POV Scott

Ricky. Ricky o incomodava. Seus olhos escuros, seu sorriso ameaçador, sua risada fria, seu olhar fixo, suas roupas sujas, rasgadas, detonadas, seu sarcasmo, sua voz fina, mas rouca, tudo, tudo o incomodava.

E ele mal conhecia o garoto.

Mas Scott tinha isso como um talento natural: quando ele não gostava de alguém, essa pessoa não merecia ser gostada por ele. Só se equivocou uma vez, quando julgou Nico durante o período em que estudavam juntos, mas esse erro nunca se repetiu.

E Scott não gostava de Ricky. Na verdade, esse sentimento era até mais forte: ele não confiava em Ricky.

E, de repente, Nico diz que Ricky virá como acompanhante na situação mais perigosa pela qual Scott iria passar.

Sim, é claro que ele estava irritado! O que ele devia fazer? Pular, cantar e jogar confete?

Mas já que teve uma votação (extremamente injusta), o garotinho ia ter que ir. Só de vê-lo deitado, dormindo profundamente, enquanto a notícia de que iriam para a missão foi dada, Scott ficou com raiva.

Mas, não tinha nada que ele pudesse fazer. Aceitar, talvez, com o tempo.

Se aproveitar disso, de alguma maneira.

O que ele tinha feito com Nico, mesmo? Sugado a dor, algo assim?

É, okay. Talvez ele viesse a ser um tanto útil.

.

POV Nico

Quando Leo avisou que iriam na missão, Nico não poderia estar mais feliz, mas em poucos segundos, sentiu-se nervoso, lembrando-se da missão dos amigos mais velhos. Olhou ao redor, procurando um olhar de entusiasmo, e só quem não o lançava era Scott, que parecia pensativo. Mas isso mudou em alguns segundos e todos começaram a comemorar. Começou como um abraço e alguns pulinhos, mas não demorou para que Jill e Cori gritassem, olhando uma para a outra, em meio a risinhos.

Por que garotas gritam tanto?, Nico pensou, olhando para Scott, rindo, com as mãos cobrindo as orelhas.

– Por que garotas gritam tanto? – uma voz arrastada teve a mesmo dúvida – vocês me acordaram. O que houve? As duas têm a mesma saia?

Ninguém conseguiu se irritar ao meio de tanta animação, até porque ele parecia falar sério, sob o efeito do sono. As bochechas de Nico começaram a doer pelo tempo que sorria, que era muito, pelo menos nos critérios deles.

– A gente vai sair na missão! – Cori disse, surpreendendo-se de novo com as palavras, e voltando a rir.

– O que? – ele saiu da cama lentamente, meio assustado, meio sonolento – como assim? Tipo agora?

– Tipo agora – Jill segurou-o pelo braço, fazendo o mesmo com Nico, e puxou-os para fora da sala – venham vocês também! – gritou para os amigos que ficaram para trás – vamos ao barco!

– Mas já? Como assim? – Ricky estava claramente confuso e irritado, e ainda falava com uma voz estranha de sono – mas eu acabei de acordar...

Jill ignorou-o e continuou a saltitar, levando os meninos. Nico, normalmente, teria tentado se livrar da mão que o agarrava, mas, bom, era Jill.

– Mas eu não quero morrer agora – Ricky esfregou o olho enquanto corria, desajeitado, tentando acompanhar o braço de Jill – a gente não pode ir depois?

– Cara, você ainda está bêbado de sono – Nico riu.

Ricky grunhiu em resposta e jogou a cabeça para trás.

– Mas, afinal, onde está o barco? – Jill se perguntou, ao notar que estava puxando os garotos aleatoriamente. Olhou para trás e viu Cori puxando Scott – você sabe?

Ela deu de ombros.

– Eu acho que vi um barco – Ricky apontou para o céu – é aquele?

Os outros semideuses olharam para cima, e talvez possa soar bizarro agora, mas na hora até que fazia sentido: eles viram um barco lindo voando sobre suas cabeças.

Uma voz alta soou enquanto o barco posava.

– Meus caros, é assim que se faz um barco com estilo!

O barco chegou ao chão à alguns metros deles, sem esmagar ninguém, por sorte. Leo estava nele, fazendo pose de importante, quando saltou, com uma cambalhota, em direção ao chão. Pouco antes de bater, Jason passou voando por ele e levantou-o para o céu em rodopios, voltando aos poucos para perto dos amigos enquanto Leo cuspia fogo.

– E é assim que se faz uma entrada triunfal – ele sorriu, piscando para Jason, ao pousarem à frente dos semideuses.

– Essa Broadway foi toda produzida agora? – Ricky virou os olhos e bateu palmas lentas – estou realmente impressionado.

– Ei, você voltou ao normal – Jill sorriu para ele.

– Eu odeio ser acordado – ele rosnou – e agora que meu cérebro funciona de novo, a gente vai mesmo sair na missão?

– Claro que sim! E agora! – Leo estava quase chutando os amigos para dentro do barco – e quando eu digo agora, é agora. Entrem! Tem um manual com tudo o que vocês precisam saber para fazê-lo funcionar. Se precisarem, me mandem uma mensagem de Íris.

Nico viu Percy e os outros “sete semideuses” se aproximarem. Eles trocaram uns comprimentos rápidos e uns “boa sorte” sem graça. Na verdade, nada importava para Nico, ele só queria se despedir de Hazel.

Olhou a irmã, que tinha lágrimas nos olhos.

– Nico – ela abraçou-o – Nico, tome cuidado, por favor...

– Eu vou – ele sentiu ela soluçar – ei, calma... shh, fica calma, eu vou tomar cuidado. Eu vou voltar – ele segurou-a pelos ombros – e talvez eu traga um velho novo membro da família.

Hazel sorriu e fungou.

– Acho melhor você entrar no barco.

Nico decidiu não continuar a se despedir, talvez se tornasse difícil demais. Se afastou da irmã e virou-se para deparar-se com Ricky olhando-os com a cabeça baixa, os lábios comprimidos e os braços cruzados. Ao ver o amigo se virando, ele desfez a posição, respirou fundo enquanto levantava a cabeça e andava em direção ao barco. Nico pensou um pouco sobre o que presenciara, mas balançou a cabeça e seguiu o mais novo.

Entraram no barco, e em pouco tempo, Scott também, e depois Cori e Jill.

– Bom – Ricky suspirou – estamos todos aqui. Eu vou tomar um banho e colocar uma roupa decente, que não seja esse pijama de hospital que eu tanto detesto.

– Você trouxe alguma coisa? – Scott perguntou.

– Eu pego do Nico – ele deu de ombros - ele usa roupas apertadas.

Nico sentiu o rosto corar enquanto o amigo saia da sala como se nada tivesse acontecido. Scott e Cori seguravam a risada, e ele olhou para a própria roupa.

– Não se importe com isso – Jill segurou seu queixo delicadamente e levantou seu olhar para o dela – eu gosto das suas roupas.

– Achei que não gostasse – ele suspeitou.

– Mas gosto – ela chegou perto – gosto muito.

Nico sorriu e colocou suas mãos na cintura da menina.

– Eu gosto das suas – ele elogiou, e segurou o pingente que ela levava no pescoço – eu gosto tanto do seu colar...

– E eu gosto tanto do seu anel... – ela mexeu na mão de Nico até encontrar o anel.

Eles riram baixinho e trocaram um selinho ou outro.

– Entãão... – Scott anunciou – a gente vai saindo. Vamos explorar o barco, Cori.

– É – ela concordou – boa ideia.

Eles saíram de fininho, envergonhados.

– Eu não acredito que finalmente estamos em uma missão juntos – Jill sorriu, ignorando as falas dos amigos.

– Sem você tentando me matar.

– Fingindo – ela corrigiu.

– Eu sei – ele sorriu, beijando-a de novo – eu sei disso.

– Há quanto tempo não temos um tempinho para nós? – Jill pensou - Só para nós?

– Não sei, mas senti falta – ele sorriu.

Eles se beijaram com mais entusiasmo dessa vez.

Tudo ia bem. Tudo ia perfeitamente bem. A primeira missão oficialmente de Nico ia começar e ia ser com Scott, um velho inimigo que virou um amigo próximo e especial. E com Cori, uma garota engraçada que ele não conhecia direito, mas queria conhecer com certeza. E com Ricky, alguém que encontrou por coincidência, ou talvez por sorte, pois era uma amizade tão diferente das outras, e eles se entendiam tanto.

E ia ser com Jill. Jill. Aquela menina tão... indescritível. Ela mudou Nico para melhor em mais maneiras do que ele sabia contar. Ela o fazia sorrir sem nem mesmo estar perto dele. Só de lembrar de Jill, o dia de Nico ficava melhor.

E Nico tinha Jill. Ele a tinha.

Tudo ia muito bem.

Tudo estava perfeito.

E eles ouviram um pigarro da porta.

Os dois se separaram aos poucos, envergonhados, e viraram a cabeça lentamente para ver Ricky à porta, com os braços cruzados e um sorriso malicioso. Jill arrumou o cabelo e Nico ficou girando o anel.

– Mas o que foi isso? – ele riu – eu entro na sala e vejo os dois aí quase se engolindo! É oficial? Todo mundo sabe?

– Na verdade sim – Nico respondeu rápido, envergonhado – o que você quer?

– Eu vim perguntar por que tem dois registros no chuveiro, mas eu posso ir embora – ele levantou as sobrancelhas.

– A esquerda é água quente e a direita é água gelada – Jill estava vermelha.

– Tem água quente? – ele pareceu surpreso de verdade – que chique. Era só isso. Se divirtam, mas não muito – ele piscou para Nico, causando constrangimento máximo, e foi embora.

Mas ele gostava de jogar uma granada e sair correndo, e completou, já fora da sala:

– Usem proteção!

Eu mato ele mais tarde, Nico decidiu.

O silêncio embaraçoso reinou a sala por um longo tempo.

– Não dá para continuar, né? – Nico tentou.

– Não – Jill respondeu quase imediatamente.

– Ah, beleza, eu vou ver o barco com Scott e Cori.

– E eu vou ver se aprendo a pilotar isso.

Eles foram para direções diferentes. Nico nunca sentiu o rosto mais quente. Nunca sentiu-se mais vermelho.

Ele começou a procurar os amigos, ainda com os lábios formigando, tentando esquecer o que tinha acontecido para ver se não evitava morrer de vergonha. Mas antes que achasse qualquer coisa, sentiu um tremor no chão e correu para a cabine, que era posicionada mais para a frente, como Leo havia explicado antes.

Jill estava levantando voo.

– É fácil! É um controle de PS4! - ela mostrou - Eu jogava isso!

Nico correu para ver a que altura estavam, e pode-se dizer que era muita. Ele quase ficou tonto e voltou para a cabine.

– E agora? – Jill perguntou – para onde eu vou?

– Para onde você acha? – Cori e Scott estavam na porta da sala – para a terra ressecada, é claro.

E assim eles foram.