Era para ser você escrita por Tamires Rodrigues


Capítulo 53
O nosso tempo




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Meu telefone tocou, pouco depois que terminei de me vestir. Achei que poderia ser Julyan ou Mer, mas era Chase. Atendi sorrindo.

— Bom dia! – Chase me saudou com uma voz feliz demais, para quem, até algumas horas atrás, estava com um sério caso de dor de barriga.

— Hum – sorri. – Alguém teve uma boa noite?

— Eu estava querendo te perguntar exatamente isso – ele riu, sem confirmar o que perguntei, mas tampouco negando minha pergunta.

Lembrei-me da noite da exposição e de que ele estava lá pra ver alguém e fiz uma nota mental de saber mais sobre. Ele era sempre tão fechado.

— Qual é o nome dela? – indaguei curiosa. Fiz uma varredura mental, tentando me recordar dos nomes e dos rostos das garotas com as quais ele andava ao redor da faculdade e falhei. Eram muitas e dificilmente as mesmas.

Chase ficou em silêncio, parecia pensativo e então debochado.

— O que você quer dizer com nome dela? – ele pareceu se divertir.

 Franzi a testa por uma batida sem entender, até que a ficha caiu.

— Você é gay?

Você não faz meu tipo, ele havia me dito, sentado no banco da faculdade.

 

Oh! Fazia sentido.

 

— Você não sabia? Quero dizer, – ele caçoou – você já me viu envolvido com alguma garota?

Nem precisei pensar para falar.

— Com várias – prontamente falei, então mordi a língua. – Mas não é como se você me devesse explicações. Eu só meio que, você sabe, achei que todas aquelas garotas eram...

— Ficantes? – ele sugeriu rindo. – São só algumas amigas, ou então alguém querendo um orçamento sobre tatuagem.

Chase era tatuador, num estúdio de tatuagens que ficava a dois quarteirões de sua casa. Ele adorava o que fazia e o trabalho artístico ajudava com os gastos da faculdade e moradia.

— Qual o nome dele? – refiz a pergunta.

— Um nome que eu não quero me lembrar – gemeu. – Definitivamente não quero.

 

Whoa.

 

— Ressaca do amor?

— Isso soou brega demais, para se ouvir estando tão sóbrio – resmungou. Toda a felicidade dissipando-se no característico humor sarcástico.

— Vamos lá, me conta! – insisti no assunto.

— Edward.

— Edward Cullen ou Edward mãos de tesoura?

— Eu te odeio! – sua resposta saiu seca e num suspiro, fazendo-me segurar um riso.

— Eu te amo! – cantarolei. – Qual a história entre você e Edward? – continuei mais séria.

Ele ficou em silêncio por alguns segundos.

— Ele é um cara legal – respondeu. – Tipo aquele cara que você olha e pensa "uau". É só que, às vezes é difícil... É confuso... E bom. Tudo ao mesmo tempo.

— Intenso – murmurei com sinceridade, mas já não estava mais falando apenas de Chase e Edward. – E por que não apenas bom?

Mais silêncio. Esperei. Chase tinha seu próprio tempo para tudo, inclusive para falar sobre sentimentos.

— Ele não é assumido. – Foi minha vez de ficar em silêncio. – Não é como se eu saísse por aí gritando, "eu sou Chase e sou gay", mas eu me escondi por tampo tempo que não quero mais fazer isso. Nem mesmo por ele.

Abri a boca para falar, mas ele ainda não havia acabado.

— Meus pais não lidaram bem com minha orientação sexual, então eu entendo o medo que ele sente. Mas é tão desanimador ser chamado o tempo todo de amigo, quando algum conhecido esbarra na gente. Eu me sinto retrocedendo.

— Eu sinto muito – foi tudo o que saiu. – Sinto mesmo.

— Eu sei. E eu também.

Nós dois ficamos em silêncio. Em parte porque eu não sabia o que dizer, em parte porque o silêncio dizia tudo naquele momento.

 

***

 

Não percebi quando Mabuchi entrou no quarto. Eu estava angustiada pensando que em breve tudo iria terminar e que eu teria que voltar para o Brasil, quando senti suas mãos afastando meu cabelo da nuca.

— Como foi com os representantes? – perguntei, olhando com tristeza o céu pela janela.

Depois da conversa com Chase, eu tinha prometido a mim mesma que falaria com Mabuchi sobre minha volta para casa naquela manhã mesmo.

— Enfadonha – ele respondeu, cheirando meu pescoço, o que me provocou arrepios.

Suspirei tirando os olhos da janela e virei meu corpo para poder fitá-lo.

— É mesmo? – meus olhos passaram por todo o seu corpo. Desde os sapatos italianos até os seus olhos escuros e brilhantes de desejo.

— Quero conversar com você sobre algo – tomei um fôlego curto para não perder a coragem e forcei as palavras. – Eu vou voltar para o Brasil em pouco tempo.

A primeira coisa que vi mudar foram seus olhos, ondas de desejo se transformando em tempestade marítima.

— O quê?

Virei novamente para a janela e minhas palavras escorreram como lágrimas.

Contei sobre meu TCC e a formatura, o vencimento do meu visto e até sobre o estado de saúde da minha avó, pois tinha medo de que ela estivesse pior quando eu regressasse.

— Mas não se preocupe que posso facilmente encontrar uma nova secretária para você – acrescentei.

Mabuchi riu, mas não parecia divertido.

Virei para ele, que olhava para cama.

— Uma nova secretária? – indagou seco. – Você está realmente dizendo isso?

— Não sei o que dizer.  Aliás, não há o que dizer.

— Não há o que dizer – ele repetiu. – Engraçado, porque eu tenho algumas coisas que eu quero saber.

— O que quer saber? – incentivei, com meu coração batendo ainda mais forte.

— Foi por isso que me deixou... Foi por isso que me deixou fazer amor com você?

Balancei a cabeça sem saber o que responder. Em parte sim, mas havia mais coisas por trás da minha decisão. Eu só não sabia como explicar.

— Eu também quis fazer amor com você – minha voz falhou com a confissão. – Faz tempo que eu desejava sentir você por inteiro e, sim, estar prestes a ir embora me deu a coragem necessária.

Ele não estava olhando para mim. Seus olhos se recusaram a parar em mim por mais de um instante.

Com meu dedo indicador tracei a linha do seu maxilar.

— Eu não me arrependo – sussurrei. – De nada.

— Nem eu – ele respondeu, finalmente olhando para mim.

Coloquei minha mão em concha em sua bochecha e aproximei meu rosto do dele, mas Mabuchi se afastou indo para o outro lado do quarto.

— Mabuchi eu...

— Gregory – corrigiu exasperado. – Você não precisa mais me tratar como se eu fosse apenas seu chefe.

Seu tom de voz me magoou e me irritou. Tudo ao mesmo tempo.

— Não quero que se preocupe achando de que eu tenho a ilusão de que somos namorados – grunhi.

Forcei uma respiração calmante. Brigar não adiantaria em nada. Absolutamente nada.

— Qual é o problema? – continuei – Tudo o que fez desde que me tornei sua secretária foi querer que eu saísse do cargo e agora isso finalmente vai acontecer.

Ele riu.

— Como se você não fosse igual, sempre arranjando encrenca comigo. Deve estar contando os dias pra se livrar de mim.

Cruzei os braços.

— Você está louco! Como pode dizer uma coisa dessas!

Sua sobrancelha ergueu. E entendi imediatamente o que ele queira dizer. Eu também não era o melhor exemplo de sanidade.

Vá pro inferno, quis dizer, mas me forcei a ficar calma. Já nem sabia o porquê de estar brava e isso me fez rir.

— Talvez queira dividir a piada – pediu ele sarcástico.

— Talvez você queira ir para o... – selei os lábios com força, calando-me.

— Me acostumei a chamar você de Mabuchi – murmurei pra mudar de assunto. – Eu dificilmente digo seu primeiro nome.

Mabu... Gregory caminhou até mim, seu semblante não tão mais severo.

— Brigar é estupidez. Principalmente quando nem sabemos mais porque estamos fazendo isso.

Assenti.

— Ainda temos alguns dias, até precisarmos dizer adeus.

Minha respiração parou por uma batida, esperando sua resposta.

— Nós podemos ter o tempo que quisermos nos dar.

Não pude perguntar o que ele quis dizer, porque seu beijo selou meus lábios.

 


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Notas finais do capítulo

TORÇAM POR MIM NAS PROVAS FINAIS!!