Estou novamente em casa após um dia lotado de confusões, o que acabou me deixando com uma enorme dor de cabeça. Acabo nem cumprimentando Fulvia ao voltar, apenas peço licença e me encaminho ao meu quarto, desejando apenas a minha cama neste momento. 

Jogo os meus saltos de qualquer forma no chão e desataco o sutiã, retirando-o por baixo da roupa. 

Não sinto sono, apenas cansaço. E quando finalmente me deito, minhas costas e minha cabeça parecem agradecer em voz alta por esse repouso. Passo um tempo olhando para um ponto distante enquanto faço um levantamento de tudo que aconteceu hoje.  

Não consigo sequer tirar um cochilo de tanta coisa que se passa pela minha mente agora. Só quero o conforto da minha cama e o silêncio do meu quarto. 

Um bom tempo se passa até que eu ouça a porta sendo aberta e não preciso virar a cabeça para saber que é Haymitch entrando. Ouço o barulho de algo sendo posto no criado-mudo e em seguida sinto o seu peso ao meu lado na cama. Ele leva uma mão até os meus cabelos e deposita um rápido beijo. 

— Você tem que comer alguma coisa – murmura com o rosto ainda próximo ao meu. Me viro para ficar de frente para ele e ainda sinto as minhas pálpebras um pouco pesadas, por conta da preguiça.  

Haymitch se vira para pegar a bandeja que havia deixado no criado-mudo e isso me faz ficar sentada. Ele me entrega e eu coloco a bandeja no meu colo, parando para observar o grande banquete que ele mesmo organizou: sanduíche, panquecas, café e alguns doces. Olho desconfiada na sua direção e ele ri. 

— Eu vou comer com você - responde como se lesse meus pensamentos. Havia muita coisa naquela bandeja e ele sabe muito bem que não costumo comer em grandes quantidades. 

— Eu já imaginava – digo, tomando um sanduíche nas mãos. O gosto da mostarda logo invade o meu paladar e fecho os olhos, degustando-a. Ele havia acertado na quantidade, sem deixar o queijo sem gosto quando acompanhando-a.  

Como de costume, Haymitch termina de comer bem antes de mim e tira o restante do tempo para me observar. Quando finalmente termino, ele me entrega o guardanapo para que eu limpe o excesso e em seguida coloco-o na bandeja novamente, a qual volta a ser colocada no criado-mudo. 

— Haymitch – digo quando ele ainda está arrumando a bandeja para que não caia. Ele murmura um "hm" e logo se vira para mim.  

Percebo que estava vagando na dúvida até então. Que nada estava realmente certo. Nada se encaixava até o Dr. Aurelius explicar o que estava acontecendo. E agora, diante dessa dedicação de um Haymitch superprotetor, a certeza vem à tona. 

— Eu quero voltar para o Doze – digo de uma vez. Haymitch continua me encarando como se não tivesse entendido direito. - Eu quero voltar com vocês. Quero ficar lá. 

Ele parece entender dessa vez e seus olhos se iluminam.  

— Você está falando sério? - ele indaga ainda com uma brecha de dúvida no olhar, em meio ao sorriso que surgiu em seus lábios. Confirmo com um menear de cabeça e ele me surpreende, jogando seu corpo contra o meu num abraço, fazendo-nos cair na cama, em meio a risos. Ele afunda seu rosto na curva do meu pescoço, fazendo-me cócegas. Seus braços me contornam, acomodando-se entre minhas costas e o colchão. Seus dedos encostam na minha pele sob o tecido, causando-me arrepios. Ele parece notar minha reação ao toque e um fio de risada escapa por entre os seus lábios encostados no meu pescoço. Ele, então, começa a distribuir beijos até encontrar os meus lábios, puxando-me para cima dele em seguida. Após perceber a ausência do meu sutiã, Haymitch arranha as minhas costas e passa a acariciar os meus seios, fazendo-me arfar em seus lábios. Ele morde meu lábio inferior e me abraça forte, ainda mantendo-me sobre ele. 

— Haymitch. 

— Hm? 

— Você está me esmagando. 

— Não estou, não - ele diz e se vira, ficando sobre mim novamente, ainda me envolvendo no seu abraço de urso. Mas antes que eu proteste novamente, ele afrouxa o abraço e se apoia nos cotovelos, dando-me um pouco de espaço.  

— Esqueci de avisar que Fulvia vai passar aqui mais tarde – ele diz, lembrando-se. - Ela disse que ainda quer "botar as fofocas em dia" com você - ele diz imitando o sotaque da Capital com a voz fina e isso me arranca uma breve risada. 

Decido tomar um rápido banho antes de sair do quarto. Aquilo acaba me despertando bastante depois de ter passado um bom tempo na minha cama. Katniss me acompanha até a cozinha e me pergunta se há alguma receita aleatória que eu poderia ensiná-la. Olho para ela um pouco desconfiada. Não parece o tipo de pergunta que ela faria a alguém, muito menos a mim. Observo-a, aguardando que ela diga que é brincadeira, mas ela nada diz. 

— É sério? - indago após alguns instantes em silêncio. 

— É que... - ela hesita, olhando para trás como se temesse que alguém nos ouvisse. - as coisas com Peeta não estão as mil maravilhas. 

— Eu sei – digo após um suspiro. Me aproximo, hesitantemente, de Katniss e beijo o topo da sua cabeça. - Mas você tem que dar um pouco de espaço para ele, não acha? Acho que já conversamos sobre isso. 

— Eu sei, Effie, mas... É difícil. Eu sou assim, sempre fui. 

— Então mude um pouco, queridinha – digo, encostando-me na bancada da pia. 

— É fácil pra você - ela resmunga com os braços cruzados. - Você e Haymitch brigam numa hora e depois já estão aí se agarrando de novo... Parecem um casal de... 

— De adolescentes? - completo e a vejo arquear uma sobrancelha. - Adolescentes que na verdade deveriam ser vocês dois. Estou certa? 

Katniss encolhe os ombros. 

— Essa era a ideia... 

Levo uma mão até os cabelos de Katniss, passando uma madeixa por trás da sua orelha. 

— E nós vamos voltar para o Doze... - ela diz com o olhar distante. 

— Sim – confirmo. - Nós vamos – digo com um sorriso nos lábios que logo Katniss entende. Isso parece animá-la e logo em seguida ela me diz que não precisa mais de receitas, pois eu cozinharei para ela, o que acaba nos fazendo rir. 

Voltamos para a sala quando Haymitch nos diz que ele e Peeta cuidarão do jantar hoje em comemoração a minha decisão que, por mais que os tenha deixado felizes, já era esperada. Troco um rápido olhar com Katniss e nos sentamos no sofá enquanto tento encontrar algo interessante na TV além do programa de Caesar. Não há muitas opções, infelizmente. 

Mais tarde a campainha toca e recebemos Fulvia e Plutarch. Dessa vez conseguimos ter tempo para conversarmos sobre o que quisermos, até que decidimos ir ao terraço. 

— Sua vida é cheia de reviravoltas, hein? - ela diz, sentando-se numa cadeira. 

— Nem me diga – reviro os olhos e Fulvia solta uma risadinha. 

— Sério, Effie. Eu nunca imaginaria você assim... Não digo sem a maquiagem, mas o conjunto de tudo, sabe? Haymitch, os garotos... Estou feliz por você. 

Aquilo não soou como piada. Nem um pouco, na verdade. Fulvia costumava ser uma das minhas amigas mais sinceras e estava provando que não tinha mudado nada disso. Sinto-me feliz por saber que ainda posso contar com ela, já que não tenho mais Cinna. 

Na sala, tenho uma visão de Katniss conversando com Peeta, não tão animados, mas ao menos estão tentando alguma coisa. Plutarch esta parado na entrada da cozinha, provavelmente conversando com Haymitch. E assim tenho uma boa visão de como será a minha vida daqui para frente. E, sinceramente, não quero abrir mão disso.