Um mês de desespero escrita por Leon Yorunaki


Capítulo 49
XLVIII: Shattered Psyche


Notas iniciais do capítulo

Para começar: por favor não me matem.
Eu sei que eu demorei, e tive diversos motivos, tanto de ordem pessoal quanto literária. Estive ocupado com diversas coisas que me roubaram o tempo de escrita (e até de leitura, como alguns autores devem ter percebido *coughTsucough*). Mas também demorei para deixar esse capítulo do jeito que eu queria. E confesso que não está 100% como eu imaginava, mas já levei tempo demais com vocês esperando.

E, como avisado anteriormente, esse capítulo não vai ser nada tranquilo de se ler. Como o nome do capítulo deve indicar, ele será impactante, e contém revelações importantes demais para serem lidas com pressa.
Aliás, dentro desse tema de "impacto", deixo avisado que ele tem umas partes mais pesadas. Nada comparado à outra vez que usei um Z-move para nome de capítulo, mas é bom avisar de qualquer modo.

No mais, aproveitem a leitura.



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Estava escuro. Era a única coisa que Himiko podia afirmar com certeza.

Jogada ao chão frio e úmido, tinha dúvidas se estava ainda na ilha Bakhold, local aonde se situavam suas últimas lembranças. Não mais podia confiar nelas; pois de acordo com o que se recordava, deveria estar morta após ter sido traída e atirada em um fosso pela Slowking que a ajudara abrindo caminho por entre as fendas de uma rocha.

A treinadora levantou-se devagar, ignorando a aparência deplorável em que estava; perceber que não estava ferida tornava qualquer outra impressão irrelevante. Olhando para cima, tentou localizar de onde havia caído após ser atingida pela onda psíquica; a escuridão relativa do local não lhe permitia ter essa informação. A queda deveria ter lhe matado não fosse a provável interferência de Futa, tal como ele fizera em situação semelhante após um teletransporte malsucedido.

Pensar em seu pokémon apenas lhe causava mais dúvidas. Afinal, ele poderia tê-la levado de volta para o local de onde haviam sido atirados. Talvez ele temesse que a Slowking pudesse atacá-los outra vez?

Acima de tudo, restava se perguntar aonde o Gardevoir poderia estar naquele momento. Até porque, naquela escuridão, a única chance de encontrá-lo seria literalmente trombando com ele no caminho.

Levou um tempo até que a garota conseguisse organizar suas ideias. Não podia ir andando a esmo sem saber ao menos onde estava, por mais estreitos que fossem os corredores de pedra. Por outro lado, não podia pedir ajuda aos seus outros pokémon, pela falta do espaço necessário para o único deles que poderia respeitá-la. Talvez fosse melhor assim; não queria correr o risco de brigar também com Nagrev, estando cada um deles com os ânimos alterados por vários motivos.

Não levou muito para que Himiko pensasse em uma solução temporária para o problema, pegando em sua mochila o PokéNav que havia afanado do treinador morto na praia. Não podia de fato usar o dispositivo, protegido com senha, mas o objeto tinha iluminação em sua tela, forte o bastante para ser improvisado como uma fraca mas suficiente lanterna, lhe permitindo enxergar mais do que dois palmos diante dos olhos.

A primeira reação ao acionar o objeto foi o incômodo com a súbita fonte de luz, mesmo com a tela virada na direção oposta a ela. A segunda reação foi o medo, quando se deu conta de que outra fonte de luz surgiu a talvez uns quinze metros de distância.

Sem saber como reagir, acabou se atirando de volta ao chão, tentando ao mesmo tempo se proteger da criatura humanoide que agora se aproximava e se acostumar com a súbita claridade em tons esverdeados que esta emanava de seu corpo.

Por um instante passou pela mente da garota a imagem de Futa, logo descartada. Não apenas ele jamais a assustaria daquele modo sem se comunicar com ela imediatamente, como também as feições daquele pokémon eram destoantes em relação ao Gardevoir, apesar de que haviam muito mais semelhanças do que diferenças.

— Me desculpe, eu não quis lhe assustar!

A voz firme da criatura causou o efeito contrário, pelo que Himiko se virou com a intenção de fugir. Claro que era uma tarefa mais difícil de executar caída ao chão, logo tornada impossível quando aquele pokémon segurou o seu braço, sem machucá-la, mas com força o bastante para que ela não saísse correndo na escuridão daquela caverna.

— Eu achei que se lembraria de mim…

Mesmo que a garota cogitasse a possibilidade de já ter visto aquele pokémon, não seria naquelas condições que ela seria capaz de reconhecê-lo. Seu coração palpitava forte, sentia as veias do pescoço prestes a explodir com a pulsação acelerada; o olhar, fixado na criatura, pesava apenas o perigo que ele oferecia com as lâminas que cresciam a partir dos cotovelos em lugar de braços, tal como a formação em sua cabeça. Enxergar todas essas características em um ser que surgira do nada irradiando uma luz esverdeada do corpo era o suficiente para desencadear vários tipos diferentes de medo na garota.

— Se acalme… como eu poderia te machucar, Himiko?

Seria uma tarefa complicada a lhe convencer após a primeira impressão que ele causou nela. Toda a reação da treinadora, do susto à fuga até chegar à completa catatonia em que se encontrava, se deu de forma silenciosa, sem os gritos que se esperaria de qualquer outra pessoa em situação semelhante. O inconsciente da garota já havia aprendido que gritar por socorro apenas tornava as coisas piores.

Mas, sem outra opção, conseguiu recobrar um pouco de sanidade com o passar dos minutos, apesar de persistirem a respiração ofegante e pulsação acelerada. Foi capaz de olhar outra vez para o pokémon que lhe continha pelo braço esquerdo, e pôde notar algumas características menos assustadoras, tal como o olhar sereno parcialmente escondido por um topete, ou a barbatana escurecida situada em seu peito; atributos semelhantes demais aos de um Gardevoir, apesar de que a criatura era obviamente de uma espécie diferente.

— De todos os lugares, não achei que seria aqui que lhe veria novamente!

— Percy?

Não que Himiko o tivesse reconhecido, mas teve o palpite por exclusão, sendo a única possibilidade. Conhecera-o apenas na forma de Ralts, o que lhe permitia considerar que fosse ele em uma evolução alternativa.

E, com a reação positiva do pokémon, a treinadora fez a única pergunta possível. sem saber qual resposta preferiria ouvir:

— Wally está por aqui também?

— Nós vimos você caindo, ele me mandou para te procurar. Venha comigo!

Era uma sensação estranha para a treinadora, menos pelo pokémon a lhe resgatar e mais por ela não conseguir conceber nenhuma possibilidade que trouxesse Wally para um local tão isolado como aquele. O menino franzino que ela conhecera no início de sua jornada, aquele jovem inseguro que reencontrara em Mauville pouco depois de ser operado, incapaz de dar dois passos dentro de um ginásio sem tropeçar em seus próprios medos. Pensar que poderia revê-lo em uma caverna inóspita e perigosa como aquela parecia uma mudança súbita demais para ser real.

E, como percebeu através do orbe das sombras passou a centímetros de seu corpo, tinha razão.

Himiko piscou, desacostumada com a súbita escuridão que retornara. A criatura ao seu lado desaparecera em uma nuvem gasosa, evaporando-se diante dos olhos dela, como se nunca tivesse existido. Apenas uma ilusão.

Exatamente como um certo pokémon havia lhe causado por pelo menos duas vezes…

— Nolan, seu filho da puta, eu vou te…

— Não era o Nolan, Himiko! Temos adversários piores!

A garota ouviu a voz de Futa, apesar de naquele momento duvidar disso. Depois de ser enganada por uma ilusão tão vívida, era capaz de desconfiar até mesmo do vínculo mental que tinha com seu Gardevoir.

— Como eu posso saber que é você mesmo?

— Eu poderia te falar de como você me roubou da mochila do professor Birch para salvá-lo de um ataque de Pidgeys, ou de como você saiu em jornada em busca de seu pai e de sua irmã. Mas qualquer um que se passasse por mim poderia te dizer o mesmo, já que você nunca aprendeu de fato a fechar a sua mente…

— E então?

— Fácil, temos que sair daqui o quanto antes. Estaremos mais seguros ao ar livre, e de lá podemos reavaliar a situação.

Himiko notou que seu pokémon se aproximava devagar, como quem dava uma oportunidade de ela duvidar dele. Talvez fosse justamente isso que a fez acreditar que era realmente ele e não outra ilusão. Sentiu-se reconfortada com a ideia, talvez mais do que deveria, quase que acostumada com o perigo que sempre corria.

— O que exatamente está acontecendo?

— Digamos que houve algumas mortes por aqui, se é que me entende…

— Fantasmas? Eu pensei que essa história fosse uma lenda!

— Nem todos que morrem se tornam fantasmas, apenas aqueles que não conseguem se desligar desse mundo. Ficam tão presos a sentimentos ruins que se ligam a qualquer coisa para ficarem do lado de cá. Quando se ligam a um crânio se tornam Duskull, mas a maioria consegue no máximo um fogo-fátuo e se tornam Gastly.

— E os sortudos que encontram alguma boneca se tornam Shuppet — uma voz conhecida se intrometeu na conversa. — Não é isso, Futakosei?

O Gardevoir respondeu com uma onda psíquica na direção de onde acreditava ter vindo a voz. Poderia ser Nolan, ou algum outro fantasma a tentar se passar por ele, mas Himiko por algum motivo tinha certeza de que não era nenhuma ilusão.

— Vamos, continue a aula, Futakosei — o fantasma provocou. — Você parece saber muito sobre o assunto!

— Não é a hora nem o local pra nos alongarmos, mesmo que você se sinta em casa por aqui.

— Vai por mim, essa fenda é o local mais seguro de toda essa ilha.

— Talvez para você, mas não para nós que estamos vivos… Himiko tem uma longa vida pela frente e farei de tudo para que ela possa voltar em segurança…

— Quem não te conhece que te compre, Futakosei…

— Sem querer interromper essa briguinha de vocês — Himiko tomou a palavra, mesmo sabendo que não era o momento para puxar conversa daquele modo —, O que te fez ficar, Nolan?

— Como?

— Você entendeu a minha pergunta. O que te fez ficar do lado de cá quando morreu?

— Vingança. Eu fui um treinador como você quando era vivo, inocente demais para a própria segurança. Apenas eu e um Grovyle, parceiros inseparáveis… até o dia em que fomos pegos em uma emboscada por um Aggron selvagem. Eu poderia ter tentado fugir e salvar a minha vida, mas fiquei para proteger meu colega… e na primeira oportunidade aquele covarde fugiu e me deixou sozinho contra o Aggron para morrer pisoteado… Jurei que iria me vingar dele, e de fato me vinguei alguns meses depois, mas isso não vem ao caso agora.

— E se você já cumpriu o que te prendia aqui, porque não partiu?

— Fantasmas não atravessam quando morrem, eles deixam de existir — Futa cortou a resposta. — É o preço que pagam por não aceitarem a morte.

— É esse o motivo de eu estar aqui — Nolan completou. — Não quero que ninguém cometa o mesmo erro que eu cometi.

— Claro… — Futa retrucou. — Montando acampamento no meio das rotas e atraindo treinadores inocentes pra drenar a energia deles. Ótima maneira de ajudar…

— Ainda é melhor que criar sua presa em cativeiro…

A última frase de Nolan reverberou dezenas de vezes mais intensa, ecoando de todas as direções daquela fenda. Futa reagiu envolvendo Himiko em um abraço, pressionando seu corpo contra as costas da garota, ciente do erro que acabara de cometer.

Ele havia baixado sua guarda.

— Todo esse tempo… era só uma armadilha?

— Sim e não, Himiko. Acho que perdemos o Nolan.

— Vá em frente, Futakosei! Mostre a ela quem você realmente é!

Os fantasmas começaram a se revelar, um a um. Quando se deram conta, podiam ver ao menos trinta Gengar a lhe rodearem, apesar de ser impossível dizer quantos deles eram reais e quantos eram ilusões. Talvez todos o fossem, modelados à imagem e semelhança de Nolan.

— Não dê ouvidos, eles querem nos colocar um contra o outro!

— Fale para ela de como você a manipulou por todo esse tempo!

Himiko não sabia como reagir àquela acusação. Tremia nos braços do Gardevoir, que atirava ondas psíquicas para todos os lados, incapaz de acertar os fantasmas, os quais se desviavam com facilidade.

— Você sabe que podia ter evitado tudo isso, Futakosei. Se tivesse falado a verdade para a garota, não precisariam estar aqui. Sua tentativa de protegê-la será o motivo das suas mortes!

Mesmo sabendo que era uma ilusão, uma mera tentativa de desestabilizá-la, Himiko sentia medo. As palavras a ecoarem, reverberando por aquelas paredes rochosas, acertavam bem no âmago de suas desconfianças. Qualquer acusação de que Futa pudesse querer o mal dela seria facilmente dissipada. Exceto a de que ele pudesse esconder algo importante dela. Teriam os fantasmas razão, ou apenas conseguiam perceber o que ela realmente sentia?

— Seu plano patético não deu em nada, mas você pode escolher se salvar se estiver disposto a sacrificar a garota… Deixe o Banette em você falar mais alto! Fale a verdade para ela você mesmo e deixe essa energia tomar conta. Ou então podemos fazer do nosso jeito…

Himiko desvencilhou-se sem qualquer dificuldade da proteção de seu pokémon, finalmente percebendo que deveria dar algum crédito às acusações que eram atiradas ao Gardevoir, notando que ele tremia ainda mais do que ela. Ele, apesar de tudo o que havia feito até então, sabia o que estava em jogo.

Sabia que não mais poderia protegê-la de si mesma.

— Olá, Puffy!

Quatro anos haviam se passado, mas Himiko reconhecia aquela voz mesmo com os olhos fechados.

Abriu-os, encontrando Norman a poucos metros de distância. Sua aparência era quase a mesma de quando saíra de casa, exceto por algumas rugas um pouco mais evidentes do que ela se recordava. Ela percebia que o rosto dele estava bem mais endurecido em uma aparência talvez cansada. Os olhos, semicerrados, carregavam uma dor tão profunda que Himiko sentiu-a junto.

Eram apenas os dois ali. Ninguém mais.

A garota perdeu-se encarando a imagem de seu pai. Era apenas uma ilusão, evidente pelo fato de que a caverna e os pokémon tinham desaparecido em uma névoa branca e iluminada que os rodeava. Mesmo assim, sabia que era real ao ponto de ela obter as respostas que tanto procurava.

— Como você está? — Atreveu-se a perguntar para ele, sem encontrar palavras melhores para iniciar uma conversa.

— Morto, é claro. Fui descartado, como todos os outros que sabiam demais. Mas também arrependido dos muitos erros que cometi.

— Então é verdade que você estava envolvido?

— Não me leve a mal, mas não me arrependo de ter entrado na Organização. Fui recrutado para treinar um grupo de treinadores e acabei traído por eles. Mas ainda é melhor isso do que viver com a culpa de tudo o que fiz com você…

— Então você tentou mesmo me matar em Mauville?

— Eu nunca faria isso. Aquele ataque foi obra do meu chefe, o Franco. Eu queria ter podido lhe avisar sobre ele. Quando eu soube que minha equipe havia se rebelado, tive que fugir. Alertei Roxanne do que havia acontecido, pedi para ela te proteger e te contar tudo quando chegasse em Rustboro, mas falhei nisso também.

— E por que não me avisou naquela carta?

— Eu não estava fugindo só da Organização. A polícia já estava sabendo sobre mim, qualquer coisa que eu escrevesse ali serviria de prova. Mas estive monitorando sua viagem, torcendo para que você desistisse de me procurar!

— Você se superestima demais, Norman! Não me importa que você tenha morrido, aliás, acho bem-feito pelo pai que você nunca foi. Tenho pena é pela April, que confiou em você…

— Não é hora para brincadeiras, Himiko. Você não é mais uma criança…

— Brincadeiras? — Himiko gritou, partindo para cima de Norman. Obviamente, como a ilusão que ele era, a garota o atravessou como se ele não estivesse ali, dando de cara com o chão.

— Me desculpe, Himiko. Eu nunca imaginei que as coisas seriam assim. Deveria ter pensado nessa possibilidade. Quer dizer, se eu tivesse pensado antes de agir, estaríamos em paz. Disso sim eu me arrependo.

A última frase de Norman não causou nenhum impacto na garota, que já se punha de pé outra vez.

— Desembucha logo! Onde é que a April está!?

Norman deu dois passos, colocando-se de frente para a garota.

— Ela está bem aqui. — e colocou a mão sobre a cabeça de Himiko.

— Como é que é?

— Essa April só existe na sua cabeça, filha.

O silêncio se fez. Pai e filha se encaravam, sentindo o peso daquela afirmação absurda.

— É tudo minha culpa. — Norman continuou. — Eu não estava preparado para ter uma filha, e acabei nunca sendo o pai que eu deveria. Sua mãe lutou muito para te criar, mas eu simplesmente fugi da responsabilidade… Você ficava sozinha a maior parte do tempo, e então criou a April como a irmã que sempre quis ter. Inocente, cheia de esperanças, amada pelo pai… coisas que você nunca teve.

Himiko levou a mão à garganta, sentindo as palavras lhe atingirem como se fossem tijolos.

— Eu nunca levei isso a sério, e creio que Nastumi também não. Crianças costumam ter amigos imaginários, deveria ser algo normal. Mas isso foi saindo do controle e eu não estava por perto para perceber… Deve ter sido quando comecei a beber…

Ela tentou gritar, perdida em um misto de raiva e medo. Não conseguiu.

— Eu tentava afogar na bebida todas as frustrações que eu tinha, de como eu era um incapaz, de como eu tinha uma mulher que nunca amei, de como coloquei no mundo uma criança que eu não queria… no álcool encontrei alívio, mas ele cobra o seu preço, fiz coisas que nunca pensei ser capaz, coisas das quais eu me arrependo…

— Você não se arrepende de nada!

Mesmo sendo apenas uma sombra de existência, Norman assustou-se com a reação súbita da filha. Himiko finalmente percebeu porque as palavras de seu pai incomodavam tanto. Sentia como se ele arrancasse os curativos de uma ferida latente, um véu de mentiras que ela contava a si mesma para esconder sua dor.

— Todos os dias que você ia dormir em casa terminavam em brigas! Você e a mamãe viviam discutindo, eu me lembro bem! Eu não conseguia dormir por causa dos seus gritos, e depois de um tempo eles viraram socos e pontapés. E quando eu tentei protegê-la uma vez, você bateu em mim também!

— E você não tem noção do quanto sofri por isso!

— Pare de mentiras! Eu me lembro bem da sua cara de alívio quando você disse que ia se mudar pra Hoenn e largar a gente ali. Você acabou de dizer que nunca nos amou, como quer que eu acredite que você sofreu por um momento sequer?

— Himiko, eu…

— Você abusou de mim naquela noite!

Até mesmo as gotas de suor que escorriam pela face da garota carregavam a dor daquele grito desesperado. Misturavam-se às lágrimas a descer por aquele rosto contraído a partir de olhos cheios de fúria. Desejava que Norman estivesse vivo, apenas para poder socá-lo de todas as formas, fazê-lo pagar com a dor por tudo que ele havia lhe causado.

E, na impossibilidade daquele feito, desesperou-se ao ver o orbe das sombras atingir o homem em cheio, desfazendo a ilusão. Aonde Norman estava restava apenas um fantasma se dissolvendo, derrotado pelo golpe. Não as dezenas de fantasmas que os rodearam anteriormente, mas apenas Nolan.

Mas Himiko havia sido a verdadeira derrotada naquele embate, presa em um choro desesperado a lhe machucar no fundo de sua alma. Toda a dor e revolta acumuladas em uma vida tornando a lhe atingir em uma única pancada, o trauma a lhe consumir. A raiva engasgada na garganta, vazando por todos os poros.

Não se dava conta de que estava em uma caverna perigosa, aonde poderia ser atacada por outros fantasmas na escuridão quase completa. Ignorava que Futa estava por ali, incapaz de se aproximar tamanha a força dos sentimentos que a atingiam.

Nada disso importava.

Nada lhe importava.

Perdia-se em gritos abafados, encolhida ao chão, incapaz de qualquer outra ação. Tornava a sentir as dores de todas as agressões que sofrera; verbais ou físicas. Culpava-se por mentir para si mesma, e mais ainda por se dar conta de que não dera resultado. Tornava a desejar que pudesse encontrar April, mesmo percebendo que nunca a teria; queria acreditar que tudo fosse apenas uma ilusão e que poderia ter uma vida em paz com a família reunida.

Mas sabia, por mais que tentasse negar, que os quatro últimos anos de sua vida haviam sido a verdadeira ilusão.

Contorceu-se outra vez, tentando não se deixar consumir por aquele sentimento que crescia em seu peito.

Ela não é real… Eu não posso torná-la real…

Engasgou-se, percebendo-se em pedaços. Não podia deixar que a verdade a devorasse viva.

Finalmente conseguiu abrir os olhos, depois de ter perdido a noção de quanto tempo havia passado presa dentro de si. Futa estava parado ao lado dela, parcialmente oculto pela escuridão do local. Ela não conseguia perceber exatamente o que significava a expressão séria no rosto do pokémon, com tantos significados se misturando naquela face enigmática, mas a garota podia enxergar a verdadeira nuance deles.

Eu não vou deixar isso crescer…

No momento seguinte, ela atirou-se contra o Gardevoir, levando o pokémon ao chão e caindo por cima dele. Futa, talvez pela surpresa, não foi capaz de impedi-la de o atingir na cabeça por diversas vezes.

— Seu filho da puta, você sabia de tudo!

Entre a falta de forças dele e o choque pela atitude súbita, ele não conseguiu responder imediatamente, permitindo que ela o agredisse por alguns segundos até finalmente contê-la com sua telecinesia.

— Pare com isso! Você sabe tanto quanto eu que tudo não passou de uma ilusão do Nolan!

— Ilusão é você achar que eu acredito em você!

— Não, Himiko. Tente pensar com calma, por que eu faria algum mal a você?

— Mas fez! O Nolan tentou me alertar todo esse tempo sobre você, é por isso que ele não desgrudou de mim… eu devia ter percebido que ele estava certo!

— Tudo o que eu fiz foi tentar te proteger, Himiko! Olhe para você, veja como tudo isso podia ter sido evitado…

— Não. Pra mim já deu.

Aproveitando a oportunidade que teve para se mover, já liberada dos efeitos da telecinesia do Gardevoir, ela pegou a pokébola de Futa, observando o objeto enquanto considerava o que estava prestes a fazer.

— Eu vou te entender se não quiser falar comigo, se não me quiser por perto. Só me prometa que vai sair dessa caverna!

O bip emitido pela esfera foi a única resposta que a garota deu.

— O que pensa que está fazendo?

— Estou te liberando. Se você realmente se importa comigo como diz, não vai fazer a menor diferença. Mas se você for essa criatura cretina que o Nolan me mostrou, vai ser muito melhor assim!

— Você está indo longe demais com isso, Himiko!

— E você vai poder fazer o que sempre sonhou… Futakosei.

O Gardevoir assustou-se ainda mais ao notar que ela o chamara por seu nome todo. Apenas o fizera uma única vez, quando ele estava a beira da morte após ter sido atacado por uma Beedrill. Nunca imaginaria que as coisas poderiam chegar àquele nível de tensão outra vez.

— Vá em frente, Futakosei. Se você se importa realmente comigo, então me mate!


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Notas finais do capítulo

Para terminar: por favor não me matem.

Espero que eu tenha sido capaz de surpreender vocês mais uma vez. Fui dando as dicas aos poucos, tentando deixar as peças no ar para que não fosse um choque completo, mas sim uma teoria improvável com aquele gosto de "e se?". Não sei se consegui cumprir esse papel, mas o recado está dado.

E o próximo capítulo deverá ser o último, a menos que eu decida dividir os acontecimentos finais em duas partes. A ideia me parece atraente para que eu consiga arredondar os cinquenta capítulos... quem sabe?




Notas do in-game:

E a Victory Road me roubou mais um pokémon. Eu estava contando com o Nolan para o final do jogo, sendo ele tão interessante enquanto pokémon e tal, mas calhou que ele caiu em uma batalha em dupla contra um Slaking e um Gardevoir de Skill Swap. Incrível o quanto as coisas se encaixaram com a história sem que eu tivesse planejado. Mais incrível ainda foi eu descobrir que o Slaking em questão tinha Shadow Ball (que na 3ª geração dá dano baseado no ataque monstruoso dele). RIP.

Status do time:
Pokémon: 6
Futakosei (Gardevoir) Lv. 90; Bold, Synchronize.
Ikazuchi (Manectric), Lv.90, Serious, Lightning Rod
Nagrev (Charizard), Lv.90, Naive, Blaze
Rejane (Lombre), Lv.90, Bold, Swift Swim
Mayhem (Slowking), Lv.90, Lax, Oblivious
Truxton (Crobat), Lv.90, Impish, Inner Focus


Mortes: 10 +1 = 11
Nolan (Gengar), Lv.35~84, Docile, Levitate



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