YuuMika – Drabbles e Oneshots escrita por Sarahsensei


Capítulo 5
Parte IV


Notas iniciais do capítulo

Ainda não acredito que levei 14 dias para atualizar uma fanfic que eu andava atualizando toda semana! Uau, essa droga que eu chamo de vida ficou bem mais agitada do que o normal nesses últimos 14 dias! Provas, simulados, jogar no interclasse, os treinos para o interclasse, estudar para o vestibular, 10 redações que precisei fazer em três dias (sendo que participo de um projeto escolar que me força a tirar 1000 nessas redações), meu trabalho, a preparação para o estágio, complicações de saúde (que eu não contei pra ninguém), problemas financeiros e o abalo que a morte do meu tio (devido a câncer de estomago, que, ironicamente, ou não, é um dos temas de Bulimia – minha longfic Shizaya) trouxe para todos da família me impediu de escrever hardmente como antes. Peço sinceras desculpas pela demora.

Bom, agora vamos falar um pouco sobre esses dois prompts que estão, de certa forma, incompletos. Como poderão perceber, eles são bem extensos, pois enquanto escrevia, ia imaginando plot sobre plot. Acabei misturando tudo que pensei (me empolguei demais, desculpem). No entanto, faltaram algumas coisas que eu havia planejado no início, por exemplo, Yuuichirou sendo devorado. Ou rolar uma briga lá muito louca entre o Mikaela e o Yoichi. Aliás, o segundo drabble desse capítulo não ia ser dessa forma, mas acabou sendo.

Coloquei alguns dos meus headcanons, shipps preferidos e insinuações nas histórias. Como disse antes, me empolguei demais. Desculpem-me. Estou seriamente pensando em encerrar essa fanfic aqui. Só que, bom, sei lá, ainda existem mais 4 prompts que eu NECESSITO escrever. Meus dedos coçam. Sério. O que me impede é a responsabilidade de completar minha longfic Shizaya. Olha, talvez eu consiga escrever os 4 prompts e o capitulo de Bulimia até sexta-feira.... Não prometo nada. Agradeço os comentários, Preciso responder alguns ainda, eu não esqueci, tá?!

Deuses, as falas das crianças no segundo drabble são todas baseadas na minha irmã (que tem 5 anos) e no meu primo (que também tem 5 anos). Poxa, eu convivo com crianças o dia todo, então sei bem que o método que o Shinya usou (por mais fantástico que possa parecer) funciona mesmo para acalmar os pirralhos. Nhaaa, estou falando demais, espero que gostem.



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Sentimentos amargos florescem em um solo podre.
Prompt: Yuuichirou e Mikaela em um apocalipse zumbi (com o Mikaela sendo um zumbi). – UA

Uma cidade completamente destruída. Prédios e casas caindo aos pedaços. Cadáveres em diferentes estágios de decomposição espalhados pelo chão. Mato crescendo em todo canto possível. Cheiros horríveis enchendo suas narinas. Carros enferrujados. Movimentos estranhos ao longe. Restos de uma vivência pacifica se dissolviam na chuva ácida. A atual Shibuya não passava de um rascunho mal-acabado, macabro, do que um dia já fora.

Este mundo foi abandonado por Deus, lembrou-se da expressão sombria do homem de olhos violeta, nem mesmo o Diabo quer ter algo a ver conosco. Querem um conselho? Não orem, suas preces não serão atendidas. E não amaldiçoem, ninguém precisa de mais azar do que estar vivo neste inferno. Mesmo tento jurado seguir o conselho, Amane Yuuichirou não conseguia não torcer para que alguma força divina desse cabo naquela realidade maldita. Ele estava tão cansado de tudo aquilo.

— Hey, não se distraía, caralho! — Após o grito, um tiro. Assustado, o moreno virou-se na direção do adolescente de cabelos rosas (que estavam pouco a pouco voltando para um tom castanho-claro). Kimizuki apoiava as mãos nos joelhos, ofegante. Guren estava a poucos metros dele, ainda com a arma em riste. Os olhos verde-esmeralda focaram nos zumbis “finalmente mortos (?)” aos pés do amigo. Merda, ele deveria ter matado aqueles, não deveria?

— ... a-ah. — Balbuciou sem saber se deveria falar algo ou não. Kimizuki deu um passo à frente, pigarreando.

— Desculpe, senhor, o único que se distraiu aqui fui eu! Foi irresponsabilidade da minha parte não trazer munição suficiente para explorar campo aber-...

— Cale a boca, Kimizuki! Não quero ouvir nenhuma das suas desculpas! Vá atrás do resto do pessoal, veja se eles precisam de ajuda. Mais tarde vamos conversar sobre a sua irresponsabilidade. — Shiho recolheu seu armamento, deu meia-volta e saiu a procura dos outros membros da equipe de reconhecimento. Havia um olhar em seu rosto que dizia “não foi sua culpa, ok? Não aconteceu nada demais”.

— Porra, moleque, no que diabos você estava pensando? Não é hora de se distrair, seu companheiro quase ia morrendo por causa disso! Pense, Yuuichirou, e se só vocês estivessem nessa missão? Eu não vou tolerar outro erro, da próxima vez que fizer merda, vai ser punido, tá me escutando? — Cerrou os punhos, controlando-se. O adulto estava certo, ele havia perdido a concentração em um momento crucial. Assim como da última vez, sua consciência (a parte sádica) forneceu, assim como no dia em que Mika... Mordeu o lábio, lembrar de Mika agora só pioraria a situação.

— Isso não vai mais acontecer. — Murmurou, evitando olhar para o mais velho — Foi mal.

— Mal? Foi péssimo! Não podemos nos dar ao luxo de perder mais alguém! Você sabe disso, pirralho! Você sabe disso e mesmo assim fica brincando em pleno campo de batalha! Eu não te criei assim, não me faça me arrepender de ter salvado sua vida! — O outro estava estressado, era notável e entendível. O grupo diminuía a cada dia, mortes aconteciam a toda hora, a comida era escassa, a água quase não dava para saciar a sede, as brigas territoriais deixavam todos tensos, ninguém nunca sabia quando seria assaltado, aprisionado ou morto, dormir por três ou quatro horas deteriorava a paciência, a atenção. Guren, como o líder, sobrecarregava-se de responsabilidades e culpa. Se alguém ali sofria mais do que todos, era aquele cara.

— Já está na hora de parar, não acha? Você está exagerando demais. — A recém-chegada pôs uma mão no ombro do homem furioso. Usava um tom de voz sério e baixo, deixando claro que não estava ordenando, mas, sim, fazendo um pedido, dando um conselho. — Você está exagerando demais e sendo cruel sem que ele mereça. É totalmente desnecessário, não descarregue suas frustrações em cima de uma criança. — O mais jovem foi jogado no chão, fazendo um barulho abafado de dor quando sua bunda entrou em contato com o chão duro. Porra, seu filho da puta, isso dói!, xingou mentalmente.

— Tch, tanto faz. — Ichinose deu de ombros, metendo as mãos nos bolsos e saindo do local. Eram naqueles momentos de raiva e estresse que o jovem conseguia ver por que a maioria da equipe pregava que eles eram “pai e filho”. A semelhança nos atos o assustava, por mais incrível que fosse.

— Bora, garoto, levanta daí. Temos trabalho a fazer, lembra? — Voltou-se para a ruiva que estendia a mão para ele. Aceitou e foi puxado para cima sem esforço. Wow, que forte! Mito Junjo, sem dúvidas, servia muito bem como definição de, bem, poder feminino. Alta, séria, forte, decidida, inteligente e bonita, a mulher era uma das poucas pessoas que “apertava o botão stop” quando Guren saía do controle. Apesar do exterior bruto, ela era uma pessoa legal.

— Obrigado. — Yuuichirou notou sangue adornando as roupas da mais velha, arranhões nos braços e no rosto, lama manchando as calças e os cabelos, arregalou os olhos. — Você está bem?

— Ossos do ofício. — Mito deu de ombros, ajeitando os longos fios vermelhos atrás da orelha. — Você não deveria estar preocupado comigo. Não salvei sua pele pra você ficar de lengalenga, venha, vamos atrás da equipe de reconhecimento!

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A equipe de reconhecimento, como a nomeação já deixava claro, servia para explorar os arredores dos novos territórios conquistados. Eles buscavam comida, roupas, armamento, água, qualquer coisa que pudesse auxiliar a sobrevivência do grupo que protegiam. Suas missões eram arriscadas, pois muitas vezes – devido à falta de conhecimento do local – “roubavam” de reservas das comunidades residentes. Verdadeiras guerras aconteciam por causa daqueles mal-entendidos. Ninguém queria ouvir justificativas. O egoísmo reinava. E a desconfiança também.

Os seres humanos haviam se tornado animais semi-irracionais. Tch, e pensar que naquela altura do campeonato, algumas pessoas ainda achavam que os zumbis eram o maior problema. Idiotas!


— Shhh. — A ruiva levou o dedo indicador aos lábios, como se a mão em sua boca não fosse o suficiente para calá-lo. Estavam escondidos atrás de um carro. Há poucos passos, um grupo de zumbis se amontoava em torno de uma antiga loja de conveniência. — Você tem munição suficiente para acabar com os zumbis que estão na entrada? Acho que tem alguém ali dentro. — O adolescente arqueou a sobrancelha. Sexto sentido feminino, talvez? A adulta bufou como se pudesse ler seus pensamentos. — Você já viu algo chamar a atenção de zumbis que não fosse um cadáver ou um ser humano vivo? É óbvio que tem alguém ali. Respirando ou não, ainda não sei. E você não respondeu, tem munição suficiente? — Justificou, retirando a mão da boca do moreno.

— Tenho.

— Ótimo, garoto. — Ela deu olhou por sobre o próprio ombro. — No três, você começa a atirar.

A contagem foi feita por dedos levantados. Yuuichirou respirou fundo e atirou em todas as aberrações que pôde daquela distância. Aproveitando-se da oportunidade, Mito saiu do esconderijo, facão na mão, atacando os mortos-vivos restantes. O menor seguia-a de perto, defendendo-a quando possível. Adrenalina corria em suas veias. Quase podia escutar sua própria pulsação. Mal conseguia perceber o que fazia, seu corpo ligava o piloto automático. Não importa quantas vezes já fizera a mesma coisa, sempre era a mesma sensação de medo, apreensão e nervosismo.

Conseguiram abrir a porta da loja com certa dificuldade, haviam estantes bloqueando o caminho. Não restava dúvidas que seja quem for que estivesse ali, estava vivo. Através de olhares e gestos, ele entendeu que cada um iria para um lado do estabelecimento, que não era para baixar a guarda, procure o indivíduo que se escondia ali, e, acima de tudo, procurar mantimentos. O primeiro item, já tinha previsto, não precisava de ninguém para lembra-lo do segundo item (não após os acontecimentos de mais cedo e... Mika), o três ia aparecer cedo ou tarde, então, dedicara-se totalmente ao item quatro.

— AAAAAAAAAH! — Antes que pudesse desviar, foi acertado em cheio por um... que porra era aquela? Abaixou-se, pegando do chão o objeto estranho. Ou nem tanto. Err, era um... olha, parecia um demônio arqueiro de pelúcia (?!). Jogou “a coisa” na direção que ela veio, atingindo (provavelmente) a pessoa que havia jogado “a coisa” em primeiro lugar. — A-ai!

— Quem está aí? — A pergunta era tão clichê que ele se estapeou mentalmente. Houve uma movimentação atrás das prateleiras a sua esquerda antes que um garoto de olhos verde-musgo e cabelos castanhos bagunçados aparecesse. O corpo todo mostrava claros sinais de insegurança e desconforto. Em torno da sua idade, o jovem abraçava firmemente o bichinho de pelúcia. O moreno perguntou-se como demônios alguém de aparência tão frágil conseguiu sobreviver tanto tempo.

— Hmm, eer, vo-você não vai atirar em mim, vai?

— Quê? Que raio de pergunta é essa? É óbvio que não vou atirar em você!

— Desculpa, é que você tá apontando um revolver pra mim. — Explicou de maneira cautelosa — Isso me deixa meio nervoso. — Só então Amane percebeu que realmente estava apontando uma arma de fogo para o desconhecido. Vendo-o totalmente desarmado, guardou o revolver no coldre.

— Yuuichirou, achou alguma coisa? — Mito aproximou-se pela direita. O adolescente não respondeu, nem precisava, ela iria ver “sua descoberta” em menos de dez segundos. — Ah, não é que eu estava certa? Olá, menino! Você passou uns maus bocados com tantos zumbis na porta, hein?!

— O-obrigado por me salvarem.

— Qual o seu nome? — A mulher de olhos lavanda analisou o moço da mesma forma que seu colega de equipe havia analisado. Como ele havia sobrevivido parecendo tão... Bom, nada de julgar um livro pela capa.

— Meu nome é Saotome Yoichi, prazer.

— Mito Junjo e Amane Yuuichirou. Feita as apresentações, vamos as perguntas importantes. Você pertence a algum grupo da região?

— Não.

— Sobreviveu todo esse tempo sozinho?

— N-não. — Yoichi mordeu o lábio. — Minha irmã mais velha estava comigo, mas... Mas... E-ela...

— Tudo bem, se não quiser nos dizer. — Não era preciso ser um gênio para descobrir que havia acontecido com a irmã de Yoichi a mesma coisa que acontecera com Mika. Exceto, talvez, que a culpa não fosse do jovem de cabelos castanhos. Sentiu o arder familiar de lágrimas nascendo, deu as costas para Saotome. — Pelo visto, não tem nada aqui que a gente possa aproveitar. Vamos procurar o resto da equipe, Mito-san.
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—Yuu-chan... — A mão de Mikaela envolta na sua estava quente e suada. Ou talvez fosse a dele que estivesse, não tinha certeza. Os tacos de madeira em suas mãos livres eram apertados firmemente. Os dois garotos de doze anos estavam aterrorizados, trêmulos e, mesmo assim, procuravam confortar um ao outro, fingindo terem esperanças de que sobreviveriam àquilo. Zumbis se aproximavam de todos os lados, deixando-os encurralados. —Yuu-chan, nós somos uma família, certo?

— Si-sim. — Sua vontade era questionar o loiro, pois não entendia a razão de querer uma confirmação daquilo que ele já sabia justo naquela hora. Entretanto, preferiu ser honesto, simples. Aquele “sim” poderia ser sua última palavra. Assim como o “sim” das outras seis crianças que haviam sido devoradas poucos minutos antes. Se seus olhos já não estivessem ardendo, secos sem lágrimas, ele teria voltado a chorar.

— Eu te amo, Yuu-chan. — Seu amigo sussurrou, apertando com força sua mão. — Eu te amo, Yuu-chan. Como família, como amigo, como... tudo. Desde sempre. E-eu sei que parece estanho e tudo mais, um garoto gostar de outro desse jeito, é que... É que meu sonho era fugir daqui, achar um local seguro e... E assim poderíamos viver como uma família feliz, sabe? Eu, você... O-os outros... — A voz do outro estava embargada. — Tudo bem se não sentir o mesmo que eu. Digo, amar dessa forma...

— Para de bobagem, Mika! — O moreno rosnou. — Você acha mesmo que eu não te amo? — E num impulso, juntou seus lábios com os de Mikaela. Um beijo casto, suave, um breve escovar de lábios. O seu primeiro e único beijo com seu primeiro e único amigo. — Eu te amo. — Abraçaram-se, murmurando sem parar a mesma frase de três palavras.

O momento doce se tornou azedo logo depois. Yuuichirou sentiu mãos frias sobre si, arranhando seus braços, puxando seus cabelos. O fedor dos mortos-vivos quase o fez vomitar. Mikaela já estava em pé (quando eles romperam o abraço?), taco de baseball na mão, golpeando desesperadamente os malditos que se aproximavam. O menino de olhos verde-esmeralda chutou a cabeça de uma das aberrações, conseguindo se desvencilhar do aperto. Costas-a-costas, lutariam juntos até o fim.

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Mas foi até o fim de apenas um deles.

Guren escutou os gritos vindo do armazém, correu até lá com Shigure e Sayuri, salvando Yuuichirou. E somente Yuuichirou. As memórias do adolescente depois do beijo e antes do resgate eram turvas, nebulosas, confusas. Ele só conseguia se lembrar daqueles belos olhos azuis encarando-o enquanto uma massa de zumbis caia por cima de seu corpo, mordendo-o por toda parte.

— Yuu-kun, você está bem? — Yoichi perguntou, tocando seu ombro. O integrante da equipe de reconhecimento estranhou o apelido íntimo (que, de certa forma, lembra-lhe Mika). — Você tem olhado para o nada durante um bom tempo.

— Essa cidade me traz algumas lembranças desagradáveis. — Deu de ombros, fingindo não estar afetado por flashback doloroso. Lembrar da sua inutilidade, do seu egoísmo, da sua fraqueza, aliás, o próprio ato de respirar o deixava de mal humor em Shibuya. Ele deveria ter sido mais útil, mais altruísta, mais forte, tch, de todas as coisas que ele deveria ter sido naquele dia, a maior delas era morto.

— Se você diz, Yuu-kun. — O outro não parecia convencido, mas deixou o assunto morrer ali. Sabia que se insistisse, irritaria seu salvador. Afastou-se, voltando para seu lugar entre as duas meninas da equipe de reconhecimento, Hiiragi Shinoa e Sangu Mitsuba. Após Mito e Yuuichirou resgatarem o jovem Saotome dos zumbis, eles o levaram para o acampamento, apresentaram todos os membros, deram-no comida, uma nova roupa e trabalho a fazer, sinais de que havia sido aceito na comunidade. Ainda que estivesse inseguro e desconfiado, vinha aceitando tudo de bom grado.

— Relaxe, novato. Você tá muito tenso. Ninguém aqui vai te assar na fogueira, ok? — A loira pôs uma mão em seu ombro. — Não tem como ficar pior.
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Uma das mais certas e inevitáveis leis do universo é: se uma situação é ruim, ela sempre pode ficar pior. Às vezes até demais. Principalmente se você está em um apocalipse zumbi. Em uma cidade infestada por eles. Fazendo patrulha a noite. Com dois idiotas. E de quebra, com fome. E frio. Karma é uma coisa filha da puta. Minha vida é uma bosta, Yuuichirou concluiu, uma grande e terrível bosta.

Já haviam se passado sete semanas desde a sua volta à Shibuya. Seu humor só piorava, assim como os pesadelos. Decidido a se cansar até desmaiar de exaustão, exagerava nos trabalhos manuais do acampamento, treinava até que alguém dissesse “chega”, além de aceitar a tarefa de passar a noite em vigília. Quatro dias seguidos. Óbvio que ele dormira umas duas ou duas horas e meia durante a tarde, nos intervalos (afinal ninguém é de ferro), felizmente sem sonhos ruins. Nas primeiras cinco semanas deu tudo certo, até que ele desmaiou no meio de uma missão. Guren quase o pendurou de cabeça para baixo em um arranha-céu.

Foda-se, pelo menos ele estava dormindo sem acordar gritando, chorando ou se debatendo. Isto é, até agora, pois sentia-se entre um filme de terror e um pesadelo medonho. Tinha vontade de gritar, chorar e se debater. Quem sabe até beliscar o próprio braço para ver se não estava tendo alucinações. Não, impossível, seus olhos estavam bem abertos, nada acontecia fora do normal em um mundo tomado por mortos-vivos. Nenhum vampiro, nenhum monstro gigante, nenhum demônio. Estava lúcido e definitivamente acordado.

Bom, saindo de seus devaneios, voltando a situação de vinte minutos atrás, Kimizuki e Shinoa lidavam com um grupo de zumbis enquanto ele recolhia todo tipo de medicamento, esparadrapo, pomada e gaze das prateleiras da farmácia que descobriram nas redondezas do acampamento. Não era sempre que conseguiam artigos para ferimentos, qualquer que achassem era considerado milagre. Não poderiam deixar a oportunidade passar. No entanto, o local estava cheio de aberrações, dificultando o trabalho.

“Obedecendo” a Shinoa, escapou pela porta dos fundos. Confiava em seus amigos, sabia que iam escapar de lá de um jeito ou de outro. Conseguiu andar um bom tempo sem encontrar qualquer morto-vivo. E desejou ter continuado assim até chegar ao acampamento. Ao longe, avistou alguns se aproximando, passos lentos, barulhos estranhos, odor nojento. Olhou para as duas sacolas cheias, percebendo que teria que larga-las para poder usar seu revolver. Tch, merda.

Sua melhor alternativa era se esconder e esperar que os zumbis passassem. Porém, parecia que a sorte definitivamente não estava contente com ele naquela noite. Olhou em volta, não conseguindo visualizar nenhum esconderijo “utilizável”. Estava no centro de uma pracinha, havia um playgroud destruído a esquerda, um velho, minúsculo e enferrujado carro perto dele, nada mais. Perguntou-se vagamente se arrombar o carro faria disparar o alarme. Se disparasse, chamaria muita atenção. Esquece, não é bom se arriscar. Melhor prevenir do que remediar.

Correu até o playgroud, subindo as deterioradas escadas de madeira, escondendo-se dentro da casinha. Até que não era tão ruim (se ignorasse a quantidade de cupins ali). Observou os mortos-vivos se arrastarem. Uns mais medonhos do que outros. Sentiu uma imensa vontade de vomitar. Aquelas criaturas nojentas deveriam estar enterradas a sete palmos do chão, para começo de conversa. Quis desviar o olhar, entretanto, no último segundo, avistou alguém familiar. Extrema e dolorosamente familiar.

O moreno arrepiou-se, chocado. Congelou no local, levando a mão à boca para reter um soluço (na verdade, um grito). Tremia de cima a baixo. Lágrimas que não pôde controlar, escorreram por suas bochechas. O coração pulsava tão forte que aparentava desejar sair pela garganta. Não queria acreditar nos próprios olhos. No meio de tantas aberrações, uma criança, um menino, chamou-lhe a atenção.

A criança-zumbi possuía sujos cabelos loiros encaracolados, olhos azuis opacos, pele ressacada e podre. Esfregou os olhos para não ficar com a vista embaçada. Não pode ser!, repetia sem parar, não pode ser! A roupa branca com preto já não era mais branca com preto, estava amarelada, esfarrapada, cheia de manchas de sangue, lama, poeira. Faltava um braço no pequeno, havia um buraco em seu peito. Aquela aparência monstruosa não apagou a essência do humano que aquele menino costumava ser.

— Mika...! — Abraçou os joelhos, deixando-se chorar. — Mika...! Não, não, não...!

16. Era uma vez.
Prompt: Yuuichirou e Mikaela no jardim de infância – UA

— E eles viveram felizes para sempre! — Shinya fechou o grosso livro de contos infantis. Seus alunos pareciam tristes com o fim da “hora da história”, uma invenção sua para amenizar os humores tempestuosos dos pequenos que acabou virando rotina por pura diversão. Sentados em uma roda, o jovem professor podia ver no rosto de cada criança um pedido silencioso por mais narrativas. Suspirou. —Tantas carinhas tristes... Ei, vocês não gostaram da história? — Fez bico, fingindo estar chateado. — Se for assim, também não conto mais nenhuma!

— NÃO! — Gritaram em uníssono, interrompendo a fala do adulto. Resistiu ao impulso de rir. E de fazer aaaaaanw. Era muita fofura para uma só sala. Isto é, quando estavam assim, quietinhos, obedientes. Cuidar de um jardim de infância não é tarefa fácil. Principalmente quando se trata daquelas crianças. Apesar da pouca idade, cada um ali possuía uma personalidade forte. No bom e no mal sentido.

— Relaxem, estou brincando. Sei que adoram escutar as historinhas, mas vocês conhecem as regras, só uma por dia! — Sorriu apologético, colocando o livro de lado. — Bom, não fiquem tristes, ainda temos muitas coisas legais para fazer hoje!

— Maa eu quero outa história! — Um garotinho de cabelos negros resmungou, cruzando os braços. — Conta só mais uma, Shiinya-sensei, pur favô! — O homem de cabelos cor-de-platina não se surpreendeu com a objeção. Na verdade, até esperava. Amane Yuuichirou não era conhecido por sua paciência e compreensão, muito pelo contrário. Era óbvio que ele seria o primeiro a reclamar.

— Tombém quero. — Mikaela levantou a mão, sorrindo. Claro, também esperava aquele apoio. Os dois eram grudados um no outro. Uma vez, literalmente. Balançou a cabeça para se livrar das lembranças engraçadas. Ele nunca mais deixou cola de isopor perto dos pestinhas depois do “acidente”. Guren, primo de Yuuichirou, havia ficado furioso. Daí, minha tia me pede para buscar o pirralho na creche e eu encontro o maldito pirralho colado em outro pirralho! Puta merda, Shinya!, quase podia ver o homem de pupilas roxas massageando as têmporas, Cara, eu não mereço isso! Eu não mereço isso! Já Ferid, padrinho de Mikaela, caiu na gargalhada ao ver a cena.

— Eu tabém! — Shinoa se pronunciou, passando um braço em volta dos ombros de Mitsuba. — Mitsu-chan quer tabém! Mitsu-chan quer tabém!

— E eu. — Kimizuki murmurou, mexendo em seus cadarços. — Outra históra seria legal. — René assentiu, concordando silenciosamente com o garoto de óculos. E Lacus concordou com o amigo. Chess Belle e Horn repetiram o “seria legal”.

— Shinya-sensei... — O menino de cabelos castanhos puxou sua manga, chamando sua atenção. — Shinya-sensei...

— O que foi, Yoichi-kun?

— Quelo ota histólia tombém. — Gemeu, escondendo o rosto entre as mãos. Oh, não, até mesmo Yoichi?! Acabaria tendo que ceder antes que eles decidissem revirar a sal-... Ou não. Na verdade, tanta insistência poderia ser usada a seu favor. Acariciou os fios cor-de-chocolate, sorrindo de maneira doce. O menor retribuiu o sorriso. Céus, seu afilhado é uma coisinha graciosa.

— Tudo bem, pessoal, vocês venceram! — Anunciou, chamando a atenção de todos. — Contarei outra história! — As crianças começaram a bater palmas, animadas. O primo de Guren sorriu com presunção, satisfeito com os frutos da rebelião que “liderou”. — Voltem aos seus lugares! Essa história vai ser especial, então, por isso, necessito da atenção de todos!

— O lhivo. — Mitsuba apontou. — Sensei, o lhivo. — De fato, o professor não havia pego o livro que colocara de lado. Vários pares de olhos voltaram-se para o professor, confusos. Não entendiam como o adulto poderia contar-lhes uma história sem o livro próprio para aquilo.

— Nós não vamos precisar do livro, gente. — Explicou. Viu Yuuichirou abrir a boca para contestar, foi rápido em complementar. — Nós vamos montar nossa própria história! Com nossos próprios personagens! E um final feliz bem original!

— Eu quero ser a pincesa! — A menina de cabelos cor-de-lavanda jogou os braços no ar, balançando. — E a Mitsu-chan pode ser o dagão!

— Eu não vou ser dagão! — A loira se levantou, inchando as bochechas. — Você não vai ser plincesa nenhuma!

— Eu sou o dagrão! — Lacus falou alto, apontando para si mesmo. — Eu sou o dagrão! Me deixa ser o dagrão, sensei! Eu quero ser! Eu quero ser!

— Shhhhh, Lacu. — René resmungou. — Shhhh. Você é chato.

— Hmmmm, estava pensando em algo diferente. — Cortou a algazarra antes que todos começassem a participar. Saotome franziu o cenho.

— Difelente, sensei?

— Uhum, Yoichi-kun. Di-fe-ren-te. Nada de princesas ou dragões. — Encarou os alunos em pé. Mudou de tom, usando um autoritário. — Sentem-se novamente. Se continuarem com essa bagunça, desisto de contar. Todo mundo sabe que eu não gosto de teimosia. — Houve um coro de barulhinhos de decepção junto com pedidos de desculpas. — Se vocês pudessem ser um animal, qual seria? Desenhem nas folhas que darei à vocês. — Levantou-se da roda, indo até o armário onde guardava os materiais. Retirou folhas A4, giz de cera, lápis de cor, deixando a tinta guache lá dentro (a última coisa que queria era repetir o episódio da guerra de tinta). Distribuiu tudo para os pequenos e deixou-os livres para desenhar. — Vocês têm dez minutos para desenhar. E só vale um animal, ok? É importante para a história.

Fiel a sua palavra, dez minutos depois, recolheu os desenhos. Mikaela – Gato; Yuuichirou – Cachorro; Kimizuki – Texugo; Yoichi – Coelho; Mitsuba – Hamster; Shinoa – Porco-espinho; Lacus Esquilo; René – Rato; Chess Belle – Pavão; Horn – Aranha. Riu baixinho, pensando em como cada um desenhou um animal que os representava. De certa forma. Gatos são travessos; Cachorros são teimosos; Texugos são irritadinhos; Coelhos são fofos; Hamsters são tímidos; Porco-espinhos são esquisitinhos de um jeito adorável; Esquilos são comilões; Ratos... Ratos são... na deles; Pavões são bonitos e aranhas são... Por que Horn havia desenhado uma aranha?

— Os desenhos são tão fofos! — Elogiou, abraçando as folhas (com cuidado para não amassá-las). — Vou explicar como a história será, tudo bem? Prestem muita atenção! Vocês serão os animais que desenharam. E os animais serão os personagens. Cada um tem direito a adicionar alguma coisa na história, porém, só na sua vez. Eu vou começar, depois é o Yoichi-kun e assim por diante até que todo mundo da roda tenha falado. Fui claro? — As crianças fizeram coro, um SIIIIIIIM bem longo. — Era uma vez, num lugar muito distante...

— Um reinô golvelnado por.. por um cacholo! E um cuelhio! Eles elam muito felizes! Viviam juntinhos num castelo. — Oh-oh. Discretamente, o adulto olhou para Mikaela, que, assim como esperado, não pareceu gostar nenhum pouco. Ele havia agarrado o braço de Yuuichirou, aproximando o moreno de si. Um dos medos secretos de Shinya girava em torno da dupla. Se aquele ciúme continuasse crescendo na medida em que estava, na adolescência, o primo de Guren estaria lidando com – muito possivelmente – namorado possessivo e dependente. Estremeceu, lembrando de um certo homem de olhos vermelhos e cabelos negros. (Não, aquele homem não poderia ser descrito como dependente. Dependente, não, controlador, manipulador, sim.). Por sorte, a próxima criança a falar era Shinoa. Esperava que a menina não falasse nada que pudesse... Colocar mais lenha na fogueira.


— Só que um dia, um texugo malzão robou o cuelho! — Ela fez uma pausa. — A mando da pincesa poco-espinho do mal!

— A pricesa porco-espin do mal estava in guerra com a raninha aranha! — A loira de olhos vermelhos nem esperou a outra garota terminar de falar. — E o coelhinho tinha poderes mágicos!

— Rainha aranha tinha um grande e fortão equilo como guerrêru. E ele não gotou do coelho. Ningué pode ser mar puderoso que ele! — O garoto de cabelos roxos não gostava de seu afilhado, nem seu afilhado gostava dele.

— No reno do rei au-au, uma hamster robô-gigate defedia o reno com bombas! Boooom! Boooom! — Shinoa riu, colocando os polegares para cima. Ela comentou algo como “apovado pela pincesa poco-espinho!”.

— Com o cueio mágico longe, o rei au-au ficou triste e sozinho, até que um gato de um lugar supê-longe visita ele! Eles viram amiguinho e depois eles se casam! — Dessa vez, foi a vez de Yoichi parecer insatisfeito com o rumo da história. Mikaela sorriu com orgulho.

— Cai uma chuva no mei do casamento e eles naum casam! A rainia aranha e a rainia pavão aparecem e vencem o rei au-au! — Chess Belle brandiu o lápis de cor amarelo como uma espada. — Ganhamos!

— Epa! Não! Não e não! — O moreno de olhos verde-esmeralda levantou o lápis de cor preto. — O rei tinha um poder ulta-sequetro! E ele pendeu a rainha aranha e a rainha pavaum. E casou com o gato e com o coelhinho tombé!

— O texugo já tava casado com o coelho mágico. — Kimizuki ajeitou os óculos. — Ma-mar tudô bem. Todo mundo casou e foi... fo-foi feliz pra sempê. — Ele pareceu nervoso tentando terminar a frase.

— Todo mundo morreu no final. O rato no porão do catelo do rei au-au tabéim. — René parecia sonolento, entediado. Shinya suspirou, aquele menino era tão sombrio...

Fim da Parte IV


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Notas finais do capítulo

Spoiler: Os próximos drabbles (que dependem da suas opiniões quanto a esse capítulo e a continuação da coleção) são ultra-sombrios. JIRJ43OUEHWOIUNHRIUHWDISA Além disso, já ando maquinando criar uma coleção de drabbles e oneshots de vários ships de Owari no Seraph. Yaoi e Yuri. Heteros ainda estão em julgamento (e procura. Mano, tem ship hétero lá?).



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