Um Passo Mais Perto escrita por Bowie


Capítulo 10
O fim do caminho.


Notas iniciais do capítulo

Narradores intercalados / Último capítulo



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Paul


— Paul, acorda! Acorda cretino! — ouço uma voz desbotada ficar gradativamente nítida e invadir meus ouvidos

— O que você quer? — falo arrastado

— Ufa, achei que estivesse morto! Você nunca dormiu tanto assim, fiquei preocupada. — Ingrid responde.

Eu ainda estava de olhos fechados, a tempo de mais uma pergunta:

— Que horas são?

— Já passa das três da tarde.

— Sério?

Abro os olhos. Ingrid estava arrumada. Sentei na cama e cocei os olhos para despertar. Uma última bocejada para espantar o sono de vez.

— Vai sair?

— Vou. — ela responde orgulhosa.

— Quem é o cara?

— Tyler.

— Tyler da assistência técnica?

Ela revira os olhos, e nega.

— Tyler, o entregador de pizza? — arrisco de novo.

— NÃO!

— Tyler Hoechlin?

— De onde tirou esse senso de humor? Tyler da loja de rosquinhas

— Eu sempre disse que ele gostava de você.

— Resolvi dar uma chance. Adeus! Ele está me esperando lá embaixo.

Ingrid me dá um beijo na bochecha e sai, mas volta instantes depois para dizer que tinha recado do William na secretária.

Esperei ver a porta da rua fechar e o elevador chegar para ouvir o recado.

“Oi Paul. Acho que fui muito duro com você ontem à noite. Queria conversar com você quando voltar.” Ao fundo pude ouvir a mãe dele gritar: “corre Will, o voo sai às três e meia! ”. Ele e finaliza com: “Tenho que ir”

“O voo? William vai viajar? Eu não posso deixá-lo ir sem uma resposta! Eu preciso dizer a ele!”

Coloquei a mesma calça que usei na noite anterior, foi a primeira que encontrei junto com também a camisa da noite anterior. Recolhi as chaves e a carteira, bati a porta, quebrei o botão do elevador, desci de escada. Raspei o carro no portão da garagem que demorou demais pra abri. Tudo porque já era 15h15.

Eu pensava alto, falava comigo mesmo, fazia promessas de sacrifícios, tudo pra que eu pudesse encontrá-lo antes de partir. Eu morreria se não contasse tudo, se não dissesse a verdade. Parecia um filme, exceto pela parte que não tinha um engarrafamento desgraçado para me impedir. Mas eu dirigia no limite da velocidade apenas para ter certeza que nenhum guarda me atrasaria. Driblava todos os carros a frente, quase atropelei um motociclista. Quando cheguei no aeroporto o relógio já batia 15h20, foi quando comecei a me arrepender de não ter avançado sinais. Chequei o quadro de embarques, achei que seria difícil, mas havia apenas um voo de 15h20. Otawa.

Corri pro portão de embarque, o aeroporto não estava cheio, era uma segunda-feira.

Diminuí os passos para pegar ar quando o vi conversar com o garoto loiro,

Emily e sua mãe.

Ele me viu e franziu a testa, estranhando minha presença. Separou-se do grupo e veio até mim, diminuindo meu caminho. Provavelmente notou meu cansaço.

— O que você faz aqui? — perguntou curioso, mas visivelmente alegre em me ver.

— Eu precisava falar com você. Eu preciso falar com você — corrigi-me — Eu preciso falar com você antes que você vá pro Canadá- E eu nem sei porque você vai pro Canadá? Por que não me contou?

— Eu não- — ele tentou falar.

— Você não precisa me dar explicações, é, mas que eu vim fazer aqui foi outra coisa.

— Paul, eu-

— Não, não… Eu primeiro!

Eu estava ofegante, as palavras vinham na minha cabeça e iam direto pra minha boca. Eu nunca fui assim, nunca fui daquela forma. Era bom, era o efeito William em mim.

— Eu te amo. — disparei — Eu te amo e eu não ligo pra porra da promessa que eu fiz para meus pais, ser feliz é o que importa. Eu não estou nem aí praqueles cadáveres preconceituosos, perdão pai e mãe, que insistiram e me incomodar mesmo depois de mortos. Eu quero você. Eu quero ser feliz com você, você me faz feliz. Você é o amor da minha vida, você mudou a minha vida! Você mudou meu jeito de ser! Eu acordei faz meia hora, estou com as roupas amarrotadas e eu te amo. Eu não sei de mais nada, eu só sei que te amo.

William estava atônito, eu diria extasiado. Olho a fundo, os amigos e família dele sorriam orgulhosos, como se soubessem meu histórico de vida.

William não reage, então eu reajo. Seguro seu rosto, não muito certo disso, ele dá um sorriso singelo e eu o beijo. O moreno envolve sua mão em minha nuca. Eu esperei meses para sentir aquele beijo. Esperei meses para sentir aquele abraço, sentir seu corpo junto ao meu daquela forma.

De repente ele sai do beijo, que é quando a mulher anuncia o voo.

— Eu preciso ir. — ele diz.

Fico triste ao ouvir aquilo, mas orgulhoso de já ter dito o que precisava. Ele sai, fico com o toque dos dedos dele em minhas mãos.

William abraça Trent, Emily e a Sra. Fisher também.

Trent segue para o portão de embarque, mas os outros três ficam. Jogo a mão ao rosto de vergonha pela cena que fiz um minuto atrás.

William vem até mim com um sorriso debochado no rosto.

— Você não me deixou falar.

— Foi melhor assim.

William me beija. Foi ainda melhor que o primeiro, apesar de menos demorado.

— Eu posso me acostumar com isso. — digo.

— Eu sempre torci por vocês. — Sra. Fisher diz ao se unir a nós.

Seguro a mão de William, entrelaçando meus dedos aos dele.

—Posso roubar seu filho pelo resto do dia?

— Deve.

Saio do aeroporto com William no meu banco do carona. Ambos estávamos sorridentes.

— Aonde vai me levar?

— Pra casa. Pra minha casa.

Em pouco tempo chego a estadual.

— Porque não pegamos essa rodovia quando me trouxe pra casa?

— E qual seria a graça?

William me beija a bochecha. Eu realmente iria me acostumar com aquilo.

— Temos umas quatro horas de viagem e eu preciso contar algumas coisas pra você.

— Coisas boas ou ruins? — ele pergunta.

— É sobre minha família.

— Você não tem que contar se não quiser.

— Eu quero.

— Bem, então sou todo ouvidos.

“Meus pais sempre amaram muito a mim e ao Ethan, só tinham maneiras diferentes de demonstrar. Desde que me entendo por gente eu percebia que o Ethan era o favorito. Apesar de eu tirar as melhores notas, fazer tudo correto enquanto ele só arrumava confusão, era ele que recebia os melhores presentes. Eu nunca entendi. Quando eu fazia algo que não dava certo, eu era quase que crucificado. Ás vezes recebia o título de filho que deu errado. Ethan sempre me defendia, ele sempre me protegia e eu tinha a impressão de que sempre que eu falhava ele fazia algo muito pior para roubar as punições. Ele era o meu herói. Quando morreram o Ethan já era de maior, então passamos a cuidar um do outro, para valer. ”

— Do que seus pais morreram? — William pergunta.

— Ele morreu num assalto, ela morreu de diabetes alguns meses depois. Não soube lidar com a morte dele, assim como Ethan não soube lidar com a morte de ambos. Meu irmão bebia demais, saía e só voltava dois, três dias depois. Nessa vida perigosa ele acabou contraindo HIV.

— Espera. — William me interrompe. Voz suave e melancólica. — Onde você estava durante todas essas tragédias?

— Lá. Eu via tudo, eu sentia tudo, mas eu guardava. Eu me controlava porque eu sentia que precisava ser forte pela minha mãe e depois ser forte pelo Ethan.

Quando ele voltava das bebedeiras era eu quem dava banho nele e o colocava para dormir. Quando ele conseguiu um emprego, sabe Deus como, de produtor de eventos, aí que ele voltava destruído. Eu tentava dar conselhos, falar com ele, mas ele desviava o assunto e sempre terminava dizendo que cuidava de si sozinho, que eu era o caçula e era dever dele cuidar de mim e não o contrário.

“Quando ele descobriu que tinha pego essa doença ele enlouqueceu. Pegou o carro e saiu pela cidade. Eu o segui, tentei fazê-lo parar, mas quanto mais perto eu chegava, mais ele acelerava. Eu nunca o vi tão transtornado. Num bairro de Lince tem essa curva estreita. Ele não conseguiu fazê-la. O carro chocou contra a mureta de proteção. Eu tentei tirá-lo do carro, mas ele, sempre tão dramático, disse que já ouvia os pais nos chamando.”

#FLASHBACK ON#

Ethan, já sentindo-se fraco:

— Me desculpa, bro. Eu queria ter cuidado melhor de você.
Eu estava em lágrimas, minha boca salivava. Estava agachado na porta do motorista abraçado a ele preso nas ferragens, pendendo para mim.

— Você cuidou. Se eu sou o cara que eu sou hoje é porque você cuidou de mim.

Ethan arfa.

— Paul, essa vida que eu levei… Não siga meus passos, seja seu próprio exemplo. Nem eu nem os pais puderam te dar o amor que você precisou, não é?

— Não fala, besteira, bro. Eu te amo.

Ethan encontra dificuldade em falar, mas mantém o esforço:

— Eu também te amo. É por isso que eu quero que- esquece a promessa que fez aos pais e me prometa- você vai ser o melhor Birgham que já existiu. Seja feliz, autêntico.

— Eu prometo, bro.

Ethan sorri ao ouvir a resposta e aquele sorriso permaneceu ali até seu último suspiro”

#FLASHBACK OFF#

— Eu sinto muito por tudo isso. — William diz com o coração pesado.

Era uma história triste, mas contá-la me fez me sentir melhor. Me senti feliz, me senti eu. E era estranho, porque eu nunca em toda a minha vida, me senti tão eu quanto naquele momento em diante.

— Agora é passado. — digo ao instalar um grande sorriso no rosto. — É hora de começar uma nova vida! — completo, estufando o peito.

— Aos 25?

— Aos 25! Antes tarde do que nunca!

— Amém!


William

Eu acredito que um relacionamento só muda de patamar quando ambos os lados estão dispostos a dividir seus fantasmas com o outro. Sejam eles novos fantasmas ou velhas assombrações. Sempre há algo a compartilhar. A história de superação do Paul era mil vezes mais triste do que a história do garoto abandonado em outra cidade. Acontece que todas essas duas histórias se cruzaram e se misturaram para se tornar uma grande história cheia de drama. Mas vamos combinar que todo relacionamento tem sua dose de Shakespeare. Durante a viagem até Lince eu o olhava e sorria e olhava pra beleza da natureza do lado de fora do carro, voltava a olhar para Paul e via algo ainda mais belo. Eu me apaixonei por aquela beleza, claro, quem não? Mas ele era mais que isso. Paul era másculo, mas frágil, determinado, mas marcado. Eu me apaixonei pelo cara que viu beleza em mim, mesmo quando eu não me considerava tão lindo assim. Eu sempre fingi ser forte, mas com ele eu realmente era.


Paul

— Naquele dia eu pensei que você sairia nu do banheiro. Não que eu quisesse vê-lo nu.

Estávamos subindo para o quarto enquanto colocávamos as cartas na mesa sobre o primeiro dia.

— Você não tem ideia do que eu pensei quando você surgiu de bermuda com os balangandãs livre. — ele diz.

— Foi totalmente sem propósito sexual, juro. Eu me visto assim quando venho pra cá.

— Quando você pegou na minha mão, no carro, eu não queria que soltasse, mas eu precisava dela pra passar a marcha.

A última confissão foi minha:

— Eu devo confessar que estou louco pra acabarmos com isso. Eu quero fazer amor com você.

Um sorriso, agora safado, se cria no rosto dele. O moreno me beija. Eu agarro a nuca dele para não deixá-lo escapar. Nossos beijos evoluem rapidamente pra algo mais quente. O calor gerado nos obriga a retirarmos nossas camisas. Ganho tempo pra trancar a porta enquanto ele tira a dele. Formalidades. Conforme os toques e os beijos aconteciam o calor aumentava ainda mais. Eu poderia jurar que fazia uns quarenta graus ali no quarto, mesmo estando na primavera. Nossos corpos suam, nossas arfadas são a resposta para as próximas vítimas: as calças. Ainda deitados na cama eu retiro minha bermuda sem deixá-lo esperando. Só notei que estava ‘aceso’ quando senti o dele no meu. Sim, estávamos nas preliminares do sexo. Seria a minha primeira vez com um cara, mas eu não o deixaria notar apesar de imaginar que ele soubesse. O sexo oral recíproco veio primeiro. Então o clima foi ficando mais ameno, doce e apaixonado, como dois amantes, confidentes. Os movimentos eram quase que sincronizados, o prazer parecia ser transmitido de um corpo para o outro. A penetração foi complicada, mas com toda a calma do mundo ele me instruiu e, pouco a pouco, fui acostumando-o a ter-me nele. Os beijos amenizaram a dor, o lubrificante também. Nossos gemidos eram como palavras de amor, nossos movimentos eram como a selagem de um ritual. A troca ocorreu momentos mais tarde; tê-lo em mim foi ainda mais transcendental. Seguimos assim até finalmente chegarmos aos foguetes e cachoeiras espalhados pelo corpo, como se tivéssemos sido destinados a ter aquela noite.

Nos atiramos no chuveiro e ficamos uma eternidade conhecendo a anatomia do rosto um do outro bem de perto.

Acordar na manhã seguinte com ele ao meu lado me fez perceber que finalmente eu tinha algo pelo qual zelar. Vê-lo abrir os olhos e sorrir pra mim, ainda sonolento, aqueceu meu coração. Ele levou, mais uma vez, vida praquela casa vazia e fria que eu era e a qual estávamos. Quando o levei de volta pra Winston, fui obrigado a ficar o dia todo com eles e a jantar com a família Fisher, dessa vez como namorado do filho deles. Até jogamos Twister e o Sr. Fisher venceu, para a minha surpresa. A viagem antes adiada por causa da reabertura do caso do Lincoln finalmente ganhara uma data. Nas férias de verão. O namoro da Ingrid com o Tyler da loja de rosquinhas continua firme e forte.

Apesar de tudo, isso não é um final feliz. William e eu somos pré-conceituados quando saímos de mãos dadas e demonstramos afeto em público. Talvez por sermos um casal gay, ou por ser um casal inter-racial, ou por ser um casal. Isso não nos entristece porque não vamos dar atenção a alguém que no repudia quando temos as pessoas que amamos amando-nos de volta, mas nos deixa chateados porque a sociedade ainda pensa dessa forma. Pra isso William comprou uma camisa branca com letras em negrito escrito na frente:

JULGUE MENOS

E atrás:

AME MAIS

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Alguns dias depois, no centro comercial de Lince:

— Eu nunca vou esquecer daquele mendigo desgraçado! Me enganou! Ele mentiu pra mim! — Resmungava o Policial Hawke enquanto observava as pessoas que passavam. — Ah, eu juro que se eu vê-lo de novo eu...

Um homem enorme, musculoso e moreno, de voz grave, solicita a atenção do policial, que não foi feliz desde o dia que foi enganado por William.

O oficial Hawke se vira para o cidadão e seus olhos brilham ao reconhecer a pessoa. Dwayne Johnson em pessoa.

— AH, MEU, DEUS. — é tudo o que consegue dizer. — The Rock! Sr. The Rock! Sr. Dawyne The Rock Johnson. Sr. Johnson!

O ator sorri com o figura e prossegue:

— Ouvi dizer que há um policial que pode me ajudar a entrar no clima pra meu novo filme.

— Ah, sim. — Hawke estufa o peito e ajeita o broche.

— Você pode me ajudar a encontrá-lo?


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Notas finais do capítulo

Capítulo final. Espero que tenham gostado da leitura. Obrigado a todos!



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