Diga Adeus à Inocência escrita por Mahfics


Capítulo 37
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Reviro os olhos e sorrio de canto. Posso notar que ele caminha logo atrás de mim, por isso resolvo apressar o passo e evitar que ele mude de ideia quanto me encontrar mais tarde e queira resolver as coisas aqui mesmo. Alcanço a mesa antes que ele me alcance.

– O que você estava fazendo com ela? – a voz de Helen se sobressai perante as demais, o que faz todos calarem.

Engulo seco e olho rapidamente para Malic.

– Não estávamos juntos. – falamos em uníssono.

Limpo a garganta.

– Fui limpar minha calça e o encontrei no caminho de volta. – explico.

– E eu fui fumar, você sabe. – ele responde, até um pouco ríspido.

– Diz aí – Juliana intervém -, onde você conheceu o Malic?

Helen encara Juliana e parece baixar a guarda. Respiro fundo e Juliana sorri contidamente.

– Obrigada. – gesticulo rapidamente para ela.

– Meu pai tem uma empresa. – Helen começa – E já fez alguns serviços para o pai do Malic e foi assim que fomos apresentados.

Algo grita em minha cabeça: e se tudo não passa de interesse?

Encaro Malic e depois Cesar. Helen pode ter ficado grávida por puro interesse no futuro promissor que Malic tem na empresa do pai, como se ela já estivesse pensando na herança. Passo a mão na cabeça. Você é ridícula, Bianca. Olha o que está pensando! Acidentes acontecem...

– Como foi saber da gravidez? – Coraline questiona, se interessando pelo assunto.

– Foi um choque. – ela confessa, sorrindo – Não contei para os meus pais de primeira e meu namorado da época terminou o namoro comigo.

– Você namorava? – Monique arregala os olhos.

– Foi um pulo de cerca malsucedido. – ela ri.

As meninas riem com elas. Malic ascende outro cigarro e se afasta, continuo parada no mesmo lugar e me surpreendo em saber que fiquei interessada no assunto.

– Encontrei Malic em um jantar que meu pai deu na empresa e bem, sempre tive uma quedinha por ele desde que o conheci e não precisei fazer esforço pra ele me notar aquele dia, a bebida foi minha parceira. – ela suspira – Não me orgulho do que fiz, principalmente por ter traído uma pessoa com isso. Nunca me passou pela cabeça que eu ficaria grávida, muito menos que me casaria com ele.

– Tacada de sorte. – Coraline comenta e então suas bochechas ficam vermelhas – Digo, você tinha uma quedinha por ele e poxa, agora, vocês vão casar!

Estreito os olhos para Coraline, que desvia o olhar e dá um gole na lata de cerveja ao seu lado na mesa.

– É estressante ter um bebê? – Monique muda de assunto e se aproxima de nós, deixando Rafael e Matthew conversando.

– Olha, achei que seria mais trabalhoso, mas o Cesar é um bebe super calmo. – ela acaricia a bochecha dele e sorri – Malic me ajuda quando está de bom humor.

– Então ele não deve ajudar nunca. – comento, amargamente.

Todas me encaram. Arregalo os olhos e sinto meu rosto esquentar.

– Admito que ele não é um bom pai, mas tenho esperança. – ela sorri, docemente.

Cruzo os braços e cerros os punhos. Ela e esse sorriso gentil me irrita, ô se irrita! Minha vontade é de arrancar esse sorriso de seu rosto a tapa, até parece que ela está zombando com a minha cara.

– Eles viviam brigando. – Juliana diz, distraída.

– Eles? – Helen franze o cenho.

Merda. Ela não sabia que éramos quase namorados.

– A Bianca já namorou o Malic. – Michaela informa, enchendo um copo com coca-cola.

Helen me encara e seu olhar queima o meu, como se, agora, ela fosse capaz de pular em cima de mim e arrancar minha cabeça com as mãos.

– Nada sério. – complemento – Não deu certo.

– Sim. – Juliana tenta contornar – Não me surpreende que ele não seja bom pai. Quando ficou com a Bianca a única coisa que eles sabiam fazer era brigar.

Mas sempre havia as reconciliações. Coro com o pensamento e com as lembranças, resolvo sentar.

Ela dá de ombros.

– Deve ser por isso que ele nunca falou isso pra mim. – ela comenta, pegando Cesar do carrinho – Não deve ter sido importante para ele.

Não foi importante? Então por que ele ainda fica atrás de mim? Por que ainda diz que sente alguma coisa por mim?

Elas continuam conversando sobre o bebê e sobre o casamento. O assunto vai ganhando mais peso e eu vou ficando cada vez mais alheia a ele. Não me interesso por nada que ela fala ou deixa de falar, para mim, ela poderia nunca ter nascido.

– Bianca. – Juliana me cutuca.

– Oi? – franzo o cenho e volto para a conversa.

– Quer pegá-lo? – ela estende os braços com Cesar aconchegado neles.

Afasto-me.

– Não sei pegar criança.

– Meus braços estão doendo. – ela sussurra.

– Onde está a mãe dele? – questiono e olho para frente, notando que Helen não está mais aqui.

– Ela pediu um tempo a sós com o Malic. – Monique informa e um sorriso malicioso se forma em seus lábios.

– Irei tacar ele no lago. – aviso.

– Faça o que quiser. – Juliana o coloca em meus braços a força.

Prendo a respiração e paraliso. Ele se remexe e franze o rosto, anunciando que irá chorar. Levanto e começo a balançar os braços devagar, fazendo-o se aconchegar neles. Ele ainda possui pouco cabelo, mas seu rosto lembra um pouco de Malic. Seu nariz, sua boca, até o jeito que franze suas sobrancelhas. Sinto uma pontada em meu peito. Cesar é mais filho do pai do que da mãe.

Acaricio sua testa com o polegar e sorrio com sua tentativa de achar um peito para saciar a fome. Dou leves palmadas em sua fralda coberta pela calça moletom. É incrível como a genética pode ser traiçoeira e tão precisa. Posso imaginar Malic assim quando era um bebê, é como se a genética tivesse tirado uma xerox do Malic bebê e transformado no Cesar.

– Obrigada. – braços surgem ao meu lado e tiram Cesar de meu colo.

Olho para o lado surpresa e me deparo com Helen, ela parece até ter chorado.

– Sem problemas.

Continuamos paradas, nos encarando.

– Espero não te encontrar mais. – ela declara.

Ergo uma sobrancelha.

– Quero que deixe meu marido em paz.

– Ele não é seu marido. – replico.

– Ainda não! – ela eleva o tom e faz Cesar de remexer em seu colo – Será em breve e espero não encontrar você como obstáculo.

– Não estou atrapalhando a sua relação. – cruzo os braços – Nem sequer falo com o Malic.

– Posso ter sido idiota antes, mas agora sei o que se passa aqui e entendo o motivo dele sempre querer ir para os lugares que você está. – ela encosta o dedo em meu ombro. Afasto-o gentilmente.

– Não temos mais nada. – insisto.

– Não acredito nisso! – ela esbraveja em um tom tolerante para Cesar – Sempre acreditei que ele mudaria, só estava um pouco confuso com a revelação repentina de ser pai de repente, mas eu errei feio! Ele nunca irá mudar enquanto você estiver aqui.

– Quer saber de uma coisa? – estreito os olhos – Cansei de me fazer sonsa para você.

Ela arregala os olhos.

– É o Malic que me procura e eu não me arrependo em recebê-lo. Amo ele e não me importo em saber que ele tem um filho ou irá casar, nada vai mudar. E sabe por quê?

Ela ergue uma sobrancelha.

– Porque meu amor é reciproco e porque ao meu lado ele é mais feliz. Você não reparou que ele não suporta você e seu jeito feliz? Ele não dá a mínima para esse casamento e só aceitou porque está sendo forçado a isso. O Malic é assim, confuso. Não é uma aliança que o impedirá de ir atrás de mim e também não me impedirá de abrir a porta e tê-lo pra mim. – respiro fundo – E quer saber mais? Quando eu for embora, ele arrumará um jeito de me encontrar e será assim, sempre. Então aprenda a lidar com isso.

Ela continua parada, estática. Seus olhos se arregalam e quase tenho certeza que ela irá chorar. Não sinto orgulho de dizer isso a ela, não sinto absolutamente nada em falar isso. Não há orgulho, sentimento, vingança ou qualquer outra coisa, apenas humilhação e remorso. O que há comigo? Onde estou com a cabeça? A errada aqui sou eu e não ela. Eu sou a outra, o obstáculo na vida perfeitinha dela.

Viro e bato em alguém; Malic. Ele segura meus ombros para me dar equilíbrio.

– Me solta. – empurro suas mãos.

Desvio dele e continuo reto, Matthew levanta da mesa e vem ao meu encontro. Aperto o passo para ele não conseguir me alcançar e pego o caminho para a saída do parque.

– Bianca! – Matthew grita – Para onde está indo?

– Pra casa! – grito de volta.

Posso escutar seus passos correndo na minha direção, quando começo a correr, sua mão segura meu ombro e me impede de continuar.

– Que merda. – praguejo – Me deixa ir embora!

– Tudo bem. – ele solta o meu ombro – Vamos juntos.

Reviro os olhos e retomo minha caminhada. Com esforço, ele tenta manter o mesmo ritmo que eu. Matt não pergunta o que aconteceu ou sobre o que eu falei com Helen, apenas me acompanha na caminhada e olha para trás algumas vezes.

– O Malic. – ele avisa.

– Mande ele ir para o inferno junto com a mulher dele. – resmungo.

– Vai pro inferno! – ele grita.

Rio.

Olho para trás por cima dos ombros e noto que Malic e Helen estão pegando o mesmo caminho que nós e pelas feições que eles têm parecem estar discutindo. Eu causei isso.

Respiro fundo e observo Helen. Se eu fosse ela também estaria arrasada, iria querer morrer e me sentir a pior das piores. Iria querer matar a puta que anda atrás do meu marido, que no caso sou eu, e daqui para frente desconfiaria de qualquer garota que fosse falar com ele. Tentaria com todas as minhas forças fazê-lo me amar mais e não sair para ir rua procurar outro par de pernas.

Minha mãe não me educou assim. Tenho que ter dignidade e respeito, tanto por Helen quanto por mim.

Empurro Matthew contra uma árvore.

– O que você está fazendo? – ele arregala os grandes olhos verdes e deixa os lábios entreabertos.

Malic e Helen se aproximam o suficiente para ver a cena.

– Beijando você. – sussurro e aproximo meu rosto do seu. Hesitante, toco meus lábios nos seus e meu coração dispara.

Beijá-lo significa aumentar minha distância com o Malic e isso será bom para Helen e Cesar. Nunca me imaginei beijando o Matthew ou tendo algum relacionamento com ele.

Afasto-me e limpo a garganta. Não foi tão ruim quando em imaginei. Ele continua paralisado com o ato e Malic já passou por nós. Encaro suas costas por um momento.

Sinto muito, essa foi minha única saída para te afastar.

– Vamos. – encaro Matthew.

Ele meneia a cabeça positivamente.

***

As semanas passaram rápido e Malic não veio mais me procurar ou falar comigo, Helen distribui os convites de casamento para Juliana, Coraline e Monique – não fiquei surpresa em não receber um, mas mesmo se recebesse não poderia comparecer, será no dia da minha mudança. Me afastei de Matthew, só para evitar de iludido com algo entre nós, tudo não passou de um beijo salva-vidas, nada mais.

Meus pais já arrumaram meu quarto novamente e vovó tem me ajudado com as coisas da mudança. Sei que ela está chateada com minha ida e não quero que ela pensa que é porque não gostei de ficar com ela, para ela não há mais motivos para ir embora; Jonas foi preso e está morta, nenhuma menina morreu e a cidade vem ganhando movimento, mas não me sinto em casa aqui, não é confortável, principalmente depois de tudo o que vem acontecendo. Tirando a sensação que tenho que o Lobo Mau ainda está por aí.

A minha entrevista para aquela repórter finalmente foi colocada na revista e impressa, sendo a matéria principal; “a testemunha”. Foi convidada para o lançamento, porém não tenho tido muita vontade de fazer coisas ultimamente, só quero ir embora logo. Só falta dois meses agora. Em contramão, a revista de Rafael tem vendido como água e ele já apareceu até em alguns programas de televisão, finalmente, ele conseguiu a fama que sempre almejou.

Largo umas caixas no meu quarto e desço novamente. Preciso pegar mais caixas no porão e depois dar uma geral pela casa para não esquecer de empacotar nada.

O telefone toca.

– Alô?

– Bianca.

A voz é sussurrada e forte, chegando a arrepiar meu corpo todo.

– Sim, quem gostaria?

– Está uma noite sombria hoje, não?

Limpo a garganta e rio. É o Matthew, ele sempre fala essas coisas.

– Você é patético, achou mesmo que ia me assustar? – sorrio.

– Sempre se tem as tentativas.

– Não sei como está a noite, não sai ainda.

– Que pena.

– O que está fazendo?

– Nada de interessante.

– Hm. Estou me arrumando para a mudança.

– Quando irá mudar?

­- Não tenho data ainda.

Vou chamá-lo para sair e quebrar esse gelo.

– Vamos congelar o cérebro qualquer dia?

­­– Congelar o cérebro?

– Matthew. – rio – Você não se lembra?

­– Não.

– Como não?

– Talvez porque eu não sou o Matthew.

O ar escapa de meus pulmões e o telefone escapa de minhas mãos. Meu coração acelera e começo a hiperventilar. Olho para todas as janelas da casa, está escuro demais para ver do outro lado. Pego o telefone de novo.

– Quem está ai?!

– Ora, Bianca, não seja tão rude com a visita.

– Onde você está?!

– Na sua varanda.

Minha garganta seca. Disparo para o porta da entrada e me certifico que está trancada.

– Está brincando comigo? – corro até a da cozinha e tranco.

– Apenas me divertindo.

– Me fale mais sobre você. – começo a trancar as janelas.

Gosto de observar as pessoas.

Tenho vontade de vomitar e fecho as cortinas, minhas pernas amolecem. Corro pelas escadas e tranco as janelas do andar de cima.

– O que mais gosta de fazer?

– Observar você.

Sinto-me mole, a ponto de desmaiar. Todo o sangue do meu corpo parece evaporar e deixar meus músculos moles, assim como meus ossos. Minha cabeça roda e sinto ânsia novamente.

– Quem está falando?

– Você adora adivinhar as coisas, adivinha quem é. – ele ri.

Desço as escadas correndo novamente e procuro por meu celular na cozinha.

– Sou péssima em adivinhar. – rio nervosamente.

– Não se preocupe, iremos nos encontrar.

Deixo o celular cair no chão. Agacho e começo a tremer. Ele está aqui. É o Lobo, tenho certeza disso. Ele irá me matar! Posso escutar sua respiração pesada do outro lado da linha. Ele está aqui! Irá me matar! Olho em volta e começo a ver vultos. Pode estar em qualquer lugar, pode atacar a qualquer momento.

Escuto passos na varando e um vulto passar pela porta. Meu coração sobe para a boca e seguro a vontade de gritar. Pelo amor de Deus, não.

Algo branco passa pela soleira da porta e os passos se afastam, a linha do telefone cai – indicando o fim da chamada. Engatinho até o pequeno quadrado branco perto da porta e pego-o. É uma foto minha se trocando no vestiário do colégio, viro a foto e leio a mensagem:

“Nunca fale com estranhos.”


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