Bad Heroes escrita por Katreem


Capítulo 1
Pilot


Notas iniciais do capítulo

Tentei fazer personalidades diferentes para os personagens, mas sem perder a essência de cada um, é claro.



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Virei minha cadeira na encurvada do corredor principal da escola enquanto continuava a receber os mesmos olhares costumeiros que diziam silenciosamente: “Coitada, não pode andar.” Às vezes eu reflito o que eu faria se me engajasse em uma fisioterapia e conseguisse, de fato, andar com minhas próprias pernas pelos corredores da escola. Minha vida não mudaria muita coisa, continuaria sendo péssima em matemática, aritmética e qualquer outra coisa que envolvesse números e letras juntos, continuaria sendo baixinha e parcialmente inútil, meus cabelos ainda seriam pretos e meus olhos ainda seriam verdes, também me vestiria da mesma forma. A única coisa que mudaria é que eu não necessitaria da ajuda da minha mãe para me vestir e para fazer quase tudo. As pessoas ainda me notariam como se eu fosse de outro planeta e as líderes de torcida ainda me prenderiam no banheiro quando terminassem de me ofender com coisas do tipo: “Aria, é melhor você correr antes que eu te pegue, ah, acho que você não pode fazer isso!”. Eu ainda seria Aria Montgomery, a garota paraplégica.

Enquanto impulsionava minhas mãos nas rodas da cadeira lentamente pelos azulejos alternados em vermelho, verde e bege do corredor, eu podia assistir Hanna Marin e Alison DiLaurentis de frente para um dos armários do outro lado corredor. Alison brandia um martelo e golpeava o mesmo com uma força exagerada na porta do armário, amassando-o. Hanna riu e apanhou o martelo da mão de Alison quando ela parou de bater e o ofereceu para ela. Hanna fez a mesma coisa que Alison, talvez menos forte. Alison ria tanto que chegava a fechar os olhos azuis de uma forma extremamente fofa.

Mas se tem uma pessoa em que você não pode acreditar de maneira alguma, essa pessoa atende pelo nome de Alison DiLaurentis. É sério, não se iluda pelos cabelos longos, dourados e cheirosos. Nem pelos olhos azuis como o céu nos dias de sol, pelo sorriso amigável e pela forma de andar. Alison e sua melhor amiga, Hanna, eram a espécie de pânico naquela escola, elas não mexiam com ninguém que não mexesse com elas, por exemplo, eu. A única vez que Alison me dirigiu a palavra foi quando estávamos na aula de educação física, no sétimo ano, quando Eric Kahn resolveu fazer uma piadinha sobre minha condição de cadeirante.

Alison dizia estar com infecção estomacal por um sanduíche de atum que devorou na cantina, mas o treinador Burton com certeza sabia que aquilo era mentira, assim como todas as coisas que Alison proferia. Ela ficou sentada ao meu lado, observando o jogo. Eu fiquei de fora por motivos óbvios, mas não era como se estivesse mesmo a fim de correr pelo ginásio atrás de uma bola. Quando a bola veio quicando na minha direção pelo chão polido do ginásio e parou há alguns metros de distância da minha cadeira, Eric se aproximou com um sorrisinho no rosto bronzeado. Alison tinha saído para beber água e de longe eu conseguia vê-la preencher um copo com água e engolir tudo de uma vez.

— Ei, Aria. Pode correr até ali e pegar a bola? — Eric pronunciou com um ar risonho, fazendo todos seus amigos rirem junto, improvisando um coro de risadas que penetrou minha cabeça como uma enxaqueca sem fim. Tudo o que fiz foi me diminuir na cadeira o máximo que pude, sentia meu cérebro ofegando.

— A Aria não pode, mas eu posso. — Alison apareceu de repente, pisando lentamente na direção da bola e pegando-a nas mãos. Eric parou de sorrir e olhou impreciso para os amigos que estavam logo atrás dele, e foi nesse momento que eu vi a bola vermelha que costumávamos usar para jogar queimada alcançar em cheio o rosto de Eric, ele tropicou para trás com a mão no rosto e quando virei minha cabeça ligeiramente na direção de Alison, ela sorriu rebeldemente para ele. — Agora pega essa bola e enfia no meio da sua...

— Srta. DiLaurentis. — O treinador Burton repreendeu-a com os lábios arregaçados embaixo do bigode castanho. — Você e o Sr. Kahn querem me acompanhar até a sala do diretor? — Ela foi para a diretoria, mas não era como se ela e a cadeira que ficava de frente para a mesa do diretor não fossem velhas conhecidas.

Alison estourou em uma gargalhada maior ainda quando Lucas Gottesmam surgiu no corredor, ele levava alguns livros embaixo do braço e se aproximou das duas lentamente. A essa altura, Hanna já tinha parado de surrar a porta do armário.

— O que fizeram com meu armário? — Ele inquiriu de forma amedrontada, olhando para Hanna.

— A mesma coisa que você fez com minha calça, Hermie. — Alison redarguiu jovial, olhando penetrantemente nos olhos castanhos de Lucas. Ela se referia ao que tinha acontecido no dia anterior, quando Lucas derrubou café acidentalmente na calça branca dela. Depois de ontem, eu anotei na capa de trás do meu caderno que nunca deveria sequer passar perto dela com algum líquido ou alguma comida em mãos. Preferia não correr o risco de chegar ao outro dia e ver Hanna castigando meu armário com um martelo que elas provavelmente furtaram de algum lugar.

— Mas foi um acidente... — Lucas tentou se proteger.

— Foi o que o médico disse para a sua mãe quando você nasceu? — Ela irrompeu grosseiramente. Nesse momento todos os alunos que estavam no corredor haviam parado o que quer que estivessem fazendo para prestarem atenção nos três. Lucas se manteve mudo diante da pergunta, o que fez Alison sorrir falsamente. — Vamos, Han. — Alison chamou pela amiga e antes de ir embora derrubou os livros de Lucas no chão, passando por ele e esbarrando fortemente seu ombro no do garoto. Ela olhou para trás uma última vez e cerrou os olhos na direção dele e disse algo que não conseguir entender.

— Ela disse “Bem-vindo ao inferno.” — Spencer Hastings sussurrou para a garota morena que estava ao lado dela, as duas permaneciam no armário ao lado do meu observando as artimanhas de Alison e Hanna. Sua amiga, Emily Fields, revirou os olhos de forma desgastante com a informação recebida por Spencer. Elas duas eram o tipo de pessoa com quem eu gostaria de iniciar uma amizade, mas não era como se me notassem ou estivessem interessadas em criar algum vínculo comigo.

De personalidade forte e extremamente competitiva, Spencer Hastings era a única pessoa naquela escola capaz de bater de frente com Alison e Hanna, as pessoas que tinham o completo repúdio da filha mais nova de Peter e Verônica Hastings. As duas estavam constantemente entrando em disputas e se estranhando pelos corredores sempre que possível. No entanto, não era como se Alison conseguisse espantar Spencer com seu ar de menina perversa, Spencer simplesmente sentia que deveria dizimá-la da face da terra. E devo acrescentar que muitas pessoas ficariam agradecidas se ela conseguisse completar, com sucesso, tal feito.

Alguns minutos mais tarde, na aula de biologia, o Sr. Sanders decidiu que nada melhor que um trabalho em um grupo de cinco componentes sobre os tipos de granito encontrados na superfície da terra poderia melhorar o humor instável de quase todos ali. Alison arremessava bolinhas de papel em Spencer durante a explicação do trabalho, fazendo-a pegar as bolinhas e lançar de volta, o que só instigava a garota de cabelos louros a continuar. Emily parecia compenetrada na divagação do professor sobre o trabalho, anotando tudo no caderno, enquanto Hanna semelhava ter desmaiado na cadeira ao lado de Alison, ela parecia absorta em um sono pesado e preguiçoso. Foi impossível não soltar uma risadinha confortável enquanto Alison a cutucava com a ponta da caneta.

— Dividirei os grupos em um sorteio. Vou tirar cinco nomes daqui de dentro — Ele mostrou um chapéu com vários papéis recortados e dobrados e a sala se juntou em um resmungo por não poder escolher os elementos de seus grupos. — e esses nomes serão o grupo A.

Ele enfiou a mão no chapéu depois de chacoalhá-lo levemente e tirou cinco papéis dobrados de lá, colocando-os em cima de sua mesa branca. Desdobrou os mesmos e leu em voz alta.

— Alison DiLaurentis, Aria Montgomery, Emily Fields, Hanna Marin e… — Estreitou os olhos parecendo não entender a própria letra. — Spencer Hastings. — Disse por fim, e com isso, começou a retirar os papéis restantes do chapéu.

Respirei profundamente, afinal, aquilo seria uma experiência completamente catastrófica.

*****

Eram quase cinco horas da tarde quando meu pai me assentava de volta na cadeira de rodas e eu via de longe as silhuetas de quatro garotas. Depois que combinamos de nos encontrar na reserva Lakers, que ficava no caminho da estrada de Ravenswood, pedi ao meu pai que viesse me deixar aqui. Spencer afirmou conhecer a área tão bem quanto conhecia a própria casa e disse que poderíamos encontrar vários tipos de pedras aqui, no entanto não achei que Alison e Hanna também fossem aparecer, já que elas praticamente nem ouviram o que Spencer ponderou durante a nossa reunião de grupo mais cedo na aula. Mas elas estavam lá, junto de Emily e Spencer enquanto meu pai iniciava seu discurso de regras a serem seguidas quando eu estava longe dele e da mamãe.

— Aquela é Alison DiLaurentis? — Meu pai perguntou incisivo, apontando o dedo indicador até onde as garotas estavam agachadas vasculhando o chão. Com certeza meu pai me puniria se eu estivesse tendo algum tipo de relação com ela, pois quase todos moradores de Rosewood já haviam sofrido com as atividades de vândalas de Alison e Hanna que adoravam destruir e depredar os carros e as casas dos moradores.

Assenti positivamente para ele.

— Não quero você perto dela, vamos voltar para casa e eu peço para trocarem você de grupo. — Ele já ia empurrando minha cadeira em direção ao carro quando eu travei as rodas.

— Pai! É só um trabalho! — Impacientei-me, olhando-o de maneira embravecida. Assisti ele tomar uma posição defensiva.

— Aria...

— Não, pai! — Interrompi o que ele estava prestes a começar. — É só um trabalho, ok? Nada demais. — Explicitei em um tom de voz mais calmo dessa vez. Meu pai bufou.

— Tudo bem, mas me ligue quando isso acabar que eu venho correndo te buscar. — Beijou minha testa de forma delicada como sempre fazia e entrou no carro. Tossi um pouco com a poeira que se elevou na estrada de terra quando meu pai arrancou com o carro e sumiu na imensa linha que ligava Rosewood à Ravenswood.

Observei a enorme floresta na beira da estrada e pela falta de árvores e a pouca vegetação eu conseguia ver as meninas a vários metros distância catando o que achavam no chão. Era a primeira vez que eu iria interagir com qualquer uma delas e um nervosismo súbito me acometeu quando Hanna e Alison me olharam com sorrisinhos nos rostos bonitos. Hanna falou algo para as outras garotas e elas ergueram seus rostos para me olhar, novamente me senti nostálgica. Spencer fez um gesto com as mãos me chamando até lá e depois todas se voltaram a procurar granitos no chão úmido e preto.

Porém quando fiz menção de movimentar a cadeira percebi que seria impossível passar pelo chão lamacento e úmido com a cadeira de rodas, pois eu sabia que quando as rodas tocassem o solo daquela parte elas afundariam alguns centímetros, tornando impraticável a ação de me mover. Com isso, fiquei o pareceram dez minutos parados, olhando fixamente para o chão. Eu nunca quis tanto andar desde o dia em que meu irmão, Mike, ameaçou me bater com seu taco de lacrosse, era brincadeira, mas fiquei com medo de verdade e quase rolei escada abaixo junto com a cadeira, sorte a minha de Mike ter me segurado.

Quando ousei erguer minha cabeça para olhar as meninas, achei que Alison e Hanna estariam gargalhando e rolando no chão de tanto rir do que estava acontecendo e me armei psicologicamente para receber uma piadinha criativa de Alison, mas o que avistei foi Hanna marchando na minha direção com um sorriso gentil nos lábios. Ela desviava de alguns pedaços de troncos no chão e pisava em cima de determinadas pedras para não sujar sua bota de cano curto da Marc Jacobs. A vontade de sair dali correndo só não era maior que a vergonha que eu estava sentindo.

— Precisa de ajuda? ­— Hanna perguntou quando já estava perto o suficiente, com um sorriso espontâneo no rosto. Sua voz aveludada e até mesmo rouca me fez sentir o rubor que se apossou do meu rosto esquentar minhas bochechas.

— Não, eu... Eu acho que posso pegar umas pedras daqui mesmo. — Sorri sem mostrar os dentes, levantando a cabeça para olhar em seus profundos olhos azuis. Ela riu.

— Aqui não tem o que estamos procurando, baixinha. — Se abaixou para ficar na altura da cadeira e eu me perguntei como ela sabia da minha baixa estatura se nunca tinha me visto em pé. — Vem, eu te levo até lá. — Aproximou-se e sem aviso prévio enlaçou minhas pernas com o braço direito e segurou minhas costas com o esquerdo, erguendo-me da cadeira com extrema agilidade. — Você é mais leve do que eu pensava. — Concluiu pensativa antes de rumar em direção às meninas.

O caminho até lá foi silencioso, eu conseguia sentir o coração de Hanna batendo tranquilamente contra minha costela enquanto entornei seu pescoço — timidamente — com os braços para ficar de uma forma mais confortável.

— Isso não é um granito, Alison! — Spencer grunhiu com as veias do pescoço saltadas quando nos aproximamos.

— É claro que é! — Alison ergueu a pequena pedra que tinha nas mãos. Era óbvio que aquilo era só uma pedra normal, mas ela parecia não dar à mínima.

— Vocês duas, chega! — Emily se pôs entre as duas que se encaravam fervorosamente. — Alison — se virou para a garota de jaqueta de couro —, você não está vendo que isso é só uma pedra normal?

— Se você diz, Amiga da Spencer, eu acredito. — Alison jogou a pedra no chão com um sorriso irritante nos lábios rosados. Hanna deu uma risada silenciosa por pouco não contida.

— Meu nome é Emily. — Ela informou parecendo irritada e se afastou da loira. Spencer fez uma careta para Alison, que apenas riu em troca.

— Tanto faz. — Alison deu de ombros e se voltou para onde eu e Hanna estávamos. — Ei, Han.

— Ei, Ali. Eu trouxe a Aria. — Hanna apertou de leve sua mão na minha cintura.

— Oi, Aria. — Spencer sorriu de forma amigável. Apenas acenei com a cabeça, fazendo o mesmo com Emily quando ela me cumprimentou também.

Depois disso seguiram-se algumas horas procurando pedras, Hanna me guiava até onde as meninas iam e eu apenas dizia quando via alguma semelhante a um granito, Alison apenas as recolhia e jogava dentro da enorme bolsa que Spencer carregava. Elas duas se alfinetaram mais algumas vezes e Emily não se preocupou em intervir, pois já era costumeiro que se provocassem sempre.

— Galera, já está escurecendo. Acho melhor irmos embora, já temos o suficiente. — Emily ponderou olhando para a lua que começava a se pôr no céu tão escuro quanto seus olhos.

— Vamos, então. — Spencer tomou a frente, começando a andar de volta para a estrada.

— Cacete! Que porra é essa? — Alison exclamou chamando a atenção de todas nós.

Uma enorme poça de um líquido brilhoso estava ao lado dos pés dela, que agora olhava agachada para aquilo. Spencer se aproximou mais do que depressa e se colocou na mesma posição de Alison, olhando o líquido com olhos brilhando. Hanna também se aproximou, e consequentemente, eu também. Emily andou até lá, mas não parecia tão empolgada quanto Spencer e Alison.

— Alison, de onde saiu isso? — Spencer a olhou.

— Caiu do céu, bem do meu lado. — Alison olhou para cima e arregalou os olhos azuis. — Spencer! — Ela empurrou Spencer pelos ombros fazendo-a cair para trás, no mesmo instante que um pingo enorme daquele líquido caiu onde ela estava, mas atingiu somente sua perna esquerda. Spencer deu um grito agudo. Vi Hanna e Emily abrirem a boca em espanto, assim como eu.

— Spencer, você está bem? — Emily correu até a amiga, com um olhar preocupado e assustado.

— Isso queima! — Spencer grunhiu com os dentes cerrados em uma careta de pura dor.

— Vamos dar o fora daqui! — Alison anunciou, se erguendo enquanto Emily ajudava Spencer a se levantar. — Vamos! — Chamou uma última vez antes de ser atingida por uma gota enorme que caiu do céu, ela segurou o braço atingido com uma careta de choro. — Merda!

Praguejou e então era como se uma chuva tivesse começado, eu via a as gotas caírem por todos os lados enquanto Hanna corria dificultosamente comigo em seus braços. A essa altura todas já tínhamos sido atingidas e a dor que corroía meus braços lambuzados daquele fluido brilhante era quase insuportável. A jaqueta de Hanna estava toda esburacada onde ela havia sido abrangida.

— Hanna! — Gritei quando senti seus passos ficarem cada vez mais lentos e seus olhos fechando lentamente, seus braços me soltaram e eu caí no chão molhado.

— Me desculpe... — Sussurrou antes cair no chão, completamente desacordada.

— Spence... Acorda... — Emily estava ajoelhada ao lado de Spencer e tudo que vi foi ela caindo no chão enquanto Alison se agachava ao meu lado, me pegando pelos braços. Ela mexia sua boca como se estivesse falando algo, mas o som parecia não chegar aos meus ouvidos. Depois disso, tudo começou a escurecer ao redor das minhas vistas e Alison continuava falando, porém meus olhos já estavam se fechando...


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado.