MAMÃE, COMO SEMPRE, está sentada ao lado de papai segurando sua pérola no banco do centro da praça de nossa pequena vila vazia. E como todo dia, mamãe deixa o portão fechado, e não deixa eu sair, nem meu irmão mais novo, Nick.

Nunca soube quem realmente mora junto em nossa vila, as únicas pessoas que conheço são mamãe, papai, Nick, Greasy Sae, e Haymitch, que mora em nossa vila, pelo o que diz, mas não parece, pois muitas vezes quando tentamos entrar em sua casa, ela está sempre trancada e sem resposta. E mamãe diz que ele não está em casa...

Nunca está em casa, então?

Pouco do que mamãe diz tem explicações, ela evita praticamente tudo, se puder, ela evita até o bacon do café da manhã.

Quando eu saio de perto da janela de meu quarto, visto uma calça preta, botas de amarrar marrons e uma blusa de lã, estamos no inverno, e tudo é repleto do branco da neve.

Desço as escadas do segundo andar, e encontro Nick brincando no sofá da sala de jantar com um avião de madeira. Saio de casa pela porta de trás, para meus pais não me verem, pretendo bisbilhotar a casa de Haymitch em busca de algo que aconteceu antes de eu nascer, eu tenho certeza de que ele tem alguma coisa lá, já que ele também evita falar do passado. Sei que em minha casa não tem nada.

Demoro para me acostumar com o frio fora de casa, sigo em direção para a casa de Haymitch, andando atrás de todas as casa da vila, e não corro.

Quando finalmente chego perto da janela da casa de Haymitch, verifico se o bêbado deixou a janela aberta, e quando descubro que sim, agarro-me na janela e levanto meu peso de criança de doze anos e entro dentro da casa de Haymitch.

Paro na sala de estar, onde encontro Haymitch esparramado na mesa dormindo, deduzo que foi por causa das bebidas, porque há várias em volta dele, me aproximo da mesa e enxergo algo estranho, um objeto dourado. Pego o estranho objeto debaixo de vários pápeis e bugigangas de Haymitch e o enxergo melhor em minha mão, um broche de um pássaro dourado em um anel, com suas asas abertas, mas sei que não é exatamente um pássaro.

Quando percebo alguém atrás de mim, dou um pulo assustado e cerro os punhos com o broche em minha mão esquerda, demoro muito para pensar em o que fazer. Uma mulher me olha estranhamente. Percebo que não usa maquiagem alguma, tem um pano em sua cabeça, que esconde a sua careca, usa um vestido longo cinza com um casaco preto, não consigo ver seus pés.

– Quem é você, mocinha? - pergunta a mulher, se aproximando.

– Minha identidade não é de sua conta - respondo, recuando. Eu quero saber quem ela é, mas não posso perguntar, sei que se eu não responder a sua pergunta direito ela não responderá as minhas perguntas.

– O que é isto em sua mão? - ela pergunta desconfiada, e se inclina e me olha nos olhos, ela pega minha mão tremida e a abre, vendo o broche, diz - Isto não é seu, garotinha - a mulher pega o broche de minha mão - Você é uma ladrazinha muito má... É só isso que pegou, hum?

A mulher me revista com os olhos. Então pergunto com os dentes tremendo :

– O que é este broche, exatamente?

Ela desmancha seu olhar desconfiado e se afasta de mim e anda pelos corredores da casa, e eu a sigo.

– É o símbolo da revolução, ladrazinha! O Tordo... Nunca ouviu falar?

– Nunca ouvi falar do Tordo, senhora... Apenas da revolução...

Ela me olha indignada, e percebo que sua personalidade é uma peça.

– Ah, o Tordo foi adquirido pela Garota em Chamas! Quando se voluntariou por sua irmã na 75ª Edição dos Jogos Vorazes, ela era daqui mesmo, do Distrito 12, foi para os Jogos usando este mesmo broche, sobreviveu aos jogos com seu companheiro, Peeta Mellark! - Este nome me faz tremer, pois sei bem quem ele é, continuo ouvindo, confusa, sem saber como este nome foi parar nesta história, não sei se acredito na mulher ou acho que ela é maluca, presto atenção nela, quase sem equilíbrio nas pernas - Foi para o Massacre Quaternário e sobreviveu, tornou-se o símbolo da revolução, e teve sucesso nisso, mas após isso ela... Tornou-se pedaços, após de tantas perdas e depois... Se afugiou-se aqui nesta vila, e evitou qualquer contato do passado menos duas pessoas.

Então, ela me olha, coloca o broche em minha mão e diz :

– Fique. É o símbolo da liberdade e justiça. Saiba disto e lembre - ela sorri para os meus olhos assustados - Sabe o que é estranho, você parece tanto com a Garota em Chamas!

– Posso saber de algo antes de ir embora? - pergunto com os lábios tremendo, a mulher assente, então pergunto - Quem era a irmã da garota?

Ela suspira triste.

– Primrose, ou Prim. Infelizmente, ela morreu em um borbadeio da Capital.

Eu me afasto, com os olhos arregalados, então essa é Prim? Esta é a Prim dos pesadelos de minha mãe?

– Eu preciso ir.

Saio correndo da casa e me sinto, pesada, com algumas respostas inusitadas em minha mente, e pela primeira vez sinto que talvez era melhor nem saber de nada, entro pela porta de trás de minha casa, e encontro mamãe sentada na cadeira da cozinha. Eu caminho até ela, cambaleando um pouco, ela se levanta e me abraça.

– Pearl...

– Mamãe, por que este é meu nome?

Ela demora um pouco para me responder, então diz :

– Pearl de Pérola, querida. Seu pai um dia me deu uma pérola, e até agora ela foi o meu amuleto, e querida, você é um amuleto...

– Mamãe... Você poderia cantar aquela música para mim?

E então ela começa.

Deep in the meadow, under the willow

A bed of grass, a soft green pillow

Lay down your head, and close your sleepy eyes

And when again they open, the sun will rise.

Here it´s safe, here it´s warm

Here the daisies guard your from every harm

Here your dreams are sweet and tomorrow brings them true

Here is the place where I love you.