Eu estava perdida desde sempre, as coisas e pessoas não faziam muito sentido pra mim. Talvez eu tenha escolhido me perder em mim mesma, a vida é uma linha dividida entre a realidade e a ilusão, entre a verdade e a loucura, nunca soube de qual lado eu estava… Provavelmente na fronteira entre as duas coisas.

Peguei meu caderno e joguei com força na parede. Nada daquilo fazia sentido… Alias, o que fazia? Eu era uma garota pobre sem muito futuro na vida, nem ao menos tinha um lugar para chamar de seu. Eu estava cansada de me mudar constantemente e de sempre ter que abrir mão de alguma coisa, Naquele meio tempo amizades haviam sido deixadas para trás, família e tudo aquilo do qual eu amava. Aquele não era meu lugar, eu sentia na pele que eu estava sendo um fardo para meus avós já idosos, que constantemente me olhavam de lado como um inseto a qual precisavam se livrar. Meu pai, a muito estava internado em uma clinica de reabilitação e minha mãe… bem minha mãe…

-Raquellllllllll - Minha avó gritava com impaciência no corredor- Será possível essa menina não tem hora pra acordar?

Sai de meu quarto e rumei para cozinha haviam tarefas a serem feitas, precisava compensar minha estadia com trabalho e mostrar que poderia ser útil em alguma coisa, a casa deles era enorme com varias escadas e corredores, logo ao lado ficava a lanchonete da qual eram donos. Meus avós levavam uma vida agitada, haviam dado duro na vida para sustentar a família, meu pai ao que tudo indicava era o único que havia desistido de viver… A lanchonete da Família Eloi funcionava com muito sucesso, toda a galera do bairro ia para lá no final de semana, porém mal sabiam eles quanto trabalho aquilo me custava… Mesmo em contato com todas aquelas pessoas eu não tinha nenhum amigo, estavam sempre me olhando com superioridade como se tudo pudessem… Porém tudo o que eu mais queria era poder sair com eles e me diverir...

“Lavar, enchagoar… servir mesas sem reclamar...

“Quero meu pedido” “Espere um pouco já vai indo”

“Nem pense em derrubar”

Mas que coisa problemática….

Virando noites arrumando esse salão,

amanhã tem prova e não estudei não

Quantas coisas na cabeça e nada no coração

Não me olhe, não se queixe, quanta motivação…”

-RAQUELLLLLL- Novos gritos, novas tarefas e eu já estava prestes a sair gritando feito uma louca varrida… Talvez eu fizesse isso…- Essa menina, ela não tem jeito! Não faz nada direito!!! E está sempre encolhida pelos cantos parecendo um rato… Deve ser doida…

As vezes sem que ela percebesse, suas palavras me feriam como tapas, talvez eu preferiria ser espancada até a morte ao ouvi-las, porém aquelas ainda eram as palavras mais docies dirigidas a mim… “Ela será igualzinha a mãe… a voz, o jeito isolente de falar… tudo lembra ela, será tão sem futuro quanto ela!” Naquele momento eu juro… Eu queria morrer…

Eu queria ser motivo de orgulho, eu não era ela, eu não queria ser como ela… Até aquele momento eu guardava apenas rancor em meu coração de tal forma que transbordava por meus olhos… Então, resolvi mudar… Eu faria tudo diferente, eu não seria como todos queriam que eu fosse. Eu estava decidida a encontrar o lugar ao qual eu pertencia!

Mal sabia eu, que quanto mais eu buscava meu caminho… Mais ainda me desviaria dele...