After Teru escrita por Leh-chan


Capítulo 1
Mais uma noite dolorosa




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{Kamijo’s POV}


            Eu corria, porque simplesmente sabia que tinha que correr. Não era por instinto, só um movimento pré-programado. Ou tão simplesmente minha intuição me dizia para fazê-lo. Ou seria a memória? A iminência de que o tempo acabava lentamente... O desespero. Seja como fosse, eu corria freneticamente.

             As luzes das velas bruxuleavam. Minha sombra na parede parecia apenas mais uma imagem disforme flutuando ágil. Uma imagem desfigurada que eu não precisava ver para saber que vira outrora. Tão, tão familiar...

             E finalmente cheguei a uma porta. Madeira pesada; tão pesado quanto tudo que havia em volta. A mão visivelmente trêmula hesitava em virar a maçaneta, mas o suave contato com ferro frio, provavelmente isso, me fez voltar a mim e lembrar o motivo de tanta pressa descontrolada. Ele estaria lá dentro. O que me assustava, entretanto, era saber que não estaria sorrindo.

             Das forças que me sobravam, apenas tudo o que a adrenalina conseguiu gerar, retirei a coragem necessária para abrir o portal. Ainda assim, essa coragem não foi suficiente para fitar a cena longamente: só o cheiro de deterioração que invadiu minhas narinas me fez querer chorar. A vontade de parar de respirar era grande. O odor, a circunstância... Tudo levava a conclusões insanas. Mas eu devia prosseguir.

             Adentrei o recinto a passadas lentas. Talvez lentas demais para alguém que correra até ali. A cadeira virada de costas para mim me permitia fitar somente a cabeça, sutilmente pendente em seu encosto. Apenas as madeixas, outrora prateadas, eram visíveis de tal ângulo. Mas agora elas tinham um brilho diferente, refletindo a fraca luz de ocasionais chamas trêmulas. Um brilho vermelho que escorria, levando consigo a vida.

             Eu realmente não precisava saber de onde aquele fluido saía, não precisava. Mas algo dizia que eu devia estar com ele naquele momento. E esse ‘algo’ fazia meus olhos arderem, trilhando caminhos aleatórios por meu rosto até encontrarem o destino imposto pela gravidade. Pequenos pedaços de mim. Salgados.

             Caminhei ainda pesarosamente até chegar à frente do assento de Teru. E a cena que fiquei observando atentamente não era bonita.

             As luzes pouco constantes vinham da outra extremidade da sala, o que fazia com que minha sombra se destacasse sobre si e deixando o quadro menos visível. Mas ainda era notável o tamanho do dano. Tive que colocar a mão sobre os lábios para conter um soluço alto em demasia.

             A sombra se estendia pela ferida que seguia além da vista, tornando-se gradualmente maior dessa forma. Seu rostinho, tão imaculado... Tão infantil que simplesmente não combinava com tanto sangue. Havia feridas na cabeça toda, como se tivesse sido batida contra algo sólido, repetidamente. Muitas, muitas vezes. Imaginar tal ato de crueldade... Será que todo o sofrimento tinha que recair justo sobre aquele garoto que culpa nenhuma poderia ter?

             Despenhei logo a sua frente, já não conseguindo segurar o choro que, na verdade, eu nunca tentei prender. Apoiei meus braços em suas pernas de pele lisinha e amparei minha cabeça ali, pranteando sem me importar com mais nada. As cenas da possível tortura em troca de sabe-se lá o quê nasciam em minha mente. Imaginação fértil que eu não gostaria de ter nesse momento...

            Só um encontro noturno, houve tantos outros... Por que esse tinha que ser tão fatalmente diferente? Por que eu tinha a impressão de que jamais me esqueceria da sua feição apavorada e sem vida? Se eu simplesmente fosse embora, poderia esconder a verdade de mim mesmo? E te deixar assim... Para trás?

             Cada minuto que passei ansiando... Que passamos ansiando por esse encontro quase parecia em vão; até mesmo parecia errado agora. Será que fomos mesmo culpados?

             Acordei novamente assustado pelo mesmo pesadelo. As lágrimas, entretanto, ainda eram verdadeiras. Verdadeiras demais para o meu gosto. Sequei-as com as costas da mão.

             Logo notei estar fortemente agarrado ao meu travesseiro macio, me apegando a ele como se fosse você. Mas você não estava mais aqui. A cada dia, e repetidamente, me lembrava daquele terrível pesadelo. O arrastar das horas, ao invés de levar a dor consigo, só parecia aproximá-la cada vez mais de mim.

             Enfiei-me melhor embaixo das cobertas, encolhido. Talvez negando a mim mesmo o fato de ser tão absurdamente fraco. Escondendo-me até da luz do dia, num luto que parecia não ter fim. E não teria.

             Apenas agarrei-me mais fortemente ao meu travesseiro, revivendo bons momentos que sabia que não voltariam enquanto ouvia o forte martelar da chuva na sacada. Parecia um bombardeio, amplificado por meus sentidos perturbados. Será que as sentiria amplificadas se me tocassem? Talvez dessa forma eu pudesse me sentir melhor.

             Ainda assim, o medo de um mundo sem seus olhos azuis só me faziam encolher mais e mais em meu repressivo cárcere espontâneo.

             Parecia-me agora tão distante aquele dia em que esperava para te encontrar – e talvez fosse mesmo um tempo distante, não tinha muita noção do tempo dali. Apenas passei a mão pelo rosto e senti a barba por fazer: era o máximo de noção que minha mente me permitia ter.

             Naquele dia, eu também sonhei com você. A diferença é que aquele sonho me fez muito bem, distinto de minha nova assombração particular. Você me esperava em um lugar longe e eu corria para te alcançar. Agora não posso mais, não é mesmo? Não agora que você foi para um lugar muito melhor, me deixando aqui para sofrer sozinho. Não é como se fosse culpa sua; jamais o culparia por isso quando a culpa deve ser atribuída a terceiros. Só queria ter mais para olhar da sacada além da chuva torrencial que não parava por um instante sequer, ou daquele arco-íris opaco que me lembrava da última vez que esteve comigo. Aquilo só fazia doer mais, talvez por isso fosse melhor ficar no escuro enquanto a chuva caísse.  Talvez fosse melhor ficar no escuro para sempre.

~

O tempo se esvaía a cada passo.
Minha sombra flutuava.
Evitando o olhar, eu parei de respirar.

A sombra se estendia pela ferida
Que seguia além da vista
Se tornando gradualmente maior dessa forma.

A noite após o sol, que não pretendia ver.
Se eu for poderei esconder tudo.

Acreditando no encontro
Todo o tempo estive esperando por isso, mas...

Acordando do sonho, você não está aqui.
A repetida tristeza se torna mais forte.
Se me esconder, a ferida também irá se esvair sob a luz.

No momento em que eu estava apenas abraçando o desejo transparente,
As lágrimas vindas do céu não podiam me alcançar.
Ao menos me deixe ser tocado por elas.

Acordando do sonho, você não está aqui.
A repetida tristeza se torna mais forte.
Se me esconder a ferida também irá se esvair na luz.

Naquele dia eu sonhei com você acenando.
Mesmo agora eu não posso alcançar aqueles braços:
Você foi embora desaparecendo no céu infinito
Deixando para trás um arco-íris.

É dolorido pensar
No dia que você estava aqui.

~

~ Versailles - After Cloudia.


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Notas finais do capítulo

N/A: Primeiramente... Olá! Obrigada por chegar até o fim. Espero que tenha gostado da história e não esteja com vontade de matar a autora, porque ela não está com vontade de morrer -q

E, antes de ir, só gostaria de dedicar esta fic à Nandinha Okami, como agradecimento pelo apoio. Bem, não é grande coisa, mas é de coração. Matei o Teru por você, veja bem!

Enfim, por hora é só.