Sete horas da manhã. Era a hora.
Peguei minha pequena mala com uma doce incerteza pairando em minha mente – melhor dizendo, uma doce descrença. Encarei-me no espelho, e o que vi foi um homem sério, com expressões beirando a maturidade, mas com um olhar leve, ansioso. Sorri para mim mesmo. Como eu parecia mais velho. Mais frio. Isso era realmente muito bom.
Olhei em volta, tentando despedir-me de tudo aquilo. Aquele pequeno cômodo cinza, uma cama, um banheiro e um espelho, tudo cheio de fantasmas. Alguns prazerosos, outros amedrontadores, mas enfim, não deixavam de ser fantasmas. E eu fazia questão de abandoná-los no passado.
Era algo terrível. Tudo naquele lugar lembrava-me dela. Tudo era ela. O aroma do assoalho de madeira, a cor das paredes, o toque do lençol... Como se fossem fragmentos das minhas lembranças, lembretes dolorosos colados nas paredes, tacando na minha cara um passado que insistia em ser presente. No entanto, por razões desconhecidas, foi barrado, não virou futuro.
Enfim, meus fantasmas não são mais meus, eu pensei, e essa ideia me agradou. Sorri novamente.
Fitei-me uma última vez no espelho e respirei fundo. Dei um passo rumo à porta, e mais outro, trancando-a em seguida. Suspirei, surpreso com minha atitude, e caminhei até a estação de trem, que não era muito longe dali. Mais alguns passos e alguns minutos e eu já estava instalado confortavelmente em meu vagão, apreciando a paisagem e o vento que insistia em bagunçar meus cabelos. E logo me afundei em meus motivos para sair daquele lugar, afoguei-me nas lembranças que remetiam meus pensamentos à noite fria em que me libertei de toda aquela doença.
Foi naquela noite que aprendi que paixões superficiais são efêmeras.