Algo importante, ou quase. escrita por venus


Capítulo 8
.Rowcksttop. 2


Notas iniciais do capítulo

“Não sou forte o tempo inteiro e não gosto de admitir isso, então não espalha. Eu sou fraca às vezes. Muitas vezes.”
— Clarisse Corrêa.



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Eu estava completamente perdida ali. As pessoas me olhavam torto e outras riam da minha cara e vinha tudo de novo na minha cabeça. Um filme repetitivo que eu odiava assistir se passava na minha consciência. Aquelas coisas que você não pode evitar, porque se pudesse elas não vinham a sua mente. Eu tentava esquecê-las e viver normalmente. Olho para os lados em busca de alguém que possa me ajudar, talvez Dallas, ela é boa com consolo e talvez seja a única desocupada. Mas tudo o que eu vejo ao tentar procurá-la são borrões quando giro a cabeça. E quando fico parada a imagem vai e vem, as risadas soam mais alta e eu sibilo baixinho a palavra "não" como se adiantasse alguma coisa.

Mas que merda!

Merda de memória.

Merda de pai.

Merda de mãe.

Merda de amigos do "papai".

Merda de boate.

Merda de crianças cruéis.

Merda de pessoas hipócritas.

Merda de barman.

Merda de energético.

Merda de Louise Stuart.

Merda de vida.

Merda de...

– Louise! - alguém me abraça por trás e me ajuda a levantar do chão. Eu paro de ouvir as risadas e olho em volta. Estão todos sérios olhando para mim. Os copos azuis de plástico nas mãos enquanto os lhos passavam por mim e por Gabriel. Eu não consegui raciocinar direito então só fiquei ali parada encarando todo mundo. Gabriel me puxa para fora. Suspira enquanto eu focalizo na lua. O ar fora da boate é bem mais refrescante e parece que o vento faz carinho no meu corpo. A lua é minguante e bem iluminada e distante. Eu gosto tanto da lua, até acho estranho o fato de só termos uma lua, já que o espaço está repleto delas. Deve existir algum ponto na Terra que dá para ver pelo menos duas luas ou algo assim. Acho que eu gostaria de ir se existir tal ponto. Eu prefiro a noite, tudo bem que é o momento em que eu mais penso e tenho raciocínios suícidas, mas é tão belo. O dia é legal, mas todos gostam do dia, e nele todos estão acordados trabalhando, estudando, ou qualquer outra coisa. Na noite não. Acontecem as melhores coisas a noite. Tudo escurece e a lua aparece, casais fazem sexo, criancinhas sonham, garotas se apaixonam, boates abrem, garotos ficam bêbados... Tudo é tão oculto e mágico a noite, de um jeito que o dia nunca irá ser. A noite quando você anda pelas ruas não ouve o som irritante das buzinas, e sim o sino do trem apitando a sua partida para a cidade vizinha. Os pássaros cantando. A coruja te olha, meio vaga. Você até respira melhor.

Gosto da noite, é bem simples.

– O que houve, Louise? - olho para a imagem de Gabe. Ele está com as sobrancelhas arqueadas e o semblante carregado em sinal de preocupação. Ela sabe muito bem o que aconteceu. Os meus ataques voltaram. E não vão parar tão cedo dessa vez.

– Ah. - olhei de novo para lua, a coruja na grande figueira a minha esquerda estava me encarando com aqueles grandes olhos.

– Responda, Lou.

– Você sabe, Gabriel. Tudo voltou de novo.

– Você anda se cortando?

– Só quando tive que contar a estória toda pro aluno novo.

– Por quê?

– O quê?

– Por que você contou para ele? Era só ele perguntar para qualquer um, droga. Você não precisava lembrar!

– Eu sei. - disse e segui Gabriel que estava com uma mão entrelaçada nos cabelos castanhos e a outra pendendo ao lado do corpo indo mais fundo no pequeno estacionamento da Rowcksttop. - Não sei por que contei. Só contei, ele saberia de qualquer jeito. E, Gabe, não dá pra viver como se tudo aquilo que eu vivi não tivesse acontecido. Você sabe que eu já tentei fazer isso. E sabe também que não deu certo.

– Você tem ido ao psicólogo, Louise?

– Eles vão me fazer repetir a história toda! Tudo de novo! Não vou a nenhum psicólogo, qual é! Dá pra lidar com isso eu mesma.

– Louise. - ele olhou para mim sério. - Calma, você está se descontrolando. Tenha calma.

– Eu tô calma, merda! Só tô um pouco aturdida, Gabriel! É simples... - eu estava fungando. Eu sempre odeio chorar, principalmente por essas malditas lembranças. Mas com Gabe era diferente. Ele me conhecia como ninguém, até mesmo tia Lucy. Ele era um irmão para mim. Me conhecia por inteira. Sabia do que eu estava falando e mesmo não "compreendendo" tudo aquilo... Ele me entendia e me aceitava do jeito que eu era, gostava disso. Ele não via o quanto eu era azeda, eu podia mascarar tudo com senso de humor para os outros, mas ele sabia o que se passava aqui dentro. Mas ele fingia não notar. Gabe também odiava todo o teatro que os humanos faziam, fingiam não ver as coisas, sendo falsos, essas coisas. Mas ele não estava percebendo que fazia parte de todo esse teatro.

– Olhe para nós, Gabriel. Olhe - disse eu. - Somos tão fodidos... - eu ri. - Danificados. Quebrados.

– Louise, não pense assim. Não faz bem para você. Tente pensar um pouco com lógica, o que você disse não é verdade.

– Mas eu penso assim! Essa é a verdade, Gabriel! O que eu disse é a verdade! Eu pensei com lógica! E você não consegue ver porque já está ficando igual o resto do mundo. Fazendo teatrinho! - ri amarga enquanto a voz ficava cada vez mais embargada. - Até arrumou uma fêmea! Quer me dar conselhos, mas não segue nenhum deles! - eu solucei. As lágrimas brotavam rápido de mais. A minha voz embargada. Eu ouvia meu pai batendo na minha mãe. O sangue dela escorrendo... - Me ajuda, Gabriel. Me tira daqui.

– Madson! - Gabriel gritou para a ruiva que veio ao meu encontro. Ela tentou me abraçar, mas eu não me mexia. Madson não estava bêbeda? Então por que parecia tão sóbria?

– Vamos, Lou. Pro carro - olhei para trás e vi Lyla conversando com Dallas, as duas sérias com o olhar perdido. Dallas sabia da estória como qualquer um, mas pela boca dos outros igualmente a Lyla. Madson e Gabriel eram os únicos que ouviram da minha boca e agora Brendan também. Estavam me levando para o carro quando eu vomitei no caminho. Meu vômito se baseava em líquido e emava um cheiro forte de álcool, mas eu não tinha bebido.

– Você bebeu? - perguntou Lyla atrás de mim, e quando tentei responder um "não" acabei vomitando mais. - Isso sempre acontece com ela? Não é melhor ir ao hospital?

– Ela só está vomitando, Lyla! Se acalme. - grita Dallas nervosa e depois eu desmaio.

***

– Você acha que ela acorda hoje? - reconheço a voz. Dallas.

– Não. - Madson.

– O que a gente faz? - acho que estávamos na casa de Madson.

– Deixa ela aí na cama, Louise vai acordar amanhã ou na madrugada. - responde Madson de cabeça baixa enquanto eu finjo dormir com um olho fechado e um entre-aberto.

– Ela não estava bebendo, o que houve exatamente?

– Ela bebeu sim. O barman deve ter errado a bebida ou algo assim porque ela estava tomando uísk com energético e nem estava percebendo. E bem... Eu já expliquei que às vezes Louise tem esses ataques. É o passado dela, tadinha. Quando ela pensa demais vem tudo à tona e ela começa a pirar, querendo se matar. Essas coisas... Você sabe.

– Ela parecia tão bem hoje a tarde. Sorria, ria, conversava, contava piadas...

– Mas ela não estava bem. Louise é a pessoa que mais sabe disfarçar quando quer que alguém não se preocupe com ela, faz o possível para ninguém desconfiar de nada.

– Meio deprimente sofrer sozinha. Ele não tinha um irmão? Ou morreu com a mãe?

– A mãe estava grávida, e quando se matou o filho morreu junto. - eu não queria ouvir mais aquela conversa, então me esforcei para dormir. Acordei às quaro da manhã, não achei cigarros então só fiquei acordada olhando o teto azul claro do quarto de Madson. Estava pensando (avá): O que eu faria? Voltaria aos psicólogos escrotos? Tentaria viver normalmente?

Eu não sabia dizer muito bem, a pergunta era difícil. Então eu pararia de tentar viver como se já tivesse superado. Eu não superei, droga. Toda noite eu sonho com homens me estrupando, minha mãe morrendo... Eu não sei o que vou fazer. Simplesmente é complicado - coisa que a vida sempre é em relação a mim e minhas escolhas. Então a única coisa certa era que eu não deveria...

Não sei.

Não deveria o quê?

Não adianta fazer promessas e no final não cumprir, comigo não adianta. Eu me cortaria amanhã e depois de amanhã e com toda certeza pelos próximos dias que virão. O motivo era o mesmo: raiva e vergonha de mim mesma. Por mais que seja patético, bobo e infantil... eu me sinto bem. E é isso que importa. Tomo remédios ante-depressivos, evito os psicólogos, me corto, tento sair várias vezes... Minha vidinha tá a mesma bosta de sempre e por mais que na maioria do tempo e me sinta mal, existem momentos em que realmente vale a pena estar respirando, sentido. Por mais que seja muito difícil. Nunca vai mudar, meus amigos serão condenados a viver ao meu lado pelo resto da vida deles e não vêem que ainda tem tempo de escapar. Isso que eu acho ridículo nas pessoas: ficarem, mesmo querendo ir e sabendo que ir é o certo. Madson diz que está comigo porque "é leal". Não. Ela já está amarrada a mim, mas ela pode encontrar alguém melhor na esquina, só não sabe disso. Cada pessoa é única, mas existem várias pessoas que podem te fazer sentir a mesma coisa. Ela e Gabe não vão embora porque ficar ao meu lado, para eles, é o certo. Só que, na verdade, é um certo muito errado. Não fazem ideia.


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Notas finais do capítulo

Olá. Gostaram? (eu sei, tá meio confuso)

Comenta o que achou e o que espera para o próximo capítulo de 'Algo importante, ou quase.' porque eu tô confusa. Estou tentando expressar minhas ideias nos capítulos e ao mesmo tempo formar uma personalidade, um alguém, vários alguéns... É confuso, podem dar ideias se quiserem - serão muito bem vindas.

Bom dia, beijo. Até mais.



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