço esquerdo por debaixo do travesseiro. Era como se durante os minutos que Spencer esteve ali falando com ela, ela tivesse esquecido quase que completamente de Ezra e daquela “dor boa”. Mas agora Aria permia-se senti-la novamente. Parecia que ela havia voltado a ter sete anos e perdera seu bichinho de pelúcia favorito. Era uma saudade agridoce, pois ela sabia que não dormiria mais abraçada com tal bichinho todas as noites.

– É estranho saber que eu não o terei mais em minha vida – murmurou, de repente sentindo seus olhos arregalados e fixados em algum ponto atrás de Spencer – Muito estranho. Quase surreal. Eu sinto um vazio... – ela agarrou a camiseta do pijama – bem aqui.

– Ah, meu bem... – Spencer devolveu numa voz macia e condolente, traçando linhas imaginárias com os dedos na palma da mão direita de Aria – Eu sei que não devemos comparar situações assim, mas você sabe que eu vivi algo parecido. Eu garanto a você que vai passar. Esse vazio que você sente agora será preenchido mais cedo ou mais tarde.

Aria sorriu minimamente de volta. Ela sabia. Spencer namorara há um ano com um garoto mexicano mais velho de inglês impecável. Alex Santiago. O cara era um doce, provavelmente taxado de gay na escola por abrir a porta do carro para as garotas e levar flores para elas no Dia dos Namorados ao invés de fazer reservas para os dois em um motel. Alex planejava cursar gastronomia nos Estados Unidos mas trabalhava com visto de turista em um restaurante na Filadélfia. Após apenas alguns meses de namoro, ele fora deportado. E a garota fora deixada num estado miserável. Ficara por dias e dias trancada no quarto e passara longos tempos sem comer. Emagrecera a ponto de assustar as pessoas. Mas, eventualmente, passou.

– Você só tem que confiar nas pessoas que te cercam e elas farão com que pare de doer – Spencer concluiu, sorrindo agora confiantemente.

Aria voltou a fitar os olhinhos castanhos da garota que agora sorriam junto com os lábios dela. Foi impossível para Aria conter o próprio sorriso também. O hálito de Spencer cheirava a café – seu maior vício –, denunciando que ela havia passado em alguma cafeteria no caminho até ali.

Spencer sempre cheirava a café. Hanna dizia que nas veias dela provavelmente corria cafeína ao invés de sangue. O vício era tão grande que a sra. Hastings obrigara-a a fazer clareamento nos dentes por duas vezes. Aria percebia agora que não se importava nem um pouco com tal vício. Dava-a um certo charme, até. Além do mais, para Aria, abraçar Spencer e não sentir aquele familiar cheirinho de café era como abraçar seu pai quando ele chegava do trabalho e não sentir o usual cheiro de suas balinhas de menta.

Enlaçou os ombros dela mais uma vez, não esperando que ela se levantasse do chão. Era confortável abraçá-la por cima do sobretudo.

– Eu confio muito em você – murmurou de olhou fechados, sentindo-se respirar profundamente e sorrir por dentro.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha ficado bom :) Não esqueçam das sugestões, tá?