A Fantástica Fábrica é invadida. escrita por dayane


Capítulo 5
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Este capítulo é dedicado à Laynet. Bem vinda a fic :)

E, infelizmente não temos patrocínio, pois fics não possuem patrocínios.



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“Hey Bucket, como vão as coisas?

Nem acreditei que vão deixar outras pessoas visitar a fábrica, principalmente depois de... bem, você sabe.

De qualquer forma, escrevo para enviar meus votos de boa sorte e que tudo dê certo.

Assinado: V.S.”

Willy enrugou a testa e encarou o pupilo.

– Aquela menininha te envia uma carta só para isto?

– Por que não? - Charlie questionou enquanto mordia uma torrada.

O relógio marcava duas da manhã e os dois, mesmo estando cansados, não conseguiam dormir. Passaram as duas semanas sobressalentes, debatendo sobre o caminho que fariam durante a visita e quais os perfis das crianças. Willy se mostrou um gênio da pesquisa e que poderia, facilmente, se tornar um psicólogo – ou psicopata. Ele explicou como fez para entender a cachola de cada criança da primeira visita, resumindo passo a passo de cada uma e como deveriam fazer com as novas.

Willy revirou o papel e tentou ler a carta de trás para frente. O envelope estava jogado sobre a mesa, ao lado de Charlie, que quase deitava sobre a madeira velha enquanto a torrada acabava.

– Charlie, ela no mínimo falaria que está com inveja da Beauregarde.

– Vai ver ela deixou algo no envelope. - Charlie zombou.

Wonka sorriu. Aquele sorriso prazeroso que só ele conseguia fazer e que tanto encantava quanto assustava.

Charlie era um gênio. Pensou. Só ele para pensar em algo assim e, se uma pessoa pensou...

O herdeiro apertou os olhos. Willy não pensaria que alguém poderia usar o envelope como papel de carta.

Willy pegou o papel que jazia sobre a madeira e o abriu. O papel grosso não revelou nada, mas ele não desistiu tão facilmente. Separou as laterais, tomando cuidado para não rasgá-las, e foi presenteado com a descoberta de um papel colado ao outro.

– Voilà – Willy soltou com o francês perfeito.

Charlie não acreditou que alguém poderia brincar daquela forma.

– E o que diz?

– Tive tempo de ler? - Retrucou o chocolateiro.

Ele removeu o papel em branco, passando a ler o que estava no papel do envelope. Escrito a lápis, Veruca Salt passou uma informação que Charlie tremeu só de imaginar o que se passou na mente de Willy.

– Charlie, - Willy leu. - foi você ou sr. Wonka que descobriu esta parte da carta? Isto não importa muito. Andei conversando com a Violet, ela me disse que recebeu uma proposta quase irrecusável pelo bilhete, mas que resolveu dar para uma garotinha da rua dela. Só, tomem cuidado. Violet me disse que a pessoa parecia disposta a qualquer loucura pelo bilhete e, pelo jeito, para conhecer a fábrica. Se precisar, conte comigo.

Willy devolveu o evelope para a mesa e ficou em silêncio. Ele encarou o papel, relendo uma ou outra palavra e deixando Charlie ansioso. Mesmo que fosse apenas uma brincadeira, que Veruca não falou com Violet ou que a pessoa só tentou convencer a recordista a lhe vender ou dar o bilhete, era uma brincadeira muito perigosa.

Charlie não conseguia imaginar como Willy se sentia. Raramente o chocolateiro ficava tanto tempo parado, com os olhos e o rosto nulo de sentimentos, sem palavras para expressar sua raiva, tensão ou alegria.

Wonka se levantou. Tão subitamente que Charlie tremeu pelo susto que sentiu.

– Eu vou dormir.



Ϣ.Ϣ.



Charlie acordou com o barulho de um helicóptero passando por cima da fábrica. Ele gemeu, virou para o lado e agarrou um chocolate de pelúcia mal costurado, querendo esquecer o mundo dormir mais um pouco. Soltando um suspiro de prazer pelo aconchego da cama, o Bucket escutou a porta do quarto se abrir.

Willy saltou para dentro do quarto do pupilo, acendendo a luz e acreditando que o pupilo estaria tão energizado quanto ele.

– Bom dia estrelinha! - Gritou enquanto via Charlie cobrir a cabeça.

Willy caçou um calendário, apenas para verificar se a data estava correta. É, estavam no dia da visita.

– Vai dormir Willy!

– Mas, Charlie, é hoje o dia.

Charlie ficou imóvel por um momento e logo sentou sobre o colchão. Os olhos arregalados, preocupado com a atitude que Willy deveria, naquele momento, estar tomando. Mas o chocolateiro já estava vestido, exalando amendoim por todo o quarto e sorrindo ansioso pela hora em que veria os ganhadores do convite dourado.

– Willy...

– Vamos estrelinha! - Willy segurou a mão do herdeiro e o puxou da cama. - Há muito para fazermos!

– Mas e a carta de Veruca?

O chocolateiro empurrou o herdeiro para o banheiro e fechou a porta, segurando o trinco até o momento em que Charlie parou de resmungar e tentar abrir a porta, e o chuveiro ligou.

Willy encostou a cabeça a porta e fechou os olhos. Se alguém tentasse invadir sua amada fábrica, nem mesmo seu pupilo poderia lhe parar. Ele ficou escutando Charlie tomar banho, a água escorrendo até o chão e o barulho do sabonete caindo. Como ele poderia permitir, que seu sonho fosse, quase, arruinado novamente?

Calmamente, o Wonka foi para o guarda-roupa e retirou a roupa que o pupilo usaria. Arrumou a cama e depois verificou a cartola que usava. O espelho lhe revelou a beleza do conjunto e como parecia jovem e sério. Adorava aquelas roupas, o fraque, a camisa, a calça e os sapatos lustrados. A forma como uma simples peça lhe fazia ser o cara mais bonito e importante que os olhos podiam encontrar.

Sorriu.

Não sabia o que falar sobre sua amada cartola. Só sabia que ela sempre devia estar por perto. Ela e sua bengala de doce.

Charlie saiu do banheiro com a cintura enrolada na toalha – ou seria o contrário? - e o vapor do chuveiro lhe acompanhando. O pupilo usou alguns cosméticos e colocou a roupa – indo para o banheiro para colocar a calça e voltando com o cabelo penteado.

– Se alguém invadir este mundo, não voltará sã e salvo ao outro. - Willy respondeu com seu sadismo.

A espinha de Charlie sentiu a descarga de medo, que o cérebro enviou ao corpo. Willy sabia amedrontar. Sabia como provar que a vida de alguém podia estar em risco e ainda assim confundir a cabeça da pessoa.

– Willy...

– Não adianta, Charlie. - O chocolateiro abraçou o herdeiro. - Só quem é convidado, pode entrar.

Charlie retribuiu o abraço, sentindo que Willy buscava um amparo. Era do chocolateiro, viver sozinho, reinando pela fábrica e liderando os Oompa Loompas. Era de Wonka, viver pensando por si e pelos outros sem esperar que alguém pense por ele. Era de Willy Wonka, acreditar que a solidão é a parte mais gratificante da vida.

Até que veio ele. Até que Charlie Bucket provou o contrário e nem cobrou por isto.

E Charlie sabia que Willy era uma criança velha e madura, mas extremamente ferida e acuada. Charlie amava esta criança, que as vezes agia imprudentemente e impulsivamente, expulsando qualquer coisa ruim de sua fábrica.

Charlie amava Willy Wonka, que com um abraço, lhe pedia apenas compreensão. E em troca, recebia amor e carinho.

– Você não foi ver seu pai. - Willy estremeceu em seus braços. Então era disto que ele queria falar? - Ele está cobrando a visita.



Ϣ.Ϣ.



“Os portões da fábrica permanecem fechados. As cinco pessoas sortudas que encontraram os bilhetes dourados, já estão posicionadas em frente a fábrica e aguardam o horário de entrarem. Conversamos com duas das crianças que, cheias de entusiasmo, falaram não terem a mínima ideia do que esperar.”

A jornalista falava com profissionalismo, mas Willy sabia que ela queria estar ali, acompanhando uma das crianças. Era algo que Willy sabia que acontecia, os adultos sempre se freando e aceitando a derrota, sem mesmo imaginar a possibilidade de seguir em frente.

– Se parece impossível – ele sussurrou – impossível é.

Charlie arrumava a gargantilha com o brasão da fábrica. Willy, que outrora foi contra colocar televisões na fábrica, parecia viciado em noticiários envolvendo a fábrica. As vezes ele lia o jornal, – o que significa que todos os dias, enquanto toma o café da manhã, ele lê alguma coisa no papel velho e sujo – mas sempre deixava um Oompa Loompa caçando matérias na televisão. Matérias que envolviam a fábrica e o mundo dos chocolates e que o deixariam ciente dos feitos mirabolantes que seus concorrentes nunca faziam.

– De que você está falando? - Charlie perguntou. - Da jornalista?

– Não. - Willy encarou o pupilo – Sabe a última visita? - A pergunta fora retórica – Percebeu que só as crianças eram impulsivas? Que os adultos se retinham e não questionavam?

– A mãe de Violet e o pai de Veruca fizeram perguntas. - Charlie retrucou.

– Bobas. Foram as crianças que avançaram as barreiras, entendendo que esta fábrica tem regras diferentes das externas.

Charlie abriu a porta do cômodo e Willy saltou da poltrona, indo na direção do pupilo.

– Então, os adultos se retraem? - Charlie manteve a conversa.

– Cheios de barreiras. – Eles caminharam pelos corredores sabendo que o caminho era longo. O elevador estava guardado, para que ninguém quisesse andar nele e causar acidentes. - Sempre com "pode isto e não pode aquilo, porque é coisa de criança". Olhe para nós, Charlie. Duas crianças reinando um mundo invejável.

– E solteiros. - Charlie brincou.

Willy sentiu o corpo tremer, as pernas travarem e um cheiro esquisito a rondá-lo. Era uma fragrância meio amarga e só podia ser classificada como: o cheiro do medo. O coração batia rápido e a fábrica pareceu fria. A garganta ardia e a saliva pareceu amarga demais para estar tudo bem com o corpo.

As luvas de Willy Wonka rangeram. Charlie sabia que era um assunto que Willy não gostava de falar, - relacionamentos - mas a cara envergonhada que ele fazia era o suficiente para que o pupilo sempre que pudesse, fizesse-a. Só que desta vez, as coisas saíram diferentes. O cheiro de amendoim, de Willy, estava mais intenso e ele parecia uma estátua, de tão rígido.

O herdeiro colocou uma das mãos sobre o ombro do chocolateiro.

– Willy. - Os olhos de Willy estavam abertos, abertos demais e com as pupilas extremamente contraídas. - Você está bem?

– Claro. - Respondeu em meio a uma risada aguda. - Muito bem. Bem demais. Principalmente agora, que você me lembrou de como eu posso ter destruído a sua vida.

O chocolateiro voltou a caminhar, seguindo com passos rápidos e fazendo a calda do fraque voar. O rosto tão contraído, como se ele estivesse indo matar seu maior inimigo.

– Eu não disse isto.

– Charlie, eu não preciso escutar todas as letras para entender as coisas.

E a sensação de saber que podia ter criado um segundo Willy, fez Willy Wonka desejar nunca ter aberto a fábrica. Mas já era tarde, Charlie estava tão conectado a fábrica, quanto o criador dela. Os Oompa Loompas o amavam e...

Seria possível Charlie se apaixonar por uma Oompa Loompa?

– O que você acha dos Oompa Loompas? - Willy se virou para Charlie, parado de caminhar e fazendo com que o pupilo quase se chocasse contra o chocolateiro.

– Você sabe o que acho.

– Se casaria com um?

– Willy Wonka! - Charlie gritou incomodado e envergonhado. - O que aconteceu com você?

Charlie seguiu pelo caminho, imitando o chocolateiro e quase correndo para a porta da fábrica.

– Charlie! - Chamou Willy. - Veja a possibilidade! É melhor do que namorar alguém por fora da fábrica, as pessoas não são confiáveis.

O Bucket girou nos calcanhares, fazendo Willy frear subitamente e quase cair.

– Você é maluco! - Os olhos de Charlie estavam tão grandes quanto os de Willy. - E eu nem estou preocupado com isto!

– Nem se aparecer um fio branco?

– Willy, você viveu sozinho por anos. Se eu não me apaixonar, se eu não encontrar uma mulher para amar, então farei como você. Não se preocupe com algo, em minha vida, que não me preocupa.

Wonka viu Charlie girar nos calcanhares e seguir caminho para a entrada da fábrica. Charlie fez uma brincadeira, apenas isto. Uma simples e ingênua brincadeira, que tinha uma estrutura verdadeira e preocupante, mas que ninguém se preocupava.

Certo. Ele pensou. Uma bala de cada vez ou o gosto fica ruim.

Charlie sentiu Willy se aproximar, correndo por um curto caminho até matar a distância. Ao seu lado o chocolateiro sorria como se estivesse bolando alguma brincadeira ou piada. Willy tinha seus pontos de previsibilidade, atitudes que tinha antes de certas coisas, mas que ele só deixava visível quando não era algo sério.

– Se tudo der errado, temos algumas Oompa Loompas bonitinhas.

Charlie riu e socou o ombro do tutor. Quem pensaria naquela possibilidade? Um humano, do tamanho de Charlie, casado com uma criaturinha como a Dóris?

– Não pense na Dóris. - Willy adicionou.

– Era nela que eu pensava.

– Não! Ela é minha favorita e velha demais para você! - Wonka riu, sendo acompanhado pelo pupilo.

A frente deles, estava o cenário para as boas vindas. Willy insistiu em reproduzir o começo da última visita, revisando a hora da pirotecnia e, só por precaução – ele disse a Charlie – deixou a ala de enfermagem para bonecos, pronta para atendê-los.

– Senhor Wonka – Charlie sussurrou.

– Diga, estrelinha. - O chocolateiro sorriu.

Ambos estavam mergulhados na nostalgia. Charlie vendo a cena de outro ângulo, como se pudesse ver através dos bonecos e da porta, a pequena criança pobre e esfomeada, que aguardava com o avô, a hora de conhecer a fábrica.

Enquanto Willy Wonka, anos depois, relembrava o misto de orgulho e terror que sentiu quando viu a última chance de acreditar nas pessoas fora da fábrica. Wonka moveu os olhos para Charlie e, com a visão periférica, apreciou sua esperança, seu herdeiro, tenso e ansioso, pronto para mostrar aquele mundo para algumas crianças sortudas.

Charlie B. Wonka, o herdeiro de seu mundo. Seu orgulho. Seu futuro.

O relógio marcou dez horas. Os portões externos se abriram e a voz de Willy surgiu pelos alto-falantes – Era a mesma gravação da primeira visita. As crianças entraram, os portões se fecharam e o show estava para começar.

Charlie estava preso em algo. Preso em alguma parte do cérebro dele e sem notar que, naquele momento de distração, Willy Wonka sumiu do seu lado. Ele estava sozinho, em frente a uma porta que se abria e uma música animada que causou um arrepio em seu corpo, fazendo-o mergulhar mais fundo na nostalgia.


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