'Round the Memory Tree escrita por jupiter


Capítulo 1
A Carta


Notas iniciais do capítulo

boa leitura! ^^



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— Promete ficar comigo pra sempre?

— Prometo.

— Mas vai ser igual aos pais e mamães da Terra?

— Não. Eu vou te amar como ninguém nunca amou.

 

Querido Thomas,

 

todos os dias, exatamente às 15h26min da tarde, eu vou até a campina seca. Alguns dizem que vou até lá porque fiquei louca, psicótica; outros dizem que é muita saudade; uns dizem que o choque me pegou, e eu não consigo aceitar sua ida.

Eu digo que ainda espero encontrar você lá, de pé, ao lado da nossa árvore, com um anel de haste na mão, pronto para colocar em meu dedo anelar. Com a mesma bermuda jeans rasgada; com a mesma blusa de botões listrada de azul e branco; seus cabelos cor de areia voando com o vento que passava. Aparentando seus sete anos de idade, quando prometeu que me amaria para sempre.

Ainda me lembro de quando você me encontrava lá todos os dias às 15h30min, com as peônias amarelas e o novo anel de haste. Isso aconteceu com sete, oito, dez, quinze anos de idade…

Ainda me lembro de seu pedido de noivado de verdade. À cerca daquela mesma árvore sem folhas, com um anel de ouro. Você estava tão vermelho e nervoso… Mas seu sorriso, acima de tudo, estava lá — me confortando, me enchendo de alegria. Era meu mundo.

E, ainda depois do pedido de casamento, nós dançamos em volta da árvore. Chovera em cima da gente. Ainda me lembro da textura das gotas de chuva — eram tão suaves quanto eu me sentia; elas se pareciam com minhas lágrimas de felicidade, a verdadeira felicidade que eu sentia naquele momento.

Lembro-me de nossa pequena casa, os detalhes tão sutis mas ao mesmo tempo tão pronunciados quanto nós dois ao mundo. O jeito que você me abraçava, que beijava meu pescoço enquanto estávamos em nossa sacada, cuja tinha uma visão privilegiada de nossa árvore.

Mas, assim como existem dias bons, existem dias ruins.

Assim como me lembro dos dias de glória, também me lembro dos dias de luta. Ainda me lembro de quando você estava sentindo dores e eu te levei para o hospital. Ainda me lembro da voz do médico dizendo a doença horrível que você tinha, e que estava em estágio final.

Ainda me lembro de querer quebrar o hospital inteiro. E também me lembro de bater no médico; dei socos infinitos em seu peito indefeso, em seu rosto pasmo e em seus braços, que tentavam protegê-lo debilmente. Lembro-me de gritar “é mentira, é mentira!” em voz muito alta. Lembro-me de seus braços tentando me restringir, mas sem sucesso algum.

Com lágrimas nos olhos, me lembro também de você, tão fraco — mas, ainda assim, tão sorridente — naquele leito de hospital. O sorriso que você dava toda vez que me via me dava forças; me fazia continuar lutando por sua sobrevivência.

Lembro-me das piadas que fazia das enfermeiras, dos remédios e das próprias camas; me lembro de sua risada — fraca, mas era sua. E isso me deixava a mulher mais feliz do mundo.

Lembro-me de nosso último dia juntos. Você estava bem. Estava de pé outra vez. Minha avó sempre dizia, mas eu nunca acreditei: “Sempre há uma despedida.”

Nós passeamos outra vez, e fomos para a nossa árvore. Foi uma tarde feliz. Você me disse palavras lindas… Lembre-se: eu te amo mais que tudo nesse mundo. É uma pena não ter realizado tudo que te prometi, mas você sempre será minha, e eu, seu. Havia lágrimas em meus olhos — você disse aquilo como uma despedida! Eu não gostei. Mas estava tão feliz… E não queria que você achasse que não fora o suficiente para mim. Você já me deu tudo o que prometeu: me deu a felicidade. Eu te amo, foi o que eu respondi. “Eu te amo”, você também me disse.

E logo em seguida, você caiu em meus braços.

Lembro-me de ter chorado, clamado por socorro. Lembro de ter gritado para os quatro ventos — você se foi, e ali minha vida acabara. Meu chão havia sumido; meu cérebro, congelado.

Por que comigo? Por que agora? Não, não, não.

Eu só pensava horrores… e com o tempo, minha mente foi clareando. Eu já não pensava em mais nada — só conseguia olhar para nossa árvore.

Lembro-me de, depois de algumas horas,  olhar para seu rosto outra vez. Meu coração descompassou, assim como fazia todas as vezes que eu te via. Você estava tão lindo… a expressão tão serena… e seu sorriso estava lá.

Aquilo me fez sorrir diante as lágrimas. Me fez pensar duas vezes. Você se foi — isso era uma realidade inevitável; eu te perdi para a doença infeliz. Mas você foi para um lugar melhor e, com certeza, estava me olhando lá de cima.

Desde esse dia, então, eu não tenho estado miseravelmente triste e deprimida. Estou até feliz; de verdade. Porque sei que você me vê, todos os dias, me deslocando de nossa casa até nossa árvore.

Infelizmente, eu não o vejo; não vejo seu sorriso, não vejo seus olhos escuros a me fitar. Mas você é como o vento — eu não te vejo mais; entretanto, posso senti-lo.

Eu ainda te amo. Meu coração é só seu, e você, apesar de tudo, ainda é meu. Muito obrigada pela vida maravilhosa que me proporcionou.


Com minha vida, sua Ana.

 

Invernos vieram e se foram, você sabe

mas sentirei sua falta, jovem e doce

para uma dança ao redor da árvore da memória.

— Oren Lavie, A Dance ‘Round The Memory Tree.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! ♥