Sixteenth Moon escrita por Nath Schnee


Capítulo 9
Oitavo Capítulo – 13 de Setembro


Notas iniciais do capítulo

Olá! Perdão a demora, eu estou postando uma fanfic de Pokémon nos dias 15, então passarei a postar esta nos dias 30. Nem pretendia postar hoje, mas uma certa pessoa (Lê-se Maria Isabel) combinou comigo de postar a fanfic dela (https://www.wattpad.com/story/48774375-uma-sele%C3%A7%C3%A3o-nada-normal) no mesmo dia que eu postaria a minha. Acabou por sendo hoje.
Obrigada Natan pelos comentários! Amei todas as notificações! Kkkkkkkk
E obrigada a todos os outros que comentaram também ♥
Boa leitura!



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Mortais das Trevas

No dia seguinte, acordei ainda querendo dormir. De preferência hibernar até o começo das férias. Havia custado muito para pegar no sono, e quando o fiz, haviam sido pouquíssimas horas. Acordei, também, de alguma forma feliz e triste, aliviada e decepcionada. Feliz e aliviada por ter dois dias de paz da escola naquele fim-de-semana e triste e decepcionada por não ter como ver Ethan.

Fiquei bastante tempo encarando o teto de gesso do meu quarto, pensando em nada, e ao mesmo tempo, em tudo. Ethan estava realmente tentando me ajudar. Proteger-me das meninas da escola. Mas de que adiantaria? Elas não eram nada comparadas ao meu real temor, algo que eu preferia que ele não soubesse o que era.

De alguma forma, Ethan havia me seguido até o jardim secreto, aparentemente chamado Greenbrier, tentara de todas as formas me animar até que aquele medalhão, seja lá como, nos mostrado uma espécie de visão. Era difícil saber ao certo o que era. Eu só me lembrava de olhar ao redor e ver aqueles mesmos limoeiros, grama, alecrins selvagens, todos juntos, queimarem por completo. Vi por algum tempo a destruição do fogo, devastando o lindo lugar e o transformando em cinzas e terra negra, em uma versão sombria dele.

Fiquei pensando no assunto antes de dormir. O que significava? Eu só podia pensar que era uma espécie de visão do futuro ou passado. Havia uma data no medalhão. 11 de fevereiro. Minha Invocação. Podia ser algum tipo de indicação de que eu faria aquilo, iria para as Trevas e destruiria Greenbrier. Talvez até Ravenwood.

Estremeci. Não conseguia pensar naquilo. Eu não era assim. Mas Ridley também não havia sido…

Tinha um ano naquela data, eu lembrei. 1865. Talvez fosse no passado, algo que destruira aquele jardim.

Eu precisava descobrir.

Levanto-me. Para mais alívio, não havia sonhado com nada, então dei apenas uma arrumada básica no meu quarto. Parei por um momento, procurando por mais bagunça.

Meu quarto era pequeno comparado ao resto da casa, ficava bem abaixo do telhado. Ele consistia em minha estante para livros de mogno junto a uma das paredes, minha cama de ferro branca, uma penteadeira e um armário. Um lustre pálido no teto de gesso. Um ventilador de teto lentamente girava acima de tudo. De tudo o que havia ali, as únicas coisas que se livravam de minha caligrafia eram o chão e o tapete. Todo o resto estava coberto com minhas palavras. Frases e trechos de livros que eu gostava.

Olhei para o teto. Ele dizia:
"se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças". Charles Bukowski.

Desde o momento que eu havia descoberto aquele meu poder de escrever nas paredes e móveis sem nem pegar a caneta, eu havia feito ainda mais, conscientemente ou não.

Havia também trechos distorcidos, como um de T. S. Eliot. Em uma das portas do armário:
"A raça Mortal"

E na outra porta:
"Não pode suportar toda a realidade."

As laterais do meu espelho:
"O conhecido não tem desejo; mas todo o amor é desejar"

Encarei. Aquele era novo. Acho que havia surgido sem eu ver, pois eu havia lido E. E. Cummings antes de dormir. 

Observei as outras frases. Aquelas haviam sido eu. Pensamentos aleatórios que foram gravados em todo lugar.

Na lateral da estante:
"Dois lados a ser escolhida, mas nenhuma escolha."

Na vidraça da janela:
"O tempo passa como se tivesse pressa"

Até mesmo o ventilador, quase imperceptivelmente, havia minha letra:
"Desconhecida para si mesma"

Saí do meu quarto e segui para a sala. Como todas as vezes que eu havia visto Ravenwood, ela havia mudado. Dessa vez estava como em um castelo, mas não aqueles reais, feitos de pedras e pouco confortáveis ou iluminados. Pelo contrário. Era como nos filmes, com paredes de um dourado pálido, janelas extremamente grandes com cortinas vermelhas tão enormes quanto. Grandes lustres de ouro iluminavam todos os aposentos e corredores. As portas eram de madeira talhadas com desenhos complexos de espirais e círculos.

Segui até o que imaginei ser o salão de banquetes e, como imaginei, a Cozinha adorara as gigantes mesas. Havia três no enorme aposento, todas fartas com todo tipo de comida. Até mesmo desconheci algumas iguarias.

Não vi tio Macon em nenhuma das mesas, então apenas fui até lá e, apesar de completamente perdida em meio a tanto alimento, consegui tomar café-da-manhã e passear mais pelo Castelo Ravenwood. Passei por alguns corredores, perdida na vastidão de todo o lugar. Houve um momento que passei a escutar algo, baixo e longe, um piano em uma sala distante.

Com certeza era tio Macon.

Apresso meus passos enquanto sigo o som. Abro uma das portas lentamente, esta estando semicerrada.

Dou de cara com uma espécie de sala de música, bem menor do que os outros aposentos, mas tão "brilhante" quanto. Havia um piano de calda, no qual meu tio estava sentado em frente, e minha viola ao fundo. Por um momento me perguntei como ela havia aparecido ali.

Ele não olhou para mim, mas eu sabia que tinha conhecimento de minha presença. Ele parou de tocar o instrumento no meio da música, que reconheci ser a Sinfonia Número 5 de Beethoven, e olhou para mim.

— Bom dia.

Acenei com a cabeça.

— Bom dia. — fiz um breve silêncio. — Não acha isso exagerado?

Exagerado era pouco...

— Exagerado? O que em específico?

Encarei-o, cética.

— Tio Macon, nós não estamos em um conto de fadas para morarmos em um castelo.

— Estamos em um conto de bruxas, então? — Macon riu, divertido. Revirei os olhos e me virei para a saída. Ele voltou a tocar o piano, mas ainda falava comigo. — É o que os Mortais desta esquecida cidade estão pensando sobre você. Ou isto ou que você é louca. — hesitei. Sabia que aquele tom de voz não era bom. Ele queria que eu continuasse em sua presença.

Meu tio havia parado no meio da música novamente.

— Conte-me o que aconteceu.

Olhei para o chão de granito branco.

— Eu não quis... — gaguejei. — Eu perdi o controle. Não suportei o que elas falavam.

— Diga-me o que elas falavam.

Fiquei satisfeita por não estar olhando nos olhos dele. Continuei encarando o reflexo do teto no chão lustroso.

— Falavam sobre o senhor. Sobre minha família. Sobre mim.

— Eles ligaram essa manhã. — Começou novamente. A Sinfonia combinava perfeitamente com minha tensão. — Ainda estão decidindo o que farão com você. Não pareciam nada felizes com sua atitude. Não são os únicos.

Irritei-me e olhei para ele.

— Elas que me provocaram! Eu não suportei!

— Mas tem que suportar. Sabe muito bem que o que elas dizem não é verdade. Se pretende ser da Luz, não perca o controle. Quebrar janelas em cima dos Mortais, Lena?

— Não foi proposital! — Minha voz já estava alterada.

— Assim como não foi proposital quando Ridley fez aquela garota ir para o meio da rua e ser atropelada?

Ele sabia que eu odiava falar no assunto. Para ele, Ridley já com trez anos era das Trevas. Eu insistia que não. Que a garota havia se distraído. Que nós não estávamos envolvidas, mas de que adiantava? Não havia a menor chance de eu explicar. A menina havia nos chamado para "conversar" depois da aula. Ridley havia ido comigo. Nós quase brigamos, lembro até que um bueiro explodiu quando me irritei, mas não havia acontecido nada além disso. Ridley a convencera de ir para casa. Ela estava olhando para nós ao atravessar a rua e uma caminhonete a acertou. Ficara paraplégica. Mas ninguém — ninguém! — além de nós duas acreditava na verdade. Os Mortais diziam que havíamos empurrado ela. Os nossos familiares diziam que Ridley havia controlado-a até a estrada.

Macon não havia acabado.

— Sabe muito bem que aquilo já era as Trevas a dominando. Não quero que você seja igual. Se você não se controlar uma próxima vez, serei obrigado a proibi-la de ir a escola. Ficará de castigo até que seja Invocada.

A mágoa dentro de mim pareceu aumentar e se tornar angústia. Minhas lágrimas chegaram. Não respondi. Apenas corri de volta ao meu quarto.

Tranquei minha porta e sentei no chão, encostada na parede.

Nem mesmo meu tio acreditava em mim?! Nem mesmo ele?! Se ele não acreditava, o que diria o Ethan se eu contasse a verdade?

Peguei meu caderno. Só escrever me aliviaria um pouco, mas eu não conseguia. Tudo o que pensava era no medalhão e sua visão. Foi então que me veio uma ideia doida na cabeça.

E se eu pesquisasse por conta própria?

Saí do meu quarto e segui pelos corredores do enjoativo castelo. Enquanto procurava algum tipo de biblioteca, escritório, ou fosse o que fosse que houvesse no castelo, encontrei de tudo. Abri uma porta e havia um outro quarto, mas pelas cores tio Macon NUNCA dormiria ali. Rosa e vermelho? Ele passaria longe. Continuei andando, conferindo outras portas e corredores. Não tive muito sucesso, aquele lugar era grande de mais.

Estava tentando achar o caminho de volta quando encontrei o quarto do meu tio, que estava ausente. Com certeza era aquele o quarto. Ninguém mais dormiria em algo como aquilo. Poderia ter saído de algum filme. A cama era completamente preta, incluindo os dosséis. O veludo do leito era cinza escuro e também preto. Havia também candelabros de ferro fundido, mas eles não surgiam efeito, pois o quarto era quase completamente imerso na escuridão. As janelas, como eu sempre imaginara, eram também de veludo, pesadas e escuras para não haver nenhum tipo de luz do sol.

Eu entrei curiosa e silenciosamente, fechando a porta atrás de mim. Tentei olhar cada detalhe do lugar. Nunca que entraria ali outra vez sem ele. Aquele era o único cômodo do qual eu nunca entrava, então talvez houvesse algo, um segredo, talvez até mesmo sobre a visão.

Eu tinha que procurar.

Fui andando fascinada. As coisas eram realmente escuras, mas não era aquilo que deixava o lugar sinistro. Era o fato de que ele passava a sensação que, com qualquer que fosse a luz que você usasse, ele permaneceria escuro. Sombrio como a noite.

Eu fui andando até que tropecei e me assustei. Mas tio Macon não estava ali, então relaxei por alguns segundos.

Olhei para o lugar que quase havia caído. Não que pudesse realmente enxergar algo, mas vi no chão um tapete. Veludo de novo. Tio Macon era um fã daquilo ou o quê?

Revirei os olhos e estava prestes a procurar novamente quando vi uma estranha linha no chão. Não uma linha, e sim uma fresta.

Abaixei-me para verificar, mas escutei algo vindo do lado de fora. Passos agitados, pequenos e leves. Um barulho de coleira sendo balançada.

Boo.

Se Boo estava ali, não demoraria para tio Macon estar também. Isso se ele já não estivesse em frente a porta.

Olhei ao redor em desespero. Não havia muito lugar para me esconder. Talvez apenas…

Deitei no chão rapidamente e rolei para de baixo da cama, no meio do caminho acabei por bater contra algo no chão, algo duro e gelado. Segurei um gemido e olhei. Era uma espécie de argola, como aquelas que abriam um… Alçapão? Por que havia um alçapão no meio do quarto de tio Macon?

Não era o momento certo para descobrir. Tentei ficar calma e avaliar a situação. Surpreendentemente não tinha poeira ou qualquer sujeira ali de baixo. Outra sorte que tive foi os lençóis da cama serem grandes e impedirem de olhar ali de baixo.

Ouvi a maçaneta ser girada e a porta sendo empurrada. Pude perceber que Boo ficara de fora.

Através de um pequenino buraco que havia entre os lençóis e o chão, pude ver os sapatos sociais pretos de tio M e uma parte de sua calça também social branca. Ele andou ao redor do quarto, mexeu em algumas portas e gavetas e parou.

— Estás também sentindo esta presença, Boo?

Engoli seco. Como ele simplesmente sabia que eu estava ali?! Lembrei-me de sua audição aguçada e prendi a respiração. Quem garantia que ele não a ouviria?

Olhei na direção de Boo. Ele farejara o ar e o chão ali fora. Meu coração parou. Mas depois correu através do corredor, e meu coração voltou ao normal com um mortal. Pude ver tio Macon seguir através do quarto e sair, fechando a porta atrás de si. Não ouvi seus passos no corredor, mas ouvi os de Boo, distanciando-se correndo e o barulho diminuindo aos poucos.

Soltei a respiração, meus pulmões ardiam pela falta de oxigênio. Acho que havia batido algum recorde, mas não importava. Havia passado medo de mais e precisava sair dali o mais rápido possível.
Saí ali de baixo e segui apressadamente para a porta, sem me importar com as possibilidades de achar algo ali dentro.

Abri a porta devagar e olhei ao redor.

Suspirei ao ver o corredor vazio e corri através de outros parecidos.  Em um desses corredores havia um único quadro, um que eu havia visto diversas vezes na minha infância. Ele sempre estivera no hall ou na sala, nunca com o mesmo tamanho, mas sempre fora o mesmo. Parei em frente a ele, o encarando com o coração aos pulos e a respiração ofegante.

Era uma pintura a óleo de uma mulher, seus cabelos ondulados eram ruivos, suas feições finas e bonitas. Não mostrava sua roupa por completo, mas era algo branco de renda.

Aquele quadro sempre estivera na casa de tio Macon, não importava o que ele escolhesse para viver. Eu sempre passara por ele e algo me fazia parar, mesmo que correndo como aquele dia. Como um magnetismo, algo que me dizia que eu deveria guardar na memória aquele rosto.

Aquela era a primeira vez que eu o olhava tão detalhadamente, então só depois eu percebi os olhos.

Apesar da expressão em seu rosto ser frieza, olhando naqueles seus olhos brilhantes eu via melancolia. Mas não foi aquilo que me chamou a atenção. Foi a cor. Os olhos eram dourados.

Dei um passo para trás, assustada. Por que tio Macon iria colocar um quadro de uma Conjuradora das Trevas assim tão visível?

Eu pouco sabia sobre os Conjuradores malignos, mas se tinha algo que havia descoberto depois da Invocação de Ridley, era que os olhos de um Conjurador da Luz ou um que não foi Invocado ainda eram verdes, como os meus, e de um das Trevas eram castanho mel, dourados, como o daquela mulher.

Olhei nas extremidades da pintura, procurando alguma informação sobre ela. O quadro estava muito alto para eu ver direito, então vi apenas uma parte. Um número ao lado de um nome que não consegui enxergar.

"1869"

Encarei aquele número. Não era o mesmo ano, mas chegava bem perto. Seria aquela a mulher que eu vira na visão? Da qual senti todo o desespero por perder Greenbrier e a família? Se era ela, obviamente havia sobrevivido aos incêndios.

Se era ela, agora eu tinha uma aparência e a informação de que ela era das Trevas, só precisava saber se aquela visão realmente tinha algo relacionado a mim. Mas aquilo já estava me assustando.

A data do meu aniversário estava naquele medalhão... A visão havia apenas caos, além de uma mulher ser das Trevas... Significava que eu iria para o mesmo lado na minha Invocação?

Desisti de pesquisar. Estava irritada com a falta de informações o suficiente e assustada com o quase flagrante. Voltei ao meu quarto às pressas.

Quando lá cheguei, estava trovejando e havia um pequenino chiado no horizonte, quase inaudível, que identifiquei ser a tempestade se aproximando, as gotas vindo em direção à Ravenwood.

A visão da janela do meu quarto, na qual estava debruçada, era apenas de árvores, de salgueiros a carvalhos e limoeiros. Em um pequenino jardim daquele lado da casa, pude ver orquídeas, rosas, não-me-esqueças, etc.

Estava cansada de tantas perguntas sem resposta que resolvi não mais perguntar por aquele dia. Peguei meu caderno e comecei a escrever, conseguindo pensar no assunto sem ficar agitada.


Fogo e destruição
É tudo o que havia na visão
Isso tem algo relacionado à minha Invocação
Ou seria apenas minha imaginação?
Estou tentando me acalmar
Mas não deixo de me preocupar
E se eu machucar alguém?
E se esse for algum aviso do além?
Não sei o que devo fazer
Não sei quem é que vou ser
Mas na minha Invocação sei que vou ver
E espero que seja o que estou a torcer
Nada do assunto a ele devo contar
E, além disso, apenas esperar
Esperar por quando tudo isso vai mudar
Esperar pelo dia que vou me Invocar


Fiquei olhando meu caderno por alguns segundos até ver um movimento em minha visão periférica, algo se mexendo preto na parede. Olhei naquela direção e percebi. Uma das frases da minha nova poesia havia aparecido na parede. Não era como eu havia imaginado, com a minha caneta voando e escrevendo. Era estranho, as palavras simplesmente surgiam de um momento a outro, como se estivessem se revelando aos poucos, letra por letra.

Encarei aquela frase.

"Não sei quem é que vou ser".

O sol estava se pondo quando eu fechei meu caderno é deixei na escrivaninha, no qual estava sentada naquele momento. Virei a cadeira giratória e olhei ao redor; o pensamento longe.

O que Ethan estaria fazendo naquele momento, em seu Mundo Mortal? Uma imagem veio à minha mente, dele mexendo no medalhão no bolso da calça.

Ethan. Pare. Você não sabe o que está fazendo.

Forcei minha mente para se conectar à dele de novo. Ele não entendia que podia ser perigoso.

Guarde isso!

O mundo girou como se eu tivesse exagerado nas voltas na cadeira. O teto se afastou e o chão chegou mais perto…

 

Nada poderia ter preparado a mim para a visão de Greenbrier queimando. As chamas lambiam as laterais, consumindo as ripas de madeira e engolindo a varanda. Soldados carregavam antiguidades e quadros para fora da casa, pilhando como ladrões comuns. Ainda assim, eu tinha ciência do verdadeiro monstro que eram. Estavam ali mesmo provando ao incendiarem tantas fazendas sem qualquer escrúpulo.

Onde estava todo mundo? Estavam se escondendo no bosque como eu estivera até então?

Folhas estalaram às minhas costas. Pude sentir alguém atrás de mim, mas antes que pudesse me virar, uma mão enlameada cobriu-me a boca. Eu peguei o pulso da pessoa com as duas mãos, tentando me soltar, e perneei.

— Genevieve, sou eu. — Aquela voz... Não podia ser real.

Tornei a olhar a ele, aliviada em vê-lo vivo. Amar um soldado sempre se mostrara a mim ser doloroso e aflitivo. Em contraste, quando ele retornava, família alguma podia me impedir de sentir o alívio, o consolo, a felicidade e a prazer de tê-lo em meus braços. E aqueles mesmos sentimentos quando eu recebia suas cartas, tudo o que havia tido nos últimos dois anos. Ethan nunca quisera se arriscar na guerra, o fazia por mim. E por este motivo, era estranho que estivesse ali agora. Não deveria estar com os outros soldados?

— O que está fazendo aqui? Você está bem? — Joguei meus braços ao seu redor. Ainda que seu uniforme cinza de Confederado estivesse com cheiro de pólvora, lama e queimado, ainda havia

— Estou, amor. — disse Ethan, mas eu sabia que ele estava mentindo. Ethan não parecia bem sequer quando me escrevia.

— Pensei que podia estar... — Eu não conseguia pronunciar aquela palavra.

Eu só só tinha tido notícias de Wate por cartas na maior parte dos últimos dois anos desde que ele tinha se alistado, e não tinha recebido nenhuma carta desde a batalha em Wilderness. Eu sabia que muitos dos homens que haviam seguido Lee naquela batalha nunca tinham saído da Virgínia. Eu havia me resignado a morrer solteira. Tinha tido muita certeza de que tinha perdido Ethan. Era quase inimaginável que ele estava vivo, parado ali, nesta noite, bem na minha frente.

— Onde estão os outros de seu regimento?

— Na última vez que os vi, estavam perto de Summit.

— O que quer dizer com a última vez que os viu? Estão todos mortos?

— Não sei. Quando parti, ainda estavam vivos.

— Não entendi.

— Eu desertei, Genevieve. Não podia lutar nem mais um dia por algo em que não acredito. Não depois do que vi. A maioria dos rapazes lutando comigo nem se dava conta do que se trata essa guerra, de que estão apenas derramando sangue por causa de algodão.

Ethan tomou minhas mãos nas suas. Elas eram ásperas e o calor irradiava pela minha pele confortavelmente.

— Entendo se não puder se casar mais comigo. Não tenho dinheiro e não tenho honra.

Wate desconhecia o quanto eu dava importância àquilo.

— Não me importo que não tenha dinheiro, Ethan Carter Wate. Você é o homem mais honrado que já conheci. E não ligo se meu pai pensa que nossas diferenças são grandes demais para superar. Ele está errado. Você está em casa agora e vamos nos casar.

Agarrei ele em meus braços de novo, temendo que ele pudesse desaparecer no ar como em meus pesadelos se eu o soltasse. O cheiro de queimado me trouxe de volta ao momento. O cheiro rançoso de limão queimando. Do meu lar queimando.

— Temos que ir para o rio. É para onde mamãe iria. Ela iria para o sul, na direção da casa de tia Marguerite. — falei.

Mas Ethan não teve tempo de me responder. Alguém estava vindo. Galhos estalavam como se alguém se debatesse pelos arbustos, avançando em nossa direção.

— Fique atrás de mim — ordenou Ethan, empurrando-me para trás de si com um braço e segurando o rifle com o outro. O arbusto se abriu e Ivy, cozinheira de Greenbrier, saiu cambaleando. Ainda estava de camisola, preta de fumaça. Ela gritou ao ver o uniforme, assustada demais para ver que era cinza, não azul.

— Ivy, você está bem? — Corri para segurar a velha mulher, que já estava começando a cair, aparentando desmaiar.

— Srta. Genevieve, o que está fazendo aqui?

— Estava tentando chegar a Greenbrier. Para avisar vocês.

— É tarde demais para isso, e não teria ajudado em nada. Aqueles azuis quebraram as portas e entraram na casa como se fosse deles. Deram uma olhada em tudo para decidir o que queriam levar e depois começaram a botar fogo. — Era quase impossível entendê-la. Ela estava histérica, e a todo momento era tomada de um ataque de tosse, engasgada com a fumaça e suas próprias lágrimas. — Em toda minha vida nunca vi ninguém como aqueles demônios. Queimando uma casa com mulheres dentro. Cada um deles vai ter que responder a Deus Todo-Poderoso em pessoa no fim da vida. — A voz de Ivy falhou.

Hesitei, sem entender realmente o que Ivy estava dizendo.

— O que você quer dizer com queimar uma casa com mulheres dentro?

— Lamento, criança.

Um arrepio percorreu meu corpo, minhas pernas fraquejaram, amoleceram. Caí de joelhos na lama, a chuva escorrendo-me pela face, misturada com as lágrimas que finalmente percorriam meu rosto, vindas de meu coração antes esperançoso e agora estilhaçado. Minha mãe, minha irmã, Greenbrier... não existiam mais. Eu não podia acreditar.

Aquilo não podia estar acontecendo.

Olhei para o céu. Ivy dissera que aqueles homens teriam de responder ao Deus Todo-Poderoso. Eu já duvidava que Ele fosse fazer alguma coisa, já que tinha permitido tanta desgraça acontecer. Como Ele poderia permitir?

— Deus é quem vai ter que me responder.

 

Voltei à realidade ainda mais devagar que as outras vezes. Minha cabeça latejava e eu sentia o corpo encostando em algo gelado. Levantei-me trêmula e abri os olhos para só então perceber que havia caído da cadeira, estava deitada no chão e, ao tocar minha testa, percebi que havia feito um galo com a batida.

Ao ficar de pé com minha visão se recuperando aos poucos e a tontura sumindo ainda mais vagarosamente, pude olhar ao redor e lembrar aonde estava. Meu quarto continuara o mesmo, pequeno e confortável, mas eu não estava nada confortável.

Genevieve era o nome daquela mulher, afinal, e ela era mesmo a mulher do quadro. O reflexo nos olhos daquele Soldado Confederado apresentava o mesmo fino rosto e olhos melancólicos, apenas a frieza havia sumido. Mas eu não entendia porque ela tinha olhos verdes na minha visão. Com certeza tinha mais de dezesseis anos, então o que a teria feito ir para as Trevas?

Haviam permanecido na minha cabeça as palavras de Ivy, uma mulher de cabelos castanhos e em parte grisalhos, uma roupa simples com avental. Ela não precisava pensar muito para se lembrar dos detalhes da visão. Mas não era exatamente aquilo que havia permanecido em minha mente.

Queimar uma casa com mulheres dentro. Quem em sã consciência faria algo parecido? Se haviam feito aquilo com Greenbrier, havia acontecido com outras casas também? Ravenwood? Blackwell havia sido queimada, pois de acordo com a direção que eles seguiram, ela viera antes da casa de Genevieve, mas os soldados não haviam pensado na possibilidade de haver pessoas dentro? Mulheres, homens... Crianças?!

Aqueles soldados eram tão perversos... Tão... das Trevas.

Fiquei imaginando se Ridley seria capaz de algo como aquilo. Eu já tinha dificuldades em imaginá-la do mal, mas imaginá-la matando de tal maneira? Era impossível! Uma parte de mim ainda queria acreditar que ela era a minha quase irmã de antes.

Deitei na minha cama, encarando o teto. Estava cansada, apesar de não ter feito muita coisa.

Lena?

Eu não queria conversar. Não queria respostas e nem perguntas. Não queria mais nada. Afastei meus pensamentos dos dele e peguei meu caderno. Passei o resto do dia escrevendo e lendo. Ethan continuou a me chamar por Kelt, e me recusei a responder em todas as vezes.

Passei todo o tempo procurando algo para me distrair e acabei por dormir cedo aquela noite, diferentemente da última. Inconsciente foi o único momento no qual não havia uma cena de fogo e mulheres gritando em minha mente.


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo fora quase completamente de minha autoria, apenas a parte da visão viera do livro, então tentem entender minha demora! Obrigada por lerem e, para quem não conhece, essa é a música que Macon tocou:
https://www.youtube.com/watch?v=VdzgAZF1BO4
Comentem, por favor! Até mais!



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