Lara acordou assim que o dia amanheceu. Tinha costume de acordar cedo e ali não iria ser diferente. Ficou deitada por um momento até ouvir o barulho que vinha da cozinha. Levantou-se e caminhou até lá. Celine já havia acordado e estava encostada na pia, segurava uma xícara e lia alguma coisa no celular.

Lara ficou observando a mulher por um momento. Ela era muito bonita. Tinha a pele morena, bem mais clara que a dela, cabelos castanhos e cacheados que passavam dos ombros. Estava usando o mesmo vestido azul da véspera, que tinha o nome da ONG bordado na altura do peito. Ainda estava descalça mas aquilo não tirava a graciosidade dela.

– Ei! Bom dia! – Despertou quando ouviu a voz da assistente social – Venha comer. – A mulher sorria pra ela e era impossível não obedecer. – Hoje eu preciso que você me acompanhe o dia todo. Vai ficar cansada mas eu prometo que vou compensar a noite, tudo bem? – Ao ouviras palavras dela, Lara balançou a cabeça positivamente e começou a comer.

– Ótimo! – Celine sorriu e depositou a xícara na pia. – Vou terminar de arrumar minhas coisas e você tome banho quando terminar, ta? – Dizendo isso ela saiu e foi terminar de se arrumar. Lara terminou de comer e tomou um banho rápido. Se arrumou e ficou sentada no sofá esperando por Celine. A mulher logo apareceu e foi direto para a porta – Vamos. – Chamou e as duas saíram.

Naquele dia elas não foram para o escritório onde Celine trabalhava, foram direto para um teatro que ficava um pouco distante. – Lara – Celine começou a falar assim que chegaram – Estamos aqui porque hoje é um dia especial. – O lugar estava cheio e elas caminhavam por entre as pessoas. – Hoje é o dia nacional da adoção. Vamos passar o dia inteiro aqui. – Era possível perceber a alegria que Celine sentia ao falar.

Ela avistou Sara e foi até ela. Sua amiga estava com o filho, Mateo, assim como os outros colegas de trabalho tinham levado seus filhos. Ela apresentou Sara e Lara e então foram procurar um lugar para se sentar. Enquanto caminhavam ela voltou a explicar – Vamos assistir algumas palestras e ouvir algumas histórias. Por ser um dia especial, você pode perceber que muitas pessoas trouxeram seus filhos e muitos são frutos da adoção. – Encontraram três cadeiras próximas e se sentaram.

Celine e Sara começaram a conversar assim que se sentaram e Lara desviou sua atenção observando as pessoas. Realmente todos estavam com os filhos e pareciam felizes. O lugar estava cheio de cartazes falando sobre adoção. Logo as palestras tiveram início. Assim que as pessoas começaram a falar, Lara teve sua atenção tomada mais uma vez.

Elas falavam sobre adoção e sobre como aquele dia era importante. Contavam suas histórias, sobre como tinham conhecido seus filhos e o quanto os amavam. Ao final da última palestra ela se sentiu tocada. Era a história de uma menina negra, como ela, e que havia sido adotada na adolescência. Lara sentiu vontade de chorar mas se segurou. Queria que aquilo acontecesse com ela mas achava que não tinha mais chances.

Despertou quando Celine tocou seu braço e a chamou para que saíssem dali. Foram para um espaço mais amplo que também fazia parte do teatro. Ao chegar lá, muitas pessoas vieram falar com Celine assim que a viram entrar. Eram famílias que ela havia ajudado com seu trabalho. Eles a agradeciam, tiravam fotos e contavam como estavam suas vidas. Lara se sentou e ficou observando de longe.

Percebeu que Celine se emocionara em alguns momentos e aquilo a intrigara. Era realmente tão boa quanto parecia. Se não fosse, não teria me ajudado. Pensou e continuou observando. As horas foram passando rápido mas ela se sentiu entretida o tempo todo. Já no fim do dia, uma exposição de pintura chamou sua atenção. Eram pinturas feitas por crianças que haviam sido adotadas e relatavam sua percepção da nova família.

Todos os desenhos eram alegres e cheios de amor. Aquilo mexeu com ela. Quando criança ela também tinha feito vários desenhos que idealizavam a família que ela sonhava em ter. Ver aquilo foi a faísca que faltava para que ela explodisse. As lágrimas molharam seu rosto e ela não fez nada para parar. Chorava copiosamente e abraçava o corpo. Por que ela não tinha tido aquela sorte?

Celine, que já estava procurando por ela, a encontrou naquele momento e sentiu o coração doer ao ver a cena. – Lara! – Ela chamou e correu até a menina, puxando-a e envolvendo-a em seus braços. – Não precisa chorar meu bem. Eu estou aqui com você. – Falava baixinho e afagava seus cabelos. Lara não a afastou, pelo contrário, agarrou-se a ela e se deixou soluçar. Ficaram ali por vários minutos até que a menina começou a se acalmar.

Celine levantou carinhosamente a cabeça da menina e acariciou seu rosto – Você está bem? – Falava em um tom tranquilo e cheio de afeto. Lara balançou a cabeça positivamente e enxugou o rosto. Celine suspirou e continuou a falar no mesmo tom – Eu estou aqui por você, Lara. Sempre vou estar. Quero que se sinta segura comigo. – Continuava a acariciar seu rosto enquanto falava.

A menina ouvia as palavras dela e então, em um momento cheio de coragem, ela falou – Você é muito boa. Muito boa. – Enterrou a cabeça no ombro da mulher e soluçou baixinho. A expressão no rosto de Celine era um misto de surpresa e felicidade. Lara tinha falado com ela. Não só tinha falado como também tinha elogiado. Aquilo era maravilhoso! Celine a abraçou novamente e sussurrou – Vamos pra casa. – Dizendo isso ela a conduziu pra fora do teatro e chamou um táxi.

Celine só soltou Lara quando as duas entraram em casa. A menina já havia parado de chorar e se sentou no sofá, Celine sentou-se ao seu lado em seguida. – Está mais calma? – Perguntou voltando a abraça-la.

– Sim. – Lara respondeu e não rejeitou o abraço. De alguma forma aquilo a fazia bem.

– Sei que viver tudo isso hoje mexeu com você. Volto a afirmar tudo que falei no teatro. Estarei sempre aqui por você, Lara. – Afagou seus cabelos novamente e sorriu.

– Obrigado. Ninguém nunca disse isso pra mim. – Ela abaixou a cabeça ao falar.

– Já não pode mais dizer isso. – A mulher riu ao dizer aquelas palavras e Lara a acompanhou.

– Está com fome? – Perguntou e foi se levantando e indo para a cozinha. – Vou fazer macarronada. Você gosta? – Procurava as coisas enquanto falava.

– Sim. Eu vou tomar banho. – Lara respondeu e foi para dentro.

Celine começou a cozinhar e depois tomou banho. Estava cansada mas estava feliz. Tinha sido um dia especial de todas as maneiras e aquilo a fazia se sentir bem. Voltou para a cozinha e viu que a menina havia arrumado a mesa e estava sentada esperando por ela. A mulher sorriu e então as duas se serviram. Comeram e conversaram sobre as palestras, os depoimentos. Eram histórias lindas.

Depois de arrumarem a mesa, Celine ajudou Lara a se deitar. – Durma bem. – Falou e depositou um beijo na testa da menina. Lara sorriu – Durma bem também. – Então se virou e fechou os olhos. Sorrindo, Celine saiu do quarto e se deitou. Ela estava falando. Lara estava falando com ela! O gelo já não existia mais e agora elas podiam prosseguir naquela jornada.

Após um dia de histórias tão bonitas, elas não sabiam que estavam construindo sua própria história e que seria tão bonita quanto as que tinham ouvido.

Feliz Dia Nacional da Adoção!

Celine Dion - Miracle