Acho que vai nevar. escrita por Lolla


Capítulo 12
Nevasca noturna.


Notas iniciais do capítulo

Obrigada por vir ler!



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Eu fiquei sentada na maca, olhando pra ele, nunca a vi tão brava e decepcionada, e nunca tivemos uma conversa tão longa e sincera antes. Eu havia dito tudo o que eu precisava para talvez me libertar das amarras que me prendiam eternamente a condição de vida dos meus pais. E ela, pelo seu jeito de respirar, desviando o olhar e mexendo noas cabelos parecia que ainda tinha muito a dizer. E então a deixei falar, apesar das palavras duras, eu queria ela ali comigo, falando, se importando comigo, ou pelo menos fingia muito bem.

– Eu estou cansada, Deus como estou cansada, de tentar ser o suficiente para você, de ser presente, de ser forte. A Mel está cansada de te curar o tempo todo, de pensar sempre em você primeiro, meu Deus a menina nem ao menos namorado se permite ter. Eu preciso,a Mel precisa, que você deixe seu pai, e a vida que passou com ele para trás, e abra os olhos pro que tem agora, ou isso, ou não vai demorar dois anos, para que acabe como ele, isso já foi longe demais. E este menino? Ele vem aqui todos os dias ler com você e quando você dorme ele está aqui também, você está jogando fora tudo que você tem de mais especial na vida.

Agora ela terminou, eu podia sentir, que ela deveria ter dito isso a anos e guardou e engoliu cada palavra por anos, e anos, não por ressentimento, mas porque ela sabia exatamente o que dizer, não foi um discurso do tipo que a gente inventa na hora, este parecia decorado, e muito bem decorado. Eu nunca a vi chorando antes, um choro silencioso e amargo, como o meu quando aceitei que deixaria o "professor" de escanteio, não havia percebido o quão parecida éramos.

Eu abaixei a cabeça, e não disse nada, ela secou algumas lágrimas, e saiu do quarto. Eu estava de castigo, um castigo por vontade própria, apesar da raiva que senti por ela ter jogado tudo na minha cara com tamanha frieza, eu sabia que era verdade, e que nunca tinha percebido o quão egoísta eu era, exatamente como as pessoas que fizeram o vídeo. Ah ! é, o vídeo, no meio dessa confusão esqueci dele, e aparentemente não importava mais, nada importava mais.

Não poderia fazer a prova de qualquer maneira,não suportaria ver e ouvir as piadinhas de novo, ser humilhada, por algo feito tão inocentemente. Só uma coisa me importava agora, a esta altura Victor já saberia do vídeo, assim como a universidade toda, porque ainda estava aqui? Porque falar comigo e por em risco todo o estágio, ou sei lá o que ele faz lá.

– Desculpa, eu não sou bom em interromper momentos assim mas, eu preciso mesmo pegar o meu celular que deixei em algum lugar desse quarto. Se não quiser falar nada eu entendo, e sim, eu ouvi o que a sua mãe disse.

Ele não era bom mesmo em ser gentil ou discreto. E nem em ficar calado.

– Victor.

Pode parecer engraçado agora, mas não foi, ele deixou o celular cair, assim que o chamei.

– Sim.

– Porque está aqui ? Porque vem aqui toda noite, e nunca me disse nada.

Victor, o quão tímido um homem pode ser, quando questionado, parece uma criança de dez anos constrangido por ser pego comendo meleca. Ele ficou vermelho, e começou a gaguejar.

– Eu não vou desistir só porque está constrangido, eu desisti antes e acabamos aqui por conta disso, quero que me responda como um homem.

– Eu não sei, é estranho até pra mim pensar isso, talvez seja porque sei lá, você e a Mel, sejam algo mais parecido com amizade que eu tenho em todos esses anos de vida.

Minhas pernas doíam, mas nada doeu mais do que ouvir da boca dele um " Amizade".

– Então é isso que eu sou pra você, uma amiga?

Eu fiquei furiosa, eu precisava ir até ele, eu precisava socar ele, até que de algum modo toda a minha raiva saísse.

– Sim! Quer dizer, não! Eu estou confuso e nervoso agora.

– Apenas me diga o que eu sou, e o que nós somos !

Eu permaneci firme em todo esse tempo, no desabafo da minha mãe, ao me ver quase deformada no espelho pela primeira vez, de saber que quebrei uma das pernas em quatro lugares diferentes. Mas perto dele, eu não era ninguém, e não tinha força alguma, então chorei. Ele veio até mim com os braços abertos pronto para me aninhar em seus longos braços gelados, e eu os aceitei, eu precisava daquilo tanto quanto dos analgésicos para poder dormir sem gemer de dor a noite inteira.

– Somos, amigos é verdade, mas somos além disso também, eu gosto de você por perto, do seu jeito confiante, que é o que eu não tenho em mim, e estamos no início de sei lá, de algo, bem duradouro e verdadeiro,isso é o que nós somos, mas não sei dizer o que você é, quem sabe disse é só você.

Ele me deu um suave beijo no canto da boca e saiu. E não o impedi, eu precisava desse momento comigo e com os barulhos irritantes dos aparelhos. Aquela noite eu não dormi, eu pensei e pensei e até imaginei como as coisas poderiam ser daqui pra frente, mas em nenhuma das cenas eu me via de volta na universidade, passar por aquilo foi algo além do traumático, foi paralisante.


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