Me apaixonei pelo lobo. O lobo que me ronda todos os dias com os olhos fixos, desejando minha carne entre seus dentes, meu sangue escorrendo por sua língua. Olhos azuis que me perseguem pacificamente enquanto eu corro apavorada por entre essa floresta negra. Ele deseja se deleitar do meu cadáver, sujar seu focinho em meus fluidos e estraçalhar meus ossos com seu maxilar. Sonha em poder devorar meu coração, em sentir minha vida esvaecer e escutar meus gritos de desespero.

Uivando para a lua, sua amante. Uma serenata antes de sair para caçar.

As batidas do meu coração podem ecoar por suas orelhas, o cheiro do meu medo provoca suas narinas. Posso sentir que ele está chegando mais perto, que está salivando, que suas patas batem na terra fofa. O lobo não te pressa, não tem fome. Apenas a paciência e seus mórbidos desejos guiam seus extintos. Ele caminha até mim, seus olhos azuis estão serenos, suas patas se movem lentamente e nenhum som lhe escapa da bocarra cheia de dentes. Vai me atacar.

Vai me atacar.

Meu sangue vai sujar seu pelo cinza enquanto suas garras rasgam minha pele. Os gritos vão preencher a noite vazia, a dor vai tomar conta da minha mente e eu vou morrer.

Eu vou morrer.

Mas a única coisa que eu consigo pensar nesse momento é o quanto o lobo é belo, que seus olhos calmos são da minha cor favorita, que seu sorriso é assustador, mas muito seduzente. E por alguns milésimos de segundos, pensamentos me distraem do medo e me dizem que seria um prazer morrer agora, ser assassinada por ele é uma tragédia muito bela. Nos meus últimos segundos, minhas pernas param de correr e meu corpo me vira para a direção dele.

Nos meus últimos segundos, resolvo focar minha atenção em seus olhos azuis. Olhos tão humanos, tão límpidos, um azul que me lembra do céu sem nuvens, me trazem conforto, me trazem paz. Encarei o animal, que estava parado, esperando o momento certo para atacar, e disse em alto e bom som:

O que está esperando?

Acabe com isso de uma vez por todas.