Diga Adeus à Inocência escrita por Mahfics


Capítulo 60
28.


Notas iniciais do capítulo

Fiquei muito tempo sem entrar aqui no site e quando entro encontro essas maravilhosas recomendações? Nossa, aguenta coração. Deixando bem claro que foi a recomendação de vocês, Gasuk, Maria Taissa e Pequeno Príncipe, que me fez parar toda a minha rotina louca e sem tempo para dedicar esse capítulo a vocês ♥
De todo o meu coração, não sei como agradecer por essa honra.



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Villa Lobos

— Bianca, não acho uma boa ideia aparecer aqui agora. – mamãe pondera – O delegado nem deve estar aí ainda.

— Não quero saber. – abro a porta do carro – Preciso tirar isso a limpo.

Bato a porta do carro com tanta força que sinto um aperto no peito ao pensar na cara que minha mãe deve ter feito e no quanto irei ouvir depois. Arrumo meu casaco e caminho até a porta da delegacia, um policial me recepciona:

— Precisa de ajuda?

Olho em volta.

— Estou procurando por Eduardo. – limpo a garganta – Delegado Eduardo.

— Ele não trabalha mais conosco. – o homem informa, indiferente a minha aflição.

Como assim ele não trabalha mais aqui?! Por quê? Ele é o único que pode conversar comigo sobre isso, talvez o único que saiba dos detalhes sórdidos de todo o caso e, simplesmente, sumiu.

— Vocês não têm mais nenhum tipo de contato com ele? Telefone?

— Sinto muito, senhorita, mas recebo ordens para não dar informação pessoal sobre nossos agentes. – ele arruma alguns boletins de ocorrência e tecla rapidamente no computador, me ignorando.

Não. Tem que ter um jeito de contatar o Eduardo, é impossível ele sumir da cidade sem que ninguém saiba dele. Talvez se eu bater nas casas e pedir informação alguém saiba me responder... Posso até ligar para aquela agente, claro!

— O senhor sabe me informar quando ele saiu, mais ou menos? – debruço no balcão.

O homem fecha sua gaveta com brusquidão. Assusto.

— Faz alguns meses. – ele me encara, sério – Mais alguma coisa?

Contraio os lábios.

— Só isso, obrigada. – dou alguns passos para trás até finalmente dar as costas.

Mantenha a calma, vou encontrá-lo. Ainda existe uma única esperança morando nesse cidade que pode me levar até Eduardo e tenho certeza que ela fará isso.

Volto para o carro apressadamente e assusto minha mãe ao bater a porta novamente.

— Vou ligar para uma pessoa. – aviso.

— E o delegado? – ela franze o cenho.

— Ele não trabalha mais aqui. – informo, desgostosa.

Ela estreita os olhos e encara o volante.

— Tem certeza que quer continuar mexendo nessas águas? – ela me encara, claramente preocupada.

— Claro, por que não?

— Tudo que rodeia esse caso parece ter um fim; as vítimas mortas, os suspeitos mortos, o delegado afastado e a falta de informação sobre o caso em si, as coisas parecem um sinal de aviso para não avançar mais, que nosso limite já foi traçado. – ela me encara e coloca a mão em minha coxa – Bianca, já chegamos em nosso limite com tudo isso, não há mais o que tirar dessa terra podre.

— Ainda há, mamãe, e você nem imagina o quanto. – digo, convicta.

Ela suspira e puxa o braço de volta, afundando no banco.

Ignoro sua preocupação materna e pego meu celular, procurando pelo número nos contatos. Por favor, espero ainda estar com ele aqui.

Encontro-o após alguns minutos e ávida procura, ligo. Não é preciso chamar mais de quatro vezes para a chamada ser iniciada:

— Bianca?

Limpo a garganta.

— Sim.

— Aconteceu alguma coisa?

— Não, só preciso de uma informação.

— Pode mandar.

— Gostaria de saber onde o delegado Eduardo está. – mordo o lábio inferior e sinto meu coração palpitar mais rápido.

Ela fica muda.

— o Eduardo? – ela parece ter arranjado fôlego para responder.

— Sim.

— O que você quer com ele?

— É urgente, não dá para explicar por telefone.

Mais uma vez tenho seu silêncio. Mordisco a unha de meu dedão e aguardo impaciente.

— Faz o seguinte: pega a estrada para sair da cidade e estarei esperando por você no acostamento.

— Qual o seu carro?

— Um honda fit preto.

— O.k. estarei te esperando lá. – desligo.

— Então... – mamãe me encara.

— Vamos sair de Villa Lobos. – guardo o celular – Ela está nos esperando na estrada.

Por que será que o Eduardo abandonou o emprego assim? Para mim, foi algo muito repentino, principalmente por se tratar de algo polêmico e que poderia lhe dar algum retorno positivo e até dinheiro. Será que foi por causa disso? Ou algo muito maior está envolvendo isso tudo? Não consigo encontrar uma explicação plausível para isso e para nada que anda acontecendo. Estou dando voltas e passando pelos mesmo lugares já caminhados, não por mim, mas por pessoas que querem que eu continue andando em círculos e assim marcam pegadas na terra para me induzir a segui-las e me tirar da verdadeira trilha.

Sinto um gosto amargo na boca e uma inconsciente vontade de fumar. Meus cigarros acabaram.

— Preciso comprar cigarros. – comento para ninguém em especial.

— Você precisa parar de fumar. – mamãe me corrige em tom sério.

Reviro os olhos.

— Por favor, já passei pelas piores coisas na vida e além do mais o cigarro vai demorar uns 10 ou 20 anos para me matar. – apoio meu cotovelo na porta.

— Por que você está fazendo tudo isso, Bianca? – ela dirige o olhar para mim rapidamente – Qual é a necessidade?

Minha respiração fica pesada e tenho vontade de chorar. Por quê? O que está me motivando a cavar mais fundo nesse buraco? Por que quero chegar na toca do lobo? Por que continuo nadando contra a maré?

— Eu não sei. – murmuro – Talvez esteja acreditando que quando souber de tudo ficarei melhor, serei libertada dessa maldição.

— Mas e se o “saber tudo” for a grande maldição?

— Então nós acabamos com ela.

Ela suspira, pesado e forte. Passo os dentes por meu lábio inferior e fecho os olhos. Isso está acontecendo porque sou capaz de superar e é isso que estou indo fazer, superar toda essa loucura antes de sucumbir a ela de uma vez.

 

 

Avisto o fit preto. Minha mãe dá farol alto e a agente responde colocando a mão para fora.

Saímos da estrada principal e entramos em uma via secundária e estreita, mão única. Interior do interior?

Aumento o volume do rádio para dispersar meus pensamentos e dúvidas, para ficar em silêncio de alma entre o barulho do meio.

**

Basicamente, Eduardo mudou para um sítio pequeno e afastado de tudo, como se quisesse isolamento total do mundo. Quase chego a duvidar se aqui tem ponto de internet, telefone ou qualquer coisa que o possa levar para a realidade.

Ele está nos esperando na porta da casa. Aparenta estar mais velho, com feições mais cansadas e com cabelos mais grisalhos.

— Quanto tempo, senhorita Pavilion. – ele se aproxima, estendendo a mão.

— Digo o mesmo, delegado. – aperto sua mão.

— Não precisa mais se referir assim. – ele parece lamentar.

— O senhor continua sendo o delegado para mim. – sorrio, mas não mostro os dentes. Talvez não estou feliz o suficiente para sorrir assim.

Ele me devolve um sorriso terno carregado de gratidão.

— Vamos entrar? – ele passa o olhar por todas nós – Acredito que temos um bom assunto a tratar.

Timidamente, eu e minha mãe adentramos na casa que cheira a café e bolo. Assim como sua fachada simples, a simplicidade enche o lugar com seus móveis comuns. Ficamos paradas no meio da intersecção da sala com a sala de estar, esperando instruções como cães treinados.

— Minha esposa está fazendo café. – ele informa.

Olho rapidamente para a porta que deve levar a cozinha. Estranho. Sempre que via o Eduardo na delegacia em seu terno achava que era para aquilo que ele vivia, nunca o associei a uma família ou filhos. É estranho entrar no pessoal de alguém que vemos apenas superficialmente.

— Bom, é apenas a Bianca que quer falar comigo? – ele divide olhares entre minha mãe e eu.

— Sim. – respondo prontamente.

— Ótimo, podemos ir para o meu escritório?

— Claro. – deixo minhas coisas com a minha mãe.

— Minha mulher está na cozinha. – ele informa para as duas, mesmo sendo óbvio a informação.

Caminhamos por um estreito corredor após a cozinha com apenas uma janela e duas portas, sendo uma delas a porta do escritório. Eduardo entra e já se acomoda em sua cadeira, insinuando com um gesto de mão o sofá de dois lugares encostada na parede ao lado da porta. Sento na beirada, ansiosa para iniciar a conversa.

— Por que me procurou? -ele debruça na mesa – Achei que depois do Malic você sumiria dessa loucura toda e iria retomar sua vida.

Aperto meus joelhos.

— Acontece que isso parece ser mais difícil na prática. – confesso – Não consigo me livrar disso, mesmo que eu tente com todas as minhas forças.

Ele suspira.

— Você é jovem, Bianca, tem uma vida inteira pela frente para enterrar esse passado.

Limpo a garganta.

— Não vim aqui para escutar conselhos. – rebato – Já tenho meu psicólogo.

Ele esboça um sorriso.

— O que aconteceu com os outros? – estreito os olhos – Você me disse que havia mais de um lobo, no entanto, se contentaram apenas com o Malic e nem tiveram o trabalho de provar a acusação contra o Malic, apenas aceitaram e fim. Como fecharam o caso se ainda há tantas questões em abertos?

Ele passa a mão pela barba por fazer.

“Esse caso afeta mãos grandes, jovem, mãos que não querem ser prejudicadas com sangue de meninas derramados em seu chão. Essas mãos controlaram o caso todo, até sobre o fato de deixá-lo mudo e cego ao mundo, controlando-o até os limites de Villa Lobo e alimentando o lobo para que ele não saia e mostre os dentes para outra pessoa. – ele endireita o corpo – Quando você encontrou com o ele no beco e arrancou a cortina que cobria o caso, toda a hierarquia e segurança da censura foi desestabilizada e o caos foi gerado. Não podíamos admitir que não invocamos forças militares maiores por pressão e propina do prefeito e dos empresários residentes da cidade, não podíamos dizer que não tínhamos um suspeito por causa de nossa despreparação para um caso peculiar assim e para esse sufoco em que éramos colocados para não deixar nada vazar.

Tudo se desmoralizou quando você, sem querer, começou a fazer parte da história.

Mas mesmo com o caso sendo reconhecido pelas mídias, a pressão não passou. Lógico que não passaria, só que agora a engrenagem do raciocínio era outro: tínhamos que encontrar um suspeito qualquer para finalizar o caso. Óbvio, quando as pessoas finalmente se tocaram da gravidade do caso, começaram duvidar da segurança da cidade e da segurança de suas filhas ou parentes mulheres, houve uma grande retirada de habitantes, principalmente os que traziam mais dinheiro: universitários. As grandes mãos voltaram com sua pressão, mas sem se envolver em nosso pescoço e nos sufocar para abafar o caso e continuar alimentando o lobo, agora elas queriam que nós fossemos atrás do lobo. A caça havia sido liberada.

Fazia três meses que tudo tinha começado, ou seja, estávamos três meses atrasados perante ele. Uma terrível desvantagem que cheirava a desilusão de nunca conseguir desvendar o caso, havia até agentes brincando que esse seria o Jack, o estripador do século XXI. Acontece que seu envolvimento no caso nos deus uma vantagem que não foi esperada, a partir do momento em que percebemos que o foco dele foi voltado para você.

Quando o primeiro suspeito apareceu, as mãos vieram junto e nos impediram de ir mais fundo na investigando sobre o Jonas, havíamos conseguido o que elas queriam: um suspeito. Agora, o movimento da cidade aumentou mais que antes e tudo parecia estar um mar de rosas, pra que estragar tudo falando que o cara não era o assassino?

Tudo ficou uma “maravilha”. Cortaram nossos recursos para as investigações sobre a ligação de Jonas com o caso e assim nos fizeram engolir que ele era o assassino e ponto-final.

Tempos depois fomos bombardeados com o reaparecimento do lobo e as mãos nos esmagaram. Como podíamos ser tão imprestáveis? Por que deixamos a informação vazar? Por que deixamos você se meter de novo? Por que não acabávamos com isso?

Ele se mostrou mais astuto do que todas as cabeças que trabalhavam no caso; era um contra centenas. 

Assim fomos seguindo, entre trancos e barrancos. Você sendo nossa única luz até que nos apresenta o outro suspeito, Malic. Mais uma vez as grandes mãos no sufocam e nos obrigam a se manter nesse último. Bom, isso aconteceu, porque nunca mais ele se pronunciou outra vez.

Então assim respondo sua questão, entende? Não adianta me perguntar se minha tese se concretiza ou se consigo provar que Malic era o lobo, nada do que eu disse pôde ter recebido um veredito, o controle era tanto que nos impede de trabalhar e isso me deixou amargo, me fez murchar e desistir. Você foi a única certeza que eu tinha, a única coisa inocente e verdadeira que eu podia agarrar para o caso.

Veja o que aconteceu com a gente...

Quando entrei para a polícia tinha em mente ajudar as pessoas, dar o meu máximo para trazer o bem de volta, mas eu percebi que só estava trabalhando para trazer comodidade para uma parte que nem se importava com a segurança pública, apenas com a sua. Peguei um atestado de estresse e quase derrame, me afastei e, finalmente, desisti.”

— Então não há resposta? – hesito.

— Nunca tivemos. – ele dá de ombros.

Respiro fundo.

— O que devo fazer então? – limpo a garganta – Digo, antes eu tinha certeza que era ele, uma certeza que cegava os olhos, e hoje vivo uma dúvida letal na hipótese do “e se”. As pessoas cometem erros e eu posso ter cometido um ao acusá-lo.

O pior de tudo é pensar no que farei se descobrir que ele não era o assassino. Que matei a pessoa errada... A pessoa mais errada. Por isso que às vezes me parece cômodo viver na incerteza e nunca descobrir a verdade, pra que? Essa verdade tem a força de desgraçar o pouco de vida que tenho.

— Pare de duvidar de seus atos, lide e aprenda com eles. – ele levanta – Nada pode mudar disso tudo.

Nada poderia ter sido de outro jeito. De alguma forma sádica e horrorosa, o final do Malic já estava pronto e não poderia ter sido mudado, nenhum dos finais que encontrei pelo caminho. Lide e aprenda com eles, Bianca.

— Acho que o bolo está pronto. – ele corta o assunto – Vamos comer.

Estou sem fome.

Caminhamos de volta para a sala e encontramos a mesa posta e uma conversa peculiar de mulheres que se encontram ao acaso.

— Conversaram? – minha mãe me encara, segurando um prato de pão-de-queijo.

— Sim. – murmuro e dou um rápido dar de ombros. Não adiantou nada.

— Vamos comer. – uma mulher pequena e magra se aproxima com uma bandeja de bolo – Vocês estão muito abatidos. – ela se refere a Eduardo e a mim.

Sentamos à mesa.

Então eles alimentaram o lobo para que ele não caçasse em outro lugar se mostrasse para o mundo, alimentaram nunca tentativa fútil e mesquinha de manter seus interesses e comodidade acima de vidas e por cima de sangue e morte. Tudo não passou de um jogo de manipulação e poder. A recompensa era o dinheiro e a consequência, morte.

Quanto mais sei sobre tudo isso, mais tenho nojo de ainda estar viva. Matthew estava certo, eu deveria ter sido morta. Imagina quanta coisa me seria poupada.

 

 

 

Minha mãe tem medo de dirigir durante a noite, por isso resolver ir embora logo após terminamos o café da tarde. Não sei se estou indo embora com as informações que queria ter tido, Eduardo foi curto e breve, deixando bem claro que não vou encontrar o que procuro, que é para eu parar de procurar. Há algo em mim que quer concordar com ele e começar do zero enquanto há outra que sente a necessidade imoral de continuar até encontrar o que quer, mesmo que isso desgrace tudo.

Mamãe entra no carro e me encara. Eduardo para ao meu lado, como se ansiasse em responder minha última dúvida. Não demoro a soltá-la:

— Você acha que há mais lobos? – encaro-o – Acha que eles só estão esperando a chance para voltar a atacar de novo?

Ele faz um longo segundos de silêncio, estreitando os olhos e divagando sobre sua resposta, chegando a ilustre resposta:

— Não tenho dúvidas.

Um baque surdo passa por meu corpo e quase me derruba no chão.


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Notas finais do capítulo

Hm, peço desculpas por ter sumido assim. Minhas aulas voltaram e agora é terceiro ano ( reta final) e logo na primeira semana já querem me matar, então não sei quando irei voltar novamente para cá... Mas não vou abandonar vocês!
Uma dúvida apareceu essa semana: de onde vocês são? que ano estão cursando? Quantos anos? ( tirem minhas dúvidas, por favor