Pulsos Atados escrita por Anayra Pucket


Capítulo 22
Capítulo 21 – O Fim dos Enigmas - Mariana




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Eu não conseguia conter os soluços causados pelo meu desespero.

Meus pés estavam pisando na estrada de terra, seguindo a trilha que levava para a abertura do terreno. Meus pensamentos não eram nada além de gritos no vácuo, água no deserto, ou migalhas para uma fome imensa. Sentia como se toda a minha esperança tivesse sido drenada do meu corpo e só restasse a culpa.

Apesar da minha mente gritar e espernear para meu corpo que aquele lugar era perigoso agora, simplesmente não era o suficiente para me impedir. Era uma analogia estranha, mas como já falei antes é como se aquele lugar fosse um imã e me puxasse para si. E não existia uma forma de escapar dessa atração, era totalmente inevitável. Ou talvez eu estivesse louca.

– Eu realmente odeio a minha vida! A minha saída mais próxima agora seria a morte, quem sabe assim as coisas se resolveriam. – Chorei mais convulsivamente se é que isso era possível. Não podia me conformar com o que aquele flashback apontava.

Eu tinha alguma coisa a ver com o desaparecimento dele, talvez até com a morte. Pra variar eu não consegui permanecer insípida e inalterada na hora que havia descoberto isso. Ao invés disso bruscamente entrei em pânico e fugi, dando mais motivos para Clara e todos, isso inclui a minha melhor amiga, desconfiarem de mim.

Como minha vida podia ter virado de cabeça pra baixo em menos de uma semana?

– Se você fosse uma humana comum, eu diria que sim, a morte podia dar fim aos seus problemas. Mas acho que já sabe que você não é exatamente normal. - Uma voz veio de trás de mim, e com o coração entre as mãos me virei para a sua direção.

Um homem jovem de cabelo acobreado estava parado não muito longe de mim, como se estivesse me observando já há algum tempo. Era o irmão do Ariel.

– O que você faz aqui? – Questionei-o limpando o nariz e os olhos com as mangas do meu suéter.

Tentei atuar como se não estivesse com medo, mas quem me conhecia ou era bom em reconhecer uma máscara de disfarces sabia que eu estava apenas fingindo. E muito mal.

– Não vai chorar mais como uma criançinha assustada? – Ele fez outra pergunta sem responder a minha própria friamente.

Não importava que ele e Ariel fossem irmãos, suas personalidades eram totalmente diferentes. Ariel era mais caloroso e receptivo, e ao mesmo tempo frio e distante. Gabriel pelo o que eu estava vendo era arrogante e grosseiro, mas ambos possuíam uma característica em comum: o mistério. Isso me desmoronava por inteira.

Pensei em xingá-lo e ofendê-lo, bater os pés no chão, discutir como uma pirralha e agir da maneira que ele esperava que eu agisse. Mas tive uma ideia melhor, e então só me virei e continuei andando.

Forcei meus pensamentos a se organizarem na minha mente e tentava por todo tempo convencer meu coração que eu não estava rejeitando o cara por quem eu tinha uma queda enorme.

“Ele não está aqui, você o viu pela primeira vez há uma semana atrás. Vocês nunca conversaram, você não sente nada por ele nem nunca vai sentir. Ele estava lá quando aquela criatura saiu de dentro do solo do terreno. VOCÊ NÃO SENTE NADA POR ELE!” – Minha mente não se calava por um segundo a cada passo que me distanciava dele.

Agucei meus ouvidos para ver se escutava passos, mas não ouvi nada.

Eu sabia o que estava prestes a fazer, e com um instinto automático me virei para o olhar uma última vez.

A confusão me atropelou como um carro em fuga, porque ele não estava lá, como há segundos atrás estivera. Esfreguei meus olhos como se isso clareasse minha vista e o trouxesse de volta para lá, mas o que eu via com certeza era real.

“Ele pode ter simplesmente ter cortado caminho e se escondido nas árvores para me assustar” – Raciocinei mentalmente – “Em uma velocidade impressionante”. – Meu medo acrescentou sombriamente para variar.

Tratei de me recompor e virei para a frente mais uma vez, com a intenção de continuar seguindo o caminho até o terreno e trombei com um dorso alto e firme.

Gabriel estava parado apenas a centímetros do meu corpo e a luz do ambiente em que estávamos não me permitia vislumbrar nada além da sua sombra e do brilho sobrenatural dos seus olhos. Eram como se tivessem sido arrancados do próprio céu e pregados ali em seu rosto, que parecia ter sido esculpido por anjos.

– Você não vai escapar de mim tão facilmente. - Ele murmurou de um jeito muito sedutor, mas aquilo não me atingiu como ele (e até eu mesma) esperava.

Eu não queria mais problemas e aquele cara definitivamente era um problema.

– Com licença. - Eu resmunguei tentando desviar, mas ele sempre entrava na minha frente. E o pior de tudo, ele estava rindo, como se eu fosse uma palhaça.

Com um impulso muito automático fingi que ia desviar para um lado e corri para o outro e ele não esperava por isso, então consegui vagarosamente despistá-lo do meu caminho. Comecei a correr e foi como se estivéssemos brincando de pega-pega e fôssemos duas crianças travessas. Não consegui prender a risada enquanto movia meus pés para fugir dele e não demorou muito para ele também começar a rir.

Num piscar de olhos, como fizera há instantes atrás ele apareceu então na minha frente do nada me fazendo trombar e quase cair de cara no chão, que só não aconteceu porque ele me segurou com firmeza mais uma vez em meus ombros.

Senti uma confusão embaralhar meus sentidos e uma pergunta ficou muito óbvia na minha expressão: Como ele fazia aquilo?

– Mariana, nós precisamos conversar. – Ele disse sem se importar com o ponto de interrogação que eu estava expressando.

– Eu mal sei o seu nome. Você é tão mal educado quanto seu irmão? – Naquele instante me flagrei soando tão espontânea que até pensei em ser atriz.

– Quanto Ariel te contou sobre nós dois?

– Você não respondeu minha pergunta. – Eu falei esbaforida.

Ele baixou os olhos.

– A minha é mais importante.

– Vamos fazer um acordo? – Eu propus – Eu respondo as suas perguntas e você responde as minhas numa boa, pode ser?

Gabriel encolheu os ombros.

– Isso vai depender da pergunta.

– O mesmo vale pra você. – Respondi satisfeita.

Ele bufou.

– Meu nome é Ga...

– Eu sei o seu nome, só quero que você... sei lá, me cumprimente como uma pessoa normal faria ao conversar com um estranho.

Gabriel voltou seus olhos bruscamente para mim.

– Não somos estranhos, nem de longe.

Aquilo me calou por algum motivo e de alguma forma me trouxe uma certa confirmação para aquela sensação que já me era tão familiar de achar que os conhecia de algum lugar.

Pigarreei meio constrangida e engoli secamente.

– Okay, deixe isso pra lá. Respondendo a sua pergunta, não muito. Pra ser honesta quase nada, descobri mais por conta própria.

– Como assim por conta própria? – Ele me questionou.

Agora foi minha vez de bufar.

– Longa história.

– Defina longa história. – Ele me fitou com olhos exigentes.

– Você já fez duas perguntas! – Pestanejei.

Ele deu um sorriso meio torto para mim, o que fez uma covinha muito fofa se mostrar em uma de suas maçãs do rosto. Cara, ele era tão lindo, uma beleza muito incomum...

– Mariana? – Ele me chamou com olhos apreensivos.

– Ahn? – Respondi distraída.

– Você não ia me fazer a sua pergunta?

Balancei a cabeça para os lados como se estivesse despertando. Gabriel estava me encarando com um sorriso arrogante no rosto e eu não conseguia parar de admirá-lo. Oh meu Deus eu estava olhando pra ele como uma retardada há séculos e ele percebeu!

Corei imediatamente e desejei como em muitas vezes na minha vida ser um avestruz e enfiar minha cabeça debaixo da terra.

– Ah-ah... – Gaguejei feio sem chão.

Senti ele pegar minha mão e entrelaçar nossos dedos, mas ainda não tive coragem de olhar pra ele. Eu deveria estar da cor de um tomate!

– Venha, acho que já está na hora de você descobrir a verdade. Cedo ou tarde isso acontecerá e acho que irá preferir ouvi-la de mim e não do tempo.

Ele me deu um puxãozinho bem de leve me impulsionando a caminhar com ele, mas meus pés travaram como se estivessem acorrentados no chão. Será que eu deveria ir?

Qualquer pessoa prudente diria que não, mas por que meu coração sempre dizia o contrário? Justo eu que me considerava uma pessoa sensata estava indo de mãos dadas com um desconhecido, que podia muito bem ser um psicopata, (como seu irmão tinha me deixado óbvio, mas que apesar disso eu não o temia) possivelmente para o mesmo lugar que eu tanto menciono por aqui. O mesmo lugar de onde saiu uma besta indescritível que parecia ter vindo do mundo de conto de fadas.

Isso era assustador, mas o fato de estar com Gabriel não era.

É Mariana você está atirando cega no escuro.

❀ ◕‿◕ ❀

Como eu já esperava ele nos conduziu até o terreno.

Mas diferente do rumo que eu estava costumada a pegar, que era só até o centro do terreno embaixo daquele cedro do Líbano, ele me levou mais adiante entre aquelas árvores misteriosas. Seguimos ao sul pelo que pareceu um longo tempo até aparecer duas pedras que eram cravadas no chão, ele parou ali e se assentou sobre uma delas, fazendo um gesto para que eu me sentasse também.

Sem entender absolutamente nada e quase arrependida por estar sendo tão idiota de confiar num cara como ele, me sentei relutante ao seu lado.

Ele esfregou o rosto com suas mãos aparentando estar cansado.

– Por onde eu começo? – Ele murmurou em voz baixa para si mesmo.

– Que tal por essa Profecia? Ou por essa coisa de Portal, Dia Determinado, Processo... O que significa tudo isso?

Gabriel olhou pra mim de olhos espantados, claramente assustado.

– Como você sabe sobre tudo isso?

– Tudo isso? – Soltei uma risada sem realmente achar graça – Eu não sei nada sobre esses enigmas, foram só coisas que o Ariel falou pra mim. Tive um sonho também muito bizarro na mesma noite que ele me contou isso. – Obriguei minha boca a se calar, pois não podia revelar nada já que ele também nunca era específico comigo.

– Não acredito que ele fez isso. – Seu rosto mudou e parecia transpirar ódio.

Imediatamente toquei sua mão que estivera agarrada a minha e tentei o acalmar.

– Ei calma, como eu já disse ele só me contou essas coisas totalmente sem sentido. Não esclareceu nada, ainda não faço a menor ideia do que essas esquisitisses possam ser.

– Mariana e o seu sonho? Você sonhou com o quê?

Desviei meus olhos dele e tirei minha mão da sua. Estava tão insegura sobre o que contar e não contar pra ele. Gabriel me disse que contaria a verdade, mas até agora ele só me enchia de mais e mais perguntas, arrancando respostas de mim sem esforço algum e eu continuava de mãos vazias.

– Primeiro a resposta pra essas esquisitisses. – Eu exigi.

– Eu preciso saber Mariana! Isso é importante...

– A minha paz também é! – Eu surtei – E eu só terei paz quando eu souber o motivo de todas essas merdas terem acontecido essa semana. Você não faz a menor ideia do quanto eu estou atormentada, não agüento mais ficar sentada esperando um de vocês dois desembuchar e esperar pacientemente. EU QUERO A VERDADE AGORA, OU EU VOU EMBORA E DESCUBRO POR MIM MESMA!

A última frase foi repleta de uma energia estranha que primeiramente me envolveu, e depois acompanhou minhas palavras. Gabriel sentiu isso também porque bruscamente ele se afastou de mim como se acabado de levar um choque.

– Mariana, por favor...

– NÃO GABRIEL, OU VOCÊ ABRE ESSA SUA BOCA PRA ME CONTAR O QUE QUERO OU TCHAU! – Aquela mesma energia vibrou minhas palavras e notei que ele teve um calafrio.

Ele me avaliou por alguns instantes, de uma forma que seu rosto, ao mesmo tempo em que parecia transparecer diversas emoções, também transparecia nada. Era realmente incrível como o cara levava jeito pra esconder as emoções.

Gabriel enfim abaixou os ombros, finalmente cedendo a minha vontade.

– Tudo bem. – Ele fez uma breve pausa para encontrar meus olhos – Você precisa me prometer que irá escutar cada palavra que tenho a dizer, e que irá acreditar em mim não importa o quão bizarro tudo pareça pra você. Acredite, eu lhe entendo.

Não pensei nem duas vezes, não podia mais esperar pela verdade.

– Eu prometo. – Foi essa a última frase que eu disse antes de deixar de ser a ingênua de tudo e descobrir tudo sobre o meu passado sombrio e misterioso. Foi essa frase que mais tarde me fez arrepender pelo resto da minha vida de ter sido tão apressada e curiosa pra desvendar tudo o que vinha acontecendo.

O que pensei que iria trazer minha paz piorou tudo. E não só para mim, mas toda a humanidade.


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