Set saía distraidamente de casa, girando a chave extra com o dedo e sorrindo feito um bobo por causa de uma mensagem de Cris, como o amor deixava as pessoas imbecis, o ruivo riu de si mesmo e imaginou se podia viver sem seu baixinho.

Estava se encaminhando ao portão principal, já vendo o motorista da família parado a sua espera, na verdade a espera de Cris, que chegaria a qualquer momento para os dois irem juntos para a escola, mas parou quando Laura o chamou, ele fitou a madrasta o chamar de lá de dentro e sentiu uma enorme onda de preguiça o invadir, mas sabia que se não fosse ia morrer nas mãos dela, então optou por não arriscar, não queria deixar Cris viúvo antes da hora.

Depois daquele pensamento besta, ele começou a andar até ela, entrou novamente em casa com um sorriso sereno e apaixonado, imaginado a imagem de Cris em seu casamento, como seria que o pediria em noivado? Poderia usar um carro de som? Não, o loiro o mataria na certa, ou então subornar um mergulhador a grudar a mensagem na cabeça de um peixe e depois fazer Cris pesca-lo?

O sorriso de Set aumentou, estava tão distraído que quase não viu a figura ruiva sentada ao lado de Laura, mas quando seus olhos pairaram sobre a mulher, seu sorriso diminuiu até se tornar inexistente, ela possuía cachos ruivos e olhos castanhos, ele a conhecia de fotos e histórias. O ruivo engoliu em seco.

Encarou Laura, e a expressão da moça respondeu tudo.

— Meu Deus Set, é mesmo você? – A mulher sorriu, se levantando e caminhando até ele. — Quantos anos você já tem? Dezessete? Já é quase um homem.

Set recuou um pouco quando ela ameaçou tocar-lhe o rosto, sentia repulsa e raiva, como ela ousava aparecer assim do nada?

— Laura quem é ela? – O ruivo perguntou de proposito, e conteve um sorriso ao ver a expressão de desgosto na cara da broaca. Laura por outro lado, lançou lhe um olhar assassino, que foi rapidamente substituído por um sorriso cínico.

— É a sua mãe querido, não reconhece?

Set abriu a boca para responder, mas foi impedido pela voz firme do pai.

— É claro que não reconhece, queria o que? –O homem parou em frente a porta da sala, encarando a ruiva com seriedade. — Sumiu por pelo menos a vida inteira dele e agora quer que seu filho te veja como uma mãe? Fala sério.

— Olha Michael, eu só voltei porque seu pai disse que você estava com problemas com o comportamento de Set. – Ela disparou, encarando Michael com ódio. — Ele e praticamente toda a família, me imploraram para voltar porque você não está mais dando conta.

O homem parecia mais nervoso que o normal. — O que vai fazer? Seguir os conselhos daquela corja e tirá-lo de mim? Meu filho pode ser difícil de lidar, mas eu posso dar conta sim, eu o conheço melhor do que vocês todos.

Set encarava Michael com incompreensão, o jovem sentia uma ponta de culpa, colocou a mão no bolso, onde havia separado o dinheiro para comprar algum cigarro no tempo livre e sentiu-se o pior filho do mundo.

— Set? – A voz de Cris ecoou na mente do ruivo e chamou a atenção de todos os presentes. — O que? Atrapalhei algo?

— Não meu menino. – Michael bagunçou o cabelo dele. — Você nunca atrapalha! Só... Estamos em uma situação complicada!

— Se quiserem eu posso ir para escola na frente. – O loiro encarou Set, e entendeu que ir embora não era uma opção, ele caminhou até o namorado, sem evitar encarar a ruiva.

— Agora Isadora, pode tentar ser civilizada e nos deixar em paz? – O homem propôs sem nenhuma paciência e Set sentiu Cris abraçar-lhe de lado, o olhar da ruiva passou de Michael para os dois meninos, Set pôde traduzir sem nenhum esforço que aquilo a incomodou, então puxou Cris mais para perto e beijou-lhe o pescoço, fazendo um carinho em seu rosto.

— Mas que inferno é esse? – Isadora parecia a ponto de explodir, Cris a encarava confuso e se separou de Set ao decifrar a expressão de nojo no rosto da ‘sogra’. — O que diabos está pensando Michael? Permite isso? E ainda diz que tem o controle da situação?

— O que foi mãe? Não consegue suportar a ideia de um filho Gay? – Set provocou, recebendo o olhar furioso dela.

— Eu já aleguei ao juiz todas as suas falhas de comportamento Set, e é só questão de tempo para eu tê-lo de volta! Vou acabar com todos esses seus... –Ela lançou um olhar de nojo a Cris, que abaixou a cabeça. — Problemas.

— E DESDE QUANDO SE IMPORTA? – Set extravasou mais pelo modo como ela menosprezou Cris do que por qualquer coisa. — VOCÊ SE DIZ MINHA MÃE, MAS PARA MIM NÃO PASSA DE UMA VADIA!

— Set! – Laura o repreendeu nervosa. Michael estava chocado demais para agir.

— DIZ QUE CRIS É UM PROBLEMA, MAS VOU DIZER QUEM É O PROBLEMA AQUI, E É VOCÊ! – Set sentiu Cris o envolver em um abraço, certamente tentando acalma-lo. — SUA VADIA, PUTA! ONDE ESTEVE DURANTE MINHA VIDA INTEIRA? Onde?

— Vai se ver comigo quando eu te enfiar em uma internato! – Ela parecia mais chocada do que todos.

— Vai se ferrar! Volta para o puteiro de onde saiu. – Set se desvencilhou dos braços do namorado e, sentindo as lágrimas pontarem, correu para o quarto.

~ ~ # ~ ~

Era a milésima vez que Set respondia a mesma coisa ao assistente social:

— Não, eu nunca agredi essa criança e alego, de novo, que o vídeo é falso e, de novo, digo que meu primo testemunhou quando Alex chutou areia na cara de Lucas. Acho que isso é uma informação relevante certo? – Ele sorriu vitorioso quando o homem permaneceu em silencio.

— Você pode até estar limpo nessa, mas o pai do menino está tão bêbado que mal enxerga um palmo a sua frente. Vai me dizer que isso também é fake?

Set teve que admitir, o cara era divertido até.

— Não isso não é mentira e é por isso que Lucas estava comigo e não com ele. – O ruivo resmungou, pensando na falação que o chefe ia arrumar no outro dia. — Harry bebe muito, mas quando está sóbrio é um cara até decente.

— Pelo menos isso você reconhece, o menino, Lucas, vem sendo tratado com descaso, o pai mesmo confessou e ainda por cima ameaçou bater na criança na nossa frente, sabe o que isso significa? – A expressão do homem estava mais suave e sua voz era menos acusatória.

— Que ele está bêbado? Ok isso é óbvio, mas eu entendi a outra coisa que quis dizer, vocês vão enfiar o menino em um orfanato ou joga-lo em algum lar da vida.

— Adoraria que pudesse ser diferente. Mas o que me sugere?

Set quis rir, era óbvio que o homem estava jogando a responsabilidade para ele.

— Que estávamos em processo de resolver isso e estávamos prestes a contatar vocês.

O assistente social pareceu surpreso. — Como é?

— Eu e meu noivo amamos muito esse menino, e conhecemos os dois lados de Harry, o bêbado largado, que é o que vocês tiveram o prazer de suportar e o lado sóbrio e decente desse homem, antes desse tal ‘desconhecido’ denunciar o Harry, já sabíamos que ele não queria cuidar de Lucas e ele nos pediu para que ficássemos com o menino. Entendeu?

O homem mordia uma caneta encarava o ruivo de um modo indecifrável.

— Primeiro você e seu noivo tem que ser aprovados, meu Deus como isso soa estranho, mas enfim, primeiro quero mandar um dos meus funcionários a sua casa para avaliar tudo.

— Sem problemas, agora posso sair?

— Sim, mas saiba que posso te chamar a qualquer momento.

— Claro, mas... Vai mesmo deixar Lucas conosco?

— Depende do que for melhor para o menino, trabalho nisso a quarenta anos e sei que quanto menos trabalho der, melhor para a criança. Nada pior do que ter que tirar uma criança da família e deixa-la largada em um abrigo até arrumar um lugar para morar. – O homem respirou fundo, sorrindo no final da frase.

— Uau. Digo... Isso foi lindo. Você é um cara bacana!

— Sei, passe o nome e o contato do seu primo! E quero deixar claro uma coisa, o menino não vai chegar perto do pai até termos certeza de que é seguro, ou seja, vai demorar.

~ ~ # ~ ~

Encarar o chefe com cara de poucos amigos ao ver o ruivo saindo mais cedo do trabalho? Set fazia isso tranquilamente. Encarar um assistente social? Moleza!

Mas havia algo que o ruivo tentava evitar a todo custo e que, infelizmente, não foi dessa vez que ele conseguiu.

Set encarou com tristeza as vinte ligações perdidas de Cris, o loiro estava furioso, e isso causou a Set um medo quase fóbico, Cris já era explodido por natureza, porém ficava mil vezes pior quando estava realmente irritado, suspirando e rezando pela própria alma, o ruivo discou o numero do noivo e esperou ansiosamente até que ele atendesse.

“20 Vezes! Essa expressão tem algum significado para você? Seu energúmeno viciado em torrada!” Cris disparou antes mesmo do ruivo poder dizer um humilde, dramático e arrependido ‘oi’. “Estou quase surtando, quase tendo um.. Um... Olha o que faz comigo, seu tatu!”

“Oi amor, eu meio que estou na-”

“Eu sei! Eu sei! Porque fizeram a questão de me mandar ir ai, mas não posso ir, tenho uma escola para manter nos eixos, e meu pai, o maldito do meu pai, fez questão de dar as caras, olha como o meu dia está lindo!” Um breve momento de silencio. “Vai ficar quieto? Feito um retardado mental que acabou de sair do manicômio? Se quiser eu posso desligar agora, ir até ai e socar sua cara para ver se aprende a falar. ”

“Cristian Collins, amor da minha vida, você só falta me fuzilar e sinto que só não faz isso porque estamos a distancia, então querido, lindo, deus do olimpo, paixão da minha vida, meu docinho, eu realmente não sei o que dizer, pois estou ciente dos meus direitos e de que tudo e qualquer coisa que eu disser poderá ser usado contra mim.”

Set pôde ouvir o suspiro cansado de Cris, e por um momento conteve a vontade de se tele portar até onde o noivo estava e abraça-lo o mais forte possível.

“Eu fiquei com medo, não posso te perder e você sabe disso, seu idiota! Me diz como está a situação por ai”

Set sentou-se em um banco da praça, sentindo as palavras do loiro pesarem em sua mente.

“Eu sei que tem medo, mas não se preocupe, não vai me perder, sabe as coisas se complicaram um pouco amor, não posso dizer por telefone, quanto falta para as aulas acabarem?”

“Não muito, por que?”

“Meu chefe está louco da vida e disse que só quer ver minha, como é que ele disse? Ah! A minha ‘fuça ruiva,’ novamente lá para as duas horas, vida de editor não é fácil sabia? Ele acha que eu respiro para ler aqueles manuscritos que ele tem o prazer de ignorar. Mas enfim, almoço fora hoje, leve o tampinha também, conhece o restaurante perto da biblioteca municipal?”

O ruivo ouviu uma risada abafada e se sentiu imensamente mais feliz, não seria fácil dizer ao noivo tudo o que acabou decidindo com o assistente social, mas era necessário.

“Sim, vai ser bom poder conversar um pouco, tenho muita coisa a dizer e sinto que coisa boa não vai vir de você.” Pela voz de Cris, Set sentia a curiosidade do noivo emanar, e se controlou para não rir, não só porque Cris o espancaria depois, mas também não riu porque não teria forças.

“Cris... É sério o que tenho a dizer, eu consegui convencer o cara de que to limpo, mas Harry... Talvez ele não possa se aproximar de Lucas por um tempo.”