Cante para eu dormir escrita por Ekkie


Capítulo 1
Presente


Notas iniciais do capítulo

Essa é a primeira vez que escrevo um yaoi, até hoje apenas li. Foi meio complicado reunir os porquês, mas muito divertido! Espero que gostem.
Boa leitura.



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Seu coração ainda doía ao lembrar que foi um extremo babaca. Acordou com grandes olheiras, tem sido assim desde o dia do acidente. Saiu do banho, penteou o cabelo na frente do espelho e pensou seriamente em desistir da tinta vermelha, não fazia mais sentido ser diferente. Ele não estava mais lá.

Pensou também em parar de se alimentar na cozinha. Toda vez que abria a geladeira lia o bilhete que não teve coragem de jogar no lixo.

Versos clichês e mal feitos não podem mostrar como me sinto

Abaixo-me a tua linguagem e declaro vulgarmente

Eu te amo mais que tudo, porra!

Castiel nunca deixou de ser uma pessoa arrogante e admitia isso sem algum problema, mas teria mudado todo seu jeito se isso significasse ter Lysandre de volta. Colocou a mochila no ombro direito e saiu de casa para encarar mais um dia na escola.

Odiava ver os olhos de pena que encaravam a foto de Lysandre no mural do corredor, se dependesse dele essa homenagem nem teria sido feita. Sabia que o garoto era querido por todos, mas toda aquela áurea de luto deixava-o enjoado. O sinal tocou e Castiel sentou na última carteira da sala, não pretendia prestar atenção em nenhuma das aulas do dia. Rosalya acariciou os fios vermelhos quando entrou na sala, mas ele não levantou a cabeça nem para falar um oi.

Mesmo sem se importar com a matéria, não aguentava mais escutar a voz de Faraize repetindo coisas sobre a Batalha de Austerlitz . Queria mais que Napoleão fosse se ferrar. Levantou bruscamente da cadeira e ignorou os olhares dos colegas de turma e do professor, retirando-se da sala. O tempo deveria estar aquecendo, mas ainda assim o vento frio de abril tomava conta de todo corredor, decidiu se isolar no porão, lá com toda certeza estaria mais aconchegante.

Estava certo, o silêncio do lugar também o confortava. Apoiou-se na parede e seus joelhos foram dobrando até cair no chão. Do bolso tirou seu telefone e, como um ato masoquista, começou a ler as mensagens dele com Lysandre.

" A primavera foi a melhor estação para Castiel, mesmo sendo enganado pela namorada, conheceu a pessoa mais admirável de sua vida. Ele foi a primeira pessoa com quem Lysandre foi falar.

— Com licença, você viu um bloco de notas por aí? Estou um pouco perdido e ele é realmente importante para mim.

— Ah, esse? — Castiel retira um pequeno bloco amassado do bolso — Encontrei na escadaria, acho que muita gente pisou nele, pelo estado que encontrei. Devia ter mais cuidado com suas coisas.

Lysandre agradeceu e foi procurar sua sala, extremamente aliviado por achar seus poemas e letras de música. Alguns minutos depois os dois encontram-se na sala e ficaram felizes por se verem de novo.

— Não pude deixar de olhar, tinha uma referência à Winged Skull, é uma música ou algo do tipo? — Castiel perguntou ansioso pela resposta.

Os dois descobriram que o interesse pela música era algo em comum, tinham certeza que se dariam bem. Durante semanas, após as aulas conversavam sobre bandas e todo o mundo musical, até decidirem tocar uma música juntos, apenas por diversão. Marcaram na casa de Castiel, como morava sozinho o barulho não incomodaria ninguém. Após a aula foram juntos.

O apartamento era pequeno e extremamente bagunçado, mas confortável. Seria um problema se Lysandre fosse uma pessoa organizada, pois havia até uma calça jeans cobrindo a cafeteira. Os dois foram para o quarto de Castiel, que procurou sua guitarra debaixo de tanta roupa espalhada.

— Eu tinha parado de tocar depois de todos os problemas que tive com minha ex-namorada, foi realmente desestimulante. — Castiel desabafou sobre Debrah, mas disse que apesar de ter o deixado, sentia-se feliz por ela — Mas depois de achar outra pessoa com tão um gosto musical tão bom é impossível não sentir falta da guitarra!

Castiel dedilhava sua guitarra com toda confiança, ignorando totalmente o tempo que ficou sem tocar. Naquele momento Lysandre admirou o egocentrismo do rapaz, nunca tinha visto alguém tão cheio de si. Com o microfone arriscou acompanhar as notas. Ficaram nisso a tarde inteira.

— Nunca cantei tanto em minha vida, — com a voz rouca e calma Lysandre afirma — temos que repetir isso.

Castiel cai na cama dando gargalhadas e concorda. Ficou feliz em ter perturbado os vizinhos como vingança à música religiosa que tocavam todos os dias no último volume. Lysandre também se jogou na cama e os dois ficaram olhando o ventilador girar.

— Acho que vamos ter que arrumar outro lugar para tocar. Com toda certeza meus vizinhos irão reclamar pelo barulho — Castiel fala em um tom divertido

— O que? Você disse que não iríamos incomodar ninguém! — Lysandre vira o rosto para o lado, ficando de frente para o rosto de Castiel

— Eu menti.

Os meninos ficaram alguns minutos sentindo a expiração do outro até a campainha tocar e fazer com que abrissem os olhos. Era a mãe de Castiel, a viagem do navio havia sido cancelada então resolveu passar os dois dias de folga junta ao filho.

— Cassy, querido, você tem se alimentado direito? Que horror, essa sala está um nojo. — Valérie entra na casa enquanto reclamava — A propósito, quem é esse rapaz?

Lysandre estava de pé, um pouco envergonhado, Castiel o apresentou e o levou até a porta. Pediu desculpa pela mãe, estava irritado por ela ter chegado do nada, se despediu e voltou para dentro.

A noite estava linda, fazia tempos que Lysandre não tinha uma amizade tão prazerosa. Não sabia ele que Castiel também."

Conforme lia as poesias que Lysandre o mandava, lágrimas iam escorrendo pelas suas bochechas. Reconhecia que era uma pessoa arrogante e amava Lysandre por lhe amar dessa maneira. Na parte de cima da escola o sinal do intervalo havia tocado, agora estavam todos almoçando, menos Castiel, que ainda se reprimia no porão.
No chão algumas partículas de poeira se estabilizavam, o lugar não era usado há meses. O nariz de Castiel coçava, mas mesmo assim acendeu um cigarro. Tragava-o profundamente, fazendo daquela fumaça sua única companhia.

"Os meses foram se tornando cada vez mais divertidos, os ensaios estavam cada vez mais frequentes e demorados. A poeira do porão não foi um problema, limparam apenas a parte que deixavam seus instrumentos.

Sempre esperavam todos os alunos irem embora para descer, essa era a condição imposta pela diretora para usarem o lugar. Só iam embora bem tarde, a ponto das ruas estarem desertas.

—O que vamos tocar hoje?—Castiel pergunta acendendo um cigarro.

— Você deveria parar de fumar aqui, se a diretora achar as pontas de cigarro estaremos ferrados.—Lysandre alertava enquanto ajeitava os aparelhos.

Castiel fechava os olhos, apreciando o som que a guitarra produzia, Lysandre também concentrava-se olhando um ponto fixo na parede. Os dois estavam com o cabelo molhado de suor, o porão abafado e a empolgação dos dois deixavam tudo mais caloroso. Depois de 40 minutos de treino fizeram uma pausa.

Após se refrescar jogando água no rosto, Lysandre passou a garrafa para Castiel, que fez o mesmo. Respiravam ofegantes, como se tivesse corrido em uma maratona. De pé, apoiaram-se um ao lado do outro na parede.

— Nunca me canso de tocar, estamos quase atingindo o tempo de um show inteiro! — Castiel estava orgulhoso de si mesmo.

Olhou para Lysandre, que o encarava fixadamente. As bochechas se aproximaram da cor do cabelo quando ele chegou ainda mais perto.

Com a mesma suavidade de quando canta, o vocalista segurou no pescoço de Castiel e o beijou. Nenhum deles hesitou, ambos estavam gostando daquilo. Lysandre emprensou Castiel contra parede e aquele beijo foi descendo para o pescoço.

— Eu te amo.— O mais alto declarou

Estavam certos que o suor daquele momento foi causado pela proximidade, não pela falta de circulação do ar no porão. As carícias se tornavam mais próximas até escutarem um barulho vindo de cima e se afastarem bruscamente.

Lysandre abotoava a camisa enquanto Castiel subiu para conferir o que estava acontecendo."

Esperou com que o barulho dos passos acabassem para ir embora. Já era tarde, mal podia acreditar que passou o dia recordando suas memórias com Lysandre na companhia de cigarros. Pegou o ônibus e, com a cabeça encostada na janela, foi escutando música nos fones de ouvido.

Mesmo que não seguisse uma religião agradeceu a Deus por chegar em casa, não aguentaria ver mais pessoas nas ruas. Passou pela cozinha, ligou o rádio e preparou um café. A música que tocava era a música dos dois, Flax, de Gem Club.

"Castiel e Lysandre estavam felizes por dividerem o quarto durante a viagem da escola. O passeio duraria três dias e duas noites em Portugal, lá visitaram Oceanario de Lisboa e outros pontos de estudo. A viagem da França até o destino foi cansativa, mas estavam entusiasmados, principalmente na parte de dividir o quarto.

Ao chegar, Lysandre segurou a cintura de Castiel em uma dança, ainda inseguro dava passos duros. Acabou por uma pequena risada, dando abertura para altas gargalhadas dos dois. Tomando folego se pôs novamente e propôs uma nova dança. Dessa vez com o pequeno rádio tocando uma música qualquer de uma banda alternativa, Lysandre cantava no ouvido de Castiel, que aos poucos foi dando passos mais leves.

— I wish I had known him then, I wish I was more like him .— mordeu o lóbulo da orelha de seu amado.

Castiel o abraçou e assim se balançaram até cair na cama.

A noite estava fria, a lua roubava todo o brilho do céu, nenhuma estrela estava presente. Debaixo dos edredons, Castiel apoiava a cabeça no peitoral de Lysandre e ele acariciava os fios chamativos.

—Vamos ser eternamente felizes, Castiel, eu te amo.

Lysandre fazia questão de declarar após toda noite de amor que tinham. Amava verdadeiramente Castiel, como um eterno poeta abriria mão de sua vida por ele."

Quando foi dar conta o café já havia esfriado. Seu peito doía de forma agonizante, estava perdendo o controle de si mesmo. Com a visão turva pelas lágrimas caminhou até seu quarto. Do guarda-roupa tirou um longo sobretudo que Lysandre não levou após sua última discussão. Jogou-se na cama e, abraçado com a peça, tentava buscar os últimos vestígios do cheiro do dono.

Arriscava sussurrar alguns versos das músicas que Lysandre costumava cantar, percebeu que todas elas pediam socorro. Deveria saber que ele precisava de ajuda, mas Castiel foi egoísta e colocou seus problemas acima de todos.

" — Não, eu não aceito!

Ninguém nunca havia visto Lysandre naquele estado de fúria. Castiel era o alvo, mas estava tão irritado quanto.

— A vida é minha, eu volto com a Debrah se quiser e você que se foda.— jogou a jaqueta no chão

Lysandre também estava sem seu sobretudo. A casa de Castiel costumava ser um lugar silencioso, mas naquele momento os gritos tomavam conta de tudo.

—Que se foda, Castiel? Que se foda? Eu larguei meus planos por sua causa e agora vem me dizer que se foda? Vai se foder você e aquela vadia! —A voz do mais alto estava totalmente desestabilizada

Castiel avançou para cima dele e com um golpe lhe deu um soco no rosto. Lysandre revidou, lhe atingindo a face também. Impaciente pegou sua mochila e virou as costas indo embora.

— Eu te odeio, Lysandre! Você acabou com a minha vida, eu te odeio!

—Eu também me odeio, Castiel. — falou sereno, batendo a porta.

Horas depois, Castiel recebe um telefonema de Rosalya, que desesperada exigia sua presença no hospital da cidade. Ainda irritado pegou a moto de acelerou o máximo que pode, não para estar rápido lá, para sentir o vento levando todos seus problemas. Entrando na emergência consegue ver a garota chorando, Leigh também estava lá a abraçando.
Ainda sem preocupação pergunta o que houve. Ao olhar para Leigh pode ver que seus olhos estavam marcados.

—Onde está Lysandre? — Sem paciência repente a pergunta e paralisa com a resposta.

Rosalya o abraça e explica o que havia acontecido."

A busca por memórias de seu amado se tornava cada vez mais dolorosa. Não teve a chance de sentir arrependimento, sentia angústia e desespero. O vento batia na janela, mostrando a solidão que acompanhava o garoto, pequenos riscos de chuva se formavam naquele vidro.

A vida de todos continuaria e Lysandre não passaria de uma lembrança do passado.

"O rosto de Lysandre era tão belo, tão detalhado, agora estava lá sem vida, com um pequeno roxo do soco na bochecha direita e com uma enorme cicatriz na testa.

— Eu te amo, seu idiota. — segurou a mão fria — Lysandre, me responda! Por favor, eu te amo, eu te amo...

As lágrimas escorriam pelo seu rosto, Castiel estava com as pernas bambas e mãos temendo. Sabia que Lysandre não o responderia, mas era impossível aceitar isso. Suas últimas palavras foram de ódio, queria mais que tudo que Lysandre soubesse de seu amor, mas demorou demais para isso. O corpo pálido e frio tornava-se mais morto a cada segundo.

—Nós iríamos ser felizes, não se lembra? Você me prometeu! Seu idiota, não vá fugir da promessa!— a voz falhada implorava perdão.

Em uma cena deplorável Castiel chorava por cima do cadáver naquela cama de hospital. Sua feição de revolta e desespero espalhava pena para as poucas pessoas que estavam por perto. A mãe de Lysandre, se aproximou e apoiou a mão sobre o ombro do rapaz. Ela também tinha os olhos inchados e encharcados.

—Eu o amava — Castiel admitia sem a menor vergonha

—Eu também, querido, eu também... — a senhora o abraçou e os dois se confortaram."

Sentado na cama acendeu mais um cigarro, foi o dia que mais fumou. Lysandre tinha depressão e Castiel não sabia, achava que realmente o conhecia, mas não esteve lá quando ele mais precisou de ajuda. Talvez aquele carro que o atingiu não tenha sido totalmente culpado.

Chorando e tragando tirou da gaveta do criado mudo um poema. Foram os últimos versos escritos.

Não acorde o passarinho

Ele está com medo, escondido

Pensou certa vez em voar

—Voar machuca, passarinho

Tornou mais uma vez a se esconder

Não liberte o passarinho

Lá fora faz frio, ele morreria

Pensou certa vez em cantar com outros pássaros

—Cantar corrói a alma, passarinho

Voltou para o fundo da gaiola

Não ame o passarinho

Ele é triste, tristeza se espalha

Pensou certa vez em abraçar

—Abraço estrangula, passarinho

Tomou uma dose de remédios

Ei, passarinho

Passarinho?

Boa noite, passarinho


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Notas finais do capítulo

Agora gostaria da opinião de vocês, fique a vontade para dizer o que achou. Comentários são sempre bem vindos! As poesias da histórias também são de minha autoria.E parabéns para a Kori! Obrigada por tudo o que faz pelo site!
Beijinhos, Ekkie



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