Pássaros Flamejantes escrita por LC


Capítulo 2
Segundo.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/608726/chapter/2

No fim do dia, subi em uma banqueta para pegar um band-aid e o colocar no corte em minha mão. Meu pai escondia esparadrapos e medicamentos na pia do banheiro, que era um pouco mais alta que eu, então eu precisava me equilibrar sobre o banquinho para alcançar.

Entretanto, era de noite e papai estava dormindo, o que me garantia certa vantagem, porém não diminuía os riscos. Se eu fosse visto mexendo em suas coisas, ele me machucaria de novo. E com mais força. E eu sentiria mais dor.

Eu merecia, afinal, tal castigo para desenvolver obediência.

E meu pai é o disciplinador ideal para me ensinar boas maneiras.

Eu estava fazendo algo horrível nesse instante, algo que considerava traição a ele. Portanto, não poderia causar o menor barulho para não acordá-lo. Me senti triste. Me senti sujo.

Contemplei meu reflexo no espelho trincado. A imagem voltou seus olhos cansados e anoitecidos para mim, o enorme hematoma visível no lado esquerdo de seu rosto. Suspirei. Não seria fácil.

Após colocar o curativo, sequei minhas lágrimas e prometi a mim mesmo não tocar novamente naquela ferramenta pontiaguda diferente que provocou minha curiosidade e foi o motivo da desavença com o papai. Nunca havia feito uma promessa antes, mas o garoto mãos-pássaro da televisão me disse que devemos respeitar e cumprir as promessas que criamos.

Minha cabeça ainda doía devido ao impacto contra a parede. Coloquei a mão em minha testa, fervendo como um vulcão em erupção. Com a visão desfocada e turva, não pude manter o equilíbrio. A banqueta começou a tremer e, já bamba, virou.

O som do impacto de meu corpo contra o chão não seria o suficiente para acordar aquele homem. Já o do osso da minha perna quebrando, sim.

Segurei um grito profundo de dor que percorreu toda a minha espinha e olhei pelo vão entre a porta do banheiro e o quarto onde ele dormia: silencioso e escuro. Deixei escapar um leve sibilo por entre meus lábios, na tentativa de amenizar a dor. Suor escorria por minha face como rios rumo à sua nascente.

Eu não sabia o que fazer. Se o acordasse, ele poderia estar sentindo vontade e desejo de me machucar, por ter lhe desrespeitado. Se eu não o fizesse, teria que permanecer no chão, me contorcendo em espasmos tonitruantes até o sol raiar. Então eu seria encontrado por meu genitor e o resultado seria o mesmo.

Com os braços, me arrastei até meu quarto em silêncio e deitei no tapete rente ao berço alto onde durmo, e lá permaneci até pegar no sono e conseguir fechar meus olhos sem ver a imagem furiosa de meu pai no interior de minhas pálpebras.

Senti nojo de mim mesmo por ser um filho tão detestável.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Pássaros Flamejantes" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.