A comida era gordurosa e molenga, daquele tipo que até seu cachorro se recusaria a comer, mas Kise Ryouta não ligava. O atendente do drive thru era simplesmente gato demais.

E aqueles olhos azuis eram suficientes para Kise ser o primeiro da fila todo santo dia, e pegar sempre o mesmo pedido — salada ceasar, batatas fritas grandes, milkshake de morango; aparentemente esses eram os itens "menos piores" do cardápio —, e sempre tentar puxar assunto com o atendente cuja plaquinha de identificação mostrava o nome Kasamatsu Y.

Ryouta sempre dava a comida para aquele morador de rua que vivia no beco do lado de sua casa e que se chamava Carl. Carl gostava das batatas gordurosas e molengas e tinha até engordado alguns quilos com aquela dieta saudável.

Kise Ryouta tinha vontade de gritar na cara do atendente gato algo como eu odeio a comida, mas eu gosto de você. Porque foi meio impossível não se apaixonar pelo jeito que o boné fica meio torto na cabeça dele, ou como ele conta cuidadosamente as moedas, ou como ele — de propósito ou não — sempre encosta na mão de Ryo quando vai devolver o troco e sorri daquele jeito que os funcionários de redes de fast food são obrigados.

O sorriso pode ser o mais falso do mundo, mas Kise não se importa. Era um sorriso, e o rapaz morria de medo de bater no poste toda vez que saía do drive thru porque suas mãos tremiam demais.

Foi andando na rua que avistou um anúncio pequenininho na porta de um bar na Fifty Street, dizendo que a atração musical daquela noite não era ninguém menos que o cara do drive thru.

Então toda santa noite, religiosamente, Kise Ryouta assiste o atendente tocar violão e cantar músicas de autoria própria naquele barzinho imundo, sempre sentado no mesmo lugar, e sempre pensando em como odiava aquelas músicas do fundo do seu coração.

O atendente tocava músicas sobre todos os lugares que ele já viveu e todas as pessoas que ele já beijou, e isso deixa Kise doente, pensando sem parar se o outro rapaz sequer sabe que ele existe.

Pensar nele é a pior parte do meu dia.

Mas eu não consigo evitar; todo dia eu vou no drive thru, e toda noite eu vejo ele tocando. Eu deveria parar de ser tão idiota e desistir. Mas não consigo... Acho que é porque secretamente eu gosto disso.

Kise Ryouta poderia passar horas na cama pensando naqueles olhos azuis, ou naquela cara de enfezado, ou como os dedos dele fazem um ótimo trabalho arranhando aquele violão, ou como a voz dele consegue penetrar no fundo da alma e arrancar qualquer tipo de esperança que Kise tivesse criado.

Estava tão besta que mal conseguia sair da cama. Era como se o maldito atendente estivesse 100% do tempo encravado na sua mente. Isso, particularmente, era uma merda.

Pensar nele é a pior parte do meu dia.

Tanto que naquela noite Ryo sonhou com ele. Sonhou em como finalmente tomou coragem e foi falar pro atendente que a comida do lugar em que trabalhava era simplesmente bosta, e que suas músicas eram piores ainda, e que deveria parar de se fazer de difícil e sair logo com ele para o bem de todos. E ele topava. Porque secretamente gostava que Kise era sempre o primeiro da fila no drive thru, e que ficava feliz que Kise assistia a todas as suas apresentações, o quão bosta fossem.

Aquele sonho meio que ficou pregado na mente de Ryo o dia todo.

Pensar nele é a pior parte do meu dia.

"Meu nome é Kasamatsu Yukio, obrigado por terem comparecido hoje."

Kise Ryouta levanta da mesa num pulo e corre até o palco improvisado.

"Eu sou sempre o primeiro da fila do drive thru, eu odeio a comida, eu odeio suas músicas, pensar em você é a pior parte do meu dia, mas eu gosto de você e do jeito que você conta moedas e toca na minha mão e da sua voz e do jeito que o boné nunca fica certo na sua cabeça, e eu quero ver você tocando músicas sobre mim, e sobre meus beijos, e sobre cada lugar que a gente morar, por isso eu queria saber se você topa tomar um café comigo um dia desses."

"Eu secretamente gosto que você é sempre o primeiro da fila no drive thru, e que sempre assiste as minhas apresentações, mesmo achando elas uma bosta. Na verdade, eu odeio café, mas sei fazer milkshake."