O Conto do Chá de Lótus escrita por João Gabriel


Capítulo 2
Chá de Lótus - Os Quadros




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Admirado pela surpresa, tentei captar alguns detalhes a mais antes de falar alguma coisa. Porque ela sentaria de lado e não de frente para mim? Em minhas confabulações resolvi acreditar que se ela estivesse com intenção de conversar teria começando um assunto, ou simplesmente esperava por encontrar alguém e sentou-se à minha frente.

– Procura por alguém? Chegou sozinha e foi deixada esperando do lado de fora pela companhia. Certo? - Tentei falar em tom calmo, mas minha voz saiu áspera e grosseira.

– Pelo seu modo de se sentar, acredito que não espera por ninguém e deseja embora o quanto antes, não é? - Sua voz era firme, um pouco mais grave para a maioria das mulheres. Ela se ajeitou na cadeira e passou me olhar nos olhos. Fiquei surpreso pela honestidade.

– Bom, farei a gentileza de lhe permitir que espere sozinha pela sua companhia. Boa noite. - Não tinha a intenção de ser galanteador, naquela noite e com a sensação de perigo que rondava o bar, eu me sentia na obrigação de ir embora e não arriscar a sorte. Entretanto, não consegui levantar e sair, surpreso com a mudança no discurso de minha companheira de mesa.

– Por favor, não se apresse. Fico feliz em conhecer o verdadeiro sargento Lynfei. - Aquilo me deixou preocupado, com a naturalidade que a fala foi construída, como se estivesse me esperando. Olhei por um tempo para ela, antes de responder.

Ela tinha os dedos levemente acinzentados, a tez branca de suas mãos indicava exposição pequena ao sol, mesmo com sob a luz verde da onde estávamos era possível notar que ela trabalhava em escritório sentada ao lado esquerdo de uma janela grande suficiente para fazer bronzear seu rosto e parte do pescoço. Um pouco mais claro eram suas mãos que seguravam a taça com delicadeza. Percebi, após mais um gole em minha bebida, que sua expressão era confiante. Sugeri a mim mesmo que seria uma dominadora de fogo, como o olhar decisivo e penetrante da princesa Azula, retratada em um quadro abaixo do general Zhao. A moldura era azul, única entre os parentes e militares da poderosa nação que iniciou a mais longa guerra que se tem ouvido falar. A irmã de Zuko estava pintada com uniforme militar masculino, em um tatame de Agni Kai, olhos bem abertos, boca semi aberta e a expressão de orgulho sobre o próprio poder. O belo rosto da princesa estava mais claro devido as faixas de relâmpago originais de seus dedos. Azula olhava para cima para onde direcionavam os dois grossos feixes de luz branca que cortavam o céu ensolarado.

– Leu sobre mim a caminho daqui, seus dedos entregaram um pouco de tinta de jornal. Trabalha em escritório, com grandes janelas, o vestido caro me diz que você é bem sofisticada e trabalha em um alto cargo administrativo. Toma decisões e por isso é sempre confiante quando fala sobre alguma coisa. - Mais uma vez uma tentativa ruim de parecer sincero e educado. Minha arrogância começava a me irritar.

– E não perguntou meu nome? Teve o interesse de pensar tudo isso de mim, mas não possui curiosidade de perguntar como me chamo? - Sua voz não demonstrava surpresa.

– Pelo jeito você não quer se apresentar. - Tentei me esquivar do deslize.

– Jiao Shuang, por favor só Jiao, senhorita Shuang é horrivelmente formal. - Sua risada era natural, ela parecia não sentir-se envergonhada ou espionava por um desconhecido. Aquilo me preocupou. - Alias, você olhou mais de seis vezes para mesa mais ao centro, onde a moça do litoral parece ter lhe chamado a atenção pela beleza e também pela companhia. Também está intrigado com a presença dos dois homens de terno escuro conversando a duas mesas atrás, e com o homem negro vestido nos mesmos padrões encostado no balcão central. - Ela terminou e voltou a me olhar nos olhos, pela primeira vez me senti sendo vigiado por todos citados em sua fala.

– Parece que você estava me espionando então? - Falei e logo olhei disfarçadamente para a dupla sentada a minhas costas, de relance olhei no homem negro no balcão.

A dupla atrás de mim trajava a mesma roupa, mas não tinha o mesmo biotipo, um era esguio e muito magro. O resto era bem desenhado, com as feições esculturas pelos ossos de um corpo magro. Tinha o nariz adunco e uma testa bem grande, deveria de alguma colonia do norte. O outro era mais baixo, mais forte e tinha o resto arredondado, usava óculos quadrados e tinha o cabelo comprido. No balcão, o homem negro estava distante, quase na área central do grande salão, tinha a barba grande e era bem alto. Não consegui olhar com perfeição suas feições, mas assim como todos vestidos daquela maneira, parecia estar me analisando também.

– É claro, queria estar perto de uma celebridade. - Falou orgulhosa.

– Não sou bom tratando meus fãs e costumo ter contato com pessoas que prendo. - Dessa vez quis ser grosso, estava preocupado com o que vi a minha volta.

– Se prestar atenção aos detalhes, verá que não precisa se preocupar comigo. - Falou, depois de um longo gole em sua bebida. Aquela taça me era peculiar, não o formato, mas a sua fabricação. Parecia cristal.

Antes de continuar a conversa, bebi o resto da minha bebida, já morna. Olhei em volta procurando por algo que acalmasse minha mente e afastasse a sensação de iminente tragédia que a qualquer momento fosse colocar o teto do Chá de Lótus abaixo e aniquilar todos oficiais e seus familiares. Nada, Queria ter ido embora antes, agora eu parecia preso a mesa onde sentei para me sentir invisível, e agora sou a atração secreta da solenidade. Virei o rosto para os quadros onde estava e me deparei com a representação de Toph Beifong, a lendária chefe de policia e referência em dobra de terra.

A chefe usava suas roupas oficiais, uma espécie de armadura prateada com ornamentos pretos, estava deitada em um solo enraizado ligadas a imensas árvores, uma floresta densa de troncos largos e copas a perder de vista. Alguns pequenos animais observam o corpo pequeno da policial, e ela parecia reconhecer a presença deles ali. Percebi que ela tinha as mãos e pés nus, encostados no chão. Ela sentia a presença de tudo. Tudo estava conectado.

A confiança que a chefe Beifong me passou, conseguiu me acalentar por pouco tempo. Comecei a tirar as botas de solado fino, muito comuns entre dobradores de Terra, Lava e Metal. Coloquei meus pés no chão para me conectar com o lugar e tentar me concentrar em poucas coisas. A insegurança só aumentava. Fiz um movimento alternado para frente e para trás com a planta dos meus pés fixas no chão. Sentia como se estivesse andando por todo os lugares do bar, sem sair do meu lugar original. Dominação de Jing Neutro avançada me permitia um sonar sísmico de quase todo o grande quarteirão onde estávamos. Mako, Bolin e Korra estavam junto com os novos monges do ar, Jinora e Ikki estavam sentadas ao lado do Avatar, enquanto Meelo deveria estar contando alguma coisa engraçada pois senti vibrações sincronizadas dos presentes naquele canto, mesmo os pés leves acostumados na dobra de Ar, era possível sentir suas presenças. Contei 157 pessoas em suas mesas, seis no balcão para atendimento, 16 garçons, dois homens que exageraram na bebida no banheiro masculino, três mulheres conversando próximo a entrada do sanitário feminino. Cinco carros espalhados nas ruas do quarteirão onde o bar foi construído. Na calçada passavam apressadas sete pessoas que esqueceram o guarda chuva, a segurança externa estava nas esquinas e dentro de um perímetro de 200 metros. Satomóveis blindados, patrulha que trocava de posto a cada 15 minutos. Contudo, não conseguia sentir a minha frente a presença de Jiao, não havia ninguém a minha frente, na mesa de Syneah, apenas três pessoas identificadas, uma delas o grandão pálido com a faixa na cabeça. Atrás de mim, a mesa vazia onde supostamente deveria estar minha dupla de vigias uniformizados. No balcão, distante de tudo, apenas os que não conseguiram lugar pra sentar sobre os cantos disponíveis no estabelecimento de Tain. Nada do homem negro de terno.

– Você parece assustado, acho que precisa de mais uma bebida. - Jiao chamou o garçom, eu estava aturdido, perdido nos meus pensamentos. Porque eu não sentia a presença deles? Eles não poderiam estar flutuando ou simplesmente desmaterializados. Quando o garçom chegou ela me fez escolher a próxima rodada. Minha cabeça doía e estava um pouco enjoado.

– Trás duas doses de raiz de Omashu, a minha senhorita irá acompanhar me na bebida. - Falei olhando para Jiao, ela estava serena como uma boa noite de verão.

Não satisfeito com a minha primeira busca, fiz um movimento circular com o pé esquerdo e tratei especificamente da mesa de Syneah. Captei sinais de terra próximos do chão, Metal de dominação e um outro material que não soube reconhecer. No balcão, o homem continuava um fantasma. Eu me concentrei agora nos homens as duas meses de distância para trás, acompanhei com o pé na direção onde eles deveriam estar. Fracos sinais de terra e metal próximos do chão. Jiao era ainda mais intrigante, nada nela era dominável, suas argolas eram de platina fosca, um fragmento de mercúrio parecendo oscilar. A única surpresa positiva era da taça de cristal, que era do mesmo material existente no castelo do rei Bumi. Quando terminei, olhei confiante para a bela taça esverdeada e ornada um material brilhante, provavelmente ouro branco. Com a mão direita concentrei a energia necessária para arrastar os cristais até a minha mão.

– Havia tempo que não via esses cristais, muito raros perdidos em cavernas desde a guerra dos cem anos. Eles são apreciados por dobradores de Terra por serem perigosos quando entram em contato com o corpo de não dominadores, ou de outros elementos. Onde foi treinada? - Era a primeira vez que senti orgulhoso de uma analise. Porém, ainda tinha mais dúvidas sobre como aquela noite terminaria.

– Sou aluna de Soi Feng, na academia do anel intermediário no fim da rua da Proteção. Tive a honra de receber seus conselhos e técnicas antes de morrer. Não consegui prestar o reconhecimento que lhe foi merecido. - Falou com pesar.

O Garçom trouxe as bebidas, ao olhar para agradecer, reparei que Syneah tinha a pele ao redor da tatuagem irritada, como uma alergia. Ela colocava a mão para amenizar uma dor, ou coceira. O homem de franja não tremia mais como antes. E o grandão parecia perturbado, queria sair para ir ao banheiro tentava levantar sem chamar atenção, ele parecia ser muito grande e doente para estar uma festa. Com os pés, lancei mais uma onda pelo lugar e percebi que o gigante pálido queria se mover rápido, mas cambaleava. Me veio a ideia de segui-lo.

– Com licença, senhorita... perdão, Jiao. Preciso ir ao banheiro. - Dei um gole na minha bebida, não tão quente quanto a primeira. Levei o copo comigo, temendo que pudesse acontecer alguma coisa quando estivesse fora.

Levantei e vi que a dupla sentava a baixo do quadro de Bumi, agora o rei parecia olhar para mim, Você precisa esperar. A sua voz aguda e cansada pareceu desprender da tinta sob a tela e penetrar na minha mente. Olhei diretamente para a dupla, eles estavam com a mesa limpa, não haviam pedido nada desde que estavam ali. Apesar de me sentir alcoolizado, meu passo era firme e passei pela mesa de Syneah, que não me olhou. Suas costas estavam irritadas, a tatuagem parecia ter derretido, estava indecifrável, como antes, mas agora era tosca.

O banheiro masculino ficava depois do balcão, próximo ao canto das Tribos da Água. As peles de cão-urso polar, focas-pinguim e outros adornos militares de malha grossa e cozida para não congelar os usuários. As terras geladas nos polos costumavam ser implacáveis com novatos. Lembro do meu treinamento, quando eramos obrigados a nos movimentar rapidamente para não morrer de frio e ao mesmo tempo dominar a terra para nos defender dos chicotes de água que eram lançados conta a turma. O quadro mais próximo que enxerguei era de Sokka, pois a luz azulada era a mais fraca dos cantos elementares do bar. Não era por menos, ali era conhecido como o canto da tranquilidade. O rapaz não estava em uma paisagem gelada como todos outros vizinhos de moldura. Ele vestia uma camisa sem mangas, com calças azuis escuras em contraste com a malha superior, azul claro. Pintado na fase adulta, feições sérias e olhar sonhador, o guerreiro da tribo do sul jogava seu bumerangue para o alto. O céu estava escuro, estrelado e a iluminação era prateada da lua cheia, da onde vinha a força dos dobradores de água, a silhueta do seu objeto voador parecia acariciar a fase do corpo celeste. A noite de lua cheia era chance de Sokka sentir a presença de Yue, com seu olhar doce e apaixonado pelo corajoso soldado que deixou na terra para salvar a tribo do norte do ataque iminente das tropas do almirante Zhao e os soldados do senhor do Fogo. O bumerangue vai e volta, assim como as ondas sonoras ou sísmicas quando encontram um obstáculo.

Entrei no banheiro deixando os sons de vozes e odores fortes dos chás de Tain para trás. O lugar era limpo e neutro, sem nada que lembre os elementos. A reflexão que tive quando vi o quadro de Sokka me revirou o estomago, mas não tive tempo de aplicar sobre a realidade que estava passando naquele momento. Ali, queria interrogar o grandão e depois ir embora o mais rápido possível. Encostei na louça que formavam as pias na base do grande espelho na parede e esperei pelo careca sair de alguma cabine. Haviam oito. Concentrei o chi para os meus pés e identifiquei o alvo na terceira cabine a minha esquerda.

O gigante saiu cambaleante, mais pálido que um espirito. Ele pareceu não me ver ali, alcançou a pia e molhou as mãos. Pelo reflexo no espelho, olhei a faixa em sua cabeça, elástica e apertada, parecia esconder um simbolo no meio da testa. Respirei fundo e falei:

– O senhor precisa de alguma coisa? Acho que exagerou no chá, hein? - Tentei não parecer ofensivo. Queria ser direto.

– Ele está bem, deixa que eu cuido daqui em diante. Obrigado sargento Lynfei. - Fui abordado por uma voz grave, que por causa do eco no banheiro eu consegui ouvir. Era o rapaz de franja. Ele parecia mais jovem agora de perto, seus olhos eram claros e ficavam escondidos atras dos oleosos fios de cabelo. Fiz um movimento rápido com as mãos e arrastei as pedras em cima dos pés do jovem. Dessa vez fui objetivo.

– É o seguinte, minha intuição não costuma me enganar quando sinto que tem problemas vindo da presença de vocês dois. Temos policiais aqui dentro e portanto sugiro que saiam antes que eu force a saída de vocês. - Apertei as mãos para que o peso das pedras machucassem o rapaz. O grandão ainda estava se olhando no espelho, não falava.

– Não se preocupe sargento, já estamos concluindo nosso objetivo. - Ele estava assustadoramente tranquilo, suportava bem a dor de ter os pés pressionados contra o chão.

– E qual seria esse objetivo? - Minha paciência tinha acabado. As pedras começaram a esquentar, eu estava pressionando mais as pedras, a ponto de arrancar uma queixa de dor.

– Logo saberá, seremos rápidos e eficientes.

Sai do banheiro muito mal, esqueci meu copo lá dentro. Olhei na direção de Mako e seus amigos, todos estavam despreocupados. Minha cabeça parecia explodir, tentei respirar e tive vontade de ir até eles. Me contive. Próximo aos novos monges, contei seis homens trajando terno escuro com a camisa verde escura por baixo. Na mesa ao lado de Korra, haviam outros três. Todos me olhavam. Sacudi a cabeça e sai de lá, queria ir embora e me direcionei a saída.

Quando senti Jiao pela primeira vez, ela me olhava nos olhos e fora da luz verde, vi que seus olhos eram azuis. Passou sua mão pelo meu braço e me guiou de volta ao nosso lugar. Antes de sair reparei nos quadro dos avatares, Korra estava sentada meditando, algo que não era uma característica marcante nela. Mas, as noticias sobre seu treinamento espiritual era unânime em afirmar que ela fazia longas viagens aos mundo dos espíritos sempre que tinha um problemas. Ela estava direcionada na direção do seu antecessor. Passei pelo quadro de Aang, também adulto, em sua fase mais sábia estava no estado avatar, mas a tela não retratava perigo, ou batalha, era como se o monge estivesse usando o máximo de suas forças para impedir um problema maior. Os raios de energia do mestre do Ar, eram apontados para o dragão vermelho de Roku, do outro lado da porta principal. Roku estava em posição de luta, e seu companheiro voador parecia segui-lo no mesmo ritmo. Não sabia o que aquilo queria dizer, não parecia fazer sentido por que o protetor da terra antes de Aang era um exímio dobrador e não precisava realizar os passos básicos da dobra de fogo. Ele estava com o corpo virado para Aang, porém seu olhar era direcionado ao quadro de Kyoshi. Eu já estava sentado a minha mesa quando senti minhas juntas doerem. Uma dor lascinante que me fez desabar na cadeira. Olhei novamente para ultimo avatar nascido no Reino da Terra, e reparei que ela era a uma mulher de princípios firmes, sendo desenhada no campo militar, no centro de Bah Sing Se. Kyoshi não estava em posição de luta, tinha postura ereta e seu famoso leque parecia comandar os movimentos de um grupo de soldados. O Dai Li.

– Você está ficando lento. - Sussurrou Jiao, percebendo que eu não estava prestando atenção nela.

– Soi Feng, era neto de Long Feng, líder do Dai Li que traiu a coroa. Azula conseguiu derrubar Bah Sing Se por dentro. Soi Feng foi expulso muitos anos depois de ser acusado de não obedecer as ordens do Rei Wu. Ele dissolveu a divisão secreta e criou a Força Toupeira-Texugo. - Estava com dor, a cabeça doía, mas como a mente estava começando a encaixar as peças o incomodo físico ficou em segundo plano. - Porque você está tomando partido dessa causa? Você está por trás dos assassinatos de oficiais da capital?

– Os traídos foram os soldados leais e criados pelo próprio Avatar Kyoshi para proteger os habitantes de Bah Sing Se. As muralhas resistiram por 100 anos graças ao sangue dos agentes do Dai Li verdadeiro, dobradores de Terra para cuidar dos habitantes da capital e de todo o reino. - Jiao parecia emocionar. Seus olhos estavam vermelhos, como se estivessem ardidos, mas não a incomodavam.

As mãos dela estavam sobre a mesa, seus dedos estavam cinzas, pareciam sem vida. Pensei por segundos que pareciam uma eternidade devido a dor que estava sentindo e me arrependi de descobrir. Ela estava com mercúrio nos dedos, o metal liquido que matava em poucos minutos. Lembrei de quando ela me encontrou quase saindo do bar, seus dedos entraram em contato com meu corpo através da minha roupa, a fina seda do meu kimono permitiu que o veneno entrasse na minha pele e atingir minha circulação.

– Envenenar é algo típico de um covarde. Jiao, você não é uma dessas pessoas. Ah... - tive que respirar mais fundo. - Você injetou o veneno em você durante anos, em poucas quantidades, fazia parte do treino secreto de Feng, o domínio do Metal Liquido e a criação da resistência do corpo para te transformar em um dobrador de terra ideal para o Dai Li. Ele foi expulso porque alunos morreram como cobaias. Você... - outra falta de ar, uma tosse seca - Parabéns, você conseguiu. Vai matar todos aqui como prêmio em memória de seu mestre? - Perto da morte, a ironia me pareceu um travesseiro confortável para minha mente envenenada.

– Nós provamos que somos mais eficientes. As verdadeiras Toupeira-Texugo teriam vergonha de vocês. - Ela riu e acenou para Syneah, que se dirigiu a mesa onde eu agonizava.

Não escutei o que ela planejava, olhei para sua mesa e vi que o grandão estava olhando fixo em mim. Não estava tão mal de saúde, deveria estar feliz pela primeira vez na noite que poderia usar seus poderes para executar um inimigo. Eu não sabia mais o que fazer, tentei me levantar, mas fui contido por Syneah. Ela se aproximou devagar, ninguém percebia meu estado. Deviam pensar que tinha bebido demais. Outra tosse e avistei Tain, tentei chamá-lo, mas a dupla que sentava por perto desviou a atenção dele quando foram para o balcão fazer um falso pedido.

– Não consigo olhar para você com a mesma honra de antes. Me responda, antes de me amarrar com as algemas que carrega. Você matou seu superior? Assassinou Ikka? - Me senti orgulhoso de completar a frase sem faltar ar. Era a ultima vez que faria aquilo.

– Não, sargento. Você foi honrado, será um mártir. - A voz de Syneah era gostosa de ouvir, naquela condição me caiu bem ouvir aquele timbre que trouxe palavras mentirosas de uma capitã desonrada. As mentiras me causavam mais dor que o veneno, controlado pela dominação de Jiao. Eu precisava pensar em algo, rápido.

– Jiao, pode ser sincera comigo dessa vez? Me concede um último desejo? - Falei em tom de rendição, a tosse foi mais seca e eu senti o gosto de sangue na minha boca.

– Claro, sargento Lynfei. - Sua firmeza não era abalada perante um homem a beira da morte.


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