Diga Adeus à Inocência escrita por Mahfics


Capítulo 35
3.


Notas iniciais do capítulo

Olá! Vim aqui agradecer pelos comentários que vocês têm me enviado. Sério, muito obrigada! E saibam que eu stalkeio todas vocês hihi ♥
Se eu demorar muito para postar é devido ao meu livro, okay? Tenho que resolver a papelada até o natal, então estou voando aqui.
Boa- leitura!



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Assim que o noticiário acabou, fomos jantar o que minha vó nos deixou preparado no forno e conversamos sobre qualquer coisa para passar o tempo. Matthew é uma boa companhia. Ele me ajuda a esquecer dos problemas quando estamos juntos fazendo qualquer coisa, até mesmo quando não fazemos nada.

***

Ir para a faculdade era uma tortura interna. Vê-lo em seu grupo de amigos e não poder lhe dirigir a palavrar, fingir que nunca o conheci, que nunca o amei. Aos poucos voltar à rotina não ficou ruim, Camila ainda fazia falta nas conversas, mas é suportável. É como se tudo fosse se dissolvendo no tempo.

– Porque aí podemos passar um fim de semana na minha casa de praia. – Michaela informa – Meus pais vão deixar ela só pra gente.

– Parece top. – Monique senta ao meu lado – Quando?

– Nas férias de julho. – Juliana responde e oferece a lata de refrigerante para a namorada.

– Vou estar de mudança. – lamento – Não dá pra ser antes?

– Ê cacete. – Coraline resmunga – Por que você vai mudar? Já acabou! Termina o ano aqui, por favor.

– Já está tudo resolvido. – contraio os lábios – Não dá pra voltar atrás agora.

– Claro que dá. – Juliana interfere – Você que não quer.

Ela tem razão. Quero ir embora e esquecer que Villa Lobos existiu na minha vida.

Suspiro.

– Já tenho minha vida resolvida lá e vai dar trabalho desistir de tudo agora. – dou uma desculpa amarela - Mas vamos manter contato.

– Sei. – Monique me encara de canto de olho.

Amiony se aproxima de nós com as mãos dadas nas de Rafael. Eles formam um casal bonito.

– Já compraram a sua edição? – ele mostra a revista que tem em mãos.

– Ficou divino. – Amiony comenta ao seu lado – Um trabalho ótimo.

– Venham ver. – ele abre a revista em uma determinada página e nós formamos uma roda a sua volta – Daqui a pouco vou ter que pagar comissão para vocês.

– Apoio. – Coraline diz sorrindo.

As aulas passam rápido demais ou eu que não me dedico mais como antes. Ultimamente, os estudos têm ficado abaixo do meu plano de prioridades, quase me esqueci deles. Tenho tentado mudar esse meu hábito e, aos poucos, volto a minha rotina de antes: estudar depois da faculdade, revisar no fim de semana, fazer perguntas durante a aula e tirar dúvidas.

Minha vó vai dormir na casa do Israel hoje – odeio quando ela faz isso, não gosto mais de ficar sozinha em casa. Talvez eu chame o Matthew para jantar comigo de novo ou converse com minha mãe por Skype, quero fazer qualquer coisa para esquecer que estou sozinha.

Para passar o tempo arranjo qualquer coisa para fazer e a primeira delas é estudar. Reviso a matéria da semana passada e a de hoje, anoto minhas dúvidas e grifo algumas observações que anotei a esmo na aula e que agora fazem a diferença ali. Quando termino de revisar, arrumo o meu quarto e minhas roupas que foram lavar, dou uma ajeitada na cozinha e ligo para a minha mãe.

– Dormir na casa dele? – ela pergunta, incrédula - Ela tá muito assanhada.

Rio.

– Ela sempre fez isso. – falo, indiferente ao caso – Você não sabe de nada.

– Não acredito! – ela ri – Misericórdia.

– Às vezes ela sente falta do vovô. – comento.

– É...

Ficamos em silêncio.

– Está tudo certo para a minha transferência?

– Só falta você. – ela sorri – Já até arrumei seu quarto.

Sorrio.

– Você é tão adorável.

– Sei disso.

Rimos.

– E seu namoradinho?

O riso some.

– Não tenho namoradinho.

– O tatuado lá.

Respiro fundo.

– Terminamos faz tempo. – viro de costas para ela e encaro o chão.

– Ai, na sua idade eu tinha tantos namorados.

Rio.

– Você é uma safada.

– Quem dera. – ela ri- Você está na idade de amar cada hora um e não um.

– Tanto faz. – dou de ombros – Ele é especial para mim, gosto mesmo dele.

– Então por que terminaram?

– Ele tem muitos problemas e não serei a solução deles.

Ela estala a língua.

– Já vi esse filme.

Sorrio.

Antes que eu possa responder, a campainha toca. Gelo.

– Está esperando alguém? – ela questiona.

– Não. – encaro-a – Devo atender?

– Claro que não! – ela se exalta – Finja que não há ninguém em casa.

A campainha toca novamente. Encaro a porta e posso ver a silhueta da pessoa do outro lado do vidro – sendo tampada pela cortina. Mordo o lábio inferior.

– Mãe...

– Vou ligar para a sua vó.

– Vou ligar para a polícia.

Pego o telefone e começo a discar quando a ligação do Skype é interrompida por uma chamada no meu celular. É o Matthew.

– Tem uma pessoa estranha na minha porta. – falo, ofegante.

– Eu sou a pessoa estranha.

Rio de meu papel de idiota e levanto do sofá, desligando a chamada.

– Mãe. – chamo-a – Não precisa ligar para ela.

– Por quê?

– É meu amigo. – sorrio – Vou ter que desligar.

– Hm... Okay.

– Boa noite, te amo.

– Também te amo. – ela sorri – Use camisinha!

Reviro os olhos e desligo a chamada.

– Senhor. – murmuro.

Abro a porta e me deparo com um Matthew inquieto. Está com os olhos vermelhos e o rosto inchado, parece até usar pijama.

– Está usando droga? – questiono.

– Ele se matou. – ele murmura.

– Ele quem? – franzo o cenho.

– O Jonas! – ele levanta a voz – Ele se enforcou com um lençol.

Institivamente, levo minha mão a boca e permaneço parada. Ele se enforcou?!

Não consigo fazer uma feição de preocupação ou solidariedade. Para mim, ele não tinha o direito de se matar, assim ficou muito fácil. Tinha que ter ficado fadado àquele manicômio, enlouquecendo como pena do que fez, deveria ter definhado naquele quarto com uma camisa de força e não se enforcado. Isso é uma injustiça! Deviam ressuscitá-lo.

– Não devia chorar por ele.

– Como não?! Ele era meu melhor amigo!

– Ele fez coisas horríveis, Matthew, merecia algo muito pior que uma morte enforcada. – digo, passiva – Merecia ter sofrido como aquelas meninas sofreram.

Ele me encara, imóvel.

– Digo – limpo a garganta -, você está no seu direito de chorar pelo seu amigo e se entristecer com seu suicídio, mas você tem que balancear as coisas. Se o Jonas tivesse morrido como um adolescente normal, como uma pessoa boa, até eu choraria por isso, mas pelo contrário, ele morreu na pele de um assassino, o mesmo assassino que matou sua ex-namorada. Não acho que o suicídio dele valha suas lágrimas ou tristeza.

Ele senta no degrau da varanda.

– Ainda sou incapaz de vê-lo como assassino. – ele confessa – Ele ainda será o nerd.

Seu riso é melancólico. Sento ao seu lado.

– Há coisas mais bonitas e decepcionantes que merecem suas lágrimas. – mordo a lateral do meu lábio inferior.

Sua tentativa de formar um sorriso me faz sorrir.

– Tipo o quê?

Mordo a unha de meu indicador.

– A vida.

Ele franze o cenho.

– Já parou para pensar onde irá conseguir encontrar algo tão lindo e decepcionante? – encaro-o – É algo mágico pensar em como as coisas se originam, evoluem e se perpetuam na existência, em como cada detalhe nisso tudo faz a diferença e, ao mesmo tempo, a vida é decepcionante pelo fato de seu final ser a morte.

– Então por que não posso chorar pela morte? – ele ergue uma sobrancelha.

– Porque estou falando da bendita morte. – sorrio – Da nossa necessidade de morte e não da morte de alguém.

– Necessidade de morte?

– Sem a morte não há continuação do que existe.

Ele encara um ponto fixo no horizonte e solta o ar dissonante, como uma risada. Continuo observando suas feições mudarem com o tempo.

– Onde você estava todos esses anos em que estive vagando por aí? – ele me encara.

Sorrio.

– Também estava vagando.

Olho para o mesmo ponto fixo que tomou a atenção de Matthew e respiro fundo.

Dessa vez o Lobo Mau não foi morto pelo caçador e sim, por um lençol enroscado no pescoço.

– Você quer jantar? – quebro o silêncio.

– Só se foi sua vó que fez o jantar.

– Idiota. – resmungo – Cozinho muito bem.

– Qualquer dia eu arrisco comer sua comida. – ele levanta.

Voltamos para dentro de casa.

Em questão de algumas conversas jogadas a esmo, Matthew parece ter esquecido o motivo de sua vinda até minha casa. Depois da janta assistimos um filme.

Matthew acaba dormindo no sofá.

***

Como não era de esperar, no dia seguinte a morde do Jonas rodou o país novamente, mas dessa vez não houve comoção ou ódio, as pessoas mal se importaram com isso – até parecia que um desejo oculto foi realizado com esse ato. As notícias sobre o suicídio me fizeram parar para pensar um pouco e chegar à conclusão de que sua morte foi estranha. Como ele conseguiu se matar? Não importa como ele fez isso, a questão é que ele conseguiu se matar. Um manicômio deve ser três vezes mais monitorado que uma cadeia só pelo fato de prender pessoas loucas ou com problemas mentais, e muitas dessas pessoas devem tentar se matar de várias maneiras, o que faz do lugar um espaço “anti-suicídio”, ali as pessoas morrem se é para elas morrerem e eu acho que foi isso que aconteceu com o Jonas. Era para ele morrer.

A semana passou rápido e passei voando por ela, nem me lembro o que aprendi – mas consegui manter o ritmo de estudo e estou me orgulhando disso.

– Não gosto de milk-shake. – resmungo.

– É raspadinha. – ele me corrige.

– Ah, disso eu gosto.

Entramos na pequena lojinha espremida por lojas maiores e vamos direto para o balcão, pedindo duas raspadinhas de groselha.

– Trouxe o celular? – ele me encara.

– Sim, não entendi porque pediu.

– Cérebro congelado. – ele sorri.

– Cérebro congelado?

– Eu brincava disso quando era criança. – ele ri – Você toma rápido até congelar o cérebro e então uma pessoa tira uma foto sua.

Sorrio.

– Que coisa infantil.

– Mas é legal. – ele garante.

Pegamos as raspadinhas e saímos, ficando na calçada. Pego meu celular e aguardo ele fazer a proeza de congelar o cérebro, o que não demora mais que uma sugada de longos segundos no canudo. Ele fecha os olhos e começa a rir, franzindo o cenho e o nariz. Rio.

– Meu Deus. – pego fôlego – Isso é tão idiota!

– Sua vez. – ele pega o celular.

Respigo fundo e sugo com todas as minhas forças. Uma dor aguda atinge minhas cabeça e me faz franzir todo o rosto, rindo.

– Cérebro congelado. – digo entre dentes rindo.

O resultado da brincadeira: dores de cabeça e mais de 20 fotos.

– Olha essa. – entrego o celular para ele – Olha a minha cara. – dou zoom.

Ele ri.

– Você fica paralisada. – comenta.

Rio e minha cabeça dói.

– Vamos encontrar o pessoal? – ele pergunta, olhando o seu celular.

– Vamos. – jogo meu copo no lixo – No parque, né?

– Sim.

– Vamos caminhando.

– Desde quando você é saudável assim?

– Sempre fui.

– Sei.

Continuamos caminhando até chegar na avenida, o parque é logo no final dela. Do outro lado da avenida está o comercial principal de toda a cidade. Pelo pouco quantidade de carros, podemos até andar no meio da rua sem medo de ser atropelado, mas ainda prefiro a segurança da calçada.

Ficamos um tempo parados na esquina enquanto Matthew telefona para Coraline. Observo a porta do mercado a minha frente e as poucas pessoas que passam por ali. Encosto no poste e continuo minha sentinela anônima. Lembro-me de Jonas e de sua morte, consigo até sentir um pouco de pena. Se ele não fosse essa pessoa horrível poderia ter sido alguém importante na vida. Que desperdício.

Uma moça chama a minha atenção, até parece que conheço ela. Está levando um carrinho de bebê. Arrasto o olhar para trás e encontro Malic.

Pequeno ataque cardíaco.

Ele magnificamente belo. Usa uma regata com decote lateral branca colado no corpo e deixando à mostra todas as suas tatuagens nos braços, pescoço e lateral do abdômen. Usa uma calça caída nos quadris – o elástico da cueca está visível, do jeito que eu amo. Em seus braços há uma pequena pessoinha; o filho.

Sinto um forte aperto no peito.

Os olhos amarelos encontram os meus.

O que eu faço? Senhor, socorro.

Aceno.

Ele acena de volta, sorrindo.

Essas trilhas fajutas.


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Notas finais do capítulo

imagem: http://cdn.minilua.com/wp-content/uploads/2013/07/chapeuzinho_vermelho_thumb.jpg



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