Death And All His Friends escrita por fukkk


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Segue mais um capítulo. Espero que gostem!



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Eu tinha me esquecido como a primavera podia ser tão bonita, com as suas árvores cheias, a grama verde, o ar fresco e puro e o céu azul e limpo. Nos vários anos que troquei o dia pela noite, eu sentia falta do sol e do céu azul, isso de alguma forma me mostrava que estava viva. E não estava sendo diferente agora. Mesmo não estando viva como pessoas normais estão, eu me sentia assim; viva. Minhas mãos tocavam as copas das árvores que quase encostavam no chão, meus pés descalços roçavam na grama macia e meu corpo se enchia de êxtase. Nos últimos 10 anos, esta era a primeira vez que me sentia livre. Como uma borboleta que acabara de sair do casulo.

Fiquei mais tempo que o esperado fora de casa, pois aproveitei cada instante que pude ao ar livre e principalmente, adorei minha experiência no lago. Minhas roupas estavam quase secas quando entrei na casa e quando o sr. Ludville me viu logo ficou preocupado com o meu estado: "Minha senhora, cuidado! Desse jeito pode pegar um resfriado, ou algo pior. Deus me livre!", com esta preocupação inútil não aguentei e soltei o riso, pois eu nunca pegaria um resfriado, nem ficaria doente e muito menos morreria. Mas eu sabia que tinha que o tranquilizar de alguma forma: "Não se preocupe comigo, já sou bem grandinha. Irei ao meu quarto tomar um banho e me vestir com roupas sequinhas", o mordomo de repente se avermelhou em um sinal de constrangimento por ter mostrado tamanha preocupação e disse: "Você tem razão, minha senhora. A senhora já é demasiada adulta para cuidar de si mesma. Perdoe-me pela minha insolência", se o pobre coitado soubesse que tal preocupação boba me fez feliz, ele não teria se constrangido. "Oh, imagina. Toda preocupação é bem-vinda, pois isso é um imenso sinal de respeito", eu disse. Antes de ir para o andar superior, lhe perguntei: "Onde o Senhor se encontra agora?" e o mordomo respondeu: "Na biblioteca, senhora. Costuma passar as tardes lá, acredito que seja seu refúgio". E assim, fui tomar meu banho na luxuosa banheira de meu quarto.

Tinha colocado uma de minhas roupas novas, um vestido verde longo e elegante que tinha um profundo decote nas costas. Podia ser um pouco exagerado para alguém que não ia a um grande evento, mas todo o meu armário continha peças assim, elegantes e distintas. Não havia uma peça simples sequer. Fui até minha penteadeira afim de dar um jeito nas minhas longas madeixas e me surpreendi com o que tinha lá; muitos produtos de beleza. Maquiagens, perfumes, grampos de cabelo, cremes e tudo o mais. Eu me perguntei que horas que William conseguiu comprar tudo isto para mim, já que tudo estava novo em folha. Rose não era de passar maquiagem e de se arrumar muito, pois tal vaidade a atrapalhava no seu dever e eram totalmente desnecessárias, já que uma guardiã não podia chamar a atenção. Mas Margot... bem, ela estava muito animada em poder se maquiar e arrumar seu cabelo. Como o vestido já era chamativo por si só, passei um rímel nos olhos (que não precisam de muito produção, pois já eram estonteantes naturais) e um batom vermelho nos lábios carnudos. O cabelo, prendi-o em um coque meio solto. Perfeito, eu não precisava de mais.

Estava quase escurecendo quando decidi ir ao encontro de William na biblioteca. Bati na porta e esperei ser atendida: "Entre", ele disse. Quando entrei, me surpreendi com o tamanho do cômodo. Quatro estantes enormes e cheias de livros emolduravam as paredes, um painel ao lado da janela guardava objetos antigos e preciosos, uma escrivaninha ficava de frente à janela e duas poltronas e um sofá ficavam no meio da sala. Mas uma coisa me prendeu mais: os quadros. É claro que toda a casa continha inúmeros quadros valiosos, mas estes em especial eram melhores. Eles eram retratos, e estes retratos, com toda a certeza, era da família de William. Olhei em sua direção, que estava largado em uma das poltronas, e ele assentiu com a cabeça, já sabendo que eu queria vê-los mais de perto. Os retratos ficavam no fundo do cômodo, meio escondidos, como tesouros preciosos costumam ficar. Havia quatro quadros e quase todos eram muito antigos e continham pessoas imponentes e poderosas, como um homem montado em seu cavalo e uma mulher segurando um crucifixo. Mas dois retratos me chamaram mais a atenção, um era de uma mulher loura, elegante e muito bonita com um capelo à moda francesa (por isso percebi que o retrato podia ser datado do século XVI); mas o outro, o outro era bem mais novo, talvez do século XIX, e o homem elegante retratado era William. Agora pude entender os motivos pelos quais os quadros estavam escondidos: eles eram de pessoas muito especiais para ele e que tiveram participação em sua vida. E é claro, ele não queria ser reconhecido pelos empregados no quadro. "Está curiosa para saber quem eles eram? Os rostos nas pinturas?", disse William ainda distante e largado em sua poltrona. "Sim", eu disse, "eu tenho quase certeza de que estes são seus familiares. E este aqui.." apontei para seu retrato "... é você". Eu olhei de volta para ele, que estava encarando o chão, como se lembrar destas pessoas fosse uma tarefa difícil. Neste momento, me perguntei se daqui à alguns anos me esqueceria das pessoas que amei e convivi, já que eu não possuía nenhuma lembrança delas, só a memória. Mas a memória é como as folhas, se vão e mudam nas estações. Eu tive medo. "Você tem razão", ele disse me tirando de meus pensamentos, "todos que estão ai já estiveram em minha vida. Meu pai, montado em seu cavalo com o simbolo de nossa casa em seu peito; minha mãe segurando um crucifixo, o que mostrava poder e resignação religiosa; e... e minha esposa". Esposa? Era óbvio que ele tinha uma vida antes de virar o que é hoje, mas ainda sim não consigo imaginá-lo tendo uma vida normal, com esposa, família, deveres e até filhos. Por algum motivo, não consigo vê-lo feliz e imagino o quão duro deve ter sido para ele ser arrancado de seus amados. "Ela era muito bonita", eu disse e ele respondeu com um ar melancólico mas ao mesmo tempo maravilhado: "Sim, ela era muito bonita. Talvez a mais bonita do reino. Catarina era o seu nome, uma espanhola muito virtuosa e eu a amava muito", mas antes que eu pudesse responder, ele continuou: "Sabe o que é mais triste? Se não fosse este maldito quadro, eu jamais me lembraria do rosto dela. Na verdade, eu não consigo lembrar outra feição a não ser esta retratada". A parte mais triste da eternidade: solidão. Todas as pessoas que você já amou e vai amar, vão morrer e eventualmente você vai se esquecer de como elas eram. Só sobrará você e a solidão, para sempre. Será que foi por causa disto que ele me escolheu para ser sua companheira? Para que ambos não ficássemos sozinhos? Eu ainda não perguntei como ele havia se transformado e agora era o momento perfeito.

"Pelos quadros, pude perceber que você nasceu há muitos séculos atrás, talvez no XVI, não sei... mas eu queria que você me contasse sobre isso, eu quero te conhecer", eu disse me ajoelhando na sua frente. Então ele olhou profundamente em meus olhos e disse: "Minha história não é feliz, por que quer tanto saber dela? Mas bom, que se dane, vou lhe contar. Eu nasci no ano de Nosso Senhor em 1425, eu era o sobrinho do rei Henrique VI e um dos homens mais poderosos da Inglaterra, sendo nomeado em meu nascimento Duque de Gloucester. Quando completei 20 anos, meu tio teve um herdeiro com sua rainha, Margareth de Anjou. Os York, aqueles malditos, começaram uma guerra para tomar o trono do legítimo rei, e eu, como um verdadeiro Lancaster, entrei na luta. Bom, foram anos e anos de guerra e nesse meio tempo o dote de Catarina foi oferecido à mim, ela era de uma família muito rica e influente na Espanha, e com a nossa união, podíamos salvar nossa casa que estava em crise; já que o bastardo do Edward de York havia assumido o trono. Assim que a conheci, me apaixonei. Nos casamos no verão de 1464... Bom, assim que os conflitos entre os Lancaster e os York retornaram, fui ao campo de batalha e conseguimos colocar meu tio de volta ao trono. Na batalha para proteger o trono contra Edward, que havia voltado de seu exílio, a morte me tocou. Fui atingido pelas costas, um ataque desonroso, e não queria morrer no campo de batalha, queria morrer em casa nos braços de minha esposa. Juntei toda minha força restante, subi em meu cavalo e fui em direção à minha casa. Eu não estava sentindo dor, nem uma pontada... nada. A morte vem doce, minha querida", ele fez uma pausa e foi em direção a janela, como se o que viesse a seguir não fosse tão fácil, mas mesmo assim ele continuou: "Quando finalmente cheguei em casa, fui a procura de minha mulher, o meu sangue manchando o chão de madeira, mas quando... quando entrei no quarto, ela estava... morta. Seu corpo estava jogado na cama, com a garganta aberta e os olhos fechados. Não tive nem tempo de chorar por ela, que a minha morte apareceu. Minha morte era branca, com os olhos âmbar e os cabelos encaracolados; uma visão". Eu estava petrificada. Olhos âmbar e cabelos encaracolados. O meu demônio, a criatura pela qual fujo à dois anos, a criatura que me fez largar minha vida... a criatura que me destruiu... foi que transformou William. Agora tudo fazia sentido. "Agora você entende? Entende o porquê te salvei dele?", ele veio em minha direção e levantou meu rosto, "porque eu quero vingança".


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Notas finais do capítulo

O vestido usado pela Rose foi baseado no vestido usado por Cecília em Atonement. E a história de William me basei na guerra das rosas. Comentem! Beijos.



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