La moitié...#Emison escrita por Zangada Bond


Capítulo 1
Rompimento...


Notas iniciais do capítulo

Essa historia foi remodelada, espero que curtam, acabei perdendo o filling e para não abandonar, decidir recomeçar.



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Emily POV

Chego em casa ligeiramente tarde e, na porta, a chuva especial de Manchester, vertical e horizontal simultaneamente, me deixa ensopada. Levo tanta água para dentro que parece que a maré transbordou e me deixou encharcada na base da escada como um pedaço de alga marinha.

É um lugar simpático e despretensioso, na minha opinião. Em um passeio de dois minutos no local, poderíamos passar como “profissionais” na faixa dos 30 anos, sem filhos. Gravuras emolduradas de ídolos musicais de Paige. Chique e pobre, um pouco mais este do que aquele. E tinta azul-escuro nos rodapés que faz minha mãe fungar: “Parece um pequeno projeto de centro comunitário”.

A casa está com o cheiro do jantar, apimentado e quente, mas, ainda assim, a tensão permeia o clima. Percebo o mau humor de Paige antes mesmo de vê-la. Assim que entro na cozinha, o retesamento nos ombros dela quando se aproxima do fogão confirma minha percepção.

— Boa noite, amor — cumprimento, puxando os cabelos úmidos para cima e tirando o cachecol. Estou tremendo, mas animada para o fim de semana. Tudo fica um pouco mais fácil de enfrentar em uma sexta-feira. Ela resmunga, o que só pode ser um olá, contudo não questiono para não abrir espaço para hostilidades.

— Você pegou o documento do carro? — ela pergunta.

— Ai, merda, eu me esqueci.

Paige se vira com a faca na mão. ‘Foi um crime passional, Meritíssimo’. Ela odiava atrasos em relação aos documentos do carro.

— Eu lembrei você ontem! Já está com um dia de atraso.

— Desculpe, vou cuidar disso amanhã.

— Não é você que vai ter que dirigir ilegal. — Também não fui eu que me esqueci de pegar semana passada, de acordo com o lembrete escrito com a letra de Paige no calendário. Não digo isso. Objeção: argumentativa. Paige continua:

— Eles guincham o carro para um pátio, sabia? Mesmo que esteja estacionado na frente de casa. Tolerância zero. Não me culpe quando eles amassarem o veículo como se fosse uma latinha de refrigerante e você tiver que andar de ônibus.

Penso em mim parada no ponto de ônibus.

— Amanhã cedo. Não se preocupe.

Paige se vira e continua atacando um pimentão que pode ou não me simbolizar aos olhos dela.

Eu me lembro de que trouxe uma bebida e me abaixo para pegar a garrafa vermelha de dentro da sacola molhada.

Sirvo uma dose e digo:

— Saúde, motorista!

— “Motorista”?

— Ônibus. Deixa pra lá. Como foi seu dia?

— A mesma coisa de sempre.

Paige trabalha com design gráfico para uma empresa de marketing. Detesta. Odeia ainda mais falar sobre isso. Mas gosta das histórias cabeludas dos processos no Tribunal Manchester Crown.

— Bom hoje, um homem reagiu a um veredicto de prisão perpétua com as seguintes palavras imortais: “Essa porra não está certa”.

— Haha. E estava?

— Se estava errada? Não. Ele matou um monte de gente.

— Pode incluir “essa porra não está certa” no Manchester Evening News?

— Só com asteriscos. Eu tive que transformar as barbaridades que a família dele dizia em um eufemismo: “gritos e choro emocionado do público”. A única palavra sobre o juiz que não o xingava era “velho”.

Rindo, Paige leva o copo para a sala de estar. Eu a sigo.

— Fiz uma pesquisa sobre a música hoje — digo, sentando-me. — Minha mãe está me atormentando dizendo que o sobrinho de “Margaret Drummond, do clube do bolo, contratou um DJ de boné que tocava coisas ‘obscenas e repletas de cacofonia a respeito de bunda e drogas’ antes de a dama de honra e os pajens irem dormir”.

— Que ótimo. Ela pode pegar o número dele? Mas sem boné.

— Pensei que seria legal um cantor ao vivo. Uma pessoa do meu trabalho contratou um cover do Elvis Presley. Parece ótimo.

Paige ficou séria.

— Não quero um idiota gordo com gel no cabelo cantando Love me Tender. Vamos nos casar na prefeitura de Manchester, não na Little McWedding Chapel, em Vegas.

Eu engulo o sapo, apesar de não descer fácil. ‘Perdoe-me por tentar tornar a coisa divertida.’

— Ah, então está bem. Pensei que seria engraçado, sabe? Mexer com todo mundo. Em que estava pensando?

Ela balança os ombros.

— Sei lá.

A truculência de Paige, observando de perto, sugere que eu posso estar perdendo alguma coisa.

— A menos que... você queira tocar?

Ela finge considerar a ideia.

— É, acho que pode ser. Vou falar com os caras.

A banda de Paige. Se alguém chamá-los de ‘SubOasis’, ela é capaz de matar a pessoa. Mas há vários detalhes. O que nós duas sabemos, ainda que nunca digamos, é que ela queria que seu grupo anterior, de Roosewod, fizesse sucesso, e o grupo atual é só um hobby de uma garota de mais de 30 anos. Sempre aceitei dividir Paige com a música dela. Só não esperava ter de fazer isso no dia do meu casamento.

— Você poderia tocar na primeira meia hora, talvez, e, então, o DJ faz o resto.

Paige faz uma careta.

— Não vou fazer todos ensaiarem e tocar só isso.

— Está certo, então, talvez mais tempo. Mas é nosso casamento, não um show.

Sinto as nuvens escuras aproximando-se com um raio entre elas. Conheço o humor de Paige, esse tipo de argumento, como a palma da minha mão.

— Também não quero um DJ — diz ela.

— Por que não?

— Eles são sempre ruins.

— Você quer tocar todas as músicas?

— Podemos fazer compilações no iPod, no Spotify , sei lá. E colocamos para tocar no modo aleatório.

— Certo. — Eu deveria deixar passar o assunto e retomá-lo quando Paige estivesse mais bem humorada, mas continuo insistindo: — Mas vamos incluir Beatles, Abba e músicas para os mais velhos? Porque eles não vão gostar se tudo se resumir a amplificadores e uma postura de “danem-se vocês, não vou fazer o que querem”.

Dancing Queen? De jeito nenhum. Ainda que seu primo Alan queira dançar. — Ela contrai os lábios e simula uma dancinha que poderia ser considerada gratuitamente ofensiva.

— Por que você fica se comportando como se isso tudo fosse uma grande chateação?

— Pensei que você quisesse se casar do nosso jeito, com o que concordamos.

— Sim, nosso jeito. Não o seu jeito — retruco. — Quero que você consiga conversar com nossos amigos e com os familiares. É uma festa para todos.

Olho minha aliança de noivado. Por que vamos nos casar mesmo? Alguns meses atrás, estávamos mais pra lá do que pra cá em um restaurante grego, comemorando o bônus que Paige havia recebido no trabalho. Surgiu como uma das coisas grandes com as quais podíamos gastar.

Gostamos da ideia de uma festa, concordamos que provavelmente estava na “hora”. Não houve pedido de casamento, apenas Paige levantou a taça e disse: “Foda-se, não é? Por que não?”, e piscou para mim.

Naquela noite, naquela sala de jantar abafada e barulhenta, pareceu uma decisão tão certa e firme, além de óbvia. Observamos as mulheres de dança do ventre arrastarem os clientes para girarem com elas, rimos até a barriga doer. Eu amava a Paige, e acho que em meu acordo foi um tipo de aceitação, como: “Bem, com quem mais vou me casar?”. Sim, vivíamos de certo modo insatisfeitos. Mas, assim como as manchinhas de bolor no canto úmido do banheiro, nossos problemas seriam difíceis demais de consertar, por isso nunca começamos.

Apesar de já termos esperado bastante tempo, eu nunca duvidei de que formalizaríamos as coisas. E, ainda que Paige usasse o cabelo todo despenteado e o eterno uniforme de estudante, com camisetas puídas de bandas de rock, calça desbotada e All Stars, por baixo de tudo aquilo, eu sabia que ela queria casar um dia. Telefonamos a nossos pais quando chegamos em casa, ostensivamente dividindo nossa alegria, talvez também para que não pudéssemos voltar atrás quando ficássemos sóbrias de novo. Nada de luz da lua e serenata, mas, como Paige diria, a vida não era assim. Agora, eu penso no dia, supostamente o mais feliz de nossa vida, cheio de promessas e irritação disfarçada, Paige toda exibida com seus amigos da banda, do jeito que estava quando a vi pela primeira vez, quando fazer parte daquele grupo era tudo o que meu coração pouco desenvolvido desejava.

— Por quanto tempo a banda vai ser a terceira pessoa neste relacionamento? Você vai sair para ensaiar quando eu estiver em casa cuidando de um bebê?

Paige afastou a taça dos lábios.

— Como assim? Como é? Eu vou ter que ser uma pessoa diferente, abrir mão do que gosto para ser boa o bastante para você?

— Eu não disse isso. Só não consigo achar que o fato de você tocar precisa atrapalhar nosso tempo juntas no dia de nosso casamento.

— Ah. Teremos uma vida inteira juntas depois disso — ela diz como se fosse uma frase de um condenado à morte, como se mandasse uma mensagem cifrada ao mundo. Não. Vou. Poder. Ir. Ao. Bar...

Respiro fundo e sinto um peso incômodo embaixo de minhas costelas, uma dor que eu poderia tentar afastar com vinho. Já funcionou antes.

— Não sei bem se esse casamento é uma boa ideia.

Pronto. O pensamento irritante que ardia dentro de mim, em meu subconsciente, gerando confusão sem fim, saiu de meus lábios. Fico surpresa quando percebo que não me arrependo de dizê-lo.

Paige balança os ombros.

— Eu disse para fazermos uma coisa fora do país. Você quis fazer aqui.

— Não é isso, estou dizendo que nos casarmos neste momento não parece uma boa ideia.

— Bem, vai ser bem esquisito se cancelarmos.

— Esse não é um motivo bom para irmos em frente.

Dê um motivo. Talvez eu esteja enviando mensagens em código. Percebo que caí na realidade, acordei, e que Paige não está percebendo a urgência. Verbalizei o tipo de coisa que não dizemos.

A recusa em ouvir não é bem uma resposta.

Ela suspira forte, um suspiro repleto de exaustão não articulada pelas dificuldades de viver comigo.

— Sei lá. Você está tentando arrumar briga desde que chegou em casa.

— Eu não!

— E agora está fazendo drama porque quer me forçar a aceitar um DJ que tocará um monte de lixo para você e seus amigos idiotas quando estiverem entediados. Pode contratar, faça tudo do seu jeito que não vou abrir a boca.

Idiotas?

Paige toma um gole de vinho e fica de pé.

— Vou continuar o jantar.

— Você não acha que o fato de não conseguirmos concordar com a música sugere alguma coisa?

Ela se senta de novo, soltando o peso do corpo na cadeira.

— Meu Deus, Emily, não tente transformar isso em um drama, a semana foi difícil. Não tenho energia para um ataque de birra.

Também estou cansada, mas não por causa de cinco dias de trabalho. Estou cansada do esforço de fingir. Estamos prestes a gastar milhares de libras na farsa, diante de todas as pessoas que mais nos conhecem, e essa ideia está me deixando terrivelmente assustada.

Na verdade a incompreensão de Paige é razoável. Um comportamento normal. É o de sempre. Mas aciona-se algo dentro de mim. Uma peça de meu maquinário finalmente pifou, do mesmo jeito que um bom eletrodoméstico sempre funciona até que, um dia, para.

— Não é uma boa ideia nós nos casarmos, ponto-final — digo. — Porque não sei nem se é uma boa ideia estarmos juntas. Não vivemos felizes.

Paige parece um tanto assustada. E, então, faz uma carranca, uma máscara de provocação de novo.

— Você não está feliz?

— Não, não estou feliz. Você está?

Paige fecha os olhos, suspira e leva a mão ao nariz.

— Não neste exato momento, veja que engraçado.

— De modo geral? — insisto.

— O que é ser feliz, posso saber? Sair pulando pelos campos, num barato de droga, e ver entre as margaridas azuis? Então, não, não estou feliz. Eu amo você e pensei que você me amasse o bastante para se esforçar. Mas está na cara que não.

— Existe um espaço entre as margaridas e as brigas constantes.

— Cresça, Emily.

A reação grosseira de Paige a qualquer uma de minhas dúvidas sempre é esta: “cresça”, “sai dessa”. Todo mundo sabe que é assim que os relacionamentos são, e você tem expectativas não realistas. Eu gostava da certeza dela. Agora, não sei mais.

— Não é o suficiente — digo.

— O que está dizendo? Quer que eu saia de casa?

— Sim.

— Não acredito nisso.

Nem eu, depois de tanto tempo. Foi bem depressa que tudo ocorreu, em poucos minutos do nada ao rompimento. Semelhante a estar na cabine de um foguete. A pressão. Talvez por isso tenhamos demorado tanto para nos casar. Sabíamos que as coisas meio borradas passariam a ser vistas com mais clareza.

— Vou começar a procurar casas para alugar amanhã.

— É isso o que nosso relacionamento de treze anos vale? — ela pergunta. — “Você não faz o que quero no casamento... então tchau”?

— Não tem bem a ver com o casamento.

— Engraçado como os problemas apareceram agora que você não está conseguindo as coisas que quer. Não me lembro dessa... introspecção enquanto eu comprava a aliança.

Ela tem razão. Será que eu fiz Paige comprar a aliança para ter um motivo? Meus motivos são realmente bons? Fraquejo. Talvez acorde amanhã e pense que minha decisão foi um erro. Talvez esse humor sombrio e apocalíptico de terrível clareza passe como a chuva que ainda está caindo lá fora. Talvez possamos almoçar amanhã, rabiscar as músicas que escolhemos em um guardanapo e retomar o planejamento...

— Certo... Se é para dar certo, precisamos mudar as coisas. Precisamos parar de brigar o tempo todo. Procurar um terapeuta, uma ajuda assim.

Ela pode me oferecer quase nada e eu vou ficar. Minha determinação é totalmente ridícula.

Paige franze o cenho.

— Não vou ficar sentada num sofá enquanto você fala para um idiota a tremenda babaca que sou com você. Não vou abrir mão do casamento. Ou nos casamos ou nos separamos.

— Estou falando sobre o nosso futuro, se tivermos um, e você só consegue se importar com o que as pessoas dirão se cancelarmos o casamento?

— Você não é a única que pode dar ultimatos.

— Isso é brincadeira?

— Se não tem certeza depois de tanto tempo, nunca terá. Nada mais há para falar.

— Sua escolha — digo, tremendo.

— Não, sua escolha — ela retruca. — Como sempre. Depois de todo o sacrifício que fiz por você...

Essas palavras me tiram do sério, explode a raiva.

— Você não abriu mão de nada por mim. Você decidiu se mudar para Manchester! E age como se eu tivesse essa dívida com você que nunca poderia pagar, e isso é idiotice! Aquela banda ia se separar de qualquer jeito! Não me culpe se VOCÊ NÃO TEVE SUCESSO!

— Você é uma menina muito egoísta e mimada — ela rebate, e também fica de pé, porque gritar sentado nunca é tão eficaz. — Você quer o que quer e nunca pensa nas coisas das quais as pessoas desistem para fazer sua vontade. Está fazendo o mesmo com esse casamento. Você é uma egoísta do pior tipo porque não se considera egoísta. E, quanto à banda, como você ousa dizer que sabe que caminho seguiríamos? Se eu pudesse voltar e fazer tudo diferente...

— Nem me fale! — grito.

Nós duas ficamos ali, ofegantes, uma briga entre duas pessoas com palavras como armas.

— Certo. Beleza — Paige diz por fim. — Vou até a casa dos meus pais passar o fim de semana. Não quero ficar aqui aguentando esta merda. E procure outro local para morar.

Eu me sento no sofá com as mãos no colo. Escuto quando ela sobe a escada, enche uma mochila de coisas. Lágrimas escorrem por meu rosto e pela gola da camisa, que mal começou a secar. Ouço Paige na cozinha e percebo que ela está desligando o fogo da panela de chilli. De certo modo, esse pequeno momento de reflexão é pior do que qualquer coisa que ela pudesse dizer. Cubro o rosto com as mãos.

Depois de mais alguns minutos, eu me assusto com a voz dela bem ao meu lado.

— Tem outra pessoa?

Olho-a, assustada.

— O quê?

— Você ouviu. Tem mais alguém?

— Claro que não.

Paige hesita, e então diz:

— Não sei por que está chorando. É o que você quer.

Ela bate a porta da frente com tanta força que mais parece um tiro.


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Notas finais do capítulo

Esse cap ficou pequeno, como eu disse antes, ainda estou trilhando a historia na minha mente, mas espero que tenham gostado,comentem o que acharam. Beijos de luz!