Dublê de pai! escrita por AneQueen


Capítulo 8
Capítulo 8




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Por um segundo, pensara que Robin iria beijá-la, mas, no último momento, ele se afastou. Duas emoções preencheram-na: alívio e decepção.

Não precisava de um homem em sua vida, uma complicação como essa. Mas, ah... A solidão que a envolvia toda noite na cama pareceu quadriplicar naquele momento. Queria muito que ele a beijasse.

Mas ele sentara-se novamente e decidiu que interpretara o movimento erroneamente.

Fazia um bom tempo desde a última vez que um homem a cantara, então era fácil cometer um erro assim.

Havia vezes, como esta, nas quais ser viúva a atingia fortemente. Ela se lembrava de tudo o que perdera e o quanto isso doía. Era forçada a lidar com a perda do marido e com não fazer mais parte de um casal.

Estava sozinha.

Segurou as lágrimas e disse a si mesma que pensaria nisso depois. Aquela palavra tomara-se seu mantra nos últimos meses: depois.

É, como quando Sabrina tivesse 18 anos.

Ficaram sentados por um momento, fingindo observar as crianças escalando os brinquedos. Sabrina continuava adormecida. Nenhuma distração viria do bebê, não agora.

— A Sra. Belle me disse que você tem 12 irmãos — disse ela, mudando de assunto para quebrar o gelo.

— A Sra. Belle fala demais.

— Ela disse que é daí que você conseguiu sua... Experiência com bebês. — Arqueou a sobrancelha. — Como se você tivesse alguma.

— Está dizendo que não acha que sou bom com crianças? Ou, nesse caso, uma criança?

— Bom; você não é exatamente o Sr. Calor e Aconchego.

— Ninguém disse que você tem de ser quente e aconchegante para cuidar de uma criança. Não me lembro de ler isso no manual das babás.

— Você já leu um manual de babás?

Ele ruborizou e percebeu que expusera um lado vulnerável. Ora, ora. Esperou, observando, deixando o silêncio pressioná-lo a contar. Demorou muitos segundos, mas ele finalmente falou:

— Minha irmã deixou um manual jogado uma vez. Um cara pode ficar desesperado por algo pára ler às vezes. — Fitou-a de relance. — Essa é minha versão e vou mantê-la.

— E o Olho Mal que silencia criancinhas é herdado ou uma dica do livro também? — riu.

— Desenvolvi isso sozinho — disse ele, apontando para ela.

— Chamo de... Tática de sobrevivência.

— Tática de sobrevivência? Sobreviver a quê?

— Por que importa?

— Só estou curiosa.

Ele fez uma careta.

— Vamos mudar de assunto. Estou te ajudando por alguns dias, não vou me mudar e virar pai, certo?

Uma geleira crescera entre eles e, claramente, não sairia dali. Conversa terminada.

— É claro — disse ela.

Ele se levantou e se afastou do banco, distanciando-se dela. Claramente, a conversa o havia atingido de alguma maneira. Estranho.

Não precisava se importar. Ou se envolver. A vida dele era dele. Tinha a sua com que se preocupar. E isso era o bastante. Ainda assim, a preocupação continuou ali, e pegou-se o observando continuamente, aquela figura alta e solitária contra a luz do sol.

O que acontecera com ele? O que o fez tão... Insensível?

Tinha de ser mais do que o típico eremita escritor. Mas não sabia o que era. De qualquer jeito, Robin não falaria, e ela não perguntaria.

Afastou os pensamentos, apanhou um cobertor no carrinho e pegou o cooler que trouxeram.

— Eu diria que é hora de comer, não?

Ele se virou, com a mesma careta de sempre no rosto.

— Não estou com fome ágora.

— Bom, eu estou. Na verdade, estou faminta. E você também deve estar considerando que não almoçou quando estive lá mais cedo. — Apoiou as mãos no quadril, determinada a mudar de assunto e recomeçar. — Agora, se você já se cansou de ser ranzinza, pode se juntar a nós. Preferimos companheiros de almoço agradáveis. — Então se virou, conduzindo o carrinho até a sombra do carvalho.

Assim que parou, o bebê acordou, estendendo os braços, clamando por colo. Sorriu e apanhou-a. Essa era sua prioridade. Não um relacionamento. Não poderia conciliar os dois, além do trabalho, as contas a pagar e o estresse de tudo o que passara. Devia se concentrar em Bri, no trabalho e só. Seria o bastante por agora.

Tinha de ser.

Segurou sua filha por alguns minutos, depois a colocou novamente no carrinho para arrumar o piquenique. Mas, assim que a colocou, Bri começou a chorar.

Equilibrando Bri em um quadril, agachou-se, pegou o cobertor e desenrolou-o, à mercê da brisa leve. Mas, enquanto tentava colocá-lo no chão, o vento a atrapalhou, emaranhando as pontas. O bebê choramingou em seus braços, querendo ser colocada no chão, só complicando as coisas.

— Bri, eu tenho que colocá-la no carrinho, querida. — Moveu-se em direção ao carrinho, mas Sabrina adivinhou o que estava por vir e agarrou o ombro da mãe: Não. Não vou lá. Nada feito, não agora.

Tentou arrumar o cobertor com apenas uma das mãos novamente e não conseguiu.

Bufou, desejando ter três braços. Como outras mães faziam esses trabalhos tão facilmente?

— Aqui. Deixe que eu faça isso. Você vai deslocar um ombro ou sei lá. — Robin pegou o cobertor e, com um movimento, arrumou-o no chão, liso.

Sorriu grata.

— Vai se juntar a nós?

— São vocês ou o grupo de pequenos e perigosos humanos ali. — Apontou para o parquinho. — Prefiro arriscar a chorona fedida.

— Sabrina não é uma chorona fedida. É um bebê. Todos os bebês têm cheiro. E choram.

— Conheço bebês. O seu cheira mal. Sem mencionar que chora alto. Na verdade, já marquei uma consulta no otorrino semana que vem.

Devia ter se ofendido, mas aquelas palavras perderam o sentido ofensivo, especialmente por ele quase ter sorrido ao dizê-las. A careta se fora e qualquer que fosse a tempestade que ia se formar ali passara. Talvez ele estivesse gostando mais de Sabrina. Ou talvez estivesse muito cansada para se importar.

— Então me diga o que é tão perigoso num bando de crianças?

— Digamos que um homem feito não deve chegar nem perto delas e de seus brinquedos. São todos da altura exata para infligir danos permanentes.

— Você, alguma vez, olha para o copo como meio cheio?

Sorriu sarcástico.

— Só quando está meio cheio de uísque.

— Você é incorrigível — riu.

— E você parece minha mãe.

— Se eu fosse sua mãe, faria questão de que tivesse comida mais saudável na geladeira. — Apanhou a salada de batatas pronta, os sanduíches de mortadela que fizera mais cedo, um saco de batatinhas e dois refrigerantes. Atrás deles, os gritos estridentes das crianças brincando felizes aumentavam e diminuíam. Pássaros voavam de árvore em árvore, e uma brisa leve mexia as folhas. O dia não poderia estar melhor nem se estivesse pintado e pendurado no Louvre. — Como você consegue comer essas coisas todo dia?

— Para sua informação, mortadela é carne. Acho. Pão é do grupo dos pães, e na salada de batata, há alguns vegetais. — Robin espiou o recipiente de plástico. — Eles só estão tão picados que não dá para ver.

— Depois dessa, vai tentar me convencer de que refrigerante é uma bebida esportiva, tão cheia de vitaminas e eletrólitos que só esqueceu-se de colocar no rótulo.

— Ei, não dá para saber o que colocam nessas coisas. Leia a lata. Cheio de ingredientes misteriosos aí. — Ele sorriu. Quando ele sorria, o peito dela se enchia de vitalidade, algo que não acontecia há muito tempo. Desde Daniel. O sentimento era tão estranho, tão distante, que não sabia como lidar com ele. Como reagir.

Era quase como se tivesse tido um bebê e esquecido como ser mulher. Como namorar. Flertar.

Isso era flertar? Ou estava interpretando completamente errado cada sinal que ele estava mandando?

Robin era tão diferente de Daniel, um homem mais quieto, menos imprevisível e não cheio de mistérios, profundidades que não conseguia sondar. E não sabia se queria.

De qualquer jeito, o que faria agora era comer. Não devia pensar em se envolver com outro homem quando mal tinha tempo de respirar desde que seu marido morrera.

— Aqui estão... Hum... Garfos — disse ela, procurando no fundo do cooler e apanhando uma sacola plástica cheia de pratos de plástico, guardanapos e outros utensílios. Robin não tinha ideia de onde ela encontrou aquilo na casa dele, e Regina teve mesmo que procurar para encontrar o que considerava essencial para um piquenique.

Claramente, o homem não era adepto a piqueniques. Quanto a ela, fazia tanto tempo desde que fora a um que quase esquecera a maravilha de estar ao ar livre.

Mas agora, com Robin tão perto, quase podia tocá-lo. Uma onda de calor emanava daquela pele, e eletricidade faiscava entre eles. Por mais que tentasse não notar, notava. Bastante. Tudo. O perfume florestal de sua colônia. O profundo azul de seus olhos. O jeito com que o cabelo escuro encaracolava-se sobre o colarinho da camisa, fazendo-a desejar passar os dedos pelas pontas. Sentir a força de um homem contra seu corpo, ser abraçada novamente.

Especificamente por ele. Por aquela figura definida, musculosa.

Pigarreou e colocou a mão no cooler.

— Aqui está: um prato, guardanapos... — Entregou as coisas a ele. — Copo de plástico... Precisa de mais alguma coisa?

Ele colocou os apetrechos no cobertor.

— Deixo você nervosa?

— Não, claro que não. Por que acha isso?

— Porque você acabou de chamar o copo de plástico de guardanapo. E o guardanapo de prato. — Aquele sorriso novamente, só que, dessa vez, provocador.

— O bebê me distraiu. — É, culpe o bebê. Colocou Sabrina no colo. — Você quer... Salada de batata?

O sorriso aumentou.

— Claro. Deixe que eu pego. Você parece ter as mãos cheias.

As mãos e a mente. O homem parecia entendê-la facilmente. Concentrou-se em ajeitar o guardanapo no colo, desejando que pudesse afastar aqueles pensamentos.

Robin serviu os pratos, com porções generosas. Regina comeu, achando que não estava tão faminta. Desde que Sabrina nascera mal tinha tempo para comer, imagine dormir, mas, assim que a comida atingiu seu paladar, abriu seu apetite, e terminou o prato em tempo recorde, mesmo com apenas uma das mãos e tendo que evitar o bebê curioso com mãos curiosas.

— Sua mãe ficaria orgulhosa — disse Robin, lançando-lhe outro olhar provocador. — Não sobrou nem uma migalha.

Ruborizou. Nossa, comera mais rápido que ele.

— Estou sempre muito ocupada para comer ou muito cansada para cozinhar. E, quando consigo fazer uma refeição, muito raramente como porcarias.

— Bom; bem-vinda á meu mundo. Só porcarias, o tempo todo.

— Isso explica — disse baixo, ajeitando o cabelo de Sabrina.

— Explica o quê?

— Por que seu quociente de felicidade beira a zero. Você provavelmente tem deficiência de toda vitamina e mineral importantes.

Ele pressionou uma das mãos contra o peito, fingindo desmaiar.

— Ah, Regina. Não sabia que você se importava.

— Só não quero que você tenha um ataque cardíaco no meio de uma troca de fraldas.

Ele sorriu.

Não havia começado a se importar, nem depois do misterioso assunto daquela tarde, pensou. Ele ainda era, para todos os propósitos, um estranho. Um estranho que despertara uma atração crescente nela, mas um homem que mal conhecia.

De qualquer jeito, Robin representava uma complicação da qual definitivamente não precisava.

Sabrina começou a choramingar e reclamar, então a colocou no cobertor. Bri levantou a cabeça, estudando Robin com olhos abertos e uma boca babona e feliz. As pequenas mãos estavam apoiadas abaixo do peito, como se fosse engatinhar a qualquer momento.

— Ba-ba-ba.

— Não pense que vou dividir — defendeu-se Robin, olhando-a e agitando o sanduíche na frente dela.

— Você não daria um sanduíche para ela, não é?

— Até eu sei que bebês não comem sanduíches. — Rolou os olhos. — Até fazer um ano, né, criança?

Arfou.

— Estou brincando.

— Não foi engraçado.

— Você precisa se alegrar um pouco, Regina. Relaxar.

— Fácil falar. Você trabalha em casa.

— É, bom, meu trabalho não é relaxante como parece. — Mordeu o sanduíche, encerrando o assunto. Descansou um braço no joelho e observou as crianças brincando. — Então o que fez você entrar nesse negócio da TV? Você não combina com isso. Quero dizer, sei que foi promovida e tal. Mas o que a fez escolher essa área?

— Por que está tão interessado? Da última vez que chequei você estava muito ocupado se fechando emocionalmente. — Mais cedo, estaria feliz por isso. Manter a impessoalidade não os aproximava, a melhor escolha para ela agora e no futuro próximo.

Mesmo ele tendo atiçado sua curiosidade um minuto atrás. Mas não iria entrar naquele assunto. Não perguntaria o que também não podia responder.

— Desculpe. Risco ocupacional. Sempre tentando descobrir o que incomoda as pessoas.

Brincou com os restos de sua salada, mas não encontrou muito que comer.

— Por mais clichê que soe, pensei que podia fazer uma diferença. Que algo que eu produzisse faria realmente diferença. Que algo seria importante. Quero dizer, foi à razão pela qual eu fiz faculdade, estudei jornalismo. Não pretendia trabalhar na televisão, mas, quando estava lá, pensei que poderia fazer um programa que...

— Mudaria o mundo?

— É. Muita ingenuidade, não? — Fora um sonho maluco e idealista, típico dos recém-formados. E fora boba o bastante para guardá-lo por tanto tempo.

— Não é tão ingênuo. Sei como se sente.

— Quer dizer que você queria fazer o mesmo com seus livros?

Ele se levantou, amassando o prato plástico.

— Obrigado por trazer a comida. Às vezes, quando estou concentrado na escrita, me esqueço de comer. Então foi uma boa ideia. — Ele foi até uma das latas de lixo e jogou o prato fora.

Outra mudança de assunto. Disse a si mesma que não se importava. Não estava aqui para conhecê-lo. Ficou no parque o suficiente, tomou sol e deixou Sabrina aproveitar o tempo com ela.

Antes de voltar ao trabalho.

Enquanto Bri rolava no cobertor e remexia-se de um lado para o outro, arrulhando e murmurando, Regina guardou os restos. Recolocou tudo no cooler e deixou-o no carrinho.

Finalmente, apanhou Sabrina e afivelou-a no assento, dando-lhe um chocalho. O bebê chutou feliz, com um sorriso largo no rosto.

— Aproveitou né?

Sabrina murmurou.

— Talvez eu finalmente tenha encontrado o jeito de nos darmos bem, hein? Se for assim, teremos de voltar aqui — disse. Logo, desejou. Logo.

De algum modo, encontraria tempo para passear mais no parque. Tomar mais sol.

Fazer mais piqueniques. Encontraria um jeito de conciliar as coisas mais a favor de Sabrina. Precisava.

O combinado temporário daquela tarde com Robin, por mais que complicasse as coisas para ele, tinha lhe dado a dádiva desse tempo com sua filha. Precisava agradecer-lhe. Quando estivesse longe dele, assim não ficaria tentada a beijá-lo.


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Notas finais do capítulo

Gente obrigada por acompanhar :) Ah esse ficou um pouco maior não queria quebrar os diálogos!!BJS