Mastros ao vento das notas marinhas escrita por Sirukyps


Capítulo 1
Capítulo 1




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Como não se encantar com o bonito som concedido por uma concha marinha? Aquela melodia que acalma em perfeita sintonia ao belo pôr do Sol. Apesar de encantar a todos, nem sempre os talentosos artistas desfrutam da mesma felicidade. Uma hora, os elogios se tornam vazios e sorrir socialmente entristece a alma.

Outra noite de domingo terminava ao som do harmonioso toque da sinfonia marinha. No último domingo do mês, regularmente, o espetáculo se iniciava com uma grande orquestra e terminava com ao suave ressoar do piano.

O pianista, um atraente tritão que fechava os olhos maleando cabeça brandamente sintonizado ao desfazer das notas, tinha acastanhados cabelos penteados para trás e trajava um terno tão alinhado como a impecável composição.

Tocando a última tecla, suspirou tristonho e insatisfeito. No entanto, não precisou de segundos, logo retornando uma expressão aristocrata para a plateia, transparecendo superioridade por aqueles arroxeados olhos de teimosia. Os aplausos eram inevitáveis, contudo ainda durante a euforia, o jovem bateu a cauda e partiu em alto mar.

Aquilo despertava a fúria do seu pai, o grande Germânia. Como poderia coordenar o som das águas marinhas daquela maneira? Tinha consciência que o filho desprezava grandezas hereditárias, sempre economizando, lutava pelas suas conquistas, pois almejava o próprio reinado para não viver a sombra de ninguém.

Um grande rei com uma bela história sobre a vitoriosa e exuberante existência. No entanto, não conseguia abandonar o pai e tudo aquilo para lutar pelos diversos sonhos, pois jamais aguentaria viver distante daquela confortável vida majestosa encontrada no castelo.

Assim, o tritão acalmava a alma nadando bastante até chegar as grandes pedras próximas ao porto, onde diversos navios luxuosos e luminosos ancoravam cotidianamente.

Conhecidos com filhos de Roma, os humanos aparentavam felizes e vitoriosos. Bebiam cervejas cantando sobre diversas histórias vividas em alto mar, esbanjando joias preciosas e alegria por onde caminhavam. De vez em quando, algumas das brilhantes pedras, mapas, bússolas e outras especiarias caíam na água salgada, sendo recolhidas rapidamente pelo aquático colecionador.

Nesta noite, um objeto desconhecido boiava nas tranquilas ondas. Redondo e negro, tinha uma textura de couro e oscilações como uma miniatura de navio. No entanto, este era enfeitado com pérolas e as penas das coloridas aves que cortavam o céu durante o amanhecer.

Sem demora, o curioso rapaz nadou para mais perto da margem e recolheu o objeto. Observava, analisando minuciosamente, perguntando-se sobre sua função. Talvez fosse um copo para a nobreza pelo espaço vazado no meio, ou ainda uma coroa para pessoas importantes.

Desviando da luz, espionava e poucos utilizavam aquele adereço dentre a multidão. Aparentavam sujos e clandestinos, todavia belas moças os abraçavam, entregando-lhes bebidas e sorrindo exageradamente.

Ele abraçou o presente dos filhos de Roma com apreço. Colocando sobre sua cabeça, na realidade, não importava tanto a função, somente o fato de ter encontrado um novo tesouro já o deixava imensamente feliz.

Fugindo das luzes que se tornavam mais forte com o avançar do horário, preparava para retornar a vida entediante, quando uma voz chamou sua atenção.

Imediatamente, por impulso, buscou refúgio atrás as altas pedras. O coração tremia temendo ser descoberto. Cresceu ouvindo histórias sobre a crueldade destes seres encantadores, por isto era inevitável o alarme. Questionava-se o que aquele indivíduo fazia naquela parte deserta da praia e não estava com o resto da multidão animada.

A voz continuava clamando atenção. Determinado, ele caminhava afastando da luz como se farejasse o amedrontamento do tritão que fugia em silêncio tentando retornar ao alto mar.

Quando mergulhou, o objeto boiou, denunciando-o. Imediatamente, o animado rapaz retirou as botas e mergulhou naqueles mares, nadando em alta velocidade atrás do negro artefato.

Desesperado pela tristeza que cercava seu coração, o jovem não gostaria de perder seu precioso item, nadando de volta, terminou agarrando no mesmo instante que o desconhecido sujeito.

Permitindo que o chapéu continuasse boiando, o estranho humano mergulhou para descobrir a face do possível ladrão que segurava firmemente na aba do objeto. Abriu os olhos, encarando por alguns minutos os vívidos olhos do desconhecido, logo retornando a superfície, necessitando de fôlego.

O tritão permaneceu estático quando encarou aqueles olhos esverdeados tão brilhantes como as águas marinhas. Não aparentava perigo e até lhe transmitia certa segurança... Ou uma estranha sensação desconhecida que lhe ponteava o peito.

Era engraçado como aquela humana cauda tinha a mesma habilidade que a sua. Os dedos atiçando a água. O peitoral coberto pela branca camisa... Criando coragem, ele cruzou a superfície, tendo um meio sorriso para aquele ofegante rapaz de acastanhados cabelos bagunçados que tentava retornar ao ritmo correto da respiração.

- O meu chapéu... – Ele pediu educadamente, virando um pouco o rosto para analisar a pálida criatura em sua frente, tendo um sorriso gentil delineando seus lábios. – Como se chama?

-Roderich... - Fez uma pausa, hesitando sobre como reagir. - Roderich Edelstein. – Completou, não tão amigável quanto o outro. Impulsionado pelo medo em perder o objeto, escondeu, afogando-o atrás de si. Levemente arrogante, sequer concordava com o que dizia, porém arriscava, pois temia que o precioso tesouro fosse tomado. - Como pode ser seu...? Ele caiu em minha casa, então agora é meu, não?

- Sua casa? Então você mora no mar? - Interessou-se, piscando por alguns segundos. Atento, desaparecia aquele gentil sorriso, restando as esverdeadas pérolas de curiosidade. - Você é um dos filhos de Germânia?

- Você... - Recuou um pouco para trás. Apesar da consciência gritar para que fugisse logo, algo o mantinha ali. Algo desconhecido, uma sensação complexa e profunda. - Como se chama...? Não tenho permissão para dar satisfação a estranhos...

- Eu sou Antônio. Antônio Fernandez Carriedo, um explorador dos sete mares disposto a satisfazer seus mais íntimos desejos. - Apresentou-se com um evidente tom de brincadeira. Uma forçada pausa ocorreu por causa do soluço alcoólico. Levando a mão a boca para ocultá-lo, voltou a fitar o bonito garoto de forma carente, assim continuou o pedido. - Mas, por favor, devolva-me este chapéu... - Observando os belos olhos em resistência, sorriu, tateando os bolsos como se procurasse algo. Retirando óculos de lentes transparentes, ergueu ao outro. - Faremos uma troca, pode ser?

- Uma troca...? – As armações prateadas logo chamaram sua atenção, permitindo o chapéu retornar para o campo de visão do marinheiro. Analisando-o uma última vez, interpôs curioso. - Então, o nome disso é chapéu... Para quê serve, senhor "Explorador dos Sete Mares disposto a satisfazer meus mais íntimos desejos"? - Caçoou, erguendo uma sobrancelha, logo se preocupando com a possibilidade de irritá-lo.

- Permita-me demonstrá-lo? - Estendeu a mão, tendo um sorriso no rosto, aguardando que o outro cedesse o objeto.

- Não... – Embora relutantemente, entregou, contrariando as ditas palavras.

- Muito Obrigado, nobre filho de Germânia. - Agradecendo através de uma improvisada reverência, guardou os óculos no bolso e colocou o objeto encharcado sobre a cabeça, molhando-se completamente. O desatento apenas sorriu do próprio infortúnio, como se nada importasse naquele momento.

- Não tem de quê... - Respondeu, inevitavelmente rindo junto. Logo estendeu a mão, pedindo os óculos como prometido pela troca.

- Antônio? – Pessoas gritavam com lanternas, percorrendo a praia, preocupadas com o desaparecimento daquele homem de pele bronzeada que tanto amava o mar. Agravando este amor quando em contato com a bebida para comemorar alguma vitória.

Enquanto isto, o espanhol agradecia, retirando os óculos dos bolsos, abrindo e colocando no rosto do sereno jovem que permanecia nadando em sua frente.

– É assim que você tem que usá-los. – Suspirou, permanecendo em silêncio como se estivesse hipnotizado pela nobreza emanada pelo envolvente desconhecido. Foi necessário outro soluço para que retornasse a realidade, respondendo aos insistentes chamados. – Estou indo! – Apreciando seu companheiro por uma última vez, comentou. – Combinaram perfeitamente. Eles transparecem a bela tonalidade peculiar dos seus olhos, filho de Germânia. - Fechando os olhos, mergulho enquanto falava como desejasse averiguar a veracidade daquele sonho. Retornando a superfície, logo tomou rumo de volta a vastidão de areia.

- Certo... – Assentiu com um sorriso animado observando o humano se distanciar, como se houvesse acabado de fazer um novo amigo. Todavia, não ignorava o fato de que, este, por sua vez, era peculiar. E, é claro, jamais teria a permissão para reencontrá-lo.

Desesperado pelo som dos humanos à distância, decidiu apressar-se, batendo a cauda com bastante força antes de desaparecer pela escuridão dos mares. O sorriso lhe estampando o rosto era aparente. Agora, carregava um novo objeto para sua coleção, ainda que não fosse o que inicialmente almejava, este lhe deixava estranhamente contente.


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