Olhos de Cobra escrita por Laura Salmon


Capítulo 21
Capítulo 20 - Cobra




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/600337/chapter/21

Eu nunca havia visto tantas armas em um mesmo local. Parecia um depósito do exército. Não eram simples pistolas e espingardas comuns. Eu não entendia muito de armas, mas aquelas ali pareciam tão tecnológicas quanto as usadas em filmes de ação. Coloquei meu corpo na frente de Karina. Uma preocupação boba, já que nenhum de nós ia tocar em nada.

Revirei a mochila atrás de um celular. Eu precisava registrar aquilo.

― Sem bateria.

― Toma. ― Karina me entregou o celular dela. Havia uma foto nossa no painel. A foto do barco. ― Ah, para de frescura e abre a câmera logo.

Obedeci ainda sentindo os efeitos de ser o plano de fundo do celular dela.

Tirei várias fotos. Era importante que eu não aparecesse. Que eu não tivesse relação nenhuma com a descoberta. Faríamos uma denúncia anônima e com o esquema desarmado eu ganharia tempo para arrumar minha vida.

― Precisamos de umas fotos do lado de fora. ― Olhei-a por cima do ombro.

― Ótimo, Indiana Jones. Porque parece que o chão está se desmanchando sob nossos pés.

Voltamos pelo mesmo local de antes, nos arrastando com dificuldade por entre o resto da construção e o mato ao redor.

Consegui um ângulo bom. Estava andando de costas, ouvindo os passos de Karina atrás de mim quando de repente ela pareceu patinar. Virei-me a tempo de vê-la gritar e cair para um lado enquanto uma cobra corria para o outro.

Karina gritou entre dentes, apertando os olhos. Soltei o celular dela sem perceber e agarrei sua perna. Dois furos vermelhos próximos à sua tíbia faziam a pele dela inchar rapidamente. Ela arfou com mais força, apertando meu braço.

Agi por impulso. Coloquei a boca na perna de Karina e suguei aquele líquido. Ela gritou exageradamente. Cuspi ao lado, colocando minha boca ali novamente.

― Para! ― Karina estava chorando. ― Você vai se matar!

Sucção e escarro mais uma vez. Eu estava tirando ao menos uma parte do veneno. Fiz uma nova sucção. Ela se contorceu, chorando de forma dolorosa. Cuspi. O gosto era terrível. Mas então, o ferimento começou a sangrar. A sangrar muito.

― Karina. ― Coloquei o braço embaixo do pescoço dela, puxando-a. O suor e as lágrimas se misturavam em seu rosto pálido. Seus lábios estavam arroxeados. ― Aguenta firme, lutadora.

Precisei amarrar um pano na perna dela antes de erguê-la no colo.

― Karina. ― Ele se forçou a abrir os olhos. Seus dentes pressionavam os lábios com força. ― Olhe para mim. Fique olhando para mim. Não feche os olhos. Me ajude a te ajudar.

― Cobra, não vou aguentar. Meu coração tá doendo.

― Ouça a minha voz. ― Eu estava desesperadamente correndo com ela em meus braços rezando para que eu também não fosse picado. ― O meu coração está doendo mais que o seu. Acredita em mim?

― Sim.

― Não pare de responder minhas perguntas. ― Eu precisava saber se ela estava ficando confusa. Mas eu estava desesperado, não conseguia pensar direito. ― Karina. Você se lembra de quando me abraçou pensando ser o Duca?

― Sim.

― O que aconteceu?

― Eu fiquei assustada.

― Fisicamente.

― Eu te abracei por trás.

―E depois? ― Eu não conseguia correr tão rápido com ela em meus braços. ― Entrelaçou nossos dedos de forma desesperada.

― Foi. Enlaçamos nossas mãos. Você me segurou.

― Foi. Isso. ― Consegui finalmente sair do presídio. ― Sabe porque eu segurei você?

― Porque queria zombar da minha atitude patética.

― Não. ― Olhei para o rosto dela. Estava piorando. ― Era o primeiro abraço sincero que eu ganhava em anos. E ele nem era para mim. ― Sorri. Karina arfou. ― Mas foi em mim.

― Foi em você. ― Ela repetiu.

― O que foi em mim, Karina?

― O abraço que era para ser em Duca.

― Boa. ― Eu já conseguia ver a vila. ― Ka. Me descreva seu estado físico agora.

― Dor. ― Ela gemeu. ― Não sinto o meu pé. Cobra. ― As lágrimas dela doíam em mim. ― Eu estou com muito medo.

― Eu também. ― Confessei. ― Mas o que seria da coragem se não existisse o medo?

― Estou com medo.

― Karina. ― Avancei pela rua. As pessoas nos olhavam com curiosidade.

― Pedro.

― Não. Karina. ― Olhei em volta. ― Picada de cobra! ― Gritei. ― Alguém ajuda!

― Cobra! ― Ela gritou. ― Pedro!

― Karina. Pedro não está aqui agora. ― Engoli em seco enquanto as pessoas se aproximavam. ― Por favor, ajudem-na.

― Que cobra a picou?

― Eu não sei. ― Me amaldiçoei. Como um Cobra não reconhecia a própria espécie? ― O ferimento não para de sangrar.

― Traz ela aqui. ― Alguém gritou.

― Pedro. ― Karina chorou.

Eu não soube de imediato se doía ela chamar por Pedro ou vê-la morrendo. Levei-a até uma casinha branca espaçosa.

― Você teve muita sorte. Recebemos o carregamento de soro antiofídico ontem. Nunca tem soro aqui. Isso daí tá com cara de jararaca.

― Usem nela. ― Coloquei Karina deitada na cama. Ela segurou meu pulso antes que eu pudesse me afastar.

― Você puxou o veneno?

― Eu suguei!

― Tragam o remédio para ele. ― O grito soou distante. Senti meus joelhos pesarem e cederem.

― Pedro.

Foi a última coisa que ouvi dos lábios roxos de Karina antes de apagar completamente em um torpor que queimava minha garganta.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gente! O meu coração está doendo! Não está nada fácil pra Cobrina. Karina ainda não colocou uma pedra em Pedro (trocadilho tenso!) E no meio de seu delírio ela está chamando por ele! E o Cobra? Ele ingeriu uma quantidade significativa de veneno. Ai, meu coração!