A Feiticeira Amazona escrita por Regiane Belmonte


Capítulo 7
Capítulo 7 – A Pegadinha




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Alexa me contou que demorava no banho mais que o normal porque amava a sensação de limpeza e de relaxamento que sentia em baixo de uma boa ducha quente. Então perguntei um pouco sobre a vida dela antes de ser detectada, pra ver se conseguia mudar de assunto, mas ela foi bem direta, tão direta que parecia ter ensaiado aquilo diversas vezes.

—Bom... Meus pais são Big Daddy e Crazy Mama. Eles eram lutadores de boxe quando a gente morava no México. – Caramba, ela tinha morado no México. – Fui pra uma escola dos 5 aos 7 anos, mas não funcionou pra mim, sabe como é, todas as regras. – Ela fez um gesto com as mãos que pareceu querer transmitir um “não tinha culpa, mas não combina comigo”- Era um colégio interno, meus pais viajavam muito, então comecei a ir às lutas com eles. Com 11 anos vim pro país sozinha, sabia me virar. Agora moro com um amigo, o J. Ele também é um Herói, me da treinos particulares. Agora quer me contar porque quase transformou aquele garoto numa escultura ambulante de vômito? – Alexa disse enquanto se despia das roupas suadas. Nesse momento, meu All Star sujo ficou realmente interessante e eu comecei a observá-lo pra tentar esconder meu desconforto com a pergunta. – Eu sei que você estava tentando mudar o assunto, mas acho que foi por isso que viemos até aqui não é? – Quando voltei meus olhos para cima ela ja tinha entrado em um box e ligava o chuveiro. – Estou ouvindo Feiticeira, pode começar a me entreter com essa história meio longa.

— Ok, mas vou tentar explicar da forma mais simples e resumida que eu conseguir.

Expliquei pra ela sobre o acidente que me deixara órfã, sobre ter me tornado parte da família Woodhand e como fui levada até aquela visita para detectar o Caio. Expliquei todas as reações que ele me causava e que eu nunca sequer tinha sentido isso na vida. De como Carter me irritara por tratar a verdade como se ela fosse tão simples e de como isso era realmente complexo pra mim.

— E foi por isso que eu quase transformei o Caio uma escultura de vômito. – disse ao levantar as mãos e bater elas na minha perna, fazendo um gesto pra tentar afirmar que eu não entendia nada do que esta acontecendo. Não sei se foi coincidência ou se Alexa fez aquilo calculado porque talvez tenha percebido que me sentiria melhor contando a história pra um vestiário praticamente vazio do que olhando pra ela, mas assim que terminei a história, o chuveiro desligou, e uma limpa e radiante Heroína saiu do box tentando prender seus enormes cabelos vermelhos molhados.

— Bem, eu entendo porque seu amigo Carter achou isso, realmente parece que você gosta desse tal de Caio. – Quando ela disse essas palavras eu olhei pra ela com um ódio imenso, não entendia porque essa era a única conclusão na qual chegavam, era impossível que fosse tão simples, se fosse simples eu não estaria aqui no vestiário contando a minha história para uma Heroína briguenta com uma cicatriz no olho, a qual eu acabara de conhecer. – Mas acho que é bem mais complicado que isso. – ela disse olhando desconfiava pra mim. – Por Ares, você tem certeza que é Feiticeira?

— Hã? Que tipo de pergunta é essa? É claro que eu sou Feiticeira. – Alexa riu.

— Me desculpe, é que você acabou de provocar uma fogueira de ódio nos seus olhos e até onde eu sei só Heróis conseguem tal feito quando estão irritados. – ela continuou rindo tranquilamente enquanto se secava e vestida suas roupas limpas. – Mas eu não sei de nada não é mesmo? Cheguei aqui faz muito pouco tempo, só achei a cena engraçada, foi mal.

— Tudo bem, não tem problema. – falei tentando parecer neutra com toda essa situação. Eu ainda não sabia que era possível uma mesma pessoa ter dons de duas classes diferentes, então tudo o que Alexa falou pra mim soaram como provocações vindas de uma garota que possuía a benção de Ares. – Você disse que aparentemente eu gosto do Caio, mas que você acha que isso é algo um pouco mais complicado. Complicado tipo o que?

— Bem, não sei te explicar, eu só sei que isso tem um cheiro muito estranho e geralmente não costumo errar esse tipo de situação. – ela respondeu arrumando suas coisas e indo em direção à porta do vestiário.

— Então o que eu faço?

— Sei lá, talvez devesse começar tentando não vomitar em cima dele na próxima vez, é um belo de um começo. – ela disse e saiu, me deixando sozinha no vestiário com meus pensamentos.

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Eu estava frustrada, irritada e com dor de cabeça. Estar no meio de pessoas era o que eu menos queria nesse momento, então fiz o que eu faço de melhor: fugir das pessoas.  De calça jeans mesmo fui para o centro de comum de lutas da academia, que no momento estava livre de Heróis. Tirei o tênis para poder subir no tatame, peguei um par de faixas na prateleira, enrolei calmamente na minha mãe contando as voltas com cuidado e cumprimentei um professor invisível antes de me posicionar na frente do saco de areia e começar.

Jab, direto, swing, cruzado,chute.

Respira.

Jab, jab, jab, direto.

Respira.

Swing, cruzado, upper, hook, chute, chute.

Respira.

Jab, direto, jab, direto, chute baixo, chute alto.

Respira.

Essa sequência era um mantra que me mantinha calma. A dor de cabeça aliviava, minha concentração melhorava e a raiva parecia se exaurir a cada soco e chute que o saco levava. Eu simplesmente odiava usar luva, elas eram pesadas e faziam meus ombros doerem antes da minha mão, então eu preferia sujar minhas mãos sem luvas mesmo.

Quando meu corpo já estava num estado quase de esgotamento, desenrolei as faixas das mãos, coloquei-as no cesto de coisas sujas, calcei meus tênis e antes de sair cumprimentei novamente meu professor invisível.

O caminho até o dormitório dos Feiticeiros foi tranquilo, a respiração estava mais fácil, parecia até que a minha visão estava de certa forma mais focada e ao olhar para as minhas mãos e ver as marcas e pequenos ferimentos que denunciavam minha atividade durante aquele fim de tarde, eu sorri.

Quando cheguei no dormitório todas as Feiticeiras olharam torto pra mim, eu devia estar com a aparência horrível ou com um cheiro desagradável, ou até mesmo com ambos, mas nada disso me importava, estava leve e em paz.

Peguei minhas coisas, segui até o nosso vestiário e deixei o água cair em minha cabeça por um bom tempo. Não sei por quanto tempo fiquei por lá, mas quando voltava para o dormitório vi que outros alunos voltavam do refeitório. Que maravilha, tinha perdido o jantar.

Corri para o quarto, joguei minhas coisas em cima da cama e sai pela porta o mais rápido que eu consegui. Cheguei ao refeitório correndo e me deparei com um ambiente meio cheio, meio vazio e ao olhar para a mesa onde sempre costumo me sentar, encontrei os olhos preocupados do Carter, sentado ao lado de uma bandeja ainda intacta com o jantar.

Ele olhou como se perguntasse se estava tudo bem, eu sorri e corri até onde ele estava, sentando em frente à bandeja.

— Você esta me devendo uma Ali, foi uma briga conseguir guardar essa bandeja pra você. – Carter disse ao tentar medir o nível de irritação que eu exalaria.

— Você não consegue ameaçar uma meia dúzia de Feiticeiros com uma boa marca de queimadura na bunda caso cheguem perto demais da bandeja da sua irmã? – Perguntei olhando pra ele lateralmente. – Que gande atacante você é. – falei e enchi a boca com uma enorme garfada daquela deliciosa comida.

Carter riu aliviado, vendo que a tensão do dia anterior tinha sumido.

— E você acha que o Carter daria conta sozinho de defender sua bandeja de tantos atacantes assim? – reconheci a voz com facilidade, era o Caio e estava sentado na nossa frente, olhei pra ele com um sorriso travesso que Carter decifrou na hora.

— Alicia, – Carter aumentou o tom da voz para mais pessoas além de mim pudessem ouvir. – sabia que temos um novo atacante de fogo na academia? – Caio inflou o peito com as palavras do Carter, por algum motivo, agora sua presença não me afetava em nada. – Dê parabéns ao Caio.

A mesa toda riu, todos sabiam o viria a seguir.

— Parabéns Caio, seja oficialmente bem vindo aos Feiticeiros Atacantes. – A mesa toda aplaudiu e sorrateiramente eu usei meus poderes no Caio. – Que tal uma mostra do que nos aguarda daqui pra frente? – pousei o garfo na badeja, entrelacei meus dedos e coloquei os cotovelos na mesa, como se o estivesse desafiando para um duelo.

— Tudo bem. – disse um confiante Caio. Ele tentou produzir chamas e nada. Seu esforço era evidente, mas nada acontecia. A mesa, cheia de Feiticeiros agora, aguardava silenciosamente o momento certo pra rir do pobre novato que quis brincar com uma neutralizadora. Depois de alguns minutos e várias caretas de incredulidade e ele finalmente desistiu. – Eu... Eu não sei o que esta acontecendo, – disse um cabisbaixo Caio. – não faz muito que eu estava conseguindo criar uma bola de fogo na palma da mão.

A mesa explodiu em risadas, os Feiticeiros batiam palmas para comemorar mais um novato confuso com a perca de poderes. Eu peguei meu garfo e voltei a comer minha comida tranquilamente e um Caio muito confuso olhou toda aquela explosão de alegria e se virou para o Carter como se pedisse uma explicação.

— Você se esqueceu da primeira dica que eu e dei quando nos conhecemos: NUNCA irrite uma Neutralizadora.

Carter levantou a mão e eu toquei, era nossa demonstração de cumplicidade em travessuras e pela primeira vez, os olhos de tempestade do Caio não me causaram ânsia.

Caio também riu quando entendeu o que acontecia.

— Me desculpe Alicia, eu não queria ser rude, só estava empolgado com meus novos poderes.

— Tudo bem dobrador de fogo, isso foi um aviso, na próxima você vai ficar uma semana inteira sem seus poderes.

Eu juro que vi seus olhos brilhando quando o chamei de dobrador de fogo.

— E isso é uma punição leve vindo dela, - alguém falou. Quando olhei vi que era Mark e que ele realmente estava rindo de toda aquela situação. – fiquei sabendo que hoje mesmo a Alicia colocou um bando de Heróis pra chorar e depois, ainda não contente com a vitória, foi bater neles pra se sentir bem. Se não acredita em mim, olhe as mãos dela.

Todos olharam para os ferimentos da minha mão e riram, depois de 1 ano na Woodhand os Feiticeiros mais velhos já estavam acostumados com algumas manias minhas, mas Caio não sabia.

— O que são isso em suas mãos? – ele estava preocupado? É isso mesmo?

— Eu gosto de treinar um pouco de golpes no centro comum de lutas e odeio luvas, nada demais.

— Mas é perigoso. – percebi que o reflexo dele era vir segurar as minhas mãos, mas parou um pouco depois de iniciar o movimento.

— Estou bem, é sério.

— Fale por você, o saco de areia deve estar se sentindo destruído. – zombou Carter.

— Fica quieto ou meu próximo boneco de treinamento vai ser você.

Até o fim do jantar naquele dia, a mesa dos Feiticeiros foi a mesa mais barulhenta do refeitório, onde todos riam do pobre novato. Foi então que percebi naquela noite que para conseguir suportar as reações involuntárias que eu sentia perto do Caio, precisaria estar focada e concentrada, então... eis que o centro comum de lutas virou um tipo de segunda casa.


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