Segunda-feira nunca havia sido um bom dia para Stiles Stilinski.

Foi em uma segunda que quebrou o braço direito, ainda pequeno.

Ele também tomou injeções somente na segunda, porque eles eram os dias de vacina.

E sua mãe morrera em uma segunda. Completamente ensolarada e sem nuvens.

O garoto nunca reclamava dos outros dias, porém segundas-feiras eram marcadas para receber xingamentos e palavras ruins do jovem de 18 anos. E hoje não seria diferente.

Ao descer do ônibus escolar, junto com seu melhor amigo e fiel escudeiro Scott McCall, Stiles suspirou e ajeitou os óculos no rosto, apenas para ter seus livros jogados no chão. Ele nem precisava levantar o rosto para saber que se tratava de Derek Hale e sua “trupe de quadrúpedes”, como Scott uma vez os chamara: Vernon Boyd, um garoto moreno e muito calado, que namorava a garota que fazia todos os homens da escola inteira babarem, Erica Reyes; Jackson Whittemore, atual co-capitão do time de basquete e namorado da garota que um dia fora a razão dos sonhos heterossexuais de Stiles, Lydia Martin; e Isaac Lahey, que não era tão calado quanto Boyd e fazia as meninas suspirarem com o pacote cachos loiros + olhos azuis.

Quando, enfim, o grupo passou – sem uma olhada singela de Isaac no bumbum de Scott, que estava agachado tentando recolher os livros de seu amigo – e Stiles pode finalmente liberar a respiração que havia prendido.

-- Obrigado, cara. – O mais novo agradeceu ao amigo assim que o mesmo entregou os livros para ele.

-- Sem problemas, bro. – Scott sorriu e seu queixo torto moveu-se com o gesto. – Qual é a do Derek, afinal? Estamos no último ano e ele ainda faz “bullying” com os nerds. Isso é tão anos 90.

Stiles riu do amigo que chegava à ser mais gay do que ele, ás vezes. Não era segredo algum a bissexualidade do mais novo e a homossexualidade de seu melhor amigo. Por conta disso, muitas vezes eles foram confundidos como um casal, por causa dos toques e abraços que eles compartilhavam, e quando eles descobriam, gargalhavam juntos. Os dois começaram à caminhar rumo aos seus armários, que ficavam em uma área mais tranquila do colégio entretanto longe do refeitório, e conversaram sobre assuntos triviais no caminho.

Ao chegar ao local, foram surpreendidos por Allison, uma das garotas do clube de xadrez que frequentavam e única amiga fora do círculo que eles tinham.

-- Garotos. – Ela os cumprimentou com um beijo no rosto de cada e recostou-se no armário ao lado do de Scott, tirando o celular do bolso e teclando rapidamente. – Hoje teremos treino. Vocês vão?

-- Acho que hoje não vai dar pra mim, Ali. – Scott foi o primeiro à falar, os olhinhos de cachorrinho ficando maiores a medida que dava a explicação para a garota. – Minha mãe terá a tarde de folga hoje e decidimos fazer uma faxina na casa, que está imunda. Me desculpe mesmo.

A garota deu um de seus sorrisos com covinhas em direção à Scott e deu dois tapinhas em seu ombro direito.

-- Sem problema, Scott. E você, Stiles?

-- Eu posso ir. – O garoto respondeu enquanto tentava abrir o cadeado do armário. – Será no mesmo horário, certo?

-- Ás quatro, na sala do conselho estudantil. – Ela assentiu no final e ele assentiu de volta, abrindo o armário. Um papel foi a primeira coisa que caiu do mesmo e ele agachou-se para pegar o pequeno envelope roxo. Stiles adorava roxo. – O que é isso? – Ela perguntou e Scott não precisou dizer mais nada, porém em seu rosto a interrogação estava tão presente quanto se ele tivesse dito.

-- Não sei. – O mais novo sussurrou, de modo que os outros dois adolescentes mal podiam ver. – É um envelope.

-- Isso nós sabemos, Stiles. – Scott disse, com um revirar de olhos no final, e tentou pegar o envelope, falhando em seguida. – Queremos saber o que está dentro do envelope.

Foi nesse exato momento que a campainha bateu e Scott e Allison grunhiram com a falta de informação e tempo. Stiles jogou o envelope dentro da mochila e pegou o livro de História no armário, fechando depois. Quando estava saindo, foi interrompido por Allison, que segurou seu braço e mandou-lhe um olhar intimidador.

-- Quando eu voltar, quero saber cada linha que está escrito aí. – E assim ela foi embora, os cabelos longos e castanhos balançando com os movimentos de seus quadris. Scott estava do lado do amigo e fez um sinal com dois dedos voltados para seus olhos e depois os girando na direção de Stiles, em um gesto que dizia claramente “estou de olho em você”.

Assim que seus dois melhores amigos foram embora, Stiles apenas voltou à andar rumo á aula e só parou no banheiro, quando pegou o papel rapidamente dentro da bolsa e leu-o, apenas para matar a curiosidade.

“Rosas são vermelhas, violetas são azuis/ Sorria para mim, pois seu sorriso é que me dá luz/Estrelas são brilhantes e a lua também/ Não pare de sorrir, meu amor, só você me faz tão bem.”

O garoto terminou de ler o pequeno poema com um sorriso enorme no rosto e olhos marejados por debaixo dos óculos. Ao que tudo indicava, essa segunda-feira não seria tão mal assim.

*

Se estar de recuperação já era um martírio, estar de recuperação em Economia Doméstica era o Inferno na Terra.

Ao entrar na sala da Senhorita Blake, ou Jennifer como gostava de se chamada, e ver apenas o tão popular e valentão Derek Hale na última mesa da sala, tudo o que Stiles queria era que o mundo inteiro parasse por um segundo enquanto ele corria para sua casa e se protegia debaixo do seu cobertor. Porém, o olhar mortal que a professora lançava – ora em Stiles e ora em Derek – foi o suficiente para lhe fazer baixar a cabeça e sentar na primeira mesa, em frente à professora.

A mesma começou à fazer um discurso de como gostaria de ter suas férias mas estava presa na escola e com apenas dois alunos, enquanto Stiles mordia a ponta de seu lápis e ele ouvia o estouro de algo parecido com bolinhas de chiclete. Ao terminar o falatório, a professora mandou que os dois juntassem-se em uma dupla para formar uma sobremesa, usando apenas alguns poucos ingredientes e com a desculpa de que ela estava grávida e com vontade de comer um doce.

O mais novo revirou os olhos e olhou para trás. Ao encarar Hale de novo, sentiu um arrepio na espinha, porém ignorou, ajeitou os óculos, e foi até a mesa do fundo, sentando-se na cadeira vaga ao lado do maior.

Os dois acabaram ficando alguns bons minutos em silêncio, até que Derek soltou um “Dane-se” baixo o suficiente pra professora não ouvir e começou a pegar latas de leite condensado e creme de leite em um pote embaixo da mesa.

-- O que está fazendo? – Stiles perguntou enquanto olhava as quatro latas – duas de leite condensado e duas de creme de leite – na mesa.

-- Estou fazendo um mousse de maracujá. Foi o que a professora pediu. – A serenidade que o maior dissera aquilo fez com que o menor olhasse para ele, com intriga nos olhos, e limpasse os olhos depois. Aquele era mesmo Derek Hale ou seria seu irmão gêmeo de que ele nunca tinha ouvido falar?

-- Quer ajuda? – O menor assustou-se quando notou que sua resposta era sincera, ele estava disposto mesmo à ajudar. E, para piorar, Derek lançou-lhe um resquício de sorriso e apontou para a geladeira no canto da sala.

-- Os maracujás estão lá dentro. Bata-os no liquidificador para que possamos começar.

O mais novo mordeu o lábio inferior e assim o fez. Em poucos minutos, o mousse já estava terminado e sendo posto na geladeira com as mãos pequenas da professora. Ela disse apenas um “Muito bem, rapazes” e foi embora, as mãos na enorme barriga de oito meses. Enquanto arrumava suas coisas, Stiles deixou-se encarar por mais alguns segundos o causador do seu transtorno diário desde o quinto ano e que, miraculosamente, estava sendo gentil com ele. Derek estava de costas, se alongando pelo tempo gasto em pé preparando tudo, e o menor pôde ver um pedaço de pele descoberta pela camisa que acabou subindo com o ato. Quando voltou à si, notou que Derek lançou-lhe um olhar um tanto “engraçado” e saiu da sala sem dizer nada.

Isso continuou por mais três semanas.

*

E, por mais três semanas, Stiles recebeu lembrancinhas do seu mais novo Admirador Secreto. O cara, como Allison insistia em dizer que uma menina nunca teria tal coragem, era bem persistente e todos os dias o garoto encontrava em seu armário algo como cartões com poemas, letras de músicas ou apenas uma mera frase que iluminava o restante do seu dia; ou flores, como orquídeas, jasmins e algumas pétalas de rosas, que acabavam deixando seu armário com cheiro de flores; e até ingressos para o show da sua banda favorita, que ele foi com Scott, claro.

No penúltimo dia do ano letivo – uma quinta-feira, dois dias antes do grande baile dos formandos – havia uma rosa no seu armário e um cartão. O menor estranhou, pois ele nunca recebeu dois presentes de uma só vez, porém achou normal – e ainda mais fofo – e abriu o cartão.

“O baile chegou e, com ele, a hora de nos vermos também. Quero que me encontre nas arquibancadas á meia-noite. Espero te ver lá, Cinderela.”

O mais novo suspirou bem na hora que Scott chegou, com um sorriso enorme no rosto.

-- VOCÊ NÃO VAI ACREDITAR!

-- Se não me disser, eu não vou mesmo.

-- Acabei de ser convidado para o baile!

-- Por quem?! – O menor fechou o armário com força, porém Scott ignorou.

-- Isaac Lahey.

O sorriso que apareceu no rosto de Stiles não era o que o outro esperava.

-- O que foi?

-- Já estava na hora d’ele “virar homem” e fazer isso.

-- Do que está falando?

-- Scott, o cara quase te comia com os olhos. E você suspirava toda vez que passava por vocês. A tensão sexual era óbvia até para quem estava na China, caro amigo.

Os dois riram depois disso e prometeram se encontrar mais tarde para procurar ternos para o baile. Stiles bufou assim que lembrou que devia ir até a sala da Senhorita Blake para que ela pudesse dar sua nota e, mesmo não querendo, foi. Chegando lá, apenas Derek se encontrava, com um papel na mão. A jaqueta do time de basquete – vermelha e branca – estava amarrada em sua cintura, e não havia sido vestida por ele como sempre. E mesmo com apenas uma camisa jeans com mangas enroladas até os cotovelos e um gorro, o cara parecia um modelo da Calvin Klein prestes à posar para um “photoshoot”.

-- Onde está a professora?

Ao ouvir Stiles, o maior virou-se e o menor viu seu coração palpitar ao ver que ele usava óculos. Malditos hormônios e seu timing perfeito.

-- Ela foi embora. Ao que parece, o bebê vai nascer antes do previsto.

-- Ah. – Fora a resposta do mais novo, que continuou no mesmo lugar, sem saber para onde ir. – Onde estão as notas?

O maior balançou a folha que segurava e Stiles correu para perto dele.

-- Quanto eu tirei? – Ele perguntou e depois notou que estava perto demais de Derek. Tão perto que sentia a respiração dele em seu rosto.

-- Nós dois tiramos dez. Acho que ela estava com muita vontade de ir viajar, porque o nosso mousse ficou horrível.

O jeito que ele havia dito “nosso mousse” fez até o sangue do menor gelar e ele ajeitou os óculos, olhando – sem pensar – para cima e encontrando os olhos esverdeados do maior. Por um momento, os dois ficaram perdidos nos olhares do outro, até que um ronco de motor foi ouvido do lado de fora e eles se separaram com um pulo.

-- É melhor... É melhor eu ir. Eu tenho que ir até o centro com Scott.

-- É, é melhor mesmo.

-- Te vejo no baile, então? – Algo no olhar de Derek mudou assim que Stiles pronunciou tal questionamento e ele se perguntou se tinha feito alguma coisa errada. De novo.

-- Com certeza. Tchau, Stiles.

-- Tchau, Derek. – E assim o menor se foi, perdido em pensamentos enquanto caminhava pelo enorme corredor e o gosto do arrependimento enchia sua boca.

*

Os minutos se arrastavam e o jovem Stiles nunca havia se sentido tão ansioso como estava agora.

Faltavam cinco minutos para a meia-noite e o mesmo estava tomando um pouco de ponche oferecido pelo comitê do baile enquanto observava Scott e Isaac em um canto, conversando e rindo como se fossem amigos antigos e não dois caras que tinham um desejo infinito um pelo outro até que se encheram e decidiram agir.

O garoto bebeu mais dois copos da deliciosa bebida e foi ao banheiro, mas quando chegou lá, notou que a fila estava cheia e ele decidiu fazer do lado de fora mesmo. Ao sair do ginásio, o menor foi até uma árvore para se aliviar quando viu uma figura andando nas sombras à sua frente em direção às arquibancadas.

Só podia ser o seu famoso Admirador Secreto. Stiles fechou o zíper e seguiu o rapaz, com uns bons 50 metros de diferença entre eles. O mais novo não conseguia enxergar bem sem os óculos, por isso ele não pôde ver quem era desde o princípio. Ao chegarem nas arquibancadas, as luzes foram ligadas e ele conseguiu ver melhor.

O rapaz parou no meio do campo e ele notou que o mesmo carregava um buquê de tulipas na mão esquerda. Ao virar-se, porém, o mundo inteiro girou e raiva começou à crescer dentro de si.

-- Então era você! Esse tempo todo... Era você! – A voz de Stiles ecoava no campo vazio e Derek assustou-se, mas recobrou a expressão serena logo depois.

-- Stiles, você veio...

-- É claro que eu vim! Eu sou um idiota, não é? Céus, eu realmente...

-- Stiles, eu juro... Eu... Por favor, deixa eu te...

-- Explicar?! – O mais novo já não tentava esconder as lágrimas que caíam. – Isso tudo foi uma brincadeira comigo! “Quem vai conseguir pegar o nerd até o fim do ano” ou algo assim. Isso é doentio, eu não... Saia de perto de mim!

O mais velho segurou o outro pelos ombros e Stiles levantou o olhar e, em vez de encontrar um sorriso de escárnio, tudo o que ele viu foram lágrimas enormes caindo dos olhos de Derek.

-- Eu te amo. Eu sempre te amei. Desde o primeiro dia que pus os olhos em você, com seu cardigã, sua camisa verde, seus jeans surrados e as botas grandes demais para seus pés. Mas eu tinha medo. Medo porque você era tudo o que mais queria e o que eu não podia ter. Eu tentei, eu juro que tentei, mas eu nunca tinha uma chance sequer.

-- Por quê eu? – Stiles perguntou, seu coração aquecendo com as palavras – que ele sabia – que Derek falava e eram verdadeiras.

-- Por quê não você?

-- Não sei se posso confiar em você.

-- Então não confie. Só me deixe te amar e eu posso me virar com o resto.

Quando o maior se inclinou para beijá-lo, Stiles se afastou e negou com a cabeça. O menor virou-se, pronto para correr e chorar nos braços de seus amigos, quando Derek falou a única coisa que poderia fazê-lo ficar.

“Rosas são vermelhas, violetas são azuis/ Sorria para mim, pois seu sorriso é que me dá luz/Estrelas são brilhantes e a lua também/ Não pare de sorrir, meu amor, só você me faz tão bem.”

Quando se virou novamente, Derek teve tempo apenas de abrir os braços para que Stiles pulasse nele e enlaçasse em sua cintura.

-- Não faça eu me arrepender.

-- Nunca.