Ela se jogou porque já não tinha mais o que se fazer.
E porque tinha muito o que fazer.
Afinal, ela sempre fora preguiçosa.

Ela se jogou porque a vitalidade lhe consumia, e as paredes cada vez mais se apertavam contra ela.
Era claustrofóbica.

Ela se jogou por ela, por eles e por aqueles. Se jogou porque achou bonito. Se jogou porque foi corajosa.
Se jogou porque era covarde.
E mais uma infinidade de adjetivos.

Ela se jogou porque não confiou em si. Não confiou em si porque não devia. E afinal, como poderia? Quem aguentaria?

Se jogou porque se cansou, se jogou porque de cá para lá, tudo era igual. Se jogou porque, por mais que andasse, cada ponta do mundo e cada canto dos cantos do mundo lhe diria o mesmo.

Que no final tudo era mal.

Que ninguém nunca era suficiente.

Se jogou porque deveria ser pura, mas também porque queria ser normal. Se jogou porque não queria se adequar e se jogou porque não queria negar.

Que por mais diferente que fosse, todos éramos iguais.

Se jogou porque ele era tão lindo quanto a aurora boreal. Se jogou porque essa era uma comparação estranha o suficiente para que ela se sentisse irreal.

No fundo ela até era.

Se jogou porque ela não conseguia admirar o superficial, se jogou porque era bonita como o natural. Se jogou porque ela seria compreendida de uma maneira errada.

O que é ser pior que ser incompreendida.

Se jogou porque falhou e porque todo mundo falha. Se jogou porque se decepcionou. Se jogou porque aquela garota era excepcional e se jogou também.

Se jogou por quem se jogou.

Se culpou por quem se jogou.

Se jogou porque sempre seria boa demais. Se jogou porque ele e nem ninguém saberia disso, porque eles eram bons demais.
Ou cegos demais.
Surdos.
Mudos.

Se jogou por causa das suas hipérboles. Se jogou porque aquele não era o dia bom. Se jogou porque seus dias nunca eram bons.

Se jogou e foi o melhor dia da sua vida.

Se jogou porque ela quebrou suas regras. Se jogou porque se romperam os laços, se jogou porque o silêncio se dissipou. Se jogou porque contou tudo. Não havia prudência nem segredos.
Suas particularidades haviam sido sanadas.
Não havia mais nada para descobrir.

Se jogou por que a música parou de tocar, e no fim das contas ela não soube dançar.

Se jogou porque seus calos já lhe imploravam uma pausa.

Uma pausa que compensasse todo aquele tempo de pé.
Todo aquele tempo sem fé.

Ela se jogou porque não acreditava em vida após a morte e porque não queria uma. Não queria ser um cachorro, um gato ou uma cigana.

Não queria outra realidade.

Não queria outra vida.

Não queria ser outra pessoa.

Não queria um vida sem ele.

Sem ela.

Sem eles,

Sem elas.

Se jogou porque venceu. Se jogou porque perdeu. Se jogou porque não soube. Se jogou porque sabia demais.

Se jogou porque não deveria ter imergido.

Se jogou porque não estava no lugar errado.

Mas, na hora certa.

Se jogou porque ela o amava. Se jogou porque além de tudo, ela ainda o esperava. Se jogou porque ele era bom demais e se jogou porque ele se jogou também.

Se jogou porque ela se inspirava naquela. Se jogou porque aquela se odiou, e a odiou por tê-la se odiado. Aquela se jogou, junto dessa.

Se jogou porque ele era peculiar. Se jogou porque ele era igual ao que ele gostava. Se jogou porque ele não se jogou, mas sim foi jogado.

Se jogou porque ela sofreu, e descobriu o alívio. Se jogou porque queria acompanhar aquela que merecia. Se jogou porque sabia o que era ter o peito quebrado.

Chutado.

Mutilado.

Mil pedaços. Mil pessoas.

Se jogou mil vezes, junto com mil pessoas, junto com mil histórias, junto com mil beijos e mil derrotas. Se jogou porque quando voltasse, faria diferente o que ninguém faz.

Se jogou porque queria histórias.

Se jogou porque era a paz.

Se jogou porque era ela.

E porque somos eu e você.