Eu voltada da caminhada tardia com calças brancas, e tênis pretos novos que faziam meus calcanhares já calejados gritarem de dor.

O guarda-chuva acinzentado que eu carregava no ombro, não impedia as gotas grossas de água de molharem meu rosto.

Pisava em poças de água, vendo as folhas alaranjadas e chatas do outono de sempre.

Aquela calçada de pedras era longa, quase infinita, me levava para a sala de cinema de ontem. Éramos dois, tão tímidos, puros ou ingênuos, tão perto, porém, tão longe ao mesmo tempo.

Eu tinha me apegado em alguns dias.

Ele também tinha gostado, mas só no privado das conversas on-line. Para o tal, talvez fosse só mais alguma tentativa, que fora falha no final, de ter um beijo roubado, e no caso, um troféu na estante do quarto.

O caminho para fora do estabelecimento era preenchido com o barulho dos outros e com o silêncio de nós dois.

O vento daquela noite levantava minha saia aos poucos, me fazendo segurá-la, enquanto ele mexia rapidamente no celular.

Era um vácuo mortal, eu me sentia no espaço, fora de minha órbita, mas meu pés continuavam no chão, por mais que minha cabeça continuasse voando.

Ele me dá um beijo casto no rosto, pega um ônibus e se vai, enquanto eu crio raízes no concreto enquanto minha temperatura corporal aumentava de um jeito ruim, a espera de minha mãe, que demorava por causa do trânsito infernal.

Um caminho interminável para casa, esperando uma mensagem, um sinal de coração acolhido.

Ele era tudo e tão pouco perto dos outros.

Uma conversa rápida no privado tínhamos tido, mas apenas isso.

As horas se passavam, e as lágrimas brincavam de se balançar no precipício de meus olhos.

A noite corria, os pensamentos voavam, a bateria do celular passava do chão, e as batidas inconstantes e recorrentes do coração continuavam, impedindo meus ouvidos de presenciar mais uma visita inesperada dentro de casa.

E como sempre o som da chuva lá fora me atordoava, me fazendo sentir como uns dos desenhos agarrados à minha parede branca, dispensáveis.

Da cabeça de um corpo formado, e da escuridão de uma adolescente vinham as histórias.

Eu subia e descia os logs, na manhã seguinte, relia suas frases que no dia anterior. E o que eu pensava ser um amor gostoso, rápido, fácil, e sobretudo passageiro, se tornou em um amor não correspondido e doloroso.

Eu podia colocar mil músicas das minhas bandas favoritas, mas nenhuma delas me faria me sentir melhor.

Eu poderia ligar para o tal cúpido de aluguel que me fez um grande favor desses para me consolar, ou até mesmo falar com ele, mas isso já tinha sido feito, e de nada tinha adiantado.

Eu podia sentar e esperar, mas não mudaria em nada também.

Eu podia esperar até a hora de sair para uma caminhada tardia com calças brancas e um par de tênis pretos novos que fariam meu calcanhares já calejados gritarem de dor.