Os dias seguintes foram confusos e cheios de descobertas. Os gêmeos passaram a encontrarem-se todos os dias depois da escola, numa obra abandonada que Filip costumava usar para encontrar algumas garotas - fato que Samantha realmente achava que ele deveria ter omitido. Experimentavam a força de Filip, às vezes motivado à raiva - coisa que era especialmente prazerosa para a irmã - outras com urgência ou autoproteção ( como quando a menina o testava atirando vários objetos ou atacando-o de surpresa ). Mas os resultados não os levaram a conclusão alguma, o que os frustrava cada dia mais. No final de semana, Filip foi viajar com uns amigos para o litoral, e Samantha recebeu outro convite de festa, dessa vez uma festa do pijama, para o aniversário de Ana Clara - esta foi lhe convidar pessoalmente, como meio de agradecer o socorro prestado - convidaria o irmão também, não fosse uma festa de meninas. A jovem ficou sem meios de recusar, vendo a pobre garota que, mesmo ferida, foi à sua casa:

— Está bem, Ana, eu vou... Quando vai ser ?

— Hoje. Vamos então? - falava a ruiva toda animada.

— Hoje? Nossa... Tá, que horas ?

— Você não entendeu, eu vim buscar você. Meu pai está no carro esperando, vamos...! - a menina não escondia seu contentamento, para o pânico de Samantha.

— Agora ? Mas nem pijama eu tenho... Eu pretendia passar numa loja primeiro e comprar um baratinho, sei lá...

A ruivinha, magra e baixinha, começou a dar saltinhos de excitação, parando logo ao sentir seu braço, ainda engessado, latejar.

— Perfeito então. Passamos no shopping e eu te dou o pijama mais lindo que tiver lá. E compramos algo pro seu irmão também. Ele veste o quê? 40 ? Talvez 38... Mas aqueles braços fortes dele devem ficar apertados nesse número...

A menina não parava de falar, e logo que começou a falar de Filip, seu rosto foi ficando da cor de seus cabelos vermelhos, apesar de não se acanhar de esta na frente de sua irmã, e continuar a falar ininterruptamente dos braços dele. Depois do tórax, do abdome, das coxas...

De repente Samantha vê algo despontar na esquina. Algo não, alguém! Ela reconheceria sua silhueta em qualquer lugar. Com urgência, agarra o braço bom da menina à sua frente que ainda tagarelava sobre os dotes físicos do irmão e caminha pela calçada até o carro estacionado.

— Vamos logo. Não queremos pegar nenhuma loja fechada, certo ?!

Com os olhos brilhando pela repentina atenção recebida, Ana Clara reiniciou seu discurso, agora elegendo as melhores lojas, decidindo qual visitar primeiro, e qual dos irmão presentear com o quê...

Enquanto a menina tagarelava animada, e pedia ao pai par sair com o carro, Samantha olhou para trás, a tempo de ver uma mulher alta, e de cabelos grisalhos demais para sua idade, apoiar-se no portão enferrujado da velha casa, e vomitar, provavelmente, tudo que tinha no estômago.

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Filip jogava futevôlei com Kaique, Miguel e Urias. Outros rapazes estavam sentados na areia rodeados de garotas. Naquele dia Filip não queria saber de garotas. Queria suar, cansar, sentir seus músculos queimarem até o cansaço vence-lo e distrai-lo da confusão que se instalara na sua cabeça. Urias bateu forte demais, e a bola voou em direção à água. Enquanto o garoto de pele olivácea foi correndo busca-la, Filip apoiava-se nos joelhos enquanto recuperava o ar e observava os amigos.

Miguel era de descendência nipônica. Seus olhos rasgados e cabelos negros contrastavam muito com a pele clara. Assim como seu temperamento forte contrastava com a aparência pacifica. Já havia comprado muitas brigas de Filip, assim como dos outros amigos - não que eles precisassem - Miguel Nakamura gostava da adrenalina de uma boa briga.

Kaique Salvatory era loiro e tinha olhos azuis. Magro como Filip, porém menos musculoso. Apesar de ser bom em atletismo, era muito preguiçoso, e preferia a pratica do esporte que ele chamava de 'caça felina', mas os outros apelidavam de 'caça tapas' - que era o resultado das investidas nada sutis que dava em toda e qualquer garota bonita que passasse na sua frente. Desse esporte Filip também gostava, mas costumava ter bem mais êxito que o amigo.

Por fim, Urias D'angello. O mais alto e musculoso dos quatro, era com certeza o mais intimidador, e sem dúvida, o mais gentil. Crescera na mesma rua que Filip, e conviveu com os gêmeos durante toda sua infância, dividindo com o amigo a dor de perder o pai, e depois o consolando quando este também perdeu o seu.

Por mais que a irmã julgasse seus amigos como companheiros de farra, eles não eram só isso. Eram a família de Filip. Família que ele escolheu, e pela qual foi escolhido quando a dele se desfez. Filip daria um braço por qualquer um deles.