Segredos de Clarisse escrita por Jéssica Belantoni


Capítulo 4
Capítulo 4




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Assim que minha mente voltou a funcionar me afastei de Miguel separando nossos corpos, por algum motivo havia um peso em minha consciência, aquilo não deveria ter acontecido, não estava preparada.

―Desculpe Clarisse, mas não consigo evitar, é quase impossível resistir a você.

―Senhor Miguel não quero que confunda as coisas estou aqui apenas para lhe servir nada mais além disso. ―Respondi sentindo o rubor tomar conta de meu ser.

―Não quero que trabalhe pra mim Clarisse, quero que sejamos algo a mais. ―Sussurrou ele se aproximando.

―Senhor Miguel por favor não insista. ―Respondi olhando em outra direção.

―Vou deixar você pensar melhor. ―Respondeu ele aproximando o rosto do meu em seguida se retirando.

O que estava acontecendo, Miguel era o homem dos sonhos de qualquer mulher então por que meus sentimentos estavam magoados e meu coração de onde tirou tanto desespero. Por que Victor estava em minha mente?

Por algum motivo sem razão alguma me vesti rapidamente, nem ao menos ajeitei os cabelos corri para fora do quarto, meu joelho estava amortecido.

Os corredores da mansão pareciam maiores e confusos, não sabia por onde ir, o labirinto tomou conta de mim, a imagem de Victor entrando em meu quarto estremeceu meu corpo. Assim que encontrei a saída da mansão percebi o quão lindo estava o dia, sabia exatamente onde desejava estar, noutro lado do lago lá estava ele sentado na grama tão verde quanto meus olhos, Victor só notou minha presença quando parei bem atrás do mesmo.

―Devia estar descansando. ―Disse ele sem tirar os olhos do lago.

―Eu estou bem. ―Respondi.

―Eu sei― Disse ele― Pena que agora já não trabalha mais pra mim.

―Trabalho sim Senhor Victor. ―Respondi corando.

―Pensei que você fosse diferente das outras, que estivesse aqui por precisão, mas agora não sei se apenas seu irmão é o errado nisso tudo. ―Respondeu ele em tom de deboche me deixando perplexa.

―Eu não sou uma mulher da vida. ―Respondi grosseiramente― Eu tenho valor Senhor, seu irmão realmente é um homem atraente e bondoso mas não pra mim.

―Por que está se explicando? ―Respondeu ele se levantando ficando frente a frente a mim― Por que veio até aqui me explicar tudo isso?

―Eu não sei, só não queria que pensasse tudo errado. ―Respondi com sinceridade.

―Pensar errado? Então me responda uma coisa e não minta. ―Começou ele― Vocês se beijaram? ―A pergunta de Victor me paralisou eu devia falar a verdade mas o som não saia― Não precisa responder― Terminou ele se afastando.

  Por qual motivo exatamente meu coração apertava de tal forma.

―O que houve? ―Perguntou me Helena voltando em meu quarto com mais um prato de sopa.

―Acho que quero voltar pra casa. ―Sussurrei.

―O que? ―Assustou se ela equilibrando o prato de sopa em mãos― Como assim Clarisse?

―Não consigo ficar aqui sinto falta de casa. ―Respondi evitando os olhos de Helena, não queria magoá-la novamente.

―Não me venha com essa, você queria distância do seu irmão. ―Respondeu ela procurando meus olhos com seu jeitinho de princesa encantada, Helena era mesmo encantadora ―Por demônios Clarisse o que está acontecendo? ―Disse ela se irritando.

― Miguel me beijou!

―Santo Deus! ―Sussurrou ela estranhamente― Conte me como foi.

―Não quero falar sobre isso.

―Não confia mais em mim?

―Jamais! Você é minha melhor amiga.

―Então me conte! ―Disse ela sentando em minha cama esticando seu vestido como uma verdadeira donzela em seguida segurando minhas mãos.

―Ele é perfeito mas eu não sinto o mesmo e não quero que ele pense o contrário.

―Clarisse minha querida ele não vai entender errado se você se opor as aproximações dele.

―Talvez seja melhor eu voltar e evitar tudo isso.

―Você não sente nada mesmo por ele? ―Questionou a Loira me intimidando com seus olhos redondos― Por qual motivo então se encontra neste estado.

―Qual estado? ―Assustei me levantando me rapidamente.

―Você está estranha parece sentir algo por ele e convenhamos ele é muito charmoso, impossível não sentir nada.

―Eu não sinto absolutamente nada por ele. ―Afirmei.

―Então assumi o que te deixou nesse estado porque Miguel beija muito bem que eu sei― Enroscou Helena passando a mim uma coisa que jamais havia notado.

―Me desculpe eu não sabia sobre seus sentimentos. ―Sussurrei tentando me aproximar de Helena.

―Não importa não foi a mim quem ele escolheu. ―Sorriu ela― Ele é perfeito, bonito, charmoso e rico, impossível você descartar um partido desse sem um por que.

  Helena jamais havia me tratado com pose de superior, não até o momento, mas o que exalava de seu ser era algo destruidor.

―O fato é que eu não tenho sentimentos pelo Sr Miguel e só queria que ele entendesse isso.

―Fácil apenas diga isso não se faça de garota difícil se no fundo deseja estar nos braços dele― Respondeu ela causando fúria.

―Quem faz este papel é você Helena! ―Respondi sem medir até onde minhas palavras poderiam ferir.

―Engano seu Clarisse eu não fui capaz de me fazer de difícil para ele. ―Sorriu ela deixando meu quarto.

  Como o esperado Helena se afastou completamente, me senti sozinha como nunca antes.

―Você pode ir ver a sua família mês que vem. ―Sorriu Miguel ―Não podemos te liberar agora. ―Insistiu ele.

―Eu precisava ver minha madrinha ela não responde minhas cartas há algum tempo temo pela sua saúde.

―Vou conversar sobre isso com meus irmãos tudo bem? ―Respondeu ele se aproximando.

  Helena tinha razão, Miguel tinha mesmo um ar sedutor, a luz que entrava friamente pelas janelas iluminavam seus olhos cor do céu se curvando assim que seu sorriso se desenhou, parecia ler meus pensamentos, por um momento comecei a me sentir envolvida.

“―Por qual motivo não me deixo apaixonar.”

―Eu posso dar o que você quiser Clarisse. ―Sussurrou ele agora segurando meu rosto ― Nunca gostei de alguém assim.

  Eu sentia a verdade nas palavras de Miguel e iria ceder a sua investida, afinal onde eu estava com a cabeça ao recusar um homem que poderia melhorar a vida de meus padrinhos, antes que assim fizesse o rosto de Victor domou meus pensamentos por completo quebrando qualquer sentimento que estivesse prestes a despertar por Miguel.

―Me desculpe. ―Pedi me afastando instantaneamente.

―O que? ­­―Respondeu ele extremamente confuso sobre minha reação― Como você...

―Eu não sinto o mesmo Senhor. ―Continuei.

―Eu não entendo. ―Respondeu ele enraivecendo― Desapareça daqui agora.

  Jamais havia visto Miguel naquele estado, era assustador, seus olhos arregalados perdidos em meio a pensamentos que eu não poderia sequer imaginar, recuei e segui para a cozinha.

―Aconteceu algo? ―Perguntou-me Renata uma das ultimas novatas a entrar trabalhar no grande castelo― Você está bem?

―Sim. ―Respondi enquanto pegava a chaleira de agua quente para preparar um chá― Onde está Helena?

―Oh Clarisse você não sabia? ―Assustou-me Renata― Helena partiu essa manhã.

―O que? ―Espantei-me.

―Sim ela e as outras quatro meninas agora restam apenas eu, você e a Marina.

―Não, tem algo muito errado Helena não voltaria para casa.

―Eu vi com meus próprios olhos logo ao amanhecer elas foram levadas pelo Senhor Rogers.

―Posso saber por que tanta conversa e menos serviço? ―Alertou Constance aparecendo do nada― Por isso precisamos tanto trocar de empregadas, vocês todas não valem por uma.

―Simples nos mande embora e pode contratar alguém melhor. ―Enraiveci sem notar o que havia dito, meus pensamentos permaneciam em Helena ela não partiria sem ao menos se despedir e se assim fez algo muito ruim nos destruiu.

―Não é de má ideia Senhorita― Sussurrou ela― No entanto por enquanto prefiro ficar com os mesmos cavalos, quando eles simplesmente se cansarem serão descartados, não se alegre por ser a que está a mais tempo aqui, tenho certeza que é por pouco tempo.

―Faço das tuas palavras meus desejos, agora nos de licença temos muito o que fazer presumo que de pra perceber. ―Respondi em alto e bom som enquanto lhe virava as costas.

―Nunca me trate como uma qualquer. ―Respondeu ela agarrando meu braço com tanta força que suas unhas cortaram minha pele.

―Chega! ―Ordenou Victor soltando meu braço das garras da monstruosa mulher, nem ao menos percebi quando ele chegou bem atrás de mim― Vá e ajude Renata a preparar a mesa de jantar.

―Claro. ―Respondi.

―Não você. ―Respondeu ele tocando em meus ombros― Constance vá ajudar Renata agora.

―O que?! ―Espantou se a megera.

―Não escutou? ―Sorriu ele.

―Mas Senhor.

―Não discuta. ―Firmou ele com a voz grave.

―Sim Senhor. ―Aceitou Constance se curvando ao seu amo e seguindo para longe na companhia de Renata.

―Obrigada. ―Disse após uma pausa.

―Você está sempre metida em problemas.

  Apenas sua voz me enlouquecia como todas às vezes em que me dirigia a palavra.  Uma onda correu sobre meu corpo quando suas mãos desceram pelos meus braços parando nos arranhões causados por Constance. Virei-me em sua direção quando senti seus dedos encostar-se a meu sangue.

  Eu deveria ter me assustado ao ver Victor levar os dedos ensanguentados aos lábios, eu deveria ter corrido no mesmo instante, mas não poderia, assim que as esmeraldas encontraram meus olhos suas mãos seguraram meu rosto, não havia possibilidade de desviar o olhar, contemplar um verde único, minhas mãos já haviam depositado na altura das suas, sus dedos passavam sobre meus lábios eu podia sentir meu próprio sangue.

  No fundo eu sempre soube o que estava sentindo desde o inicio, apenas fechei os olhos quando ele se curvou. Naquele momento, não importava minha reputação, eu queria estar ali e sentir Victor, oh sim nossos lábios se encontraram e meu corpo estremeceu algo em mim sabia que um dia aquilo aconteceria, seus lábios comprimiam os meus fortemente enquanto sua língua manchada com meu sangue dançava junto a minha.  Seus braços fortes cercaram minha cintura e me colocaram sobre a mesa, sim momento arriscado, meu futuro estaria perdido mas não o impedi, Victor era o único homem que eu deixaria me tocar como mulher independente se fosse apenas aquele momento, eu estava disposta a arriscar.

―Não podemos. ―Resmungou ele ainda me beijando― Não assim.

―Está tudo bem. ―Sussurrei.

―Você merece todas as etapas Clarisse e eu não posso te propor isso.

―Eu não me importo― Respondi encostando a cabeça em seu peito― Contanto que seja com você.

―Estou enlouquecendo. ―Sussurrou ele se abaixando até que eu cedesse espaço para que encostasse a cabeça em meu pescoço― Isso vai me causar problemas.

―O que quer dizer? ―Perguntei enquanto lhe abraçava.

―Eu quero você pra sempre, seria pedir muito? ―Respondeu ele de forma que apenas eu pudesse ouvir― Não deixe que ele te toque nunca mais sou extremamente egoísta.

―Isso é um pedido informal? ―Sorri.

―É um aviso. ―Sorriu ele― Esperei você por muito tempo e se eu baixar a guarda vou te perder.

―Já faz quase um ano que estou aqui e você nunca se aproximou e agora diz que me quer? Estou um pouco confusa. ―Disse temendo estar entendendo tudo errado.

―Pensei muito em todas as consequências que isso nos trará, gosto de ter o controle das coisas e pela primeira vez eu vou abrir mão de todo esse controle isso vai te colocar em perigo se eu não estiver atento, por isso quero que volte para casa logo ao amanhecer, eu mesmo te levarei e conversarei com a sua família.

―Você está me assustando. ―Respondi fazendo contato visual.

―Nos primeiros raios de sol a carruagem estará preparada para irmos.

―Certo. ―Respondi enquanto sentia meu coração estremecer.

―Preciso ir agora, amanhã você já será minha noiva formalmente. ―Sorriu ele antes de me deixar sozinha novamente.

“― Meu Deus o que aconteceu aqui, até uma hora atrás eu estava tentando evitar Miguel e agora estou noiva de seu irmão, aquele que julgava me odiar, apesar de toda a loucura eu sempre sobe o que sentia por Victor só não queria assumir isso a mim mesma.”

―Vamos Clarisse ajude a colocar o almoço na sala. ―Ordenou Constance adentrando no cômodo.

―Sim Senhora. ―Respondi ajeitando meu longo vestido e os fios soltos de minha trança bagunçada.

―Estranho não vai questionar. ―Sorriu ela.

―Não senhora. ―Respondi querendo acertar a panela em sua testa enorme― Senhora poderia me informar quando foi que Helena decidiu voltar para casa?

―Helena. ―Sorriu ela― Ela pediu para ir ver a família há dois dias, presumo que não vá voltar.

  Helena não trairia a mim dessa forma, mesmo que eu a tenha magoado ela não seria capaz de me deixar sabendo que meu desejo era voltar para minha família.

―Você tem certeza do que está dizendo! ―Gritou Miguel da sala.

―Só estou contando o que vai acontecer em breve. ―Disse Victor com sua doce e calma voz.

  Pensei em recuar temendo saber o assunto tratado, mas Constance seguia bem atrás de mim, antes mesmo que minha imagem se projetasse na sala ouvi o som medonho de Rogers ecoar meu nome.

―Clarisse querida junte se a sua futura família.

  Oh sim eu tenho certeza que ouvi os dentes de Constance trincar.

―Você não me aceitou por esse verme. ―Gritou Miguel me queimando com seus olhos.

―Desculpe Senhor. ―Sussurrei.

―Não se desculpe Clarisse você não precisa disso. ―Respondeu Rogers.

―Você não passa de uma meretriz. ―Debochou Miguel mostrando a mim uma face que até o momento não conhecia.

―Não ouse sujar a honra dela. ―Protegeu me Victor.

―Pode descanar por hoje Clarisse, sua caminhada será longa amanhã.

―Obrigada Senhor Rogers. ―Respondi pronta para sair.

―Clarisse. ―Chamou ele― Não sou mais seu Senhor por isso não precisa mais usar esse traje.

  Apenas assenti com a cabeça, por um instante encontrei os olhos de Miguel, a calmaria havia dado espaço à tempestade, teria eu feito a escolha certa? Não, desde o inicio eu jamais deveria ter aceitado tal emprego, mas se assim fizesse o que haveria de acontecer entre eu e Pedro?

  Como iria explicar esse relacionamento repentino para meus padrinhos, como dizer que meu Patrão me vê como mulher, o estranho e inevitável é que essa união acabaria por me unir também a Miguel, não da forma que ele desejava, por um momento eu quase cedi a sua pressão, dessa forma eu jamais saberia dos sentimentos de Victor e nunca assumiria os meus próprios.

  Pela primeira vez entrei em meu quarto e haviam preparado meu banho, um maravilhoso banho extremamente quente, enquanto mergulhava meu corpo na delicada banheira aconchegante, pensava em meus padrinhos tentando esquentar um pouco de agua para aquecer o banho em uma noite  de inverno como a que estávamos.

  Penteei meu longo cabelo escuro e vesti meu traje favorito de um branco como a neve que caia lá fora, adormeci como nunca antes.

  Como o esperado os sonhos me tomaram, estava eu vestida de noiva , em um corredor com muitas pessoas, minha família estava lá, Helena também, estranhamente em meio as pessoas fundidas na decoração de flores estava Victor, se meu amado Victor estava com a multidão, quem me esperava ao altar? Oh não, Miguel me esperava ansioso com seu terno branco, seus cabelos de ouro desciam pelos ombros, fios finos e dourados balançavam conforme eu me aproximava e por qual motivo eu continuava a caminhar?

  Claro esse era meu subconsciente, eu quis estar com Miguel também, talvez ter aceitado Victor tenha sido rápido demais, neste momento meu sonho mudou vejo Pedro ele me agarra novamente naquele estabulo, entro em desespero, espere Victor está aqui, oh sim Victor é meu anjo de olhos verdes, novamente ele me segura pela mão e me salva, seria sempre assim, Victor sempre me salvaria. Estou novamente à igreja, agora as coisas estão certas Victor é quem me espera, mas por que ele não está sorrindo ele está desesperado, onde estão todos? A igreja está vazia, abandonada, Victor corre em minha direção por que ele está chorando? Paro em meio ao corredor olho em minhas mãos e em meu vestido estou coberta de sangue, seria meu sangue? Não. Virei me e encontrei, Miguel estava coberto de sangue, seu sorriso era maléfico, havia corpos nus esquartejados por toda igreja, minha família havia sido devorada, num instante Miguel já havia atravessado meu corpo apenas com sua mão, a dor era real, eu estava morrendo, senti as mãos de Victor me alcançar, assim que meus olhos se fecharam no sonho acordei em meu quarto ouvindo um grito, poderia ter sido meu?

―Clarisse. ―Chamou me uma voz conhecida.

―Helena? ―Respondi encontrando a silhueta de Helena saindo da escuridão.

  Helena estava diferente, ainda mais bonita do que me recordava, seus cachos dourados haviam sido cortados na altura dos ombros, sua pele parecia cintilar me dando a leve impressão de estar rígida.

―Ouça Clarisse, você deve fugir agora mesmo. ―Disse ela aflita baixo o suficiente para que apenas eu pudesse ouvir― Você deve ir embora.

―Você não havia partido? ―Por um instante pensei que vomitaria, a tensão corria pelo meu corpo― Você havia ido embora.

―Parti para o inferno Clarisse, você deve ir antes que Miguel venha atrás de você.

―Eu estou sonhando novamente, você não está aqui. ―Gritei enquanto sentava-me na cama.

―Eu estou aqui. ―Respondeu ela se ajoelhando a minha frente e segurando minha mão― Nunca permitiriam que voltássemos eu nunca verei minha família novamente.

―Isso é um sonho.

―Clarisse veja eu estou aqui― Chamou ela forçando me a olha lá, antes que seus lábios se estreitassem e dissesse algo mais Helena me surpreendeu com um beijo em seguida começou a chorar― Eu estou aqui! Agora ouça me e fuja!

―Mas e Victor? ―Perguntei aflita e um tanto envergonhada― Ele vai me proteger.

―Ele não pode te proteger Clarisse corra ao estabulo e pegue um cavalo e corra o mais rápido que puder e não olhe para trás.

―Você virá comigo?

―Não.

―Você não pode ficar Helena. ―Ouvi um grito no andar de cima.

―Você deve ir agora. ―Gritou ela pegando em minha mão e como um demônio desaparecermos no ar e reaparecermos no estabulo― Clarisse vá embora.

―O que você é? ―Perguntei aflita sem entender nada.

―Sou o que eles são. ―Disse ela entristecida― Sou um demônio, não posso mais deixar a casa dos Carmichael e você morrerá se ficar aqui.

―Helena. ―Clamei chorando assim que subi no cavalo.

―Adeus Clarisse. ―Disse Helena chorando antes de acertar um tapa no cavalo que o fez correr.

  O que estava acontecendo, em um instante estou noiva e noutro perseguida por um demônio, o que exatamente é um demônio, sempre fui tão religiosa e não sei responder meus próprios receios.

  Ainda era noite e se não fosse o leve clarão do Luar temo não ter achado a estrada. Graças a Deus eu havia aprendido a cavalgar ou não saberia suportar o impacto do cavalo abaixo de mim.

  Nem mesmo a neve gelada desacelerava meu coração amedrontado.

  A penumbra da noite havia me cegado me deixando perdida, avistei um pequeno clarão ao topo da colina, o vilarejo que conhecia tão bem me aguardava.

  Nem me importei com meus trajes quando cheguei ao vilarejo, algumas pessoas já estavam em pé juntos aos primeiros clarões do amanhecer, continuei o mais rápido que podíamos até minha casa que permanecia um pouco mais além do pequeno vilarejo, assim que cheguei meu coração apertou, a porta estava escancarada, havia cheiro de morte. Desci do cavalo quase desmontando ao chão, minhas pernas tremiam, lá do fundo da escuridão algo foi arremessado em minha direção caindo em minhas mãos, por extinto talvez, quando tomei conta do que se tratava meu coração trincou, havia cabelos dourados, os fios que eu tanto amava ajeitar antes de ir estudar, agora seus olhos dourados estavam arregalados de terror, a cabeça do pequeno Arthur estava em minhas mãos. Abracei aquela cabeça com todas as minhas forças sujando toda minha roupa. O choro não cessou.

―Não chore pequena Clarisse―Disse Miguel saindo da escuridão― Eles não gritaram muito.

  Miguel estava coberto de sangue, em seu rosto havia um sorriso estampado de maldade.

―Por quê? ―Chorei― Eles eram tudo que eu tinha. ―Abracei novamente o que restava de meu irmão mais novo.

―Você escolheu isso Clarisse. ―Disse Miguel tomando a cabeça de Arthur e a arremessando para longe.

  Meu corpo estremeceu com a aproximação de Miguel, era como se eu nunca o tivesse conhecido realmente, havia muito sangue em seu rosto até mesmo seus olhos que antes azuis agora predominavam em um vermelho tão forte quanto o de seu irmão Rogers.

―O que eu fiz pra merecer isso? Acabou com a minha família por eu simplesmente não amar você?

―Amar? ―Debochou ele― Acha mesmo que eu me importo com um sentimento tão humano? Não vê esse seria o fim desde que você aceitou trabalhar para os Carmichael, você sentenciou a sua família.

―Eles eram minha vida. ―Sussurrei tentando digerir o que estava acontecendo.

―Não pequena você ainda tem sua vida e eu vou drenar cada segundo dela. ―Disse ele se aproximando a cada passo que eu retornava, meu temor estava entorpecendo meus sentidos, meu estava aterrorizada― Cada segundo de uma morte lenta e dolorosa.

  Não havia o que fazer, minha família já havia sido tomada de mim, mas momento algum eu desejei morrer, não nas mãos de um demônio, por vontade de viver corri o mais rápido que pude pela plantação que me levaria o mais rápido a cidade, o choro não sessou e clamei cada lagrima para que Victor me encontrasse e me salvasse como todas as outras vezes, mas ele não chegou e só percebi o quão tarde seria se chegasse quando Miguel apareceu em minha frente e me arrebentou ao chão, sim ele estava me devorando, mesmo assim eu continuei tentando.

―Você é deliciosa. ―Gritou ele enquanto arrancava minhas vísceras.

  Eu já havia aceitado meu destino, todas as pessoas importantes em minha misera vida passaram em minha mente inclusive Victor, por ironia fui me apaixonar somente no fim de minha vida, meu anjo mortal, meu protetor, nem bem tive a chance de conhecer o homem que fez meu coração enlouquecer. Nenhum som chegava limpo aos meus ouvidos já estavam entupidos, a dor não podia mais sentir, eu estava morrendo.

― Victor... ―Chamei sem que som algum saísse de minha boca.

  Sem ao menos entender o que aconteceu algo extremamente rápido arrancou Miguel de cima de mim, o cheiro me era conhecido.

―Vai ficar contra mim querido irmão? ―Grunhiu Miguel.

―Vá embora agora se não quiser morrer aqui. ―Gritou Victor.

―Por uma humana? Ou melhor uma morta agora.

―Nunca vou deixar ela partir sou egoísta demais pra isso.

―Você só pode estar de brincadeira. ―Grunhiu Miguel.

  Não fui capaz de entender muita coisa apenas ouvi a voz de Helena e tudo se calou, quando meus olhos se fecharam ouvi a voz veludada de Victor ao pé do meu ouvido.

―Me perdoe, não pude ser mais rápido. ―Chorou Victor, sim ele estava chorando― Mas eu não posso deixar você partir, algo em você Clarisse me faz querer ser melhor e depois disso espero mesmo que me perdoe.

  Fechar os olhos para o mundo e encontrar o vazio, foi o que me aconteceu, meu coração parou e eu morri, sem dor, sem desespero, tudo passou e me vi mergulhar na escuridão e de uma hora para outra a luz invadiu minha paz e eu abri meus olhos, mas agora eu já não pertencia ao mundo dos humanos, eu havia me tornado um deles.


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