–Sherlock Holmes.

Nenhum indicio de duvida havia no momento, eu tinha certeza de que era aquilo que eu queria, tinha certeza de que era aquele meu desejo.

–Você vai escolher meu irmãozinho tolo à sua mulher? – Ele sorriu. – Admito que fiquei surpreso, meu caro John. Mas, você tem certeza?

Eu não queria olhá-la nos olhos, sei que fazê-lo poderia me fazer mudar de ideia, e não é isso que quero, eu sempre considerei Holmes uma peça muito importante na minha vida e ao casar me fiz essa pergunta varias vezes, sobre quem eu deveria escolher, não é por falta de amor a Mary que eu o escolhi, e sim por que minha divida com ele é grande demais.

–Tenho. Eu quero Sherlock Holmes.

Um silêncio tomou conta de local. Meus olhos estavam grudados aos do detetive, eu via um misto de surpresa e confusão naquela expressão vazia que ele sempre fazia. Um som de tiro corta o silêncio e logo vejo o corpo de Mary caindo no chão, um torpor toma conta de todo meu corpo e minha consciência volta a fraquejar.

“Vamos John! Aguente!”

“O que eu fiz?”

“Matei minha mulher”

“Sou um monstro”

O detetive pega meu braço e me puxa dalí, ele corre rápido e minhas pernas o acompanham num ritmo atrasado, mais uma vez eu não sentia nada, nada físico. Minha maior dor vinha de dentro, e aquela tinha sido causada por mim, era a dor da escolha, a dor de perder alguém querido, mesmo já tendo visto muitos amigos morrerem em minha frente, eu nunca me acostumaria com a sensação.

Não sei por quanto tempo corremos, mas, quando paramos já estávamos na cidade.

–John!John!

Meu olhos encontram os de Holmes, suas mãos tocam meu rosto, ele esta arfando. Uma estranha sensação toma conta de meu corpo, eu não sei que sensação é essa, mas, ela me parece tão familiar, tão...comum. Lágrimas já começavam a escorrer pelo meu rosto, a dor começava a parecer mais forte, mas, sabia que uma hora ela iria embora.

–Você é burro John? Ele era meu irmão! Nunca me mataria. – Agora ele já andava de um lado á outro. – Você poderia tê-la salvo.

Me aproximo dele e soco seu rosto. Como ele conseguia ser tão idiota? Tão ingrato?

–Por que você...- Ele começa, mas, o interrompo.

–Eu acabei de sacrificar minha mulher para salvar sua vida, você poderia ao menos demonstrar um pouco de gratidão? – Tudo que me consumia era raiva. Eu o odiava, odiava muito, ele e esse seu jeito de não sentir nada, de descartar qualquer coisa que o faça sofrer.

–Por que?

Eu tinha vontade de socá-lo, até o chão abaixo de nós afundar.

–Por que é o que pessoas normais fazem Sherlock! – Eu gritava. – Será que você ser normal apenas por 5 segundos? Será que pode deixar de ser Sherlock Holmes o grande idiota por 5 segundos?

–Por que você a sacrificou por mim? Ela era sua mulher.

–Por que eu te amo...- Sussurro. – Eu te amo ta bom! É por isso que fui tão idiota esse tempo todo, por isso que acabei de sacrificar a única pessoa que me suportava mesmo quando falava sobre nossos casos e sobre você o tempo todo. É por isso! Está satisfeito agora? – Minha voz já não era um sussurro, agora eu gritava, todos que passavam, nos lançavam olhares duvidosos e muitas vezes enojados, mas, nada disso importava.

Ele me encarava, com aquela mesma expressão mecânica, sei que ele pensava alguma coisa, tinha medo do que seria, tinha medo de sua decisão, pois eu bem sabia que ele escolheria sempre o que o afeta menos, e neste caso eu sabia que o mais afetado seria eu.

–Sabe John... – Começou ele. – Acho melhor parar de vê-lo, desde que o chamei para o caso, só tem te acontecido coisas ruins..

– Então você resolveu se importar comigo agora? De repente resolveu bancar o sentimental, não fode comigo Sherlock.

Lágrimas já escorriam novamente pelo meu rosto, mas eu sentia uma enorme raiva crescendo dentro de mim e com ela vinha o sentimento de perder. Tudo era tão doloroso.

“Por que tudo isso está acontecendo comigo?”

–John... Eu sinto muito. – Ele começava a se afastar, mas eu o segurei. – Isso é para o seu bem.

–Quer fazer algo por mim? Não me abandone. – Comecei a folgar o aperto que dei em sua roupa. – Por favor... Não me abandone, não aqui, não agora.

–Adeus John.

A ultima lembrança que tive foi de suas frias mãos tocando as minhas quando ele as pegou para que eu soltasse sua roupa.

*Uma semana depois*

O alarme tocava, indicava que era hora de ir para a clinica. Deixei que tocasse mais um pouco, não queria me levantar, meu corpo todo doía, a noite anterior acabara comigo e eu não lembrava de nada que havia feito... Eu sentia falta daquela voz, daquele grito e ameaça caso não desligasse o despertador, apenas fiquei ouvindo seu toque irritante como se fosse a melhor canção do mundo, aquela era a coisa, poderia se dizer que era a única, única coisa que trazia a lembrança clara dela de volta, eu sentia tanta sua falta.

Meu celular toca. Uma nova chamada.

“Numero desconhecido”

–Alô?

–Oh! John! Como você está? – Era uma voz masculina, um tanto..Eufórica.

–Bem... –

–Estava preocupado com você, ontem você não me parecia muito bem, não quero te ver chorando sozinho de novo, e sempre que quiser uma companhia para beber ou até para contar seus problemas como ontem, pode sempre contar comigo, bem.. preciso ir agora, você já sabe onde me encontrar. Bye bye. – Desligou.

“John? Quem era? Eu não estava chorando sozinho...aaah não...”

*Suposto sonho de John*

Acabara de largar da clínica, meu ultimo paciente tinha um problema realmente sério, isso acabou por roubar parte de minha noite, aposto que não tem comida, acho melhor comer em algum lugar.

Entro num pequeno restaurante, é um lugar bem agradável, não há muitas pessoas e isso é bom, tudo que eu não preciso é encontrar algum conhecido ou paciente para vir conversar sobre minha vida, tudo que tenho feito ultimamente é tentado arrumar distrações para não me pegar pensando na minha vida, fazer isso me faz querer chorar, afinal, quem eu quero enganar? Minha vida está uma merda, sacrifiquei minha mulher por um idiota e ainda fui largado por ele, logo depois de confessar tudo que eu sentia por ele, quando na verdade foi ele quem me beijou pela primeira vez me colocando nessa confusão.

Lágrimas escorriam pelo meu rosto.

“Eu sabia que isso iria acontecer.”

–Eu queria não ter que reviver isso, todos os dias. Queria não ter que lembrar de tudo tão claramente. Queria não ter que acordar todos os dias e lembrar que estou sozinho. – As palavras se embrulhavam nas lágrimas.

–Nós temos uma ótima torta de chocolate, se você estiver interessado por trazê-la para você. – Disse alguém.

Ele estava de pé ao meu lado, usava uma camisa branca e um avental preto por cima da calça de mesma cor, seus cabelos estavam bagunçados mas eram brilhosos e ruivos, sua pele era clara e ele tinha um belo sorriso no rosto.

–Eu vou aceitar – Não deixei de sorrir.

–Viu? Um belo sorriso lhe cai bem.

Ele se aproxima um pouco mais e enxuga um lágrima que ainda escorria, e logo passa na barra do avental.

*Voltando a realidade*

O alarme já não tocava mais, e eu estava atrasado, muito atrasado. Tomei um banho rápido e logo fui para a clinica, meu rosto não era um dos melhores, grandes olheiras ocupavam um grande espaço entre meus olhos e minhas bochechas e eu não tive tempo o suficiente para deixar minhas roupas no perfeito estado em que uso todos os dias.

– Drº Watson? O senhor está bem?

Era uma senhora que estava sentada de frente para mim, seu rosto não me era estranho.

*Lembranças de John*

–Sua namorada parece ser uma ótima mulher. – Olhei e percebi que havia uma senhora sentada na cadeira que estava logo depois de minha mesa.

– Perdão?

–Sua namorada, é uma ótima mulher, te fazendo sorrir com um pequeno aparelho. – Ela sorriu gentilmente pra mim.

–Oh não! Não é minha namorada, é apenas um grande amigo idiota que eu tenho. – Expliquei.

*Realidade*

Era a mesma senhora daquele dia.

–Algum problema com a sua namorada? – Perguntou ela.

–Oh! Não, Não. Perdão. – Sorri. – Só tive uma noite difícil.

Ela me lançou aquele sorriso gentil de sempre, aquilo fez com que eu me sentisse culpado, mas, eu não sairia por ai contando minha história para qualquer um, principalmente da parte que eu deixei que minha mulher morresse...

– Drº Watson, não se martirize tanto, todo grande problema vem também com uma grande felicidade no final, basta saber decifrá-lo.

–Obrigado.

Aquela frase realmente mexeu comigo, não saberia explicar o que era, mas, ela me parecia tão...Fantasiosa...afinal, que grande felicidade eu poderia tirar de tudo isso?

Aquilo me consumiu por boa parte do tempo.

Já era noite, andava por ai, atrás de um lugar parar comer, estava cansado, não queria ter que cozinhar.

*Voltando para o suposto sonho de John*

–Não se preocupe com isso, eu sei que isso é algo que todos dizem mas por experiência própria eu te digo que é tudo verdade, então eu também direi, tudo da certo no final, principalmente quando se tem algo que vale a pena lutar. – Ele estava sentado de frente pra mim, o avental agora estava jogado sobre a mesa e encima desta, havia um grande pedaço de torta o qual dividíamos e copos de cerveja.

–Queria poder acreditar nisso, mas, quando você começa a se sentir sozinho, nada parece ter solução e qualquer coisa parece ser tão complicado, tão difícil... – Eu dizia.

–Mas você não precisa estar sozinho, eu sei que é bem estranho mas, quero que me dê seu telefone.

Sorrio.

–Você pode muito bem ser um sequestrador de homens ou algo parecido.

–Claro que não. – Ele da uma gargalhada.

*Fim do sonho*

Passo por um pequeno restaurante, me parece aconchegante.

–É ELE!!!- Grito.

Lá estava ele, dentro do restaurante, o garoto do meu sonho.