Silver ainda não sabia como exatamente tinha ido parar ali, parado ao lado de uma barraquinha de takoyaki em Ecruteak afastando pessoas de perto de si com um olhar irritado no rosto.

Ele nunca fora muito de ficar em lugares lotados - normalmente teria passado longe de um festival como aquele, cheio de lanternas coloridas penduradas e pessoas andando por aí vestidas tradicionalmente para a ocasião. Aquela confusão de cores não o atraía muito.

Então por que mesmo ele estava ali, recusando a se mover de perto da maldita barraquinha parecendo que iria matar alguém?

A resposta era simples, claro. Era a mesma que ele tinha para noventa e nove por cento de seus problemas desde quase dois anos atrás.

A culpa tinha de ser de Lyra.

Tudo bem, não exatamente dela. Afinal, foram aquelas malditas dançarinas do teatro da cidade que tinham chegado sorrateiramente até os dois assim que ambos haviam terminado uma batalha e, sem mais nem menos, mencionaram o festival e os convidaram para ir. Claro que, ao ficar sabendo da notícia, Lyra tinha sorrido um daqueles sorrisos largos e brilhantes que o irritavam e faziam calor transbordar em seu peito ao mesmo tempo e dito que definitivamente iria.

E sim, isso fazia sentido, porque a garota era a junção de todas as coisas coloridas e brilhantes que ele poderia conhecer; um evento como aqueles era mesmo a cara dela. O ruivo só não esperava que Lyra fosse virar para ele, lançar um daqueles seus olhares de expectativa com seus olhos cor de mel e falar que ele definitivamente tinha de ir com ela.

E Silver tinha sido teimoso, tinha recusado e recusado e a chamado de todos os milhares de apelidos nada carinhosos que havia acumulado em sua lista naqueles últimos anos, mas acabara cedendo no final. Como sempre.

O que o trazia para sua localização atual, esperando no lugar marcado pelos dois, usando suas roupas de sempre e desejando que estivesse em qualquer outro lugar que não ali.

O ruivo levou uma das mãos para trás de sua nuca, suspirando pesadamente. Para piorar, aquela garota estava atrasada. Devia ter tropeçado em alguma pedra no caminho, ou ficado distraída demais com uma barraquinha qualquer.

E me deixou aqui, plantado feito um idiota. Ele pensou amargamente para si mesmo, cruzando os braços. Ah, o que aquela mulher o fazia aturar.

Foi quando ele estava quase desencostando da tenda para ir atrás dela ele mesmo que Silver ouviu seu nome sendo chamado ao longe, e virou-se na direção da voz.

A resposta irritada morreu em sua garganta no exato momento em que seus olhares se encontraram. Ele, que quase nunca via sua rival usando algo além daquela roupa ridícula e chapéu gigante, sentiu-se de repente com falta de ar ao olhá-la lá, cabelo disposto em suas marias-chiquinhas usuais e usando uma yukata vermelha com flores amarelas.

Ele não quis admitir para si mesmo, mas a primeira coisa que veio na sua cabeça assim que ela parou à sua frente, respiração ofegante e bochechas coradas por estar correndo, foi que ela estava absolutamente adorável.

O ruivo levou seus olhos para uma barraquinha à sua esquerda tentando fingir que seu rosto não estava vermelho no momento.

- D-desculpa a demora, Silvy! - Lyra finalmente disse, depois de respirar fundo, abrindo um sorriso amarelo para ele. - Eu não sabia como colocar esse ebi direito, então acabei me atrasando...

- Se você não sabia como colocar, por que veio com ele então? - Ele resmungou, a encarando.

- Bom, é esse tipo de roupa que se usa num festival, não é? - A garota levantou os braços, dedos segurando as mangas largas da yukata, um sorriso dirigido para ele.

Depois, ela piscou.

- E-eh?! Silvy, porque você não veio com uma yukata?! - Ela perguntou com a voz surpresa, apontando para o garoto como se ele tivesse cometido um crime ou coisa parecida.

- Por que, idiota, eu não sou um velho de sessenta anos. - O ruivo respondeu, uma veia brotando em sua testa. - Você não precisa seguir essas tradições ao pé da letra, mulher. Quantas pessoas você tá vendo vestidas assim por aí?

Lyra piscou, olhando em volta. Depois, toda a sua surpresa pareceu desinflar, sendo substituída por um olhar desapontado.

- Ah, mas eu queria te ver usando um... - Ela murmurou para si mesma, um bico formando-se em seus lábios enquanto olhava para o chão.

Você queria o quê?! Silver sentiu a vontade de exclamar, rosto antes vermelho passando para o escarlate, mas sentia que iria se envergonhar demais se reagisse tão fortemente a um comentário como aquele. Ele não deveria se alterar tanto por causa dela, droga!

- Q-que seja. Você chegou, então vamos logo fazer sei lá o quê que você quer para eu poder ir embora. - O garoto preferiu então ignorar o comentário, cruzando os braços.

- Para de ser chato, Sil! - A garota bufou, mas depois abriu um sorriso. - Mas vamos logo. Eu quero ir na barraca de pesca, na de tiro ao alvo... E talvez na de derrubar garrafas!

- Você não tá um pouco velha demais para fazer essas coisas, não? - O ruivo arqueou uma sobrancelha para ela.

- Claro que não, bobo! Aproveitar um bom festival de Ecruteak inclui ir em todas as barraquinhas de jogos! - Lyra protestou, fechando as mãos em punhos.

Silver, no entanto, não parecia muito convencido. Os olhos cor de mel dela faiscaram por um instante, e ela abriu um sorriso travesso.

- Mas, Silvy, para você odiar tanto essas barraquinhas... Não vai me dizer que você é ruim nelas?

O franzir das sobrancelhas do ruivo e o bico que se formou em sua boca a disseram que ele tinha mordido a isca.

- É claro que não, idiota. Você não ouviu o que eu disse não?

- Ouvi, mas... Para mim pareceu que você estava tentando esconder que era ruim nisso falando que era coisa de criança!

Isso foi o suficiente para faíscas surgirem nos olhos prateados dele. O ruivo se aproximou dela instintivamente, encarando-a de perto, e Lyra sorriu de volta para ele.

- Isso é um desafio, Lyra?

Ele tinha usado seu nome; não estava brincando. A garota quase soltou uma risada com o quão fácil fora tirá-lo do sério, mas optou por apenas aumentar seu sorriso.

- Talvez tenha sido sim, Silvy.

Ambos se encararam por mais um momento, rostos se aproximando. Depois, o casal conseguiu assustar quase metade das pessoas dali de perto quando dispararam pela pequena rua iluminada quase que ao mesmo tempo até a barraquinha mais próxima.

O dono da tenda de takoyakis, um senhor já de idade que jogava molho nas bolinhas de polvo, sorriu levemente para a cena.

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Dez barraquinhas e uma perda colossal por parte dele depois, Silver se encontrou andando pelas ruas cheias de Ecruteak, sendo seguido por Lyra enquanto ela carregava um Teddiursa de pelúcia gigante numa das mãos e uma maça do amor na outra. O ruivo não sabia se ficava irritado consigo mesmo por aceitar o desafio ou com ela por ser tão boa naquelas barracas idiotas, mas definitivamente nunca faria aquilo de novo.

- Ahhh, isso foi ótimo! - Lyra, por outro lado, parecia mais animada que antes; tinha um sorriso largo no rosto. - Eu adoro festivais!

Silver revirou os olhos com isso, ignorando o comentário dela. Como havia pensado, era mesmo para ela gostar de lugares como assim. Lyra provavelmente sempre vinha a eventos como esse, vestia-se com uma daquelas yukatas coloridas, visitava todas as barracas de jogos e comia todas as coisas que pudesse.

...Assim como aquele ano. Mas ele gostaria de pensar que essa era a primeira vez que ela tinha vindo, também. Porque olhando para ela agora, tão feliz rodeada por toda aquela gente e segurando uma pelúcia com quase metade do seu tamanho, Silver sentiu-se um pouco possessivo daquela visão. Não queria que outras pessoas vissem o quanto seu rosto se iluminava depois que ela conseguia um prêmio, como ela parecia tão graciosa com aquelas mangas da yukata que eram grandes demais para seus braços.

...Ele estava agindo feito um idiota, não é mesmo.

- Sil?

O garoto acordou de seus pensamentos quando a ouviu chamando-o ao seu lado, e virou seus olhos para ela. Lyra tinha a cabeça tombada levemente para o lado - adorável foi a palavra que surgiu novamente em sua cabeça, mas ele a reprimiu rápido - e o encarava com curiosidade.

- Que foi? - Ele perguntou, um pouco irritado, não sabendo se era com ela ou consigo mesmo por se sentir tão afetado com ela. Talvez os dois.

- É que falta meia hora para a apresentação das dançarinas no palco. Podemos ir?

- Vamos logo. Você vai ficar fazendo birra se chegarmos atrasados, então.

Ela quase comentou que ele fazia a mesma coisa quando perdia para ela em uma batalha antigamente, mas ficou quieta. O Silver daquele momento estava se mostrando estranhamente calmo, ela não queria estragar isso.

- Hm! Vamos então! - A garota sorriu para ele, trocando sua guloseima de mãos e puxando ele pela mão com sua outra agora livre. O ruivo não teve tempo de falar nada; já começara a ser puxado na direção do centro do festival.

Silver protestou, mas se encontrou calado no momento seguinte, rosto vermelho e uma expressão irritada no rosto. As duas mulheres que deram um risinho ao verem os dois passando também não estavam ajudando.

Ela não via o que aquilo parecia? Deles segurando as mãos num meio de um festival como aquele? O ruivo sentiu a vontade de gritar com ela por ser tão idiota, tão alheia aos olhares dos outros assim.

Lyra era a campeã de Johto agora. Ela tinha compromissos com outros treinadores, aparecia em vários lugares, e as pessoas cada vez mais a reconheciam nos lugares aonde ela ia. Andar por aí segurando as mãos com um garoto, mesmo que ele fosse seu rival, certamente não passaria despercebido.

Seu rival... Ele comprimiu os lábios levemente. Mesmo que o ruivo fosse o rival dela, ambos tinham cada vez menos tempo para batalhar naqueles últimos meses. Ontem tinha sido uma das únicas vezes em que Silver fora corajoso o suficiente para procurar ela ele mesmo para uma batalha, e ambos nem haveriam se encontrado de novo hoje se não fosse por aquele festival.

E ele não queria admitir isso, provavelmente morreria antes de ter que dizer isso em voz alta, mas... Sentia falta dela. Lyra tinha passado tantos meses atazanando a vida dele durante sua jornada por Johto que ele se acostumara a ver o sorriso irritante dela com frequência. Até quando fora para Kanto ela também o seguira. E agora...

Silver só a podia alcançar em momentos como aquele. Era estranho como aquela mulher o podia deixar tão dependente dela quando o mesmo o odiara por grande parte do ano anterior.

Sem falar que... Ele não havia mencionado em nenhum momento daquela noite por aquilo ser idiota, mas... Eles dois, juntos num lugar como aquele, com ela usando uma yukata de todas as coisas...

Aquilo não era...?

O ruivo impediu a si mesmo de pensar mais em algo, focando-se no trajeto que faltava à sua frente. Se continuasse a ter aqueles pensamentos completamente fora de seu estado são de consciência, sentia que sua cabeça poderia explodir.

Pelo jeito, ele passara um bom tempo envergonhando a si mesmo mentalmente; porque o palco grande onde ocorreriam as apresentações estava logo à frente. Lyra puxou um pouco mais forte, se desviando das pessoas que começavam a se amontoar por perto.

- Ei, mulher, espera-!

Ele teria parado de andar ou puxado ela para trás como uma punição por praticamente arrastá-lo por aí, mas o mesmo se viu impedido de fazer isso quando outra pessoa chamou a atenção de Lyra primeiro.

- Ah, Morty! - O rosto dela se iluminou quando seus olhos o encontraram, e ela puxou Silver junto até ele, um sorriso animado no rosto. - Há quanto tempo, hein!

- Posso dizer o mesmo, Lyra. - O loiro alto deu uma risada leve, devolvendo o sorriso para ela. - Eu adoraria se você aparecesse no ginásio para batalhar comigo qualquer dia desses-

Ele parou de repente, olhos se voltando para o ruivo que o encarava com uma expressão irritada. Morty sorriu levemente.

- Vejo que trouxe seu rival com você. Ele continua o mesmo de sempre, pelo que posso ver.

- O que você quis dizer com isso, seu-!

- Ah sim, o Silvy não muda mesmo, hehe! - Lyra ignorou completamente a exclamação irritada anterior de seu rival, sorrindo para o líder de ginásio. - Mas o que faz por aqui? Você também gosta do festival?

- Haha, claro. Mas na verdade, eu estava procurando alguém antes de achar vocês. É que eu vim-

- Ah, então é aí que você estava!

Uma voz feminina e levemente irritada interrompeu o loiro, e tanto Lyra quanto Silver piscaram quando viram Whitney aparecer por trás de Morty, seu cabelo rosa normalmente preso agora solto e com uma presilha de flor vermelha num dos lados.

- Ah, Whitney! - Lyra apontou o dedo para a garota, uma expressão de surpresa no rosto.

- Eu! - A mais velha riu, para depois segurar uma das mangas da yukata roxa com nuvens brancas do loiro ao seu lado. - Esse idiota aqui resolveu sair andando do nada e me deixou para trás no meio da multidão, mas se foi para encontrar a Campeã, eu posso perdoar ele.

-... Desculpa por isso, eu devo ter me distraído. - Morty levou uma das mãos para coçar sua nuca, uma expressão sem graça no rosto. - É que eu estava-

- Perseguindo um Pokémon fantasma, vendo um espírito andar perdido por aí e quis ajudar, já sei. - A garota de cabelos róseos abanou uma mão para ele, o interrompendo. - Não importa mais. O bom é que eu te achei, a apresentação está quase começando e você não comprou meu algodão doce ainda!

- Ah, verdade. - O loiro dirigiu um olhar levemente exasperado para ela, sorrindo. Silver, que nunca tinha gostado daquele cara, pelo menos sentiu pena dele por um momento. Sabia o que era ser arrastado por aí e ser forçado a comprar coisas para uma garota hiperativa.

- Ah, bom, vocês tem que ir logo então! Vai começar daqui a pouco e eu não quero que vocês percam a dança! - Lyra falou para eles, fechando as mãos em punhos e trazendo-as para frente de si mesma.

- Sim, sim, melhor irmos! - Whitney assentiu, já puxando Morty pela manga de seu yukata sem esperá-lo começar a andar. Ela virou-se mais uma vez para os dois, lançando um último sorriso a eles. - Bom encontro para vocês dois!

Silver sentiu seu rosto esquentar quase que imediatamente após isso - viu, ele sabia que estava dando a impressão errada das coisas! - e estava prestes a negar aquela afirmação quando a garota ao seu lado se adiantou.

- Hm! Para vocês também!

O garoto paralisou em seu lugar, observando abobalhado enquanto Lyra balançava a mão em despedida para o casal que se afastava.

Ela... Não havia negado aquela afirmação. A líder do ginásio de Goldenrod tinha explicitamente dito a palavra encontro, com todas as letras, referindo-se a eles dois, e Lyra não parecera nem um pouco afetada por isso.

Silver tinha quase certeza que aquela era só mais uma das vezes em que Lyra queria ir para algum lugar e arrastava a pessoa mais próxima para ir junto, mas... Teria ela tido essa intenção quando o convidara? Estariam eles realmente num encontro?

Seria por isso que ela havia segurado sua mão mais cedo?

O ruivo mal pôde escutar enquanto a garota ao seu lado falava para ambos se apressarem, o puxando pela mão mais para perto do palco. Não conseguiu prestar atenção em mais nada além do cabelo dela balançando com seus passos, a mão pequena e macia segurando a sua.

Ele podia falar sempre para si mesmo que odiava aquela garota com todas as suas forças; podia a chamar de insultos, afastá-la de si o máximo possível, negar que eles sequer eram amigos, mas a verdade era difícil demais de esconder. Porque a risada dela passara de um som insuportável à música para seus ouvidos, porque vê-la sorrindo podia relaxar todos os músculos de seu corpo.

Porque ele passara a esperar com expectativa todos os momentos em que a veria novamente, naqueles últimos meses.

Silver a amava; aquilo já estava mais do que óbvio. Dentro de si mesmo, já havia assumido aqueles sentimentos. Mas revelá-los a mais alguém parecia uma grande perda de tempo; especialmente quando ela nunca gostaria de alguém que passara a maior parte do tempo que se conheciam a chamando de fraca e estúpida. Amor era algo que ele não podia exigir de Lyra.

Então por que aquilo parecia tão certo, agora? Por que olhar para ela, naquele momento, o fazia querer a puxar para um canto recluso e a dizer exatamente tudo que estava engasgado em sua garganta naqueles últimos meses?

Seria por que agora ele tinha esperança?

Era realmente engraçado, ele não pôde deixar de pensar para si mesmo, porque coisas como esperança eram algo que Silver se recusava a ter antes. Confiar que algo bom poderia acontecer parecia irreal demais para alguém como o passado como o seu.

Mas como ele poderia pensar isso agora, quando a garota mais persistente, mais doce e irritantemente animada que destruíra todas as paredes que ele construíra por volta de si mesmo estava lá, ao seu lado, e poderia gostar dele de volta?

...Tinha de fazer isso. Ele não conseguiria sair daquele lugar sem saber o que exatamente Lyra achava que eles estavam fazendo naquela noite. Mesmo que aquilo não desse certo, ele...

Silver estava disposto a se arriscar.

Ele foi suficientemente paciente para esperar até depois da apresentação, quando as dançarinas haviam todas se curvado em reverência, para puxar a garota de longe daquela confusão toda de pessoas.

- Sil? Eh, Silvy, espera, eu queria falar com elas agora-!

Lyra tentou protestar, mas ele resolveu ignorar o que ela estava dizendo. Tinha certeza que, se tivesse de esperar mais, iria acabar explodindo e perguntando aquilo na frente de todo mundo.

Era melhor que fosse ali, longe das tendas suficientemente para ser deserto, mas ainda assim levemente iluminados pela luz das lanternas de papel penduradas nos postes.

- Sil, ainda tá muito cedo para ir embora, sabia? Eu ainda nem comi yakisoba ainda... - A garota à sua frente reclamou, um bico se formando em seus lábios.

- Lyra. - Ele resolveu ignorá-la, porém, virando-se em sua direção. A garota arregalou os olhos, surpresa por ele tê-la chamado pelo nome assim, do nada, e se calou.

O ruivo hesitou um pouco, fechando as mãos em punhos. Vamos, ele tinha que fazer isso.

- O que estamos fazendo aqui, hoje?

Ela demorou um pouco para responder, piscando.

- ...Ué, estamos indo para o festival, Silvy, o que você-

- Eu não quis dizer assim! - Ele a interrompeu, irritado, para depois se controlar novamente. - Eu sei que é um festival, idiota. O que eu quero dizer é- O que isso significa para você?

Lyra arregalou um pouco os olhos, um tom leve de vermelho tomando conta de seu rosto. Ela abriu um sorriso para ele, mesmo assim, levemente sem graça.

- Como assim, Sil? Eu quero voltar logo para lá, você não pode deixar isso para depois-

- Responda, Lyra. - O garoto a interrompeu novamente, dando um passo à frente na direção dela, que deu um para trás e bateu de costas com a parede de uma das casas.

- Uh... - A garota o encarou, seus olhos cor de mel brilhando incertos - era estranho vê-la insegura por um momento, principalmente quando aquela era Lyra - mas ela comprimiu os lábios em seguida, parecendo se focar. - E-eu pensei que você sabia o que eu pensava que seria, Silvy. Você veio comigo mesmo sem saber?

Ele estreitou os olhos com isso. Como aquilo respondia sua pergunta? Era para ele adivinhar se a persistência da garota tinha sido por um motivo além de ela ser naturalmente irritante?

- Então o que você quer que eu pense que seja? Por que você está me deixando confuso desde que chegamos aqui e eu estou seriamente com vontade de jogar tudo para o alto e finalmente fazer o que eu queria ter feito assim que te vi hoje, mulher.

- E o que você quer fazer? - O olhar dela passou de determinado a algo mais, algo que ele tivera refletido em seus próprios orbes prateados alguns minutos atrás enquanto a observava assistir à dança.

Aquilo foi o suficiente para acabar com sua hesitação.

- Isso.

Ele não esperou mais; levantou uma das mãos para segurá-la pela bochecha e desceu seu rosto para encontrá-la, acabando finalmente com a distância entre os dois. Silver pôde sentir quando Lyra parou de respirar por um segundo, surpresa, mas seus pensamentos esvaíram de sua cabeça quando a mesma subitamente o puxou pelo pescoço, mais para perto da parede à qual ela estava apoiada.

O ruivo não poderia dizer que estava surpreso com a impulsividade da garota à sua frente, Lyra sempre fora receber toda a teimosia de si mesmo com a dela própria. Mas seu coração ainda pulou em seu peito por ela estar lá, lábios macios e mãos enroscadas em seu cabelo, o beijando de volta com a mesma intensidade que ele.

Então aquilo tinha mesmo sido um encontro, no fim das contas.

Ele se afastou alguns segundos mais tarde, ofegante, a mão que ainda o segurava por trás o impedindo de se afastar muito. Silver abriu os olhos para as piscinas cor de mel que o encaravam, brilhando, e sentiu por um momento a vontade de sorrir.

Mas, como sempre, ela fez isso primeiro.

- Hehehe... - Uma risada baixa escapou da boca dela, seu rosto se desviando para baixo. O ruivo a encarou num misto de confusão e afeto, tentando encontrar seus olhos.

- Qual é a graça? - Ele perguntou, quando sua curiosidade tomou conta de si.

- É que eu nunca poderia imaginar que você fosse me beijar primeiro, Sil. - Ela comentou, se adiantando antes que ele pudesse se irritar muito. - Quer dizer, você tá sempre dizendo que eu sou irritante, então...

- Eu não... - Ele começou a falar, mas corou e ficou quieto. É, ele fazia isso bastante mesmo.

- Ei. Isso quer dizer que você gosta de mim também? - Lyra perguntou depois de uns segundos, levantando o rosto para olhar para ele de novo.

- Você acha que eu só te beijaria assim, do nada? - O ruivo estreitou os olhos para ela, o que a fez inflar as bochechas levemente.

- É que você é tão imprevisível às vezes, Silvy! Eu não consigo saber o que você tá pensando! - Ela reclamou, o encarando emburrada. Dessa vez, ele não repreendeu a si mesmo por pensar que ela ficava fofa desse jeito.

- Talvez eu deveria acabar com suas dúvidas, então. - Silver murmurou, chegando mais perto outra vez, e teve tempo de ouvir o começo de outra risada vindo dela antes que sua distância chegasse à zero.

Ele mal podia imaginar que, a dois anos de encontrar a garota idiota e curiosa demais que tinha o importunado nos fundos do laboratório de Newbark, eles poderiam estar lá, agora, se beijando perto de barraquinhas multicoloridas e sendo iluminados pela luz da lua e das lanternas de papel brilhantes. A própria ideia de deixar alguém virar uma parte tão importante da sua vida parecia ridícula para o Silver daquela época.

Mas agora, ao trazê-la mais para perto, aquela ideia lhe era até convidativa. Para Lyra, que continuava grudada a ele mesmo depois de tantas vezes em que ele tentara a afastar, parecia ser muito mais fácil aceitar que ela estava lá, e que ela iria permanecer lá por quando tempo que quisesse. Para sempre, ele se arriscava a desejar.

Eu te amo. Ele a beijou mais forte, mão acariciando sua bochecha. Eu te amo.

E, sentindo-se com o corpo leve e coração batendo rápido, ele não pôde evitar de sorrir quando ouviu um ‘eu te amo’ sendo murmurado de volta.

Owari.