Los Angeles, CA

SÁBADO, 15 DE JUNHO DE 2015.

Eu já sabia que o dia mais longo da minha vida seria hoje. Assim que acordei, eu já sabia de que algum modo tudo estava planejado para dar errado. E mesmo assim, por teimosia talvez, andei pelas ruas acinzentadas já sabendo das consequências que aquele ato iria me trazer.

As garrafas de bebidas da noite passada estavam vazias. Eu estava esquecido na conversa da esquina. Nunca fui de reparar mudanças do meu corpo, entretanto, olheiras roxas e fundas se formavam sob meus olhos e meu rosto estava pálido como se visse um fantasma. E por um momento, pude acreditar que aquele reflexo no espelho não era eu.

❄️

HORAS DEPOIS
O líquido percorre minha garganta com o gosto ácido que bem conheço. Causando uma combinação perfeita com o tormento que permanecia ali - arrancando a pouca dignidade que eu possuía. Dessa vez solto um chiado rouco em resposta, cerrando os olhos.

Mesmo com a rua estando movimentada com carros que ultrapassavam o limite da velocidade, pessoas seguindo seus destinos cruzados. Existia o silêncio, que chegava a ser um pouco assustador, mas bom.

Havia algo que me fazia manter os olhos fechados, e, de alguma forma, isso me aliviava melhor que a bebida, passar um tempo nas correntezas de sua mente em uma praia só sua, era algo incrível, e é também o único lugar que, por enquanto, ninguém havia tomado posse. Gosto de pensar nas ondas da minha praia como dor, aquelas ondas imensas que parece que irá engolir tudo que está por frente. Eu estava acorrentada á elas.

Eu também podia sentir o peso nas minhas costas. A culpa estava fervendo em minhas veias. Sentia como se acabasse de cometer o pior crime de todos os tempos usando apenas palavas. Eu me sentia mal por ela, por seus pais que me tratavam como um filho, pelos convidados que vieram de longe para ver aquilo, pelo dinheiro gasto. Por tudo.

Uma sombra se formou em minha frente, me tirando do transe em poucos segundos, além de bloquear a luz do sol como uma tela de proteção. E mesmo contra minha vontade, levanto a cabeça abruptamente.

Olhos azuis me encaravam com um certo dó. A luz do sol criava um aspecto mais sinistro, maquiagem impecável, o rosto levemente vermelho. O cabelo louro amarrado em um coque mal-feito, parecia que estava chorando poucos minutos antes. Estava tão perto que pude ouvir sua respiração.

O susto foi imediato. Um grito foi reprendido em minha garganta e tento - inutilmente- ir para trás. Ela me encarou assustada, sendo que não era eu que estava a 10 centímetros de distância de um total desconhecido.

Havia uma câmera em suas mãos, grande e preta. E um sorriso falso habitando seus lábios. Em um movimento rápido, tirou algumas garrafas do meu lado e se sentou, como se fossemos dois melhores amigos de faculdade. Franzo as sobrancelhas vendo tudo aquilo. Quem era ela?

– Você está bem? - Ela perguntou, devidamente preocupada.

Fito seus olhos, estranhando a pergunta. Por um certo tempo, vi minhas ondas de dor habitando-os. Azuis e agitados. Ela parecia falar sério, sua boca mantinha uma linha reta e me encarava esperando a resposta.

–Hã ... sim. - Digo depois de um tempo - Obrigado por perguntar, e você? - Pergunto-a, resolvendo puxar um assunto.

Ela dá um sorriso cabisbaixo antes de responder. - Mais ou menos, sabe? Eu estava com Susan antes de vim até aqui. Aguentei duas horas de choros, e perdi meu voo para Nova Iorque - Ela aponta para uma grande mala preta.

Susan.

Aquilo me atingiu como um soco no estômago, fiquei desnorteado por alguns segundos, apenas o som de seu nome me causava ondas de arrepios. Como será que ela estava depois de tudo aquilo?

– Você é o cara que disse não, né? - Ela perguntou, olhando no fundo dos meus olhos.

Senti minha garganta queimar. Ela sabia, e ainda havia se prejudicado por minha culpa.

–Sou. - Minha voz falhou. - Eu ... - As palavras saiam confusas, minha língua parecia lixa de tão seca. - Eu posso te ajudar de alguma forma?

Ela me encarou como se não acreditasse no que ouviu, mas o que eu dizia era verdade. Mesmo assim, resolveu continuar com um tom de indiferença.

– Não. Você não pode me ajudar, sem nem ao menos se ajudar. Olha seu estado!

Ela apontou para a roupa que eu usava : O terno branco estava rasgado e com furos. Meu cabelo estava desgrenhado e eu estava descalço. Sem tirar o detalhe de estar com garrafas de bebidas espalhadas na minha frente.

–Ei! Eu estou bem, ok? - Eu disse, elevando meu tom de voz um pouco mais alto. Fiquei com raiva, todos diziam a mesma coisa quando passavam por mim. É difícil entender que eu estou bem?

– Percebo. Está com fome? - Sua pergunta entrou na minha mente, ecoando em todos os cantos. Na verdade eu não comia faz dias. E estava realmente morrendo de fome.

–Não. - Meu estomago roncou discordando. - Talvez um pouco.

Então ela riu. E sua risada misturou com a minha.

– Me conta. O que aconteceu? - Ela perguntou.

Então eu disse tudo. Eu não sei o motivo, mas quando vi as palavras já estavam jorrando da minha boca. Posso colocar a culpa certamente na bebida, mas 1) Eu não estava tão bêbado. 2) Porque, no fundo, eu já sabia o motivo. Eu precisava que alguém me escutasse, sendo conhecido ou não, amigo ou não. Eu precisava que uma pessoa ouvisse tudo o que eu tinha para desabafar, e ela escutou tudo em silencio, ouvindo com a cabeça abaixada e dizendo algo quando necessário. E eu gostei dessa sensação. Então, quando eu terminei de falar, ela me disse que eu não devia está assim, e algo que eu nunca vou esquecer, eu deveria pensar em mim em primeiro lugar, Eu não estava feliz com Susan, então necessitava fazer aquilo. E ela disse também que eu neste momento não estava bem. E com essa segunda parte até concordei.

– E acho também que deveria conhecer lugares novos. - Ela disse por final. - E como sou uma ótima pessoa, aceito seu pedido de ajuda. Me leva a Nova Iorque. - Sorriu.