— OK. Deixa eu ver se entendi: vocês vieram de uma realidade diferente deste mesmo planeta, mas que está em processo de destruição por causa de uma guerra entre seu povo e os tais Mons. E nesta Terra vocês se misturam às pessoas comuns para manter sua espécie viva. Casam-se com as pessoas e procriam. E depois de muitas tentativas fracassadas, as novas gerações de meta-humanos estão vingando... Só que os tais Mons descobriram seus planos de sobrevivência e agora estão caçando suas crianças... - Samantha suspira.

A expressão da garota era indecifrável. Olhou bem para as cinco pessoas à sua frente: Dona Lúcia, permanecia impacivel na sua cadeira. Urias estava com uma cara péssima, e só olhava para baixo. O casal Dumont, como sempre, estava abraçado e tinha uma expressão suave. Filip parecia ser o único ali que realmente demonstrava algum nervosismo. E Sofia... Como interpretar o olhar dela? Tinha-se a impressão que ela já passara por aquilo dezenas de vezes. Samantha respirou fundo antes de perguntar algo que mudaria tudo que ela sabia de sí mesma e de todo o resto.

Mas e se ela não gostasse da resposta? E se não conseguisse aceitar? Ela não gostava mesmo da vida que levava, gostava?! Não. Mas já estava acostumada a ela... E agora, teria a chance de mudar tudo. De começar do zero. De se fazer alguém. Quem sabe não descobrisse algo que a apaixonasse. Algo que a motivasse de verdade.

Talvez algo pelo que valesse a pena lutar... Não. Filip era o lutador. Ele era o conquistador. Ela era apenas sobrevivente. Dizia para si mesma que detestava o jeito do irmão, mas no fundo sentia inveja. Inveja de sua audácia, de sua força, de sua persistência. Ela não suportaria nem metade do que passaram se não fosse ele ali, seguindo em frente para ela segui-lo à sombra. Ele fazia tudo parecer mais fácil. Apenas quatro minutos mais novo. Mas ele havia vivido bem mais que ela. Ele sofreu bem mais também. Ele tentou muito mais... "Ele regava o jardim..."

Seus pensamentos a colocaram nostálgica. E não era hora de passado. Tinha um baita presente para resolver.

— Diga-me então: somos essa nova geração? A que está em perigo?

— Sim querida, vocês são. - pela primeira vez, desde que Samantha havia acordado, ouviu-se a voz de Michele, a mãe de Ana Clara. — Você, seu irmão, Urias, Victória, Miguel, e nossa pequena Ana. Suspeitamos que sejam todos filhos da terceira geração. Exceto Sofia, não é meu bem? - ela lhe lança um sorriso terno - Sofia é segunda geração.

— Michele! - o sr. Dumont a repreende - Pelo amor de Deus a menina nem assimilou a noticia direito e você joga mais merda no ventilador?

— Maurício! Precisa falar a palavra feia com 'M'?

O mundo de Samantha virando de pernas pro ar, e o casal tendo 'DR' por causa de uma 'merda'. A garota não resiste e desata a rir. Primeiro um sorriso disfarçado, mas logo ganha proporções de gargalhadas. Ela estava enlouquecendo, claro. Nada daquilo era real. Eram alucinações. Por isso pensava no irmão. Era a culpa de ter destruído a relação com ele que a enlouquecia. Já era. Acabou sua família, acabou sua perspectiva, acabou sua lucidez.

Mas quando menos espera, seu rosto queima. Ela abre de repente os olhos e entende: Filip havia lhe batido. Ele estava de pé e sua mão ainda estava no ar. Nos seus olhos lágrimas, e em sua boca uma expressão de desgosto.

Samantha sentiu algo quente por dentro. Algo que nunca havia sentido em sua vida. Esse sentimento, essa sensaçao mechia com seu corpo e pertubava sua mente. Seu coração ficou agitado como tempestade em alto mar. Sua respiração pesava dez toneladas. Sua boca tinha um gosto amargo e espesso. Os pensamentos se anuviaram e ela já não via ninguém nem ouvia nada. Seus punhos se fecharam com tanta força que os nós dos dedos perderam a cor. E como se não mandasse no próprio corpo, ela o atacou.