Era para ser você escrita por Tamires Rodrigues
Meu telefone tocou, pouco depois que terminei de me vestir. Achei que poderia ser Julyan ou Mer, mas era Chase. Atendi sorrindo.
— Bom dia! – Chase me saudou com uma voz feliz demais, para quem, até algumas horas atrás, estava com um sério caso de dor de barriga.
— Hum – sorri. – Alguém teve uma boa noite?
— Eu estava querendo te perguntar exatamente isso – ele riu, sem confirmar o que perguntei, mas tampouco negando minha pergunta.
Lembrei-me da noite da exposição e de que ele estava lá pra ver alguém e fiz uma nota mental de saber mais sobre. Ele era sempre tão fechado.
— Qual é o nome dela? – indaguei curiosa. Fiz uma varredura mental, tentando me recordar dos nomes e dos rostos das garotas com as quais ele andava ao redor da faculdade e falhei. Eram muitas e dificilmente as mesmas.
Chase ficou em silêncio, parecia pensativo e então debochado.
— O que você quer dizer com nome dela? – ele pareceu se divertir.
Franzi a testa por uma batida sem entender, até que a ficha caiu.
— Você é gay?
Você não faz meu tipo, ele havia me dito, sentado no banco da faculdade.
Oh! Fazia sentido.
— Você não sabia? Quero dizer, – ele caçoou – você já me viu envolvido com alguma garota?
Nem precisei pensar para falar.
— Com várias – prontamente falei, então mordi a língua. – Mas não é como se você me devesse explicações. Eu só meio que, você sabe, achei que todas aquelas garotas eram...
— Ficantes? – ele sugeriu rindo. – São só algumas amigas, ou então alguém querendo um orçamento sobre tatuagem.
Chase era tatuador, num estúdio de tatuagens que ficava a dois quarteirões de sua casa. Ele adorava o que fazia e o trabalho artístico ajudava com os gastos da faculdade e moradia.
— Qual o nome dele? – refiz a pergunta.
— Um nome que eu não quero me lembrar – gemeu. – Definitivamente não quero.
Whoa.
— Ressaca do amor?
— Isso soou brega demais, para se ouvir estando tão sóbrio – resmungou. Toda a felicidade dissipando-se no característico humor sarcástico.
— Vamos lá, me conta! – insisti no assunto.
— Edward.
— Edward Cullen ou Edward mãos de tesoura?
— Eu te odeio! – sua resposta saiu seca e num suspiro, fazendo-me segurar um riso.
— Eu te amo! – cantarolei. – Qual a história entre você e Edward? – continuei mais séria.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos.
— Ele é um cara legal – respondeu. – Tipo aquele cara que você olha e pensa "uau". É só que, às vezes é difícil... É confuso... E bom. Tudo ao mesmo tempo.
— Intenso – murmurei com sinceridade, mas já não estava mais falando apenas de Chase e Edward. – E por que não apenas bom?
Mais silêncio. Esperei. Chase tinha seu próprio tempo para tudo, inclusive para falar sobre sentimentos.
— Ele não é assumido. – Foi minha vez de ficar em silêncio. – Não é como se eu saísse por aí gritando, "eu sou Chase e sou gay", mas eu me escondi por tampo tempo que não quero mais fazer isso. Nem mesmo por ele.
Abri a boca para falar, mas ele ainda não havia acabado.
— Meus pais não lidaram bem com minha orientação sexual, então eu entendo o medo que ele sente. Mas é tão desanimador ser chamado o tempo todo de amigo, quando algum conhecido esbarra na gente. Eu me sinto retrocedendo.
— Eu sinto muito – foi tudo o que saiu. – Sinto mesmo.
— Eu sei. E eu também.
Nós dois ficamos em silêncio. Em parte porque eu não sabia o que dizer, em parte porque o silêncio dizia tudo naquele momento.
***
Não percebi quando Mabuchi entrou no quarto. Eu estava angustiada pensando que em breve tudo iria terminar e que eu teria que voltar para o Brasil, quando senti suas mãos afastando meu cabelo da nuca.
— Como foi com os representantes? – perguntei, olhando com tristeza o céu pela janela.
Depois da conversa com Chase, eu tinha prometido a mim mesma que falaria com Mabuchi sobre minha volta para casa naquela manhã mesmo.
— Enfadonha – ele respondeu, cheirando meu pescoço, o que me provocou arrepios.
Suspirei tirando os olhos da janela e virei meu corpo para poder fitá-lo.
— É mesmo? – meus olhos passaram por todo o seu corpo. Desde os sapatos italianos até os seus olhos escuros e brilhantes de desejo.
— Quero conversar com você sobre algo – tomei um fôlego curto para não perder a coragem e forcei as palavras. – Eu vou voltar para o Brasil em pouco tempo.
A primeira coisa que vi mudar foram seus olhos, ondas de desejo se transformando em tempestade marítima.
— O quê?
Virei novamente para a janela e minhas palavras escorreram como lágrimas.
Contei sobre meu TCC e a formatura, o vencimento do meu visto e até sobre o estado de saúde da minha avó, pois tinha medo de que ela estivesse pior quando eu regressasse.
— Mas não se preocupe que posso facilmente encontrar uma nova secretária para você – acrescentei.
Mabuchi riu, mas não parecia divertido.
Virei para ele, que olhava para cama.
— Uma nova secretária? – indagou seco. – Você está realmente dizendo isso?
— Não sei o que dizer. Aliás, não há o que dizer.
— Não há o que dizer – ele repetiu. – Engraçado, porque eu tenho algumas coisas que eu quero saber.
— O que quer saber? – incentivei, com meu coração batendo ainda mais forte.
— Foi por isso que me deixou... Foi por isso que me deixou fazer amor com você?
Balancei a cabeça sem saber o que responder. Em parte sim, mas havia mais coisas por trás da minha decisão. Eu só não sabia como explicar.
— Eu também quis fazer amor com você – minha voz falhou com a confissão. – Faz tempo que eu desejava sentir você por inteiro e, sim, estar prestes a ir embora me deu a coragem necessária.
Ele não estava olhando para mim. Seus olhos se recusaram a parar em mim por mais de um instante.
Com meu dedo indicador tracei a linha do seu maxilar.
— Eu não me arrependo – sussurrei. – De nada.
— Nem eu – ele respondeu, finalmente olhando para mim.
Coloquei minha mão em concha em sua bochecha e aproximei meu rosto do dele, mas Mabuchi se afastou indo para o outro lado do quarto.
— Mabuchi eu...
— Gregory – corrigiu exasperado. – Você não precisa mais me tratar como se eu fosse apenas seu chefe.
Seu tom de voz me magoou e me irritou. Tudo ao mesmo tempo.
— Não quero que se preocupe achando de que eu tenho a ilusão de que somos namorados – grunhi.
Forcei uma respiração calmante. Brigar não adiantaria em nada. Absolutamente nada.
— Qual é o problema? – continuei – Tudo o que fez desde que me tornei sua secretária foi querer que eu saísse do cargo e agora isso finalmente vai acontecer.
Ele riu.
— Como se você não fosse igual, sempre arranjando encrenca comigo. Deve estar contando os dias pra se livrar de mim.
Cruzei os braços.
— Você está louco! Como pode dizer uma coisa dessas!
Sua sobrancelha ergueu. E entendi imediatamente o que ele queira dizer. Eu também não era o melhor exemplo de sanidade.
Vá pro inferno, quis dizer, mas me forcei a ficar calma. Já nem sabia o porquê de estar brava e isso me fez rir.
— Talvez queira dividir a piada – pediu ele sarcástico.
— Talvez você queira ir para o... – selei os lábios com força, calando-me.
— Me acostumei a chamar você de Mabuchi – murmurei pra mudar de assunto. – Eu dificilmente digo seu primeiro nome.
Mabu... Gregory caminhou até mim, seu semblante não tão mais severo.
— Brigar é estupidez. Principalmente quando nem sabemos mais porque estamos fazendo isso.
Assenti.
— Ainda temos alguns dias, até precisarmos dizer adeus.
Minha respiração parou por uma batida, esperando sua resposta.
— Nós podemos ter o tempo que quisermos nos dar.
Não pude perguntar o que ele quis dizer, porque seu beijo selou meus lábios.
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TORÇAM POR MIM NAS PROVAS FINAIS!!