–Lamento muito- digo ajudando-o a se levantar.

–Bem, eu não lamento muito, mas sou um cavalheiro e cavalheiros gostam de manter as aparências, então,- diz olhando-me intensamente-lamento muito.

Tive vontade de rir, mas novamente, ele estava tão perto, podia sentir o calor de seu corpo e cada terminação nervosa se acendeu, meu coração começou a disparar e meu cérebro parou de funcionar, por um instante achei que iria ser eu a beija-lo ou seria eu a implorar para que o fizesse, mas fui interrompida por uma voz anasalada e um cheiro insuportável de lavanda.

–Benjamim Swan, como me alegro em vê-lo, há muito não nos encontrávamos, achei que estava se escondendo de mim- disse a mulher com o cabelo negro amarrado em um coque alto, e um vestido tão justo que achei que a causa de sua aparência doentia fosse ele.

–Meranda, nunca me esconderia de tão formosa dama- disse educadamente, mas sua expressão demonstrava o contrário. A linguagem formal usada pelos dois denunciava algo que eu não era capaz de compreender.

Meranda riu e estendeu a mão, Benjamim a beijou delicadamente.

–Muito educado, para alguém como você.

Não entendi o que Meranda quis dizer com isso, mas a cara que Benjamim fez indicava que era melhor nunca perguntar.

–Digo o mesmo sobre você.

Meranda deu um sorrisinho asqueroso, que quase me fez correr de agonia e olhou para mim com aqueles olhos negros e frios.

–E quem seria essa?- perguntou.

–Essa é Melissa Forbs, uma prima de Kate, vinda de Bristol, Kate pediu que a acompanhasse em um passeio- falou olhando para mim, percebi que pedia silenciosamente que atuasse também e continuasse com a farsa, relutante o fiz.

–Prazer- falei estendendo a mão e sorrindo com o máximo de doçura que possuía.

–Não possui sotaque algum de Bristol- denunciou Meranda.

–Mudei-me a poucos meses para lá, na verdade, fui criada em Londres- falei me esforçando ao máximo para parecer uma dama inglesa.

–Compreendo- disse me olhando de cima a baixo- é muito bonita, devo acrescentar.

–Obrigado- respondi sorrindo- a senhora também é muito...encantadora.

Meranda riu alto.

–Que ser fascinante é você, Melissa,- continuou rindo- as pessoas em Londres são tão chatas, sempre com as palavras na ponta da língua, um vocabulário decorado de algum romance shakesperiano.

Foi minha vez de rir e Benjamim me acompanhou.

–Concordo- falou galante como sempre- bem, foi ótimo encontra-la Meranda, mas precisamos ir.

–Leve a menina para que me visite, a adorei.

–Claro, se Kate permitir, com licença.

Puxou-me pelo braço e saiu as pressas, quase correndo, pude sentir os olhos de Meranda em nós. Quando diminuímos o ritmo, não aguentei e as palavras jorraram de minha boca.

–Quem era ela? Por que teve que mentir quem sou? De onde a conhece? Kate sabe quem ela é?

–Muitas perguntas, para poucas respostas.

Parei, brava como uma menina de cinco anos.

–Exijo que me diga, acha que não percebi que estava me distraindo, para que eu esquecesse sobre como você sabe tantas coisas sobre mim? Não vou cometer o mesmo erro, exijo que me diga.

Ele suspirou e parou olhando para o céu, pedindo socorro, parecia mais um anjo sem asas, tentando voltar para casa.

–Tudo bem,- começou- entenda que não posso lhe contar tudo, mas quero que saiba, que nosso encontro no bordel, não foi por acaso, e temo que este com Meranda também não.- ele me olhava como um médico olha para uma pessoa que acaba de perder um ente querido.

Suspirou e continuou.

–Não cabe a mim, contar tudo, porque não sei tudo, mas preciso que você confie em mim e Kate do jeito que há alguns minutos atrás confiava, não vamos lhe fazer mal, nunca faríamos isso, você é especial demais. Meranda é descendente das bruxas de Salém, quando Kate estava na faculdade, sim, Kate fez faculdade, o senhor Ives, pediu para que fosse instruída no que quer que desejasse e ela escolheu por história das trevas, bruxaria, seu exame final foi todo baseado em Meranda, as duas passavam tanto tempo juntas que começaram a comentar que tinham um caso e que Kate fazia parte dos rituais, dando sangue que Meranda necessitava, ora, era tudo mentira, claro, mas Kate parou de vê-la e pediu que fizesse o mesmo, por motivos desconhecidos, depois que o senhor Ives morreu, as pessoas começaram a dizer que Kate havia feito um pacto com o demônio para que ele levasse seu marido e ela ficasse com toda fortuna, é por isso que não falamos mais com ela, pode não parecer, mas Kate se importa muito com a opinião dos outros.

–Entendo- foi tudo que fui capaz de dizer.

–Não se assuste, é tudo uma grande mentira inventada para difamar Kate, pois você sabe de onde ela vem e as pessoas são muito maldosas e...

–É a Kate que cabe me contar toda a verdade?- perguntei.

–Sol, não pergunte a ela, saberá que lhe contei.

Bufei.

–Me contou o que? Sobre a relação de uma bruxa e uma prostituta?- ele se encolheu diante de minhas palavras, mas a surpresa foi tomada por um ódio mortal.

–Nunca mais a chame assim, essa prostituta lhe ofereceu um lar!- rebateu.

–A preço de que? O que vocês querem comigo? - falei quase gritando.

Ele se acalmou e sua expressão tomou um ar gélido.

–Já disse não cabe a mim falar, lhe contei o que achei necessário, e é só.

–O que é necessário- falei irônica.

Ele agarrou-me pelos ombros e aproximou-me de si.

–Não faça mais perguntas, por favor,- sua voz não estava gélida e sim carregada de emoções- não a machucarei, não deixarei que ninguém o faça. Por favor Sol, faz muito tempo que não me sinto assim, a encontrei há apenas dois dias e já sinto como se estivesse comigo a vida toda, queria que as coisas fossem diferentes, queria não ter segredos com você, mas se quiser sempre tê-la perto de mim, é esse o preço a se pagar e sou egoísta demais para não acata-lo feliz.

Nossas testas estavam se tocando e nossos lábios tão próximos, se eu me movimentasse o beijaria, mas não tenho toda essa coragem que finjo ter, não depois de tudo o que ouvi, não sei se acredito em suas palavras, parece que esconde tanta coisa que se eu for resolver me arrependerei de tê-lo feito, mas por mais que eu tente enganar a mim mesma, necessito dele, de seu calor, de suas palavras tranquilas, desde o momento que o vi pela primeira vez eu senti essa necessidade, a vontade de agarra-lo e nunca mais soltar, mas não sei se estou pronta para pagar o mesmo preço que ele, o preço da verdade. Posso fingir que estou, posso ser a garota má e rebelde que tanto quis ser, agora, posso mentir para ele, para ter o que quero, não é exatamente isso que ele está fazendo comigo?

–Beija-me- pedi- beija-me.

E ele obedientemente o fez.