A Caminho escrita por Sra Scala


Capítulo 5
Capítulo 5




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Passaram-se alguns longos segundos até Betsy conseguir relaxar e me soltar.

As orientações que Kassidy passava eram mais simples do que eu supunha. Betsy ficou um pouco constrangida quando tive que passar o gel de álcool para limpá-la, mas a dor logo desviou sua mente do assunto.

O primeiro bebê saiu no quarto empurrão de Betsy. Bem menor do que eu imaginei que seria (pelo menos se comparado aos que eu já havia visto nos braços de antigas colegas de escola). Mas ela chorou bem alto e imaginei que era um sinal de boa saúde.

Coloquei a criança em um dos lençóis que havia sido separado e a ajeitei no braço de uma Betsy meio pálida e completamente extasiada.

–É uma menina Kassy!

Minha vontade era parar tudo e ficar olhando aquela cena, mas sabia que não havia muito tempo. Instruído por Kassidy, prendi os grampos que vieram no kit onde ela indicou e separei a menina do resto do cordão umbilical. Betsy voltou a bebê para si, ajeitando o lençol para mantê-la coberta e aquecida.

O chorinho amainou vagarosamente, Betsy a olhava com uma ternura que, confesso, dificilmente teria imaginado ser possível. Ainda mais depois de ouvir sobre o que o ex havia feito. Só então consegui imaginar o motivo de tantas disparidades emocionais nesses meses: ela podia não se conformar com a interrupção abrupta da vida a que ela fora acostumada, mas começara a amar suas crianças com todo o coração.

A questão toda era que elas a lembrariam de um homem que Betsy odiava em todos os momentos. Eram filhas dele também afinal de contas e nada poderia mudar isso.

Kassidy me deixou ficar sem as luvas cirúrgicas após entregar a menina para Betsy. E dessa vez foi eu quem ficou constrangido. O que eu deveria dizer? Ou fazer? Minha vontade era aproximar-me das duas e beijar Betsy e a menina. Dizer e elas que nunca ficariam sozinhas e que o desgraçado nunca iria reaparecer em suas vidas. Eu devia estar ficando louco, isso sim.

Voltei à realidade ao ouvir Betsy soltando um gemido de dor. Ela tentava se mexer no banco claramente desconfortável e sem muito jeito, já que a menina repousava encostada em seu peito. Um segundo gemido denunciou o motivo do desconforto: as contrações tinham voltado.

Não pude deixar transparecer, mas comecei a ficar preocupado: Claire parecia estar cansada por causa da viagem, fora o susto que eu a fiz passar e ainda o parto da primeira criança.

–Robbie...

–Estou aqui Betsy...

–... Minhas costas... Faz aquilo de novo... O que você fez lá fora... Por favor, estão doendo...

–Kassidy?

–Tudo bem... Só não será possível tirá-la daí Claire, sinto muito.

Saí do carro e ajudei-a a desencostar-se do banco, tomando cuidado para não fazer nenhum movimento muito brusco e também para não incomodar a bebê. Passei meu braço por trás dela alcançando a região dolorida. Com a outra a envolvi pela frente. O que veio bem a calhar quando senti o corpo de Betsy relaxando e o braço que segurava a criança afrouxando levemente antes de voltar a se firmar.

Ela teve outra contração enquanto eu massageava a parte baixa de suas costas. A maneira como senti os músculos dela se retesarem me deu uma vaga ideia da dor que ela estava sentindo. Betsy pendeu a cabeça para próximo de mim quando relaxou.

–Robbie... Estou cansada...

–Eu sei Betsy... Mas já está acabando... Aguenta só mais um pouco está bem...

–Até o bebê nascer?

–Até o hospital Betsy...

–Vai demorar... Não vou conseguir...

–Precisa conseguir Claire...

–Não me chame Claire... Não você...

Uma contração mais forte começou e ela abafou o gemido de dor pressionando o rosto em meu pescoço. No segundo seguinte ela respirou forte e eu vi o lençol meio ensanguentado que cobria o banco ficar encharcado por uma água um pouco turva e levemente rosada.

–Hey vocês dois, o que está acontecendo aí? Claire! Robbie! Alguém fale alguma coisa!

A outra bolsa... Kassy, a outra bolsa estourou... Está forte demais...

Era a resistência de Betsy era que estava ficando menor, e isso estava me apavorando.

–Robbie, volta para o seu lugar, já sabe o que fazer.

–Me dá mais um tempo Kassidy, ainda não dá para ver o bebê.

Sem saber exatamente o que estava fazendo, coloquei minha mão na parte mais baixa da barriga de Betsy e pressionei bem de leve, foi o suficiente para tatear a cabecinha. Mas quando outra contração começou eu quase entrei em pânico: o bebê não estava descendo, e eu tinha certeza que não estava colocando força a ponto de barrar a passagem do bebê.

A mão de Betsy que não estava segurando a menina desceu até o lugar em que a minha estava e, mesmo durante a contração, o pânico passou em seu olhar ao chegar na mesma constatação que eu. O bebê não estava descendo.

–Robbie... Robbie, o meu bebê... Meu Deus...

Claire? O que está acontecendo? Robbie, o que está acontecendo!

–Betsy... Betsy, olha para mim... Fica calma... Respira... Respira... Isso... Continua respirando assim....

Escorreguei o braço que estava nas costas de Betsy mais para baixo, até o quadril dela e esperei outra contração.

–Fique com as pernas abertas Betsy... E quando a contração vier, empurre.

Não deu muito tempo para ela raciocinar até a nova onda de dor vir. Assim que senti os músculos ficarem tensos, fiz toda força que pude para erguer o quadril de Betsy do banco, assim mantive até sentir que a dor dela havia passado.

Recostei-a de volta no banco e voltei a verificar sua barriga. O bebê havia se deslocado para baixo! Apesar de claramente dolorida, o rosto de Betsy trazia um pouco de alívio. Alívio que não se estendeu para mim.

–Água... Por favor...

–Kassidy, posso dar água a ela, não posso?

–Pode... Goles pequenos, tome cuidado para que ela não engasgue. E trate de me contar agora o que está acontecendo aí Robbie!

–A posição em que Claire está não deixava o bebê descer.

– O que? O que você fez?

–Ergui o quadril dela para ver se o bebê deslizava.

–E?

–Acho que vai dar para começar a vê-lo na próxima contração.

E foi um dos melhores momentos daquela tarde ver o segundo bebê aparecer. Fiquei massageando Betsy o máximo de tempo que pude, até que se fez necessário que eu voltasse a limpar as mãos e colocar luvas cirúrgicas limpas.

Sem conseguir manter a pressão por muito tempo, a segunda criança demorou um pouco mais a nascer (o que fez minha preocupação aumentar bastante). Mas o bebê, que era tão pequeno quanto a menina, também não demorou a mostrar que estava vivo e forte.

–É um menino Betsy...

Ela me olhou e sorriu um sorriso que misturava felicidade e muito cansaço.

Kassidy repetiu as instruções dadas enquanto a menina nascia, e, depois do bebê estar envolvido por outro lençol e bem aninhado pelos braços de Betsy, pediu ainda que os cobrissem com os mantos a fim de manter os bebês abrigados de qualquer vento gelado.

Recolhi o lençol emporcalhado que estava por baixo de Betsy, tomando cuidado para não contaminar o que havia sido colocado por baixo, e o joguei em uma das sacolas de descarte.

Me permiti respirar aliviado pela primeira vez desde o restaurante. Os bebês estavam bem. Betsy estava bem. Exausta, é verdade, mas bem.

–Robbie...

De repente dei-me conta de que estava com o olhar perdido em Betsy e nos bebês. Retirei as luvas cirúrgicas e me levantei do carro. A pele clara de Claire estava pálida e os olhos verdes um pouco enevoados por causa do cansaço, mesmo assim, ela estava longe de parecer alguém adoecida.

–Claire?

–Oi Kassy...

–Está tudo bem com você? Como está se sentindo?

–Estou bem... Um pouco cansada... E com fome, na verdade...

–Está sentindo algum enjoo ou tonteira?

–Não.

–Vocês têm alguma coisa aí para comer?

–Hm... Sobrou bastante coisa da cesta que trouxemos... Sanduiche natural, bolos, pão caseiro, biscoitos, café, suco...

–Ótimo, ajude-a a comer Robbie, mas nada de cafeína e se o suco for cítrico também dispense... E os bebês Claire?

Eu saí de perto para pegar a cesta mas a escutei.

–Choraram um pouco, mas estão dormindo agora... Consigo senti-los respirando com regularidade...

Não era preciso ser um expert para saber que ela sorria.

–Isso é bom... Chegaram a mamar?

Hm... tentei mas... Não quiseram...

–Não se preocupe, é isso o que geralmente acontece... Infelizmente não posso ajuda-los muito agora, mas há dois bons pediatras de avisados para permanecerem aqui esperando vocês chegarem.

Voltei trazendo um dos saquinhos de biscoitos.

–Kassidy, tudo bem se eu levantar o encosto do banco agora?

–Hm... Preferiria que continuasse assim, ou até mais deitada até conseguirem chegar ao hospital.

–Mas aí ela e as crianças ficariam praticamente soltas no carro em movimento.

–... Tem razão... Ela chegou a perder muito sangue?

–Não sei quanto seria considerado muito, mas o lençol manchou pouco.

–Entendo... Pode levantar então...

Enquanto ajeitava o banco de Betsy, ela continuou.

As janelas do carro estão fechadas?

–As duas da frente a dos passageiros, mas deixei a porta detrás aberta para evitar que algum curioso a visse e resolvesse se intrometer.

Entendo... E os condicionadores de ar?

–Estão na potência mínima e todos desviados dela.

Betsy fez uma leve careta de dor, e sorriu assim que constatou que os bebês continuavam dormindo. Por mais incrível que possa parecer, ela estava realmente muito bonita.

–Kassy, vamos ter que ficar aqui parados por muito tempo?

–Olha Claire... Vocês poderiam até sair, mas precisariam parar em breve por que as placentas iriam começar a ser expelidas... Vale mais a pena para você comer alguma coisa e descansar até elas saírem.

Ela não deve ter gostado muito da resposta.

–Hm... Não vai... Doer muito, vai?

–Depois de dois partos seguidos, eu garanto que você vai tirar de letra...

Não que isso a tenha animado muito.

Depois de comer quase metade de um pacote da receita de biscoitos de leite condessado da minha mãe, vi Betsy com fazer uma expressão de incomodo. Kassidy foi chamada do outro lado da linha e disse que sairia por alguns minutos.

–Betsy? Está tudo bem?

–Hã? Está sim... É que meu braço está um pouco dormente...

Robert, seu idiota, é claro que estaria... Como pode esperar que ela ficasse todo esse tempo segurando as duas crianças e ainda conseguisse manter a circulação normal nos braços? Mas como pedir para que eu a ajudasse nisso?

Você... Quer que eu...

Betsy me olhou como quem não quisesse pedir que eu fizesse ainda mais do que já tinha feito.

–Ora Betsy... Estou aqui para isso não estou?

Ela ficou graciosamente corada.

–Tem... Certeza?

Claro que eu tinha.

– Então... melhor você pegar outro dos mantos...

A ajudei a tirar o manto que cobria os gêmeos, deixando-o totalmente com o menino e cobri a outra criança com o outro manto. A vi dar uma leve tremida de frio, mas não demorou a relaxar de novo embaixo do novo cobertor.

Betsy se inclinou um pouquinho para frente e me deixou envolver uma das crianças.

Mesmo estando embrulhada no lençol e no manto, era agoniante ver o quão frágil aquele bebê minúsculo conseguia ser. A menina começou a estranhar o afastamento da mãe e ameaçou chorar, mas, graças ao bom Deus, não abriu o berreiro, acalmando-se pouco tempo depois.


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