Ouço alguns gritinhos, algo um pouco perturbador... abro os olhos e movo minha cabeça pra fora da maca, e percebo que Ali está tremendo, mas não de frio, pois seu cobertor está bem enrolado em seu corpo. São tremeliques de medo, ou algo assim...

– Ei, Ali – falo, saindo da maca e cutucando seu ombro – acorda...

– NÃO! – exclama ela, levantando seu tronco com uma agilidade imensa, e por pouco não acertando meu rosto – nossa... foi horrível, Tom! – resmungou, e lágrimas brotaram de seus olhos – aquele cara estranho, o Phill tinha te capturado! Ele te espancou ... meu Deus, ele ia te matar e...Ei! pare de sorrir feito um bobo!

– Ahn, que? – falo, encarando ela – ah... é que fiquei meio, hm, feliz de você ter sonhado comigo e... – sou interrompido por mim mesmo. Isso lá é coisa que se conte?

– Ah... – diz ela, com um leve rubor nas bochechas – a questão é que eu tive pesadelos e... bem, como te pedir...

– Sim...?

– Eupossodormirnamacajuntocomvocê? – solta ela, rapidamente.

– O quê? Não consegui entender, desculpa.

– Eu, ahn, bem, posso dormir na maca junto com você? – questiona, olhando para o outro lado.

– Ah, bom, pode sim – falo, e ela olha pra mim.

– Jura? Sem problemas?

– Sem problemas.

– Ok, então, an, você primeiro.

Vou até a maca, e me deito nela, de lado. Alice, como se estivesse, sei lá, com medo, se aproxima e se deita também. Ela se encolhe, e eu cubro nós dois com a coberta. Descanso o braço em sua cintura, e depois de um tempo ela começa a dormir. Adormeço aos poucos, e nem percebo quando o sono chega. Só sei de uma coisa: ela não teve mais pesadelos aquela noite.

[...]

Sinto um leve puxão de orelha, e abro meus olhos, encarando uma Alice já vestida.

– Ah, então foi por isso que de repente ficou frio o espaço do meu lado? – pergunto, me sentando e esfregando os olhos - Era você que tinha levantado?

– Ah... sim, foi por isso...

– Entendi... – bocejo, e estico meus braços e pernas, logo em seguida descendo da maca.

– Hoje vamos para casa! – comemora Alice – E precisamos comemorar com algo bom! Tipo, sei lá, lanche!

– Com Coca? – pergunto, com os olhos brilhando ao me lembrar daquele gosto com gás, açucarado...

– Sim! – diz ela, colocando a mão de frente pra minha, e batendo nela, logo em seguida com um soquinho – Ah, vamos lá! Assim – diz ela, pegando minha mão e me mostrando como se fazia o que ela chamou de ‘’toca aqui’’.

– Ah, tipo quando eu batia minha pata na sua mão?

– Tipo isso – exclama, rindo... minha Bastet, que risada boa de ouvir...

– Bem, eu falei com o doutor, e ele disse que você tinha que dar uma passada no escritório dele pra uma conversa. Acho que ele precisa fazer algum exame, sei lá.

– Tudo bem... você arruma as coisas enquanto eu vou lá?

– Sim, pode deixar! – exclama ela. Dou um beijo em sua testa e saio, procurando a sala do médico. Bato na porta.

– Entre! – consente o médico – Bom dia, sr. Thomas. Vejo que já está melhor... você tem uma saúde de ferro, meu rapaz!

– Obrigada... eu acho.

Antes de continuar, ele solta uma risada.

– Pois bem, você está aqui por causa de uma amostra de sangue que recolhemos durante seus exames... bem curioso o seu DNA. Tem pequenos átomos de, bem, não estou louco, mas o seu DNA possui traços de DNAs felinos... você tem algo a nos falar?

Encaro ele, assustado. O que mais ele sabe?

– Mas isso tudo é apenas bobagem, algo impossível. Você veio até aqui para eu medir seus batimentos cardíacos, e ver se está tudo em ordem.

Solto o ar que eu não tinha percebido que estava segurando, e me viro de costas para o doutor, levantando a camisa. Ele coloca o estetoscópio na minha coluna, e sinto uma pontada de frio irradiando daquele ponto.

[...]

Depois que termino os ‘’exames básicos’’ volto para o quarto onde estavam as várias macas onde os pacientes passam a noite. Chegando lá, me deparo com Alice esperando com tudo em uma só mala.

– Que magia você usou pra caber tudo aí dentro? – questiono, pegando a mala da mão dela.

– Eu sou mestre nas magias, amigo – fala, cruzando os braços com cara de ‘’mano das quebradas’’.

– Ah, claro que é – ironizo, puxando ela pela mão.

– Ei! Espera aí! – reclama, enquanto corre e é puxada por mim em direção à saída. – Vamos logo, eu estou com fome! Comida de hospital é muito ruim, pelo amor de Bastet!

– Bastet...? ah, a Deusa dos Felinos, da mitologia egípcia não é? – aceno com a cabeça, concordando com ela – Onde você aprendeu isso? – questiona, como se eu tivesse pego um livro dela e lido enquanto estava na minha, ahn, forma de gato.

– Você lia em voz alta As crônicas Dos Kane, eu só prestei atenção na gata Muffin! – afirmo.

– Ah, seu danado! Eu gastando saliva pra ler em voz alta e você só prestava atenção na parte que a gata aparecia?! – solta, com uma raiva repentina.

– Calma, é só uma personagem de livro, eu não vou te largar!

– Mas quem disse que eu estava com ciúmes? Eu não estou com ciúmes!

– Minha Bastet....

– O que?

– EU NEM FALEI EM CIÚMES CRIATURA!

– Lógico que falou... eu ouvi! Você falou assim ‘’calma, é só uma personagem de livro, você não precisa ficar com ciúmes!’’

– Ah, então você não ouviu o que eu disse? – questiono, muito ansioso pela resposta... tomara que não tenha ouvido, eu não saberia onde me enfiar!

– Não, não ouvi. O que você tinha falado?

– Não, era isso mesmo que você falou, eu só queria te testar... – Que soe convincente, que soe convincente...

– Ah, se é assim.

Ufa.... por um segundo, nossa, que susto.

– Entra aí – diz Alice, apontando para a porta do carro. Entro e me sento no banco do passageiro, obviamente. Pegamos a rodovia, e depois de alguns minutos, entramos em um drive thru de lanches.

– Pega o cardápio, pode escolher primeiro.

Olho por alguns minutos e escolho o X-burguer.

– Pega – falo, devolvendo o cardápio pra Ali.

Ela observa todos os lanches e opta por um X-salada. Esperamos um tempo até o lanche ficar pronto. Alice contorna o drive thru e sai na rua novamente.

– Tem coca em casa, se é o que você está se perguntando – fala Alice.

– Como você adivinhou? – indago, incrédulo em sua capacidade.

– EU LEIO MENTES HAHA...DÁ SETA PRA ENTRAR O ANIMAL! – reclama ela, fazendo com que eu solte um grito de susto – Meu Deus do céu, Tom, você tá bem? – questiona, preocupada.

– Você é louca? Estávamos de boa, conversando e do nada você grita! Eu quase caí aqui – no começo é realmente uma reclamação, mas depois eu começo a rir - Que fome...

– Já estamos chegando, seu esfomeado! – reclama Alice, entrando no bairro. Em poucos minutos estamos em casa, e podemos comer nossos lanches.

Comemos em silêncio, afinal, conversas são desnecessárias. Tomei três copos de coca, minha Bastet.

Como ainda é de manhã, Alice resolveu me mostrar alguns vídeos na internet.

– Senta aqui na cadeira, você vai rir pra caramba! – afirma Ali, com convicção.

Vou até o computador, levando uma cadeira. Coloco-a ao lado da cadeira da Alice, e me sento.

– Olha isso! – diz ela, com uma animação gigantesca – Meu Deus! Que gato besta!

– É sério isso? – questiono, emburrado ao ver aquele monte de vídeos seguidos, com vários gatos se enfiando em caixas, potes ou caindo na água.

– Ah, que fofo! – fala, passando a mão na minha cabeça – ficou com raiva! Que bonitinho! – ironiza.

– Sai... – falo, olhando para baixo.

– Hm, então vamos colocar música!

– Boa ideia! – exclamo, mudando imediatamente de expressão.

– Que tal, ahn, Levels, do Avicii?

– Ah, pode colocar, desde que seja boa.

– É sim! – afirma, digitando o nome na aba de pesquisa

Ouvimos, depois dessa, mais dezessete músicas! Realmente, eu preciso ouvir mais... As que Ali sabia, ela cantou junto. Fiquei sinceramente impressionado com a voz dela... eu nunca parei para prestar atenção, e, bem, CARAMBA! QUE VOZ MARAVILHOSA!

Ela está cantando uma agora, e sem perceber eu começo a balançar a cabeça junto com o ritmo da música e da voz dela.