We Are Young escrita por Mad


Capítulo 2
Encontro




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Aquele era apenas o segundo dia de aulas na sala 211.
Uma turma do 2° Ano do Ensino Médio não ia conseguir me desestabilizar. Eu não ia me entregar tão fácil. Ia manter a postura, continuar escrevendo no quadro. Manter meu profissionalismo.

Gritos, risadas e pessoas andando para todos os lados. Uma terra de ninguém, uma selva que eu deveria domar. E eu ia fazê-lo, de preferência da pior forma possível para eles.
O quadro estava cheio da matéria, e eu continuava a escrever, lotando-o aos poucos. Fórmulas, resoluções. Se eles não me davam a oportunidade de explicar, então teriam que fazer por si mesmos. Ao olhar para trás conseguia ver um ou dois alunos copiando de forma furiosa o que eu escrevia, mas o resto... Bem, o resto era o resto.
Aquelas garotas escandalosas e suas risadas histéricas. Aqueles garotos imaturos de cabeça suja. Uma típica classe de ensino médio.

Não gritaria, bateria na mesa, de mim não seria expelido nenhuma espécie de protesto. Eu apenas continuava escrevendo. Continuava escrevendo.
Faltavam apenas 10 minutos para que o sinal soasse indicando o término do período e que eu finalmente me veria livre daquele caos, quando uma voz notavelmente masculina – Mas que ainda assim desviava o timbre entre grave e agudo – soou de um canto da sala, mais especificamente entre o grupinho de histéricos que comentei.

– Oh, cara, é sério que você ainda está escrevendo? É pra copiar isso ai?

Virei-me, apático e enrijecido, na direção do som.
Meus olhos varreram o ambiente, seguindo os outros olhares alheios até pousarem sobre um garoto, que eu não havia notado com exclusividade até então. Um jovem de olhos iluminados e sorriso insuportavelmente travesso, a encrenca estampada em sua expressão. Sua pele tinha um tom de dourado, seus cabelos castanhos e os olhos eram em um tom doce de creme de avelã, que seria mais fácil de ser apreciado se não carregasse aquele brilho insuportável de sarcasmo.
Pigarreei, encarando-o com a minha melhor expressão vazia.

– Estou dando a matéria como dada. Aula que vem darei carimbo nos cadernos completos e deverá levar bilhete quem tiver o caderno incompleto. – Eu tinha vontade de rir ao encarar as expressões ao meu redor, mas me continha com força – Estudem, como estamos entrando em Junho marcarei uma prova daqui a algumas semanas, antes das férias de Julho.
Encarei a classe calada com um olhar superior. Estava dando certo, eu estava mostrando quem mandava naquele lugar. Fizeram suas próprias escolhas, teriam que lhe dar com o acarretamento de suas próprias ações.
Nossa, que clima maravilhoso da vitória.
Porém, vi o garoto levantar-se da classe, uma risada de escárnio escapou de sua garganta, deixando-me extremamente confuso e incapaz de dizer algo. Antes que pudesse repreendê-lo, suas palavras já pairavam no ar.
– Não pode fazer isso. É apenas seu segundo dia de aula aqui, não pode nos dar matéria sem explicações e seguir em frente, precisamos de explicações, pois tudo isso – Ele fez uma grande gesticulação para o quadro branco atrás de mim – É grego para mim. Não tem como eu estudar algo que não sei.
Engoli em seco, sentindo minha garganta arranhar de raiva. Como ele havia juntado coragem para me questionar, questionar a minha palavra?
– Na verdade posso. No momento em que eu tento explicar as fórmulas, mas sou interrompido por gritos e risadas, não há mais o que eu possa fazer. Dei minha matéria no quadro, quem REALMENTE estava prestando atenção, irá entender por si mesmo usando a lógica e os resumos anotados.
O garoto encarou-me com um olhar estranho, quase que familiar. Uma espécie de desafio pairando como uma névoa sobre o castanho. Logo mais ele levantou os dois braços, gesticulando pela sala.
– HEEEY PESSOOAAAL! – Ele gritou – Estou tentando aprender com o... O... Professor de Física aqui, então calaaadooos!
Pisquei algumas vezes, encarando ao redor. Ouvi algumas risadinhas, será que ele era o “palhaço” da turma? Não poderia deixar o início do que seria um longo ano de palhaçadas e implicâncias dentro do meu conteúdo, acontecer. Abri a boca para dizer algo, mas fechei-a em seguida. Os olhares voltavam-se atentos em minha direção. Encarei o garoto mais uma vez, um sorriso implicante brilhava em seus olhos como quem dizia “Viu só?”.
– Pronto, professor. Agora pode dar a sua matéria.

Droga, droga, aquele garoto.
Suspirei pesadamente e fechei o livro em minhas mãos. Comecei a juntar meu material, segurando-o entre minha cintura e meu braço.
– Semana que vem quero os cadernos completos e os exercícios das páginas 22 e 23 do livro completos. Caso o contrário, bilhete assinado pelo responsável. Espero que aula que vem isso não venha a repetir-se.

Sai do local no exato momento em que soara o sinal.

~~~

Um copo de café borbulhante era o que eu tinha em mãos. Mantinha-me afastado dos meus colegas de trabalho, pois não me sentia em condições psicológicas suficientes para tentar iniciar uma adaptação por meio de um dialogo.
Uma pilha de papéis e fichas estava em cima da mesa onde eu permanecia escorado, a cada ficha que abria, tomava um gole de café.
Eu precisava descobrir o nome do peste da minha turma. Por algum motivo, eu precisava, pois sentia que ele daria-me bastantes problemas ao decorrer dos dias.
Por fim, abrindo uma pasta qualquer, deparei-me com sua foto 3x4 nas informações. Joguei as outras sobre uma cadeira vazia ao meu lado e pus-me a examinar a que tinha em mãos, pensativo. Irian. Irian Martins.
Uma sombra suspeita tapou a luminosidade do Sol que usava como lâmpada natural para enxergar os dizeres que tinha em mãos. Virei-me a tempo de ver George, o professor de matemática de origem japonesa, me observando com um olhar curioso.

– Irian causando problemas? – Perguntou, com um sorriso que poderia classificar como amigável.
Pigarreei antes de responder.
– De certa forma não, apenas sinto que terei uma longa história com ele, é bom ao menos eu saber seu nome. – Comentei, fechando devagar a pasta em minhas mãos e pousando-a com as outras sob a mesa. Agarrei a xícara de café e virei-me na direção do homem de olhos puxados atrás de mim.
– Sabe, Irian pode ter um estilo estranho e despojado, mas, olha Max, ele é um orgulho, aquele menino. Sozinho, fez mais que o resto. Sempre carrega as notas nos outros nas costas simplesmente por ter capacidade de fazê-lo. É um grande dom que ele tem, sabe, muita inteligência às vezes pode fazer subir a cabeça um pouco de arrogância, não acha?

Concordei com um murmuro, levantando-me e saindo do lugar, irritado. Não havia lembrado de pedir opiniões alheias para japoneses de Exatas. Caminhei pesadamente pelo corredor ao banheiro, chegando lá, pousei meus óculos sobre a pia e molhei meu rosto com água fria.
Levantando o foco e fitando-me no espelho, pude entender de onde conhecia aquele olhar. O olhar que eu mesmo produzia em meus momentos de triunfo. Familiar, rotineiro, irritável.
Sequei meu rosto e dei as costas ao grande espelho. Sentia que, por algum motivo, se ficasse mais um segundo pensando naquilo, acabaria enlouquecendo.


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